blog caliente.

31.7.05

Chateia-me isto

Eu vou de férias. Ir de férias é uma chatice porque, para as coisas serem bem feitas, ficava-se de férias. Não se ia. Não conheço nenhuma casa de férias mais confortável do que a minha, nem sítio nenhum onde me apetecesse mais estar, estando de férias, que aqui, onde estou.

Eu devia era estar de férias, não precisava nada de ir de férias. Não me apetece ir, agora. Depois de amanhã não digo que não, ou mesmo na sexta-feira que vem. Mas agora não me apetecia. Raios partam o dia 1, mais essas normas turístico-fascizantes do "dia de entrar, do dia de sair".

Vou enfiar-me num T3, parece que muito espaçoso e confortável, a cheirar à maresia que se cheirar de lá. Sem piscina, sem papel em branco (é isto, aqui, que eu não escrevo em mais lugar nenhum, bolas), sem as minhas coisas todas. Não posso levar as minhas coisas todas, isso chateia-me. Chateia-me, que querem?

Levo algumas coisas, pronto. Mas como é que essa merda das coisas que se levam se escolhe? Não posso levar a TV cabo, espero que aquela espelunca tenha, não deve ter, nem edredons de jeito tem, pelos vistos. Cinquenta e seis CDs, isso levo, e o "David Crockett" do Sousa Tavares, que leio sempre até meio e nunca acabo, e uns papéis que tenho de ler, sobre "planos de acção", uma paneleirice pegada de gestores. Mas não posso levar a minha Sony topo de gama, que lê perfeitamente mini-disks de Brahms, mas não cabe no raio da bagageira!

Vá lá que a Volta dá na 2, penso eu. Isso e o Sporting com a Udinese, que há-de ser na 1.

Nervos

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Afinal como é?
O "galochas" vem ou não vem?
Chateia, isto. É que vi o Porto a jogar hoje, bolas. E bolas.

Eu gosto mesmo disto

Já agora (que é como quem diz "mamai mais esta") vem-me a talhe de foice (e não "talho de foice", para não haver aqui converseta sobre carniça) a diferença fonética entre o que diz um vilarrealense e o que diz, no mesmíssimo comprimento de onda, um bragançano ou, em alternativa, um tipo de Mirandela ou de Macedo de Cavaleiros. Não sei como se chamam os habitantes desses pequenos lugares pitorescos donde nem sequer se vê o Douro.
Minto, sei como se chamam alguns. Confesso.

Bom.

Para um vilarrealense não há ovos. É uma maneira de dizer, pronto. Mas, no fundo, não há. Os ovos, aquelas coisas ovais que são desfechadas - com maior ou menor violência - por galináceos cus, para um vilarrealense são umas meras coisas revestidas de calcário frágil, que servem para fazer omeletas, com muita cebola e salsa.
Não ligam aos ovos, os habitantes de Vila Real, mas sabem-lhes o nome: se tiverem um no frigorífico, têm lá, exactamente, um ovo. Lê-se "ôvo". Se tiverem dois, têm dois ovos. Lê-se "óvos".

Já um trasmontano puro e duro, daqueles que saem para Espanha "por Zamora" em lugar de ser pelos outros sítios civilizados, um trasmontano desses (olá Mirandela, olá Macedo, viva lá Bragança e Vila Flor!), perante um ovo, em tendo de o nomear, chama-lhe "óvo". Se tiver dois, tem ali dois "ôvos".

Há, em Portugal, muita gente engraçada. O que justifica certas coisas e, não justificando outras, não me impede de vos prestar o que vos sei prestar: serviço público permanente.
Leia-se, claro, "permanãinte".

Melhor que os dialectos: os sotaques

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Isto, escrito, deve sair pífio. Mas todos sabemos que, seja o que for, antes de sair, pode sempre vir a sair pífio. Vê-se como saiu só depois de sair.

Admito, aqui, que a minha vida tem conhecido os seus momentos mais altos e mais baixos (alguns vergonhosamente baixos, admito) naquelas ocasiões em que, sem pensar muito, emiti fosse o que fosse "só de esguicho". A emissão deve ser precedida dum trabalho laborioso, passe o pleonasmo, eu sei, mas eu não tenho tempo para isso. E nem é só tempo, é inteligência: se penso muito baralho-me e, depois, não me sai nada, nem pífio, nem profundo.

Ora, então, isto dos sotaques. Isto é muito engraçado. Distinguir, por exemplo, um reguense dum habitante daquela cidade que parece um monturo e que dá pelo nome régio de Vila Real (devia, pois, ser uma vila) é fácil. Para quem sabe.

Pegue-se na palavra "sebenta", por exemplo. E remetamo-nos aos tempos da faculdade. A sebenta, é sabido, era o instrumento de trabalho único para estudar disciplinas como Urologia, Ortopedia e Otorrino. Não havia pachorra para ler compêndios sobre ciências pequeninas (embora no caso da Urologia isto dependa muito, evidentemente), bastava a sebenta.

Ora, aqui, note-se a finura pueril desta nuance, onde um vilarrealense diz "sebéinta", um reguense tende, inexoravelmente, a dizer "sebãinta".

Isto é muito engraçado. Eu sei, chatos do caraças, diz-se sebenta. Mas o único sotaque que é ridículo é o de Lxboa que, aliás, nem é um sotaque, é um dialecto. Os outros, os verdadeiros sotaques, não correspondem a estudos de mercado, nem a paneleirices da moda. Sai-nos assim há imenso tempo, nem sequer consegue deixar de nos sair assim. Entendem? Pronto, eu esmifro-me a explicar: a gente não faz esforço nenhum para as palavras nos sairem assim, a gente esforça-se é para nos sairem escorreitas. Vêem a diferença?

Eu vou de férias, mas hei-de passar algum tempo a aborrecer-vos com coisas destas, que se escrevem facilmente enquanto descansamos os costados e as pernas, crestados da canícula e dos sargaços.
Por exemplo, os de Famalicão, é consabido, não são de lá: são de "Famalicoum". E, como vou estar na Póvoa (minha terra adoptiva, só não nasci lá por acidente, terra que já não visito há mais de três anos, aliás), vou ter exemplos disto, diariamente.

Quando chegar a falar de Fafe e de Felgueiras, das nuances fonéticas que distinguem fafenses e "pães-de-loenses", já estareis fartos de mim. Se eu chegar a dissecar as diferenças de sotaque entre um gaiense de Vilar de Andorinho (Vilar diz-se "Bilhar") e um gondomarense de São Cosme (diz-se "Çàncòsme"), nesse caso, ficareis agoniados.
Já estais agora? Azar! Eu próprio já ando agoniado de mim há muito tempo, consolai-vos com isto.

Ah! E Agonia é apelido conhecido e respeitado no eixo Póvoa-Vila do Conde. Eu hei-de ter muito que vos contar. Deus vos proteja.

Dialectos: Lxbôa

Tenho seguido divertido e com interesse o que Vital Moreira vem escrevendo sobre o "lisboetês".

O "lisboetês" é um dialecto não oficial que, cuida quem o utiliza, é, fundamentalmente, chic.
Não é usado, apenas, por lisboetas. Várias pessoas se sentem atraídas, de forma fatal - quando não de forma fatela - pelo dialecto. Eu conheço algumas. Em situação que cuidam de alguma relevância, essas pessoas assumem o "lisboetês" como fonética preferencial. São, geralmente, jovens que se transformam em "xovens", ou menos jovens que se catapultam à relevante posição de "tíus". É como um "ríu" que corresse para o mar das "grandexensações". Entendem? Bom, os de Caxcaish entenderão melhor, presumo.

Isto passa-se, mesmo, com alguns nativos de Vila Pouca de Aguiar, ou de Murça, quando em contacto com seres que consideram superiores, mesmo que seja por habitarem as zonas limítrofes de Chelas. Lê-se "Chêlas".

Em tempos que já lá vão, convivi com duas primas que falavam "lisboetês" convicto. E ainda falam, presumo. Mas assumiam, além dessa, uma outra vantagem na sua esmagadora dimensão comunicativa: frequentavam o Liceu Francês Charles Lepierre, o que lhes fornecia, ao "lisboetês", como que um sufrágio santo de "internacionalidade".
Internacional é o que, em Portugal, se chama aos estrangeiros: um estrangeiro, seja cançonetista ou mimo, é quase sempre uma atracção internacional. Já repararam? Mesmo que seja apenas um inglês de Birmingham, ou um francês do Limousin, é um internacional que ali temos. Mais, mesmo, que um "tipo de fora", um estrangeiro. Claro que se o tipo trabalhar nas obras é estrangeiro mesmo. Nas obras trabalham "monhês", "prêtx", ou "'cranianx", que as vogais do fim e do princípio são para comer. Há muita fome escondida, geralmente, nos adeptos do "lisboetês".

Lembro-me de, por essa altura antiga, com nove tenros e retorcidos anos, já me enervar que me gozassem por abrir os "entes", como em "doentes" e "dentes", e por abrir bem as outras vogais que me ensinaram a abrir. Como em Corgo, por exemplo, que o rio chama-se Corgo, não se chama "Côrgo". E, este era o supremo gozo que levava sempre, este era fatal, por meter a partícula de ligação "i" entre palavras que terminassem (a primeira) e começassem (a segunda) pela letra "a". Como em "límpida água", que me saía (e me sai) sempre "límpidaiágua".

Explicar isto a alguém de Vila Pouca, ou mesmo de Fornelos, que frequente sítios "in", como "pàdóques do Estoril", já é difícil. Explicá-lo a duas moças da Linha que, ainda por cima, frequentavam escolas estrangeiras (com um péssimo resultado no que respeita ao português, evidentemente: a minha Mãe, que era professora, tinha de lhes dar explicações da Língua Pátria, nas férias durienses, porque davam muitos erros em qualquer ditado), resultou impossível.

Já pelos doze anos, quando o buço começa a ornamentar-nos a região supra-labial, escurecendo-a, perdemos-lhes o respeito de vez. Elas vêm de cima para baixo, a gente desfere-lhes cabeçadas de baixo para cima.
Lembro-me da discussão acesa que tivemos, um dia, no carro do pai delas, a caminho de Lisboa. Eu ia num estado lastimável de opressão porque, na altura, a simples visão dos bairros miseráveis de Sacavém e dos Olivais - na sua altitude macabra e esmagadora, para quem ia das berças do profundo Norte- me metia respeito. Caramba: arranha-céus!

No entanto, durante a viagem, as duas resolveram brincar comigo e com a minha ignorância parola de reguense, lavado mas dado a sossegos. Quiseram obrigar-me a dizer Lille, Cannes, Marseille e (pasme-se) Lens.
Eu disse "Lile", "Cánes", "Marselha" e "Lans". Como em "lãs".

Foi uma risota que se estendeu até à frente da viatura, até o motor pareceu esganar-se na delícia da minha humilhação. Explicaram-me tudo, as cabras, até "Marrecei-eh" me explicaram!

Encontrado assim, tão só, no primeiro banco de trás da minha vida, fora dos meus e do meu sossego, cresceu-me a pequena revolta dos pobres que não têm quem lhes valha e têm, nessa ausência de conforto, de se valer de si. O que faz um buço, meu Deus.
Picado nos meus brios de duriense já, praticamente, "sub-pentêlhico", desenrasquei-me. Lembrei-me, graças a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, que as cabras diziam "Paris", como eu dizia. E fodi-as pela primeira vez, tenho a certeza, embora, sendo elas de Lisboa, estas certezas nunca se possuam em definitivo:
- Olhai: explicai-me lá, então, porque dizeis Paris. Não deveríeis vós dizer "Pàrri", ó inenarráveis putas?

O carro seguiu, em marcha lenta e abafada pelo silêncio (que me oprimiu, a mim, mais que a ninguém), até Algés. Que se diz "Algêsh", para quem não sabe.

É que eu, do resto da frase toda, não me lembro bem. Podem ter-me saído outras palavras. Sei lá o que lhes disse! Sei-lhe é o sentido, à frase inteira.
E recordo, sem dúvida nenhuma, a violência daquele "putas", que aqui na Régua se diz "poutas!", quando o parimos com merecida raiva.
Faz efeito, ao menos: cria silêncios opressivos mas pacificadores.

Almas

O Miguel é um blogger muito simpático. Perdoa-me, mesmo, os excessos verborreicos. Mesmo quando eu próprio me torço de vergonha deles, relendo-me a frio.
Mas é muito mais que isso, o Miguel. É escorreito e bom. Foi sempre, leiam-lhe os textos mais antigos. As letras escorrem ali, calmas e límpidas, dando forma e corpo às ideias que lhes estão na génese.

O Miguel é um homem que escreve claramente. E bondosamente. Eu leio-o sempre, conheço-o de há muitos dias. Se não quiserem ter trabalho de pesquisa, leiam este exercício de lucidez e de bonança.

Não há rancor, não há petulância, não há nenhuma soberba de doutor, no que escreve o Miguel. Há é uma maneira bonita e boa de discorrer lucidamente, muita elegância calma, muita segurança e, acima de tudo, "muita mais alma" do que ele pensa.

Ele é modesto. E sabe que sim.
Tem muita alma, o Viva Espanha, tem de ter: só se reconhece nos outros (mesmo que por bondade pura) o que já conhecemos antes.

30.7.05

Ladies in Lavender


Uma brisa, vinda não se sabe de onde e que desaparece tal como veio, passa por duas mulheres cuja maior parte da vida já se esgotou e atravessa-lhes as almas. As mesmas almas livres com que nasceram, sedentas de vida e busca, de desejo de caminhar sempre adiante até que um fim as trave. Aquela parte pura e intemporal da alma que se pensa ser a que nos vem de termos sido pequenos, mas que, afinal, morre ao mesmo tempo que nós.
Pela voz de um violino, recordam-se de si próprias. A brisa, que não percebe ninguém nem se faz entender, fala através de um violino. E, sempre que o violino fala, recordamo-nos de nós, dessa parte de nós que nos guarda, invioláveis de tudo. A parte da alma em que guardamos os segredos do que amamos sofrendo. Ou do que sofremos, amando.

As extraordinárias Judi Dench e Maggie Smith são as duas mulheres, as sisters of mercy que vagueiam nos meandros de si próprias enquanto ouvem o som de um violino. De corpos cansados, mas com almas que correm, de tão vivas.

Adenda: a Carla também viu o filme. E eu também gosto mais da Maggie Smith...

Escapes

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As chaminés são os tubos de escape das casas.
Ficam no telhado porque as casas não são como os carros, são como as pessoas, os fumos tendem a sair pela cabeça.
Não se vêem nas pessoas, claro, nem os fumos nem as chaminés, porque as pessoas não são obra de engenheiros.
Se fossem, tínhamos cópia do projecto e pagávamos SISA e prestações, em lugar de pagar para ver.

Esta chaminé é minha. Não a dou. Preciso dela.

Esguichos de besugo

"O país a arder e a gente de férias, a curtir".
O Contra-Informação, como todos os "formatos curtos de digestão fácil", tende à demagogia intestinal do velho UL-250.
Têm pouco tempo, os criadores, o que os limita à paródia rapidinha. Limitarmo-nos à paródia rapidinha é uma coisa digna dos Parodiantes de Lisboa, que o meu pai ouvia à hora do almoço, enquanto eu comia silenciosa sopa, aos 3 anos. Não é mau. Mas não passa disso.

Bastava chover e era menos uma piada sobre os políticos. Era, sobretudo, menos uma má piada. As boas piadas não devem depender do acidental. Não devem, aliás, depender de nada.

Bichas

A lolita, que tem sido elogiada - de forma que me causa (admito) inenarrável inveja - pela sua capacidade de síntese, conseguiu escrever dezassete frases (ou mais) sobre o que disse João Miranda naquela diatribe "dos CTT e da Papelaria Fernandes".

Eu também sei ser sintético. E superlativo.
Ora vejam. Isto é serviço público.

João Miranda disse isto.
Eu, se fosse liberal, diria isto: a Papelaria Fernandes devia fechar ou, numa alternativa de mercado "reconvertível", despedir um dos seus funcionários, que poderia ir trabalhar para os CTTs que tivessem mais bichas.
Não sei onde é que os CTT têm mais disso, mas há-de ser em Lisboa, porque é lá que há mais de tudo.

E pronto. Era assim. Viram? Claro que não ganho uma bomba de ouro com isto, nem um elogio, sequer, mas isto está tudo comprado. Seus Paixões! Seus... olhem, eu não vos trato mal, que eu gosto de vós. Em brasileiro, para amolecer: "eu amo vocês, tudo beim!".
Blargh!

Atenção, não me venham dizer que não tenho capacidade de síntese, seus facciosos! O texto, se eu o escrevesse, seria só o que está em itálico! E a bold. Seria sintético, OK?
Bolas, eu sabia.

Rostos

Bruno Paixão decidiu como decidem os árbitros e as pessoas portuguesas todas, em geral. Decidiu a direito, porque não decidir assim é muito mais complicado e exige limpidez. A direito é mais fácil, as críticas diluem-se nas regras, quando se decide a direito. E perde, com isto, a limpidez, que se dilui sempre menos em meios movediços, quanto mais não seja por ser sólida. A limpidez é transparente, mas é sólida. Não sabiam? Atirem um calhau de xisto à água dum ribeiro e vejam que, depois do chapão, a pedra não se dissolve. Vai ao fundo? Isso é outra conversa. Uma conversa em que se provaria, facilmente, que um xisto carece de limpidez. Admito.

Moutinho fez falta grosseira em jogo amigável. Se não tivesse acontecido mais nada, isto é, se o outro tipo não lhe tem dado um murro, na ressaca, se se ficasse a contorcer de "fiteira dor", no chão, Moutinho levaria um amarelo. E o outro, nada. Seria justo.

Para mentes pequenas e habituadas a julgar a direito, o facto do inglês (que é africano) se ter levantado do chão e pespegado um soco no Moutinho tornou-se um problema novo. Os tontos não resolvem, em regra, problemas novos. Vão ao regulamento e exibem-no, eis a verdade que aqui está.

A vida não é assim.

Bruno Paixão, perante problema novo, julgou a direito: amarelo para Moutinho (que pediu logo desculpa, sendo mesmo afagado - porque é puto e pediu desculpa, não havendo nada mais ternurento nesta vida que ver um puto pedir desculpa, sem ser por SMS - pelos adversários) e vermelho para o outro. Se tivesse mostrado o vermelho aos dois seria forçado, se houvesse vermelho para Moutinho teria de haver roxo para o homem do Boro. Isto complica muito, quando não se decidiu, antes, sobre o que fazer em situações complicadas.

A vida exige-nos que saibamos sempre o que fazer, isso é que custa. Temos de antecipar o que nos pode acontecer antes de acontecer. Não para salvarmos nada, apenas para decidirmos bem. A boa decisão tem a amplitude do peito humano, geralmente.

Num jogo amigável, e mesmo noutros jogos mais a sério, o árbitro, o juíz, tem de julgar sem ser a direito. Tem de julgar esquerdo. Muitas vezes é assim, na vida toda.
Naquele caso, um aperto de mão obrigatório e pedagógico, seguido de amarelo para os dois, estaria bem.

Claro que um árbitro que sorri como Bruno Paixão sorri, naquele esgar eterno de cúmplice de qualquer coisa, não pode ser, nunca, pedagógico. Há qualquer coisa de premeditado no seu rosto, no seu sorriso, que lhe impede pedagogias e lhe acarretará, sempre, suspeições.

Quanto ao resto: os ingleses, com 10 ou com 11, são bons fregueses do Sporting. Tinha logo de nos calhar, para o "tira-teimas" uma equipa italiana, a Udinese. Quarta classificada do campeonato italiano, ou seja, uma cambada de "retranqueiros" do pior.
Sobre isso, eu digo qualquer coisa, mais em cima do acontecimento.

A livre concorrência

Mau exemplo, o do João Miranda. Mau exemplo. Tão mau que resulta indemonstrável aquilo que queria demonstrar.
Eu acredito que o João Miranda não seja frequentador assíduo de centros comerciais. Se fosse, sabia que a densidade populacional em cada lojeca de roupa é proporcional ao número de chineses por cada metro quadrado de Pequim e que, apesar disso, o número de caixeiras por cada dez fregueses só não é menor do que um por razões de impossibilidade ontológica.
Papelaria Fernandes? Mas quem é está para ir à papelaria Fernandes no indolente final de Julho? E aposto que esses dois funcionários devem estar, vai não vai, para entrar de férias.

Aposto, também, que, se os serviços de correios fossem privatizados, não só faziam saldos como contratavam os funcionários a termo certo, para não se verem metidos em problemas, digamos... estruturais.

29.7.05

O Bolhom

Há pouco, no telejornal, apareceram de novo as reclamantes vendedeiras do mercado do Bolhão. Eu admito, até, que reclamem com muita razão. Acho, até, que as vendedeiras do bolhão deviam ser elevadas a património municipal e condecoradas no dia da raça.
Mas, tenham paciência. Elas já sabiam desde há muito que ia haver obras e que tinham de se mexer a tratar de mudar as banquinhas. Mesmo sabendo disso, dedicaram-se por inteiro à reclamaçom na Têbêíe até se depararem, hoje, com a bedaçom de parte do mercado.
A TVI, claro, esteve lá outra vez e registou as imagens das vendedeiras iradas, verborreando sobre "os seus direitos" e olhando, chorosas, as abóboras e as couves tronchudas que lá se quedaram, inalcançáveis, por detrás da vedação.
O sonho imemorial, mas tão presente, do "pobrezinho mas honrado" conjugado com a hiperconsciência da cidadania pode dar resultados desastrosos. Até elas, as vendedeiras do Bolhom. Até elas.

28.7.05

Sobre presidentes

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Em Ponta Delgada ia sempre a pé para o hospital. Descia do meu sótão, posto de vigia da rua António José de Almeida, sempre ladrilhada e húmida, passava pela florista do rés-do-chão com um sorriso calmo e subia os vinte metros que me faltavam, sempre, para a Machado dos Santos. Ia por ela fora, todos os dias, perto das nove horas. Quando desaguava os passos no campo de São Francisco, antes de ver o mar, o coreto, o hospital, vi muitas vezes o Dr. Mota Amaral a encaminhar-se, austero mas simpático, para as suas orações matinais à sombra tutelar do Santo Cristo.

Mota Amaral saudava sempre. Era simpático. As pessoas gostavam dele, mesmo os que lhe chamavam, num chasco quase surdo, João Bosco. Alguns separatistas antigos, alguns aparelhistas locais menos felizes, não sei.

Vivi, atento, a campanha eleitoral das eleições regionais, aquelas em que se candidatou, pelo PS, Martins Goulart, irmão do outro Goulart que me ensinou a meter cateteres venosos centrais. Há-de estar na Horta, era de lá.
Mota Amaral referia-se a Goulart como "esse cetáceo que aí veio", aludindo à formação académica, feita nos Estados Unidos, do seu adversário político. Mas fazia-o, sempre, com respeito. Sem ranger de dentes.
Nessa campanha, não se rasgou um cartaz nas ruas de Ponta Delgada. Provavelmente antecipando, já, o advento de Carlos César, (ad)ventos de mudança.

Mesmo assim. Parecia no fim dum tempo, São Miguel. E via-se ali a civilidade de quem se empresta à mudança por dela ter vontade. Ou porque tinha de ser. E há-de ser assim quando a mudança se impuser, de novo, se calhar.

Sei que os Açores não são a Madeira, ainda bem. Há ilhas e monturos vendáveis. Sei que Mota Amaral não foi, nem será nunca, um Jardim prepotente de sebo maninho.
E sei que foi nesse tempo que vi ao perto, pela primeira vez, um Presidente da República. E que ele me saudou, educadamente, como fazia aos outros todos que lhe cruzavam o caminho devoto. Consta que, depois das orações, ia nadar para a Calheta, nunca o vi lá. Mas dizia-se isto, calmamente, como se entoam as normalidades, mesmo as superiores.

Não sei se me fiz entender, mas talvez não. Acontece-me muito, culpa minha.

(a fotografia, mal tirada, é do meu quintal; trouxe os Açores comigo e fiquei lá, um bocadinho de ambas as parvoíces).

À flor da pele

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Choveu, depois de muito tempo, no meu caminho de todos os dias.
Como se um céu de chumbo, todo feito de fumos, coriscos ziguezagueantes e água potencial, se derramasse numa cinética molhada. Calmando tudo.
As cores, os aromas, os cheiros, as carícias, os sons, são parte do nosso viço. Secamos sem sentidos, da mesma forma que nos secamos quando nada os estimula.
Choveu e derramou-se beleza no meu caminho de todos os dias. Pode vir o sol, que estou melhor.

Só mais isto

DE TUDO, O PIOR MAL É TER NASCIDO (para quem quiser saber de Antero sem ser por Eça)

"É um dia húmido de Novembro. São Miguel está, como quase sempre, sob uma espessa camada de nuvens. Azorian torpor é como os ingleses chamam a esta atmosfera opressiva, obsidiante, que não só atormenta o corpo como parece infiltrar-se e assediar a mente. Na baixa de Ponta Delgada, ao lado da Tabacaria Açoriana, fica a loja de quinquilharias de Benjamim Ferin. Antero entra na loja e cumprimenta o empregado. Está calmo, tranquilo. Pergunta se tem revólveres à venda. O empregado olha-o surpreendido. Antero, sorri:
- Sabe, vou morar para um local longe de vizinhança. Com os ratoneiros que andam por aí, é bom estar prevenido.
- Sem dúvida, senhor doutor. É mais prudente estar prevenido.
E vai buscar as armas que tem para venda. Antero analisa-as uma a uma. Acaba por optar por um revólver Lefaucheux. O empregado ensina-o a carregá-lo.
- Nunca peguei numa arma de fogo...
O homem dá-lhe mais algumas explicações. Quando vai a retirar as balas do tambor, Antero diz-lhe:
- Não, não. Deixe-o assim, já pronto.
O homem obedece, mas avisa de que convém nunca esquecer que a arma está carregada, pronta a disparar. Às vezes há acidentes...
- Esteja descansado. Vou ter todo o cuidado.
Enquanto embrulha o revólver com sucessivas camadas de papel, o empregado pergunta:
- Ouvi contar que o senhor doutor ia para Lisboa?
- Pensei nisso, mas desisti, pois ultimamente tenho passado melhor.
- Ainda bem, senhor doutor. Ainda bem.
Antero tira da algibeira algumas libras que põe sobre o balcão:
- Faça o favor de se pagar. Eu nunca me habituei a fazer dedução de moeda fraca.
Antero sai. Os homens que estão à porta, saúdam-no respeitosamente.
Vai a casa de seu primo, Augusto de Arruda Quental. Quando entra coloca o embrulho sobre uma mesa e, por cima, põe o chapéu. Conversa tranquilamente com o primo. Falam de banalidades. O tempo, a política, coisas da família. Quando Antero se ergue para sair, o primo dá-lhe o chapéu e faz depois menção de lhe entregar também o embrulho. Antero quase grita:
- Não lhe pegues!
Despedem-se.
Metendo pela Rua de S. Brás, encaminha-se a passos lentos para o Campo de São Francisco, uma ampla praça pública de Ponta Delgada. Aí, senta-se num banco, junto do muro do convento da Esperança.. Nesse muro, por cima do banco, um dístico em pedra lavrada mostra a palavra esperança sobreposta a uma âncora. Antero sorri. Esperança e uma âncora que o segurem à vida, eis precisamente o que lhe falta. Olha o largo, com as suas árvores, com as suas simétricas placas redondas de relva, circundando o pequeno coreto implantado no centro. Há pouca gente. Uma senhora passa perto levando pelas mãos duas crianças. À memória ocorre-lhe a imagem de um menino passeando ali, pela mão de seu pai, muitos anos atrás. De tudo, o pior mal é ter nascido, pensa. "


Nota de besugo:
No Campo de São Francisco fica o antigo Hospital de Ponta Delgada, pintado de verde claro, cujas enfermarias enceradas me ensinaram os primeiros passos, em 1989. Tem um coreto ao meio e, quem vem da estreita e movimentada rua Machado dos Santos, tem de passar primeiro pelo Senhor Santo Cristo. Antes de ver o mar.

Escolas e rigores

De Antero disse Eça que "a sua face, a grenha densa e loura com lampejos fulvos, a barba de um ruivo mais escuro, frisada e aguda à maneira siríaca, reluziam, aureoladas".
Chamou-lhe, sempre que pôde, Santo Antero. Um "refulgente espelho de sinceridade e rectidão", possuidor do "claro riso dos heróis" e da força imensa da razão, que mesmo "em brigas que fossem justas o seu murro era triunfal".

Tinha Antero, contudo, "certos modos ainda então inexplicáveis - dias de tristeza e esparsa cólera, um querer e não querer entrechocados, entusiasmos que logo escarnecia, bocados de vida que deixava sumir em fumo, e esses apetites de solidão...".

Esteve em Vila do Conde, já mais para o fim, numa casa "simplificada até ao cenobitismo, e onde por único adorno, além de livros numa estante de pinho, havia flores das sebes em púcaros de barro". E no Porto, em Cedofeita.

Conta Eça que se despediram, por fim, "Adeus, Santo Antero!" - "Velho amigo, adeus!" e que nunca mais o viu.
Foi para São Miguel, onde nascera. E lá se matou, num sítio onde passei algum tempo do meu bom desterro açoriano, sentado num banco de jardim que me disseram ser o mesmo ( o sítio era) em que Antero, "concluindo que a vida lhe não convinha, saiu dela voluntariamente e por isso muito deixou que pensar e murmurar aos homens...".

Claro que Jerónimo de Sousa é sólido, lolita. Tem, mesmo, os pulsos firmes de quem não os afilou dissecando o seu Hayek, o seu Martin, em esplanadas. E é sereno que Antero (aquele grito que vem no Abrupto, que citas) teria de fazer, por força, pela própria força, parte das suas escolhas. Se Eça escolhia bem, porque haveria de escolher pior Jerónimo? Que, ainda por cima, há-de ter o bom gosto e a sabedoria de perdoar a Antero a desistência. Como Eça perdoou, não entendendo.
Outras escolas, mais antigas.

Será retrato?

O texto é ligeiramente paternalista e algo assombrado, mas gostei de ler isto. Não sabemos se Jerónimo de Sousa é exactamente assim; se for, será um sólido Jerónimo de Sousa.

27.7.05

The master of the universe

Assumida a chefia do blogue e confessado o fétiche da máscara (e quantos outros se encontrarão no baú, enfim...), eis um novo besugo que ainda não conhecíamos, aterrorizador como só os espíritos das trevas o são e de semblante altivo e impiedoso como é próprio de um líder reformista e liberal.
Por outro lado, facilmente se deduz que a brancura que ostenta se deve, evidentemente, ao excelente Clarim que eu, imbuída da melhor das intenções, lhe aconselhei. O resultado está à vista.


















De resto, tendo o besugo mais de trinta e cinco anos, estando no pleno gozo dos seus direitos cívicos e adquirindo, desolado, que Freitas do Amaral não será candidato, suponho que tudo isto - perfumes, sabão e golpe palaciano - são claros indícios de que vai avançar com a sua candidatura à presidência da República.
Aguardemos, portanto. Coroa já ele tem.

"Perhaps" é "de certeza"!

Para terminar esta fase essencialmente pictórica que atravesso (é uma forma de existencialismo dos pobres, pronto), decidi ser hoje o dia em que se definem, neste blogue, hierarquias.
Por conseguinte, aqui vai esta. Categórica.
Rima com pictórica, isto vai de mal a pior.

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Lalalala...vanda

Ei-la que chegou, risonha, cantando aquele jingle: "com Clarim toca a lavar!". Ei-la que me aconselhou, depois, um "xifoliante"! Ou seja, um decapante, o que vai dar no mesmo e arrepia-me, com ou sem "de" atrás. E ei-la que, insatisfeita ainda a sua jactância verrinosa, me receitou um transformismo arrebicado, sugerindo que me transformasse no único besugo (pelo menos em fase submarina) apetrechado de cascos, ferraduras e odor corporal a suadoiro de crina. Pois bem.

Sabes que eu gostava muito do Fantasma, aquela banda desenhada do "duende que caminha"?
Pois é verdade. Não sabias, lolita? Pois gostava. E ainda gosto. Tenho, até, uma fantasia dele, no baú, que visto de vez em quando.
Perguntas-me porquê? Queres saber quando a envergo?
Pois eu te digo, lolita, com voz tonitruante, à Manuel Alegre (e agora mudo de linha e escrevo a bold, senão não parece a voz do Manuel Alegre):

"Sempre que se impõe fazer justiça!!!"

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Cheiros (epílogo)

Bom, é no que dá a gente aconselhar-se com mulheres sobre questões de perfumaria e outros adereços odoríferos: gasta-se uma pipa de massa.

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Porque, de facto, nem todos os médicos têm ordenados chorudos...

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A do rocinante vais pagá-la; é já a seguir.

A teoria da impressão do destinatário

Há uma contingência incontrolável na maneira como os outros olham para nós. Os outros, na verdade, não nos vêem; vêem, só, aquilo que lhes convém parecermos.
É essa impressão de nós que prevalece, ainda que o que é esteja tão despreocupado em provar que é que ofusca aquilo que parece.
No Direito, só se afasta aquela regra se o destinatário conhecer a vontade real do declarante.
Que, lembro, nunca conhece.
E isto, no mínimo, irrita.

26.7.05

Conselhos de lolita

Besugo: deves usar o tradicional perfume masculino. Aquele que todos os nossos ditosos antepassados usavam (embora menos, é certo, que a higiene diária é uma invenção recente, estimulada, por razões evidentes, pelos serviços municipalizados de águas) para se manterem asseados e para merecerem a atenção das damas mais exigentes. Trata-se, repara bem, não de enfeitar, que isso não é assunto de macho; trata-se, apenas, de assear as carnes. E, como sabiamente dizia a minha avó, antes um homem limpo do que um narciso aprumado. Cabe-me, por isso aconselhar-te a receita imemorial e simples da abundante água, aliada a um confiável sabão como este da foto. Remover-te-á o sebo com um exfoliante, devolver-te-á a frescura das dermes infantis.


Em alternativa, toma o exemplo do excelente Alonso Quijano, o celebradíssimo D. Quixote, que acreditava na pureza das virtudes masculinas e foi favorecido com as atenções de Dulcineia cheirando, simplesmente, a... Rocinante.

Especialistas! Humpf!...

Agradeço o empenho de Miss Pearls na tentativa correcção do meu comportamento desviante no que toca ao uso dos aromas.
Recomenda-me uns "chás de algas do Rio Ocreza apanhadas entre as 3 e as 4 da madrugada nos dias ímpares dos meses com menor taxa de inflação" . Está bem, eu faço isso, eu consigo discernir quais são os dias ímpares e sei ver as horas, mas isso da inflação? Como é? Eu assim não consigo! O mais que eu consigo digerir, em termos de comentário económico (ele escreve pouco, exactamente, há-de ser por isso), é o Luís Delgado! Como é que vou saber em que meses a inflação é menor? Além disso, não sei se a si já lhe contei, "é sempre agora!"... já contei? Ai já contei a toda a gente? Desculpe, pronto.
Não se pode fazer isso num mês qualquer, independentemente da inflação? Veja-me lá isso...
(cuido que ninguém reparou que não falei do rio Ocreza, que deve ser afluente do Douro, às tantas..)

Quanto ao tiro ao alvo, já tentei. Já tentámos todos, a parte masculina do blogame mucho, até utilizámos uma fotografia do Francisco e rimo-nos à brava, lá nas catacumbas. Ele prometeu vingar-se mas, até agora, nada. Falácias. Bom, como eu dizia, já experimentei isso e é o que se vê: mantenho-me entre o inodoro e o "tirem-me este gajo daqui, que parece que entornou o raio do frasco em cima!".

Também fui informar-me sobre o Safari da Ralph Lauren. Fui, mas saí logo dali: a menina pensa que eu ando a roubar? Já viu o preço daquilo? Cruzes, canhoto, se aquilo for em dólares... é fazer as contas! Se eu comprasse uma coisa daquelas, por absurdo, tinha de me durar dezoito anos, para não desenvolver um complexo de culpa adicional por me agravar o défice!
(Não há a mínima hipótese de o preço estar em escudos, pois não?... Pois, já calculava que não).

De maneira que me resta o seguinte: a velha e campestre lavanda. Lá terei de ir ao baú buscar os "tweeds"...
E como a Miss Pearls se limitou a devolver-me a sugestão (sim, que eu é que me lembrei da lavanda, porque aquilo não cheira muito quando a gente abusa, entre outras coisas), sabe a menina quando é que lhe vou pagar a consulta, sabe?
É já a seguir!
(pode ser sem o recibinho, fáxavore?)

25.7.05

E agora?

Este blogue nasceu, por iniciativa da lolita, no dia 24 de Agosto de 2003.
Ou seja, só fazemos dois anos daqui por um mês. Mas, como eu disse ontem, tanto faz. É mais mês, menos mês, nisto dos blogues. É sempre agora, não é verdade?

Também é verdade que eu só entrei mais tarde. A lolita convidou-me e, agora, vê-se desesperada comigo, não consegue despachar-me do plantel. Nem mesmo em blogues romenos me querem.

Tudo isto para agradecer os parabéns antecipados de alguns confrades, nomeadamente estes (se me falhar algum, a culpa é da lolita; aliás, foi ela que me disse "vai ver o que andaste a arranjar, agora desem... trabalha, besugo dum raio!"): Abrangente, Blasfémias, Eclético, Espumadamente e Vilacondense. O Espumadamente, aliás, foi o único que desconfiou que havia uma confusão qualquer (como se me imaginasse dotado de um espírito vocacionado para o caos, ora!), de maneira que já marchou para as páginas amarelas (como marcharia de qualquer maneira, só antecipou a pena...).

Meus amigos: muito obrigado a todos, em nome da tropa toda (eu sou de infantaria, chego-me à frente, pronto; a lolita é mais cavalaria, força aérea, com períodos de fuzilaria e de secretaria), pela vossa simpatia. Bela frase, esta, ó Maria! Onde é que eu ia? Ah! De facto, é sempre "agora". E pareceu-me bem que ontem também fosse "agora". Boa malha. O que faz a aflição.

Contudo, que nem vos passe pela cabeça não repetir a dose no dia 24 de Agosto. Ela despede-me, entendem? Com justa causa, desta vez. A minha cotação interna, neste blogue, é mais ou menos igual à do Miguel no Benfica.
É claro que um "agora" não dispensa outro, é sempre "agora". Por isso, para vosso bem (e sobretudo pela minha pele) tomem nota: vinte-e-quatro-de-agosto. Sim?

Está bem, eu sei, já disse isto do "agora" tantas vezes que até já enjoa, é isto do "agora" e eu. De maneira que me calo, cá vos esperamos, com as vossas saudações, no aniversário do blogame mucho. Também aceitamos donativos, mas isso podem mandar só em meu nome, depois falamos, OK?

Caramba, como é que eu fiz isto? Desculpem lá...

O futuro imperfeito

Cavaco Silva tem revelado, cada vez com maior clareza, as razões pelas quais não deveria ser o próximo presidente da República. Excede-se em tácticas para poder opinar sem que pareça que foi ele que pediu para ser ouvido. Exige segurança máxima e condições óptimas para anunciar que é candidato. Com isso, transparece-lhe uma pusilanimidade que até agora não se havia revelado e que não se imagina nem num presidente de Junta de Freguesia, muito menos num chefe de estado.
O facto é que, com esse excesso de cautela tão cara a quem se conhece a idolatria pelos rigores orçamentais (e se adivinham, até, os higiénicos), o homem tornou-se refém da sua candidatura condicional que, agora, se torna cada vez mais presente e inevitável. Ainda que, por artes da esquerda unida (como isto me soa anti-fascista...) o sonho se perca pelo caminho. O sonho da presidência dogmática.
A pior das desgraças será a de ser eleito, mas sem adversário que lhe engrandeça a vitória. Como numa maratona sem brilho, em que só correm atletas anacrónicos porque os mais novos emigraram ou são mercenários que desistiram em favor de outras glórias.

Pesadelos de besugo

Adianta-me um grosso não me ir deitar. Acordarei mais cansado, apenas.
Mas tenho de vos contar o meu pesadelo recorrente. Um deles. Ou mesmo dois.

Num, estou na sala de emergência com um pneumotórax asfixiante. Deitado, nu, algaliado, todo eu só carne. Uma farda azul, peremptória, recusa meter-me um dreno porque se vê, na radiografia que me fizeram entretanto, já algaliado, uma massa inoperável num dos pulmões. E diz, definitivo, "que não fumasse". Só não morro porque acordo.

No outro, estou a sair do bloco, sempre deitado e algaliado, adoram meter-nos tubos de silicone pela pila, depois de cirurgia urológica que me fizeram. Ou outra cirurgia qualquer. A farda azul (ou mesmo verde) diz-me, do alto da boca, que já está. Pergunto se tenho metástases e a boca alta e cerrada sentencia "que sim". O que me consola, porque gosto de pensar em mim como uma desgraça sistémica. Depois, num estertor, ainda balbucio "eu sou um de vós", mas a boca responde-me, sempre cerrada, que já não.

Nos resultados, tocam-se.

Cavaco tem demasiadas certezas sobre os outros. Soares tem demasiadas certezas sobre si próprio.

Presidenciais

Trato mal quem me quer bem, faço sempre isto. Não pode ser doutra maneira, para ser importante. Que adianta tratar mal quem nos quer mal? Nada, é natural.

Fazem-me falta os rostos que já vi até ao fim. Conheço filhos de mortos que só ajudei a embrulhar no celofane da minha impotência de bata paneleira.
Isto dói-me muito e não sei se devia, sequer, escrever isto aqui. Nem em sítio nenhum. A Lolita diz-me sempre para não me expor e eu não ligo. Farei mal.

Eu gostava muito de curar pessoas, devia tratar otites e operar miopias, coisas assim.

Cada um há-de morrer das doenças que andou a tentar tratar, excepto alguns que não trataram bem de nada. Cavaco Silva há-de morrer de não ter sido um homem bom, por exemplo.

Declaro iniciada a minha campanha por Manuel Alegre. E tenho pena de Jorge Coelho estar tão magro, não sei porquê. É pecado dizer isto? Não devia, também?

24.7.05

Como se vos quisesse deixar alguma coisa

Um blogue não faz anos. Nem dias. É como as pessoas.
Não há tempo. É sempre agora. Porque agora não há tempo.
Deve ser por isso que me esqueço sempre dos aniversários quase todos: por ser sempre agora e porque não há tempo.

O que é pesado, difícil, agreste, pouco doce e doce ao mesmo tempo, é os "agoras" de agora trazerem sempre, agarrados a si, os "agoras" mais antigos, como se os "agoras" de ontem fossem os electrões que estabilizam um núcleo excelente, um núcleo em que cada neutrão se tripartisse, como se sabe agora que acontece, e ontem (agora?) não. Como hei-de explicar Física e Química aos meus filhos se, nos livros deles, não se fala, sequer, de "quarks"? Um núcleo, com a sua estrutura orbital perfeita, não é mais perfeito, nem mais complexo, que a nossa memória. Até porque a nossa memória é a subjectivação da perfeição molecular. Também não passará disso, valha a verdade.

Aprendemos o ontem hoje, o hoje amanhã. Por isso é que é sempre agora.
O tempo é uma ilusão. O que tiver de vir de mau, virá. O que estiver aí de bom, à espreita, virá também. Não depende só de nós. O que depende de nós é muito pouco. Porque nós somos poucos, também. Há muitos, mas eu estou a falar de nós.

Não se pode meter tudo numa frase, nem sequer num escrito inteiro. Há quem pense que sim, mas isso são súmulas pequenas, resumos de informação, sumários. Mais nada.

Quando o blogame mucho fizer dois anos merecerá os parabéns de ontem, de hoje, de sempre, nenhuns. Mas não há-de ser por nada de especial, nem hoje nem naquele dia.
É por isso que o blogame mucho faz hoje dois anos. Porque tanto faz.

Aquela rua, aquela casa

Revisitei, hoje, a rua portuense onde cresci.
Entrei sabendo onde estava, sem consciência de que era nessa rua que entrava. Olhei as casas antigas, de que recordei os habitantes, os vizinhos, os que tinham filhos da minha idade, os que tinham vidas difíceis, os que já eram amigos da casa, aqueles a quem nós, os pequenos, fazíamos partidas. Lembrei-me do nome de cada um deles e eles, todos juntos, recordações, vizinhos e a rua, pareceram-me acolhedores.
Imaginei as outras casas que já não existem, entretanto demolidas em favor de prédios de apartamentos. Recordei a rua, há muito anos atrás, cheia de pessoas a passar, lembrei-me das entregas em casa do pão e do leite, lembrei-me do amolador das facas. Da gaspiadeira. Do portão verde, antigo, em frente à minha casa, do muro que não me deixava ver para dentro, das casas bonitas de azulejo, do empedrado da rua.
A casa da minha infância já não existe. Agora é só uma memória que se me aviva quando passo por ela. Há um prédio, no seu lugar, para o qual olhei sem o ver, lembrando-me dela, percorrendo-a desde a fachada até ao quintal, onde todos os anos fazíamos tantas coisas, nos verões quentes, nas noites alegres de São João. Na minha memória quase tudo existe; mas tudo passou, desaparecido ou substituído. As coisas e as pessoas que nos acompanham ao crescer, invisíveis e irrelevantes enquanto se cresce, não se esquecem. Mesmo que pouco sejam lembradas.
Há coisas tristes, pelo meio disto. Histórias tristes, que me foram contando, de pessoas que morreram gastas de vidas vazias. E há histórias alegres, de famílias que cresceram e se multiplicaram, que dão aos filhos dos filhos o património da rua da infância.
A mim, saudosa, aquela pareceu-me hoje a rua mais esquecida do Porto.

Favoritos

Pouco a pouco, temos vindo a actualizar as nossas páginas amarelas.
Temos acrescentado alguns blogues, fundamentalmente por serviço público: quem quiser sair daqui, já enfastiado de nós, para outros lugares, dispõe de mais alternativas. Sem ser por esta razão imbecil, torna-se mais fácil, também para nós, ir onde mais nos apetece ir.

Faltam bastantes, ainda. Lá iremos. E há meia-dúzia que acabaram e que não estão ali a fazer quase nada. Mas os que sairem da lista será só por isso, por já não existirem. Os que mudaram de endereço, a gente vai atrás deles. Os que estão, ficam. Gostem de nós ou não. Conheçam-nos ou não. O problema é, nesse pequeno particular, em ambos os casos, apenas deles, que não sabem o que perdem. Há pessoas que conhecem as pirâmides de Gizé, que se visitam perfeitamente em qualquer livrinho ou URL, e nem desconfiam de Panóias. Isto não nos importa nada, como calculam.

Recentemente, um dos nossos favoritos riscou-nos do seu mapa. Foi o Água Lisa 3. Demos conta, por que não dizê-lo? Riscou-nos, notámos. É com ele. Nós não o exorcizámos. Longe disso, isso não é critério. O exorcismo é o superlativo absoluto simples da irracionalidade. Reparem que adicionámos um blogue que, bem recentemente, me fez inenarrável azia. E eu tinha razão, naquele caso, que se tratava ali duma generalização intolerável de redutora. Mas todos temos os nossos momentos, porque somos corsários dum mar muito grande e adverso. E a destreza das dúvidas é um bom blogue, negá-lo para quê?

Nós não concordamos com tudo o que escrevem os nossos favoritos. São-no, às tantas (favoritos nossos), também por isso. Ou, sobretudo, por isso. Nunca apesar disso.
A nossa linha editorial é esta, desde o início, ainda por cima sem caixa de comentários. Não gostamos. Os comentários são, geralmente, mal escritos. E há muito filho da puta que não pode ver uma folha de papel em branco sem desenhar, logo, na brancura, trampa.

Quanto à ordem: a alfabética é a boa ordem. Se bem que há portistas, benfiquistas, liberais e adeptos do hip-hop em quase todo o abecedário, o que me preocupa.

Faremos dois anos em breve. Dentro de um mês, mais ou menos. Tenciono falar disso mais logo, disso e do que acho que somos, mas depende muito. Trabalho cedo, amanhã.

Não é muito importante fazer dois anos, basta pensar que qualquer um dos nossos filhos já por lá passou, pelos dois anos, abanando a data sem lhe ligar muito. Mas os blogues duram, geralmente (felizmente) muito menos tempo do que os filhos.

Cheiros essenciais

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Se ligasse a perfumes usava sempre Boss. Geralmente não ligo, se calhar porque não sou eu que me cheiro.
Um amigo meu liga e usa sempre: after-shave, colónia, essas coisas. Sempre Hugo Boss. Eu gosto. Mas não ligo. Nem ao meu cheiro nem ao dele.

Tenho um frasquinho de Fahrenheit há dois anos e ainda não vai sequer a meio. Não é Boss, é Dior, mas também gosto muito. É quente e adocicado, algumas mulheres conseguem suportar-me sem vomitar, quando o ponho. É raro, duas vezes por ano, se tanto. Já se vê, por aqui, como vai a minha capacidade de sedução, funciona de seis em seis meses, se estiver o sol certo.

Um homem deve usar perfumes como se não lhes ligasse. São as mulheres que têm de nos sentir e definir os odores. Os perfumes de homem são para mulheres. Percebem?
Eu faço isto bem, consigo perfeitamente viver com este "não ligar": não os uso, mas é como se os usasse. Porque os tenho. Fica barato ter bons perfumes, assim. Não se gastam. Tenho-os porque gosto de os ter. Cheiro-os mas não me borrifo com eles. Quando os ponho, borrifo-me.

Lolita, tu que me lês tão bem, explica-me isto. E dá-me conselhos. Faz um esforço. Vais dizer-me que ainda não tenho a idade do tipo da publicidade da Boss, mas sabes que a minha fotografia, daqui a dez anos, vai ser parecida com a dele. Vais dizer-me que usei Fahrenheit na passagem do ano (foi a última vez, de facto) e que abusei na dose. Vais dizer-me, porque sabes que isso me irrita, que sou um metrossexual encapotado, um dos "que liga e faz de conta que não liga". Mas sabes que nada disso colhe, que nem tu acreditas nisso. "Metroquê"?

O que colhe, é que sabes muito bem porque falo nisto: estive a arrumar algumas coisas para as férias, faltando ainda uma semana para a minha quinzena de paz. E arrumei os dois frasquinhos, bem arrolhados, no saco. E sabes que não tenciono usar nenhum dos dois, entretanto, porque não é importante. Nem depois, porque, depois, estarei em paz.

O que tu não sabes, pois que to digo só agora, é que os meus doentes, geralmente, vomitam com o cheiro dos perfumes.
É só por isso, no fundo, que cheiro sempre (o menos que posso, mesmo assim) a um discreto gel de banho. Um qualquer que passe despercebido no ladrilhado cúbico da sala de tratamentos.

A miss Pearls pode dar-me conselhos, também. Conhece-me muito menos que a Lolita, mas ambas conhecem mais que eu, disso de odores. Uma lavanda suave, que dizem?

Birth

Há filmes que se arrastam em volta de um mote banal, exploratório de uma dúvida esotérico-religiosa generalizada na espécie humana, como é o caso da reincarnação. Uma história de um puto de dez anos que aborda uma mulher de trinta e muitos informando-a que é o seu falecido marido Sean é uma história que, desde logo, não suscita mais do que a curiosidade decorrente desse esoterismo que nos assalta a todos, de quando em quando, a uns mais e a outros menos. Vê-se, apenas, para ver como se desenvolve.
Depois, há a repulsa que involuntariamente se sente pelo erotismo latente entre a mulher adulta e o puto de dez anos. É difícil, para não dizer penoso, ver um filme (pelo menos deste género intimista) sem que se consiga ter empatia com nenhum dos personagens.
Não há nada, no filme, que me pareça digno de registo. Enfim, só o bonito apartamento, no Upper Side nova-iorquino. Mas isso, os ambientes portentosos, são cenários típicos de filme americano. E a Nicole Kidman, cuja beleza divide opiniões, é alta, branca e representa bem. E o filme há-de ter sido escolhido num casting para "filmes apropriados para a Nicole".

Os tempos

Mário Soares não. Por favor.
Eu também já não nado coisa de jeito. Desloco-me na água.
Não. Mário Soares pode, sempre, boiar e ir falando. Basta. Não o vejo nos blocos de partida, não o vejo a virar aos 50 metros, parece-me cansado.

De qualquer forma, do ponto de vista estratégico, o PS só ganha em apresentar já o seu candidato. Brevemente. Reparem que Cavaco alimenta o seu mito, duma forma tão inábil que, quando resolver (se resolver) avançar, as pessoas dirão, apenas, "até que enfim, pronto, lá vai ele". Não haverá nenhum élan nessa candidatura, a não ser artificial. Já se fala dela há tanto tempo que soa a inevitabilidade chata.

Qualquer que seja o candidato do PS, apresentado rapidamente, terá vantagem, nestas coisas da pequena política: se Cavaco disser que sim, as pessoas dirão "olha, este não queria avançar sem saber quem ia ter pela frente, agora lá se chegou". Se não avançar, as pessoas dirão "que medo tinha, o homem, estava à espera e quando viu que era este, quedou-se". Cavaco acabará por ser colocado onde merece, com tanta hesitação: a reboque.

Agora, uma coisa: a candidatura de Manuel Alegre poderia, talvez, unir a esquerda. Talvez, não sei. Porque não há uma esquerda, há só "esquerdistas", hoje. E, se calhar, foi o que houve sempre. Mas não vejo outra candidatura que fosse mais capaz disso. Uma união falsa, como todas as uniões políticas de hoje, mas pronto, hoje não é ontem. Ontem não havia tantos incêndios, nem tanto enervamento fácil por pequenas coisas.

23.7.05

Danos colaterais

Quando me sinto cansada só leio blogues fashion, daqueles em que se escreve posts curtos falando de banalidades disfarçadas de verdades desconcertantes.

Compotas

Gosford Park, revi. Enfim, só tinha visto dois terços. Gostei outra vez.
É assim:
Numa casa cujo andar de cima está cheio de gente que se preocupa com compotas, foder e dinheiro, os criados vivem no andar de baixo.
No andar de baixo, pelo contrário, os criados preocupam-se com dinheiro, compotas e foder.
Há as escadas, pelo meio. Claro.

Desta trama difícil e elaborada nasce um jogo de contrastes entre os do andar de baixo e os do andar de cima, sobretudo por causa duma gorda do andar de baixo que adora fumar e ir para lavandarias abrir as pernas a tipos do andar de cima. Nasce isto, o tal jogo de contrastes, e sanciona-se a recordação de coisas antigas que são sempre iguais.
Pelo meio, morre um gordo velho do andar de cima, que tinha um cão odioso e uma cadela velha que sustentava. Ambos lhe sobrevivem, o que é fundamental. Não tinha mais nada, o pedaço de víscera, nem a mulher era dele. Dele, mesmo, eram só o cão e a velha.

Moral da história: compotas, fundamentalmente compotas.
E a cor é muito bonita. Sobretudo no dia da chegada, quando chovia a potes.



Aditamento matinal, depois de má surpresa:
É evidente que o filme não é nada disto, a vida também não. Não percebo nada de cinema, nem da vida. E cada notícia má que me chega, seja eu a procurá-la (porque pergunto), seja ela a procurar-me a mim, de surpresa, faz abanar tanto as poucas certezas que ainda vou mantendo dependuradas de mim, que elas vão caindo, uma a uma, como se fossem pêssegos podres. E é nestas alturas que, relendo coisas que escrevi, me apetece apagá-las todas. Como esta, que escrevi à noite e reli de manhã e, à luz do sol que hoje me alumia o dia tristonho, me parece ridícula e inútil. Não apago, mas apetecia-me.

22.7.05

Povo que "botas a cruz"

Mais um banho de bola que se saldou num empatezinho. Era a brincar, mas o banho de bola fica. Não foi um banho muito grande, foi um duchezinho. Mas viu-se bem, foi lavadinho. O Sporting tem tudo para dobrar a primeira volta já com dezassete pontos de avanço sobe os lampiões e os andrades luso-brasileiro-argentinos.

Li críticas a Freitas por defender que os impostos não devem ser dicutidos em campanha eleitoral. Isto é engraçado. Ele tem carradas de razão. Do ponto de vista do "elegível político", discutir os impostos geraria uma controvérsia com custos eleitorais que contraindicariam, sempre, a discussão. Isto é fácil de entender. Ninguém quereria (tirando cerca de setecentas pessoas) discutir isto a sério. Milhões de pessoas quereriam, sobretudo, penalizar isto. Seria uma discussão que redundaria num rotundo "impostos a subir, não!". E parece que esse "não" levaria, tão somente, a que os impostos fossem aumentados por outrem, menos propenso às discussões sérias, em campanha.
Ora, a isto chama-se sabedoria. O povo não quer discutir. Melhor, querer, quer. Mas não é isso dos impostos. Isso dos impostos, é logo "não". Não é por nada, discutir com o povo, se o povo diz que não, é porque não. Não é por mais nada.

Não me gozem.

O que o homem quis dizer é pura estratégia política, não é um processo de intenções sobre as virtualidades da discussão, a outro nível. Sabemos todos que a discussão pode parir a luz, mas só nas raras vezes em que os interlocutores apreendem um centésimo (ao menos) do que se discute. Na maior parte delas gera, a discussão, se generalizada, unicamente ruído. Um tilintar de faqueiros fracos ao desafio.

E de ruído estou eu farto. Dizer "que depois se vê quanto vos vamos sacar" não chega a ser uma crítica. É uma antiga regra geral usada por quem sabe que discutir com o povo não é informá-lo e deixá-lo falar. O povo não precisa disso, porque o povo acha, invariavelmente, que está tudo mal. E tem razão, se estivesse bem até o povo se lavava mais e opinava menos.

21.7.05

Férias e licenças

Já se sabe: no Mar Salgado a marinhagem mete-se em "surfs" difíceis. O coiso do Islão, o coiso do Ocidente, a rosa dos ventos religiosa, isso tudo. A gente lê e basta: nem tuge. É só sentir o sal.

Agora, aquilo das férias judiciais e das férias das pessoas, é de caras. Não concordo que seja fácil para uma criança de dois anos, note-se. Mas a um ganapo de sete anos já se explica a coisa bem.

Isto a seguir é um contributo para a explicação dos pássaros salgados. Não era preciso? Não têm de quê, na mesma.
Vai em itálico, porque é pedagógico.

É como se fosse nos hospitais, percebem? Os tipos, por exemplo nós, os médicos, vamos de férias. Suponhamos que vamos de férias em três meses, os três que vão de Julho a Setembro, passando por Agosto. Assim ao gosto do freguês. Conjugamo-nos nos nossos veraneios, agora vais tu depois vou eu, e lá vamos. E é assim, de facto.
Ora bem: temos, portanto, três meses de férias dos médicos, não é? É, pois. E temos zero meses de férias dos hospitais.

Fui suficientemente claro? Se sim, apite, aí do alto mar. Se não, paciência.

Uma pergunta estúpida

E se eu te deixasse morrer em paz, te deixasse ir assim, em lugar de te picar mais uma "lesão potencialmente abcedada nesse fígado bilirrubínico", para te ministrar, depois, (in)competente antibiótico? Logo a ti, que estás tão cravejada de metástases pelo corpo todo que, se soubesses mesmo a verdade inteira, tenho a certeza que quererias era que eu me fosse foder, mais as minhas angústias de te limpar a morte na minha cabeça, e te deixasse em paz.

Pois, para isso tinha de te dizer tudo. E tu só me perguntas "quando te ponho boa". E eu tenho-te dito que vai ser em breve, não é?
E vai.

Recado do Douro poente para o Douro de dentro

















Durante uns dias, o suco das ameixas durienses adoçará duas bocas que, entre sorrisos reconfortados, as saberão saborear melhor do que ninguém.
Obrigada.

As ameixas da foto foram roubadas à Casa da Cacela; as outras foram entregues ao sorridente destinatário.

20.7.05

Regras

Aqui há uns dias, numa conversa ténue, confirmei o que já sabia. Há pessoas que têm uma noção tão hierarquizada das relações interpessoais que estranham qualquer relação que, nem que seja fugazmente, tenha instantes de nivelamento inoportuno. Daqueles momentos não escolhidos de "olhos nos olhos, muito bem, mas quem está por cima, afinal de contas?".
Falo do trabalho, claro.

Quando se tenta manter um espaço aberto, de acesso fácil, sem mediadores (porque não os há, sequer), esse espaço tende, facilmente, para o caos do incómodo constante. Estou a lembrar-me do serviço onde trabalho, que começa a assumir contornos de serviço de urgência (ou seja, com "atendimento não programado") pela facilidade de acesso que encorajamos. É nessa mistura de precisões e servidões que os olhos se cruzam mais vezes, a direito.

A questão, no fundo, são duas.
1 - Como conseguir manter as coisas assim, abertas, sem deixar que essa abertura transforme um espaço que se pretende de privilégio alheio, no "terror" da urgência geral, onde cai tudo, quase ao calhas, pelos motivos mais certeiros ou disparatados?
2 - Como conseguir fazer passar uma ideia que, num queixume, num mero desabafo, parece que negamos? Pois. É isso mesmo. Queremos que as coisas sejam assim, fazemos com que sejam assim, metemos a cabeça para aí e, depois, ao tentar meter o corpo todo, acaba por nos custar. Isto é o menos. Acontece é isto, muitas vezes: se, numa conversa qualquer, uma daquelas que temos com quem julgamos que vai tentar entender o que estamos a dizer, acabamos por nos queixar, por manifestar uma lamúria pequena sobre o que nos custa a maneira como fazemos as coisas, há interlocutores que nem sequer querem saber de nos dizer "isso custa-te, mas está bem assim, percebo-te, aguenta-te à bronca que vais bem". Não. Perguntam logo é se "não és tu que mandas? então?".

A questão, pois, "são estas duas". Porque as coloco eu, claro, só por isso é que são estas duas, que eu vivo para dentro e para fora.
E, muitas vezes, para fora, não vejo quase nada.
Quero eu dizer, com isto, que nem sequer vejo um sinalzinho, um sorriso breve de "vais bem, apesar de tudo". Só regras de conduta. Isso vejo. Estão sempre a acenar-me, severas de certeiras.

Bolas, alguém que consegue esperar!

Concordo completamente com isto.
OK, eu agora vou mesmo descansar. Juro.

Vãs tentativas

Fiquei curioso de ver o impacto... enfim, "ambiental", que teria um título que aí para baixo debitei, num escrito.
Vai daí, fui ao Google e teclei, enfim, mais palavras para quê, esse mesmo título. E carreguei no botãozinho da pesquisa.

Não resultou, camaradas. Não está lá prosa nenhuma parida por mim. Continuaremos, pois, rondando as míseras 150 visitas diárias, fora os desistentes. Sim, eu sei que afasto os leitores. Não possuo aquela "atracção fatal" do Luís Delgado, por exemplo. Nem mesmo a do João Miranda, que não é fatal, escreve bem, mas enfim, estou sempre a escrever enfim, mas enfim, eu vi-lhe a fotografia.

Em contrapartida, sobretudo na opção "imagens", o meu título... enfim, valha-me Deus.
OK, OK, eu saio já.

Notícias da silly season

Soubemos, pelo telejornal da TVI, que o exame nacional do 12º ano de português correu bem aos alunos do Liceu Maria Amália. E que os emigrantes portugueses, entrevistados em Vilar Formoso, sentem saudades do seu país e morrem por comer, assim que possam, umas boas sardinhas na brasa. Um nervosinho repórter da TVI assegura que Correia de Campos esteve ontem à noite internado na unidade de coronárias do Hospital de Santa Maria. O Ministério desmente e comunica que o ministro está com uma ligeira gripe.
Miguel Sousa Tavares, que está em Lagos mas não é substituível, comenta à distância os acontecimentos do dia e exorta o governo ao debate público sobre a oportunidade dos investimentos com o TGV e o aeroporto da Ota.

Entretanto, mudo para a Sic Notícias. Mário Crespo, o jornalista do dentinho maroto, modera um frente-a-frente entre João Cravinho e Manuel Monteiro, o herói dos taxistas que, no momento em que eu começei a ouvir, dizia qualquer coisa sobre as suas opções políticas, das quais não abdica, e tal. João Cravinho, tentando ser irónico, usa de retórica bravia. Os espanhóis são tontos! São? Sim! Os espanhóis são tontos! Depois percebi que falava do investimento no TGV em Espanha.

Fui à RTP Memória, a ver conseguia sobreviver sem participar no debate do TGV/Ota. Dei de caras com Lady Bellamy angustiadíssima, porque já passava das quatro e meia e Eliza, que entretanto se tornou activista dos direitos cívicos, ainda não tinha chegado para o chá.

Operações de marketing (colocação obrigatória de banda encefálica)

Sobre isso do novo nome do estádio dos lampiões, embora admita perfeitamente as hipóteses Coca-Cola, Shell, Corte Inglés e, mesmo, aquilo dos hamburgueres, não estou de acordo.

Aquilo, era chamar-lhe "Franganário", ou "Aviário dos Pneus". Ou, mesmo, "No Name Stadium".

Já o inquérito da SIC me pareceu bem. Reparem que 50% dos portugueses (cuido que serão 50% daqueles portugueses que, por esta altura das suas vidas, já mandaram mais SMSs do que a sua família inteira, desde as Guerras Liberais, deu de quecas) acham que o Benfica vai ser campeão. Este "acham" está correcto, é uma concordância com uma parte do sujeito composto (regra de besugo).
Eu acho bem que metade desta amostra acredite no potencial do Benfica. Ficava mais preocupado e confuso se fosse diferente.

Claro que o amigo Dragão não levará a mal que lhe diga que o Estádio que leva o seu nome parece um monturo de betão armado, pois não? Óptimo. Assim a gente entende-se, o país pula e avança, chegamos à Lua antes, mesmo, de se saberem os resultados daquele bombardeamento do cometa.

É tão evidente que o Sporting vai ser campeão nacional, ganhar a taça de Portugal e deslumbrar a Europa que, por me parecer despiciendo, me eximo de explicar porquê.
Vou, ao invés, falar a seguir duma coisa que me preocupa.

19.7.05

Como ficaria o E.T. com o cabelo às ondinhas?

O que você foi fazer, Evaristo! Mostra-nos o Isaltino de cabelo esticado e descobre-se um sósia helvético do Spielberg...

Blowjobs

Isto vai de ananases mas, mesmo assim, há brisas frescas que inebriam e sossegam.
Eu gosto de o ler porque me faz rir. Faz-me rir porque não escreve nada de jeito e porque tem, apesar disso, aquela cara séria de quem vai parir um potro selvagem pelas meninges, acabando por lhe sair, pelos quartos traseiros, sempre, uma lêndea. E baia. E pachorrenta.

Agora, entre negras previsões estrangeiras e nacionais, que mistura a esmo na moulinex da frontaria, quer endireitar Portugal.

Ora bem. Há os que querem que ele vá para frente, há os que querem endireitá-lo. E há os que querem ambas as coisas, desgraçados. São os utilitários.
Eu, quando quero endireitá-lo, aliás, passe a publicidade (não, não dou o telemóvel), não tenho dificuldades. E ele vai para a frente, garanto-vos. Que eu, quando quero, é "avante camarada". Falo do país, claro. Em tempo de eleições, evidentemente.

Ora, toda a gente já tinha entendido, vou fazer delete a esta frase de cima, se me lembrar, no fim.

Agora, o Luís Delgado, não sei. Saberá ele, mas nada nos diz, sobre isso, de concreto. Mas gostaria de endireitá-lo, isso sabemos. Disse-o ele, como se fosse uma fagueira esperança que acariciasse.

Bom, Luís, eu aconselho-o. Isto é serviço público.

Agarre nele pelas quatro pontas (Caminha, Bragança, Sagres e Vila Real de Santo António - isto, enfim, "grosso-modo", se conseguir) e puxe. Vai precisar de mãos adicionais? Ó homem! Isso admira-o? Faça o que lhe disse, arranje lá quem lhe trate de Caminha, e estique. Estiquem, melhor dizendo. Com veemência de pulso, está bem assim?
Viu? Ei-lo ( a ele, ao país, claro) transformado, após algum esforço, num rectângulo bidimensionalmente perfeito. Não se percebe para que o quer você assim, mas pronto.
Agora, o relevo, a questão do relevo. Há que aplainar. Contrate um carpinteiro que lhe pegue nele (no país, claro) e lhe apare as veias do lombo. Isso mesmo, a Estrela, o Marão, o Gerês, o Caldeirão, a Freita, a Arrábida, essas veias todas. Fica-lhe aí um rectângulo lisinho, vai ver. Embora eu não perceba para que é que isso lhe serve, pressinto-o mais tranquilo nessa lisura toda.

Ainda não está feliz? Eu sabia. Quer, como querem os seus amigos todos, que ele (o país, bolas, o país, havia de haver uma tecla especial no computador para não termos sempre de estar a espantar fantasmas) vá para a frente. Isso é mais difícil, não é? Pois é. Segue conselho na linha de baixo.
Olhe, Luís: arranje maneira de o descolar (ao país, evidentemente) do forro de nylon dos calções, que é como quem diz "da Espanha", bote-lhe um mastro ali pelo sítio onde estava, antes de vir o carpinteiro, a veia mais saliente (chamemos-lhe veia Estrela, pronto), cosa ao mastro uma vela com uma cruz epopeica pintada de vermelho (ou de azul, ou da cor que quiser) e, depois, energicamente, bufe.

As imperfeições da democracia ou a inutilidade da greve

É curioso, o exercício da greve de zelo pelas forças policiais. As democracias são tão imperfeitas que até o exercício da autoridade do Estado depende do grau de satisfação dos indivíduos que a exercem. Mas não se instalará o caos, durante os dez dias em que os agentes fecharão os olhos à transgressão, porque as democracias são tão imperfeitas que ninguém tem tempo ou disposição para estacionar em local proibido apenas porque deixou de ser proibido. E, por isso, o dano público será tão ligeiro que a greve policial não surtirá qualquer efeito na melhoria da anti-sociabilidade do governo Sócrates.
Pobres agentes da autoridade.

18.7.05

Britt-Póvoa

Os britânicos são pessoas como as outras. E ainda bem.
Ouvi um britânico, esta noite, afirmar, mais ou menos, que "agora é que é de vez, o terrorismo tem, de vez absoluta, de ser combatido por todos". Mais ou menos isto.

Claro que, depois, enumerou os países que já foram vítimas de indiscriminadas bombas fundamentalistas, vários deles não apoiantes da "ideo-actividade" do eixo do bem. Como se dissesse - e disse, no fundo - que isto é uma dor de nós todos, não apenas deles, dos do eixo.
E tem razão, é. Mas foi bem visível onde lhe doía mais, quando lhe saiu aquele traiçoeiro e irrecuperável "agora".
É normal. Eu compreendo, compreendemos todos. Dói-nos mais onde nos dói mais; dói-nos mais, sobretudo, quando nos dói mais. Que dúvida há, aqui? Nenhuma.
Há é um bocado de legítimo sofrimento que se pretende generalizar aos outros. Já vi disso em carpideiras da Póvoa, mas sem manipulação. Elas carpiam sempre, fosse qual fosse a traineira. Não se limitavam a chorar a desgraça dentro de portas como quem dissesse "agora, que me tocou naufrágio, é que as lágrimas são salgadas". Não, choravam sempre. Eu era puto mas lembro-me de aquilo ser assustador de forte.

Isto já para não falar nos olhos pequeninos.

Não há ninguém, no seu perfeito juízo, que sinta sequer longínquo enlevo perante um cabelo às ondinhas, colado ao crâneo e penteado no sentido da nuca. Talvez por isso Isaltino sofra esse estigma inominável que o torna antipático a qualquer cidadão que não viva em Oeiras e não seja ex-eleitor do PSD. E, como se não bastasse, é corrupto - pensamos nós. Mas o certo é que as ondinhas capilares bastariam.

Derivadas de besugo

Ouvir António Vitorino é uma coisa. Lê-lo, há-de ser outra. Contudo, vê-lo enquanto o ouvimos é que é educativo.
Percebe-se melhor, nessa mistura bi-sensorial, que o mundo é dos "meias-tintas". Para quem não sabe, um "meias-tintas" é uma espécie de pássaro, um espécime assim entre o melro e a andorinha.

Mas o mundo não é deles todos, isso não. Porquê? Porque somos muitos, às tantas.
Não. O mundo é só dos "meias-tintas" que nunca poisam a sério em beiral nenhum, antes esvoaçam entre beirais, com reconhecida (tem de ser reconhecida, claro, fundamentalmente pelos outros "meias-tintas", ou por grande parte deles) competência.

Tipo esperto, o Vitorino. Só há-de pousar quando estiver cansado e, palpita-me, há-de fatigar-se muita passarada antes de ele começar a sentir os efeitos do excesso de ácido láctico nas asinhas buliçosas.

Baratas tontas

Um dos bombistas suicidas que se deflagrou em Londres chegou a estar referenciado pelos serviços secretos britânicos e, por qualquer motivo que pareceu curial, sob vigilância. Depois, eventualmente por ter deixado de ser considerado perigoso, a monitorização cessou.

A questão relevante, até perante o singelo facto de os outros três "homens-bomba" (ou seja, 3/4 dos operacionais-mesmo-operacionais) nem sequer terem sido, alguma vez, suspeitados por quem quer que fosse, nunca deveria ser esta. Mas foi:

- Quem é o responsável pela cessação da vigilância? Averiguemos.

E, seguramente, esse desgraçado há-de ter de explicar-se. E, se não se explicar bem, há-de ser punido. E há-de ser apontado como mais uma razão para o terrorismo ter sucesso. Purgam-se os nossos grandes e intoleráveis medos na punição das pequenas culpas do outro, à falta de melhor. Registo isto, como mais um exemplo da "trabalhadeira" agitação humana perante tudo o que nos foge ao controle. Mas é só mais um exemplo do que estou farto de saber, que a regra geral é simples: o erro julga-se pela sua consequência; não que isto esteja certo, mas doutra forma não há notícias.

Quero eu dizer, com isto, que não se investigue quem tem a responsabilidade pela cessação da vigilância? Não, senhores. Deve, até, ser fácil saber quem foi. Bem mais fácil, se calhar, que o que terá sido ao responsável pela determinação (o "negligente") prever que aquele indivíduo iria fazer o que acabou por fazer.

Sabem o que é um Holter? Um Holter é um mecanismo simples, um aparelhómetro que monitoriza os nossos batimentos cardíacos, isto assim basicamente, traduzindo-os, depois, em traçados electrocardiográficos. Serve para detectar arritmias, por exemplo. Uma arritmia é, de forma simples, uma alteração do "ritmo certo".
Havemos de acabar aí, no Holter global. Reparem que não discuto, sequer, a bondade disto, só estou a tentar adivinhar para onde nos levam e a tentar, desesperadamente, acertar o meu ritmo. Para não ter de passar pelos suplícios do digitálico, da amiodarona, pelos efeitos indesejáveis de todos esses "novos afinadores de piano" que aí vêm. Que não sabem de música uma semi-fusa, mas sabem de som.

Reli, neste fim-de-semana, ao sol, umas crónicas antigas de Miguel Esteves Cardoso. Lembrei-me agora disso porque, numa das "suas aventuras na república portuguesa", ele falava (no final dos anos oitenta, vejam só, isto agora deve ter refinado) nos portugueses que, não ligando sequer à música que escutavam, eram fundamentalistas da qualidade do som. Das colunas e dos amplificadores. Como - e isto nem sequer é discutível - para ouvir os "Coldplay", por exemplo, que são vulgaríssimos de lineu, não é preciso mais que um rádio de pilhas, convenhamos que há portugueses (e outras pessoas, seguramente) que não se centram no importante porque não conseguem, isto por um lado, e porque o importante é muito difícil e não se resolve, geralmente, fazendo contas fáceis. Sai Coldplay, pronto. E sai. Sobretudo porque entra.

Há quem, com a casa a cair, acabe por chamar um trolha que lhe pinte o escalavrado tecto do quarto. Sempre fica melhor, pintadinho...
Parece-me que isto vem a propósito mas não me peçam para explicar porquê. Nem sei, nem preparo a papa a ninguém desde que o João cresceu.

15.7.05

Algum futebol a sério, para variar

É provável que Liedson venha a sair do Sporting. A serem verdadeiros os 10 milhões de euros propostos pelo Estugarda ao Sporting, conjugados com a vontade (que se entende) do jogador de melhorar o seu futuro, dificilmente o Liedson não nos deixará. Tenho pena, claro, porque é um jogador com características difíceis de encontrar num ponta-de-lança com a sua morfologia ligeirinha: grande capacidade de luta, rapidez, azougue, sentido de oportunidade. E pareceu-me sempre humilde e simpático, ainda por cima. Contava com ele para um excelente ano.

As saídas de Enakharire e Hugo Viana (das de Rui Jorge e Barbosa não falo, porque condeno, em absoluto, a forma como foram tratados, embora reconheça serem duas pessoas com "feitios difíceis" - o que não é desculpa para nada, tão pessimamente andou a SAD do Sporting nesta matéria que... nem digo mais nada) abrem lacunas importantes na defesa e no meio campo.

Enakharire seria titular indiscutível do Sporting (com Polga, provavelmente), por me parecer o único capaz de oferecer a Ricardo algum relativo sossego na sua "crónica tremideira" nas bolas aéreas a cair no limite da pequena área. E, também, por ser rápido (Polga é razoavelmente rápido, mas Beto é lento como uma lesma, sobretudo quando tem de se virar e perseguir quem quer que seja que o tenha apanhado a "dormir").
Hugo (o carequinha) seria sempre uma alternativa viável. Mas não é rápido. Cumprirá sempre, será, sempre, um óptimo central de marcação em qualquer clube do quinto lugar para baixo, mas não tem perfil para o Sporting. Tem o perfil humano (gosto dele), mas mais nenhum.
Um defesa central dum clube com aspirações, que passará mais de 95% dos jogos do campeonato a jogar ao ataque, tem de ser rápido, forte, bom no jogo aéreo e, ainda, de saber sair a jogar. E de entregar bem a bola.
Neste sentido, parece-me ser José Castro o central que o Sporting devia ir buscar. Não tinha visto bem o rapaz, admito, quando me pareceu que não passava doutro Beto. Passa. É diferente. É bastante mais rápido e tem melhores pés. E tem grande potencial de valorização, porque parece esperto e é muito novo.
Com Polga, Beto, Veloso, Semedo e Castro, estaremos bem de centrais.

A saída de Hugo Viana deixa-nos órfãos do estratega. Do jogador "fino" do meio campo. Não se conte com Carlos Martins, que é dado a estados de alma, nem com Moutinho (embora este seja uma pérola, faz o meio campo todo) para acrescentar um toque de classe e criatividade ao jogo do Sporting. Não. São guerreiros, Moutinho é indispensável, mas não chega.
Não sei se João Alves, o do Braga, será contratado. É novo e é bom. É certo. Mas, pelo que tenho lido, perante a presença garantida de Rochemback, Custódio, Martins, Moutinho, Labarthe e Loureiro no meio campo, o que me dá garantias dum miolo sólido (Loureiro não é nabo nenhum, ao contrário do que já vi escrito; é um excelente jogador, alto, forte, exímio recuperador de primeiras e segundas bolas, bom na progressão "ali na molhada", sai bem a jogar ou a "limpar", já o vi actuar muitas vezes, quase sempre bem, em vários clubes e, mesmo, na Selecção), faz falta... Figo.

Exactamente. Leram bem. Se os jornais não mentem, Figo sairá a custo "zero" do Real. Aos 32 anos, não seria tentador para Luís Figo regressar ao Sporting, num ano em que se festeja o nosso centenário, sem redução significativa (enfim, muito significativa, pronto) da sua massa salarial, para embarcar num projecto que, se correr bem, poderá fazê-lo jogar na Liga dos Campeões e participar na disputa dum título (ou mesmo mais) muito importante para o clube que o lançou na "alta bola"? Parece-me que Figo seria homem para ganhar "apenas" 2 milhões de euros por época, nos seus dois últimos anos de carreira, ou mesmo algo menos, se o deixassem gerir e usufruir (a 100%) dos seus direitos de imagem. Ora isso significaria, para o Sporting, ter Figo durante 2 anos por 4 milhões de euros. E para Figo, seria acabar em casa, a lutar por títulos, respeitado, reposicionando-se no país que o viu nascer e onde quererá viver, ganhando bem mais do que o que o Sporting lhe pagaria.
Eu faria um esforço neste sentido, se fosse da SAD do Sporting. E mais: Figo não é, agora, o melhor ponta direita da Europa. Mas ainda fará o lugar, se for preciso, melhor que outro qualquer que cá tenhamos, ou que venhamos a ter. Faz, mesmo, ambas as pontas, mais devagarinho que antes mas, ainda assim, com competência. E remata. Marca livres. Dispensava-se Wender, se fosse o caso de o Braga continuar careiro. Não era?

Faltará, sempre, substituir Liedson. Fala-se em Wagner Love. Eu tenho-lhe uma azia do caraças, que é compreensível. Mas, além da azia, tenho dúvidas: parece-me um bom jogador, sem dúvida, mas demasiado rotinado no contra-ataque. Como no CSKA. Ora, o Sporting não joga assim. Em contra-ataque, jogamos nas Antas e na Luz (na Luz tem sido ela-por-ela, aliás). Terá, creio eu, de se arranjar outro ponta-de-lança. E aqui, reconheço, foi pena o Benfica ter-se lembrado do Tomasson. E o Porto ter garantido o Sokota. São bons jogadores.
Haverá alternativas mais fáceis que as que eu vou dizer, seguramente. Mas eu, a sair Liedson, entrava mesmo numa pequena loucura. Já que se vai tentar ter uma equipa forte (vem aí o Centenário, queremos ir à Champion's, queremos ganhar o campeonato) rondaria Crespo (palpita-me que não vai jogar no Chelsea) ou Morientes. Um matador experiente e cotado, um que fosse deste calibre.

Mas atenção:
Até para se poderem ter jogadores deste calibre num plantel heterogéneo, é importante ter lá Figo. Isto não é parvoíce. O nome mais sonante dum plantel, o "líder mediático", convém que seja da casa. Tenho a certeza que Mourinho aproveita muito bem Lampard e Terry, no Chelsea, como aproveitou Baía e Costa, no Porto, porque sabe perfeitamente disto.

Olha que bem apanhado

Judite de Sousa, a mãe da expressão "Portugalce".

(adaptado do original)

14.7.05

Upstairs, downstairs
















Deparei-me hoje no canal Memória com a antiquíssima Família Bellamy, no episódio em que Mrs Bridges se livra de apuros por causa do gesto cavalheiresco de Hudson, que a pede em casamento para que ela escape de uma pena de prisão por rapto de uma criança. O que me agradava naqueles londrinos altivos é o mesmo que se pressente no Gosford Park: aquela afectuosidade subliminar que, ainda que profunda e sólida, só longinquamente trespassa através das posturas impecavelmente correctas e tão obscenamente british que até a expressão de felicidade é comedida, embora comovida.
Comportam-se como se soubessem que estamos a assistir a tudo e impondo-se-lhes, por isso, a regra inviolável da reserva dos private matters. Como Lady Marjorie que, perante a notícia do casamento de Hudson com Mrs Bridges, exclama sorridente, embora sóbria: that is a most satisfactory arrangement.

Fora de tempo

Estou tramado: o Altino lê o diário digital e lembra-se de mim. Vou ali cortar os pulsos e já venho.

Vá lá que o Altino, ao menos, não se ofende por eu falar mal do "ècèlebê". Toda a gente sabe que o "ècèlebê" é uma variante patusca do Benfica. Conforme o João Pereira é um clone apanascado do Veloso.

Ó Altino: tu deslinkas-me se eu continuar a gozar com o teu clube, sempre que me der para aí, ou limitas-te a pagar-me na mesma moeda, fazendo rastejar o meu clube (eu sei disso que vocês babujam sobre os lagartos, escusas de te rir!) sempre que te aprouver?
Tu responde, que é para eu saber se me dedico, unicamente, às lendas minimalistas, ou se posso discorrer sobre a bola (e sobre outras coisas pueris deste mundo) sem me marcarem penalties por faltas cometidas fora da área.

Acrescento que me palpita que, amanhã, a Grande Entrevista há-de ir para o ar mais cedo. É que Ribeiro e Castro é sócio dos "encarnados". Ser militante dos "vermelhos", ainda por cima na qualidade de "póstumo", é muito menos importante e mediático.

Play it again, Sam

O blogue do Miguel (que tem aparecido pouco por estar apaixonado) faz agora dois anos de vida. Muitos parabéns.

Cunhal, Fidel e tonterias

Maria Eugénia Cunhal, a quem a Judite de Sousa chamou de rectaguarda sentimental do irmão, não disfarça, no olhar, a respeitabilidade da firmeza. Quem quisesse, com esta entrevista, poder enternecer-se com um Cunhal visto por uma irmã devota havia de se ter desiludido. Como Cunhal o faria, também ela guardou teimosamente as recordações do Cunhal irmão ou do Cunhal filho, contando coloquialmente sobre os reencontros de forma a, intencionalmente, fazê-los parecer banais. Reencontros esses que não eram mais do que contingências da luta, a luta a que tudo se submeteu e se secundarizou, até a família e o estar perto da família.

A irmã é parecida com Cunhal. Ambos teimosos, ambos tenazes, ambos determinados, no fio invisível que lhes conduz a vida, a agir sem desvios, ainda que milimétricos. Cunhal previligiava a luta. Afinal, tão parecido com Fidel e com a lucha deste, e que só por mero acaso histórico não se tornou, como este, timoneiro de uma nação, tarefa em que seria, no mínimo, tão coerente como Fidel.

O acaso não quis, porém, que esta suspeita se comprovasse. Por isso os tontos lhe elevam as virtudes que negariam na situação inversa, tal como lançam fogo sobre o similar Fidel a quem os acasos históricos tornaram anacrónico e, por isso, fustigado pelos neo-democratas de sofá, de onde conjuram, com contentinho e desafogado pseudo-humanismo, os abusos do líder cubano.

Falo dos tontos que se distraiem na sua amálgama de impropérios compulsivos e que, quando dão por isso, já se atravessaram a debitar tonterias como quem atira aos pratos na feira. Porque nunca lhes sai o brinde e porque se mantêm irremediavelmente enredados nas malhas do esganiço enlouquecido, sempre se aventuram, incansáveis, a atirar novamente aos pratos. A novos pratos, claro, eventualmente mais incautos ou pacientes do que os anteriores, que tentarão encontrar, sem sucesso, alguma lucidez escondida na prosa insana.

Entretanto, tudo está regular. Acho que a Maria Eugénia nunca divulgará o espólio íntimo de Cunhal. E Fidel ainda é o Comandante en Jefe.

12.7.05

Ourivesarias

Os treinadores holandeses são todos assim, avessos a ornamentos?
Ou são só estes que cá estão agora?

Deixo a pergunta no ar para ser respondida por Ruud Gullit, Frank Rijkaard, Daniel Passarela e Gabriel Batistuta. Estes dois últimos não são holandeses, eu sei, mas também sei outras coisas.

Quero ir-me emboraaaaaaa!!!!

O Miguel quer ir-se embora do Benfica, mas parece que não pode e que há ali uma marosca qualquer em que o Miguel terá embarcado. Não acredito que a tivesse promovido, até prova em contrário.

O Miguel não tem razão nenhuma, claro, mas eu entendo a angústia dele. Aliás, o Simão só não sai porque o Constantim não tem um chavo para gastar em cláusulas de rescisão.

Mais um momento solene de profilaxia

O verdadeiro arrastão
O único que se conhece, com propriedade e certeza é o «arrastão» da economia que surgiu com o clima depressivo do país.
Esse sim, é verdadeiro, não fabricado, não mediatizado, e que não afecta uma praia, mas um país e dez milhões de cidadãos.
O arrastão é um assalto colectivo ao bolso dos contribuintes, dos consumidores, das empresas, e gera um efeito de medo, contenção, inacção, e desconfiança no futuro.
Mas este arrastão foi provocado por um problema menor mas importante, localizado, e de repente, sem que se evitasse isso, atingiu todos, ao mesmo tempo, e com efeitos desastrosos.
Aguardemos pelos resultados, e pelos meses e anos que aí vêm. Depois não se queixem...


Vá, quem escreveu isto? Não vale ir ver o "link", vá, não façam batota! Atenção, os que já tinham lido não vale, não entram no jogo, OK?
Que jogo? Então, este jogo, de adivinhar quem escreveu, ora! Que prémio dá o jogo? Sei lá, não dá nenhum, não vos basta o gozo de jogar?

Novas lendas de besugo

Um empresário de sucesso perguntou a um génio (que se esforçava por sair da lamparina, mas estava atrancado no gargalo) por que raio havia terroristas. O génio, camuflando a Uzzi atrás das costas, respondeu que devia ser por haver, nos homens, grande capacidade de causar e de sentir terror.
"Ora, isso não é resposta!" - protestou o empresário, irritado.
"Não?"- espantou-se o génio, apontando a Uzzi ao empresário de sucesso.
"Não, porque eu chamo a polícia e tu vais preso!"
"Preso já eu estou. Tu é que, ou me tiras daqui, ou levas uma rajada nos cornos. O que acontecer depois deixa de te preocupar, entendes?".
"Não! Parvo!".
O génio acabou por lhe dar apenas uma rajada curta, transformando o encéfalo do empresário de sucesso numa gelatina definitivamente extrínseca.

Como isto se passou num deserto qualquer pouco visitado, foi Miguel Sousa Tavares que acabou por encontrar as ossadas do empresário de sucesso. Não viu lá lamparina nenhuma. Donde se depreende que o génio terá sido preso e a lamparina confiscada ou, em alternativa, que o génio detinha parte da razão e a terá levado com ele, à sua razão, pelo mundo fora. Ou que, pensando bem, Miguel Sousa Tavares terá mentido. Estando o génio a treinar, já, às ordens de Cu-Adriano, sem brincos nem turbante. E a lamparina, já devidamente polida, na sala de troféus do estádio do Dragão.

Por falar nisso, com a devida imodéstia analítica que tão bem me caracteriza (é isso e o latir), ainda bem que o Dragoscópio reconsiderou e desistiu daquela ideia peregrina de encerrar, vender, trespassar, mesmo dar, o "estaminé fumegante".
Fica-se melhor assim, bolas.

Muito grato

Pela parte que me toca, eu leio-o, também. Elaborei, mesmo, um resumo, para me penetrar melhor das verdades mais certeiras. Que ficarão a “bold” para assumirem, no meu pavloviano íntimo (e no íntimo deste pasquim, que conspurco torpemente), toda a pujança que é devida aos dogmas.

Eis-me, então, filtrado por lupa fina e resumida:

É o besugo, infelizmente, uma mistura de ditirambos repetitivos e de ordinarices rascas, aparentemente por possuir um mau fígado e por esguichar, proveniente duma laboriosa e sobre-estimulada vesícula, abundante fel. Contudo, está o besugo generosa e parcialmente desculpado destas coisas desprezíveis que o caracterizam: basicamente, por escrever com poucos erros, por causa dum cachorro e, principalmente, em nome do princípio da equidade.

Esclarecido e grato, tentarei, de hoje em diante, ser uma pessoa melhor e mais completa na humilde - e assim reforçada - noção das minhas imperfeições.
Com o que me despeço, atento e purificado.

Nota final - Em nome da verdade e da decência, corrigi um detalhe importante no ignóbil texto que intitulei, abjectamente, "Cu man" ; assim, onde se lia, no último parágrafo, "quinze anos", lê-se, agora, porque fui fazer contas, "doze anos". Acrescentei, ainda, uma pequena frase final que, na sua singeleza, é já um primeiro sintoma da minha esperançosa purificação. Vai, mesmo, a verde.

11.7.05

Guardadas no fundo do peito.

Da humilhação não escaparam, mas foram absolvidas perante uma quase demissão de todos os intervenientes de um tribunal que, seja por que razão for, deu sinais claros de não querer aplicar a lei.
Só elas saberão, lá no fundo das alegrias das suas vidas, onde guardam as dores, eventualmente inconscientes, do que perderam para poderem ganhar ou, pelo menos, tentar não perder mais, ainda que sempre perdendo.
Isto, felizmente, nunca poderá ser julgado em tribunal. Muito menos pode ser objecto de condenação pública.

Fiquem bem

Sinto a falta dos meus dois filhos. Eu sei que isto só tem interesse para mim e, ainda por cima, é banal: toda a gente sente a falta dos filhos. Devia ser proibido, a qualquer homem que se sentisse enternecido numa "pequena dor" qualquer, escrever sobre ela. Porque sai sempre uma ninharia entre o dorido e o apanascado, que apetece apagar no dia seguinte.
Mas eu não consigo, merda. Dotado que sou para a ninharia, em permanência, quero que se foda quem achar isto, ainda por cima, mariquice. Escrevo.

São os meus meninos, sabem? Os que eu quero que vivam muitos anos e bons, depois de mim, que é para a minha vida ter algum sentido, vista daqui e vista depois, por eles. Senão, não tem interesse nenhum, não vale a pena. Não é por eles serem meus filhos, é por serem filhos. Isto é verdade para os filhos todos e para os pais todos. E mesmo para quem, não tendo filhos, vê os filhos dos outros como um prolongamento incidental de si.

Claro que eles não lêem estas merdas que o pai escreve, até porque este execrável besugo exagera nos palavrões, não poucas vezes. Não, isto é uma lamechice só para mim. Se eles pudessem ler, acreditem, nunca escreveria isto. Nem outras coisas de que, às vezes, me arrependo.

Desculpem, os que lerem tudo, mas é que eles são tão pequeninos! Quando estão longe de nós parecem sempre mais pequeninos e vulneráveis. Não é? E parece que nos aprofundam ainda mais os sulcos descaídos do rosto, antecipando o miserável e inevitável dia em que não os veremos mais.

Muito obrigado

Ao Diário da República, por ter lá posto Brahms.

Bolas

Os meus dois filhos são atletas e vão estar fora durante uma semana. Vão para Espanha jogar andebol.
E eu estou lixado da cabeça, porque lhes vou sentir a falta e não quero que eles saibam mas, por outro lado, gostava que soubessem, e que me sentissem a falta a mim, embora ficassem felizes na mesma, como eu vou ficar, embora não tenha a certeza.
Isto dói um bocadito. É uma pequena dor, como diria a lolita.

A idade média dos bloggers portugueses deve rondar os trinta anos, eu tenho quarenta e quatro, é fazer as contas...

Quando este bicho vos morder, daqui a catorze anos, telefonem ou mandem um e-mail: eu saberei o que se deve fazer, presumo, nessa altura. E darei conselhos.
Hoje não sei dar.
Apesar de tudo, há livros que hão-de ser escritos, apenas, no seu devido tempo.

Cu man

Aos quatro minutos de jogo, o Paraty "xuíxo" de serviço fez prrrrrriiiiiip!
Ficou o "ècelebê" a treinar para o campeonato nacional, desde logo: onze contra dez.
Cumpriram a missão, os Joões Pereiras: lá ganharam por 2-1.

O Vieira veio, depois, com aquela testa estreita que ele tem, dizer, numa entrevista, que estava a dar uma não-entrevista.
Uma não-entrevista consiste no seguinte: o repórter de serviço faz perguntas, o imbecil de testa curta e estreita diz que não está ali para responder a perguntas. E só dispara para o ar, com ar de quem, acertando em melros, cuida matar tordos.

O Chalana, que não fala holandês, é o último benfiquista que ali há. Hão-de despedi-lo, antes que seja cedo demais.
Graças a Deus, Chalana, tu livra-te desses cromos logo que possas. Tu, logo tu, no lugar do Álvaro? Que nunca seria jogador da bola se não fosses tu? E os cromos holandeses a falar entre si, ignorando-te? Tu respeita-te, Chalana, estás na casa da tia!

Mas que merda é este Benfica nojento dos últimos doze anos, que nem eu, sportinguista respeitador, lhe consigo ter respeito!!!!!? É um "ècèlebê", pois, é isso...

10.7.05

Clássicos de besugo

O Benfica estreia-se hoje, frente ao Sion, que é uma equipa suíça que já conheceu melhores dias, mesmo no tempo em que lá jogava o Carlos Manuel.
As atenções desportivas do país estão, portanto, centradas nesse clássico do futebol moderno, Sion-Benfica. Sim, que cada jogo do Benfica é um clássico.
Consta que não será um jogo fácil mas, palpita-me, para o Benfica, nenhum jogo será fácil, esta época. Como no ano passado, exactamente, sim. Só que, com menos penalties inventados, os lampiões vão lutar com o Braga pela posição cimeira no campeonato "as duas equipas que o Jesualdo já treinou a sério" .

Boa sorte, Jesualdo, que tu sabes da bola vista do banco; o "Cúman" (há sempre o outro "Cu", o "Cu Adriano", o "Cu" que mete respeito, a ver vamos, estou desconfiado dos andrades, dão a volta quando menos se espera)) tem o defeito ligeiro de ter a certeza de que ainda poderia, com vantagens para o simpático clube que tem a galinha como símbolo, ser titular deste Benfica que aí vem, mesmo que fosse a médio centro. Ou no lugar do Cariáca, que é um russo brasileiro.

O ruído de fundo é este: "Miguel, volta para casa, que o pai Veiga é grande e eu, não sendo o seu profeta, sou a sua profiterole!". É este grito, lancinante, e o ululante "ècèlebê": é o "fadinho" do costume.
Miserável agremiação, esta, que patolas! Que "xuíxos"!

Claro que jogar com os Sarilhenses de lá, da "Xuíxa", tem mais encanto. É como a Académica, é como Coimbra - diz-se "Cuímmmmmbbrra!", como se fosse o Manuel Alegre a falar - , é como aquelas coisas todas, vagamente chatas, que nos fazem verter uma lágrima na hora da despedida, embora seja só pelo alívio de não voltarmos a ter de as sofrer.
Houve militares que choraram ao despedir-se da guerra de África. Não sabiam? Eu sei, que me contaram alguns.

Que é isto, quando comparado com a forte perspectiva de o Sporting vir a ter, este ano, a (de longe) melhor e mais equilibrada equipa dos últimos anos? Nada. Folclore minhoto. Os benfiquistas e o Minho têm uma forte ligação porque o Minho é a terra do sarrabulho, em papas.

Eu mais logo explico melhor isto, que é para os senhores entenderem. Os que não entenderem mais logo vão perceber ao longo da época, há alunos que desabrocham só no segundo período.
E, alunas, nem se fala. Algumas é só ao terceiro. Desculpem, no terceiro.

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