blog caliente.

31.10.03

Provérbios

Quem o quintal não trata, a chuva maltrata.

Quem o quintal não amanha, a chuva apanha.

Quem não limpa o quintal, lixa a pose de calma beatitude pós-prandial


Verdades simples, sendo certo que não entendo a última, em que são usadas expressões vulgares no povo, mas já em desuso certamente.

Todas estas verdades são importantes quando se aproxima um fim de semana em que me vou lembrar que outros cá andaram antes de mim, frequentaram alguns dos mesmos lugares que eu hoje frequento, viveram experiências semelhantes às minhas, e finalmente morreram como eu hei-de morrer um dia.

Na minha empedernida alma de conservador, esta ocasião é também um elixir para a minha existência. Lá vou eu, com aqueles que tomarão de mim o testemunho, visitar aqueles de quem o recebi e explicar-lhes (não é preciso falar, eles vêem) que eu próprio o recebi de outros. Que também já fui miúdo, filho e neto, e que um dia também eu cá não estarei, estando eles (assim o espero, pelo menos).

Gosto disso. Bom fim de semana.

30.10.03

O mais autêntico elixir

A intempérie destruiu-me, completamente, um par de sapatos,umas peúgas pretas, uma camisola de pura lã, um par de calças de ganga, os deltóides, os trapézios, os abdominais e os quadricípedes femurais (entre outros músculos sossegados) e a pose de calma beatitude pós-prandial. As fortes chuvadas que hoje se derramaram sobre o Douro, mancomunadas com as folhas e outros detritos de videiras e folhas caducas, o dito entulho, provocaram-me domiciliária inundação. Saltei da mesa do jantar para o quintal, perante eminência de catástrofe. Rapidamente, sem necessidade de prévia reunião, foi criado um grupo de emergência de quatro pessoas (os residentes), que se encharcou completamente em actividades de desenrascanço. Atribuídas aos maiores (2) as funções de coordenação e actividade física, aos menores as de comunicações e transporte de material, a situação teve desfecho feliz. Ao longe, ouviam-se sirenas de bombeiros, que a chuva cai para todos.
O duche quente e recompensador soube bem.
A roupa e os músculos ficaram uma miséria (levantar tampas de saneamento com um palmo de água em cima não é como ganhar as eleições do Benfica!).
Quanto à minha pose de calma beatitude pós-prandial, que se lixe. Antes de lhes dar um beijo a despachá-los para a cama, os meus filhos disseram-nos, à mãe e a mim, “até amanhã, atletas!”. Caramba. Os putos são autênticos anti-depressivos, “Josés Mourinhos” em embrião! Quase nos fazem desejar o próximo treino, o próximo jogo a doer!
Bom, tanto também não.

29.10.03

Interlúdio musical

O mio babbino caro,
mi piace è bello, bello;
vo'andare in Porta Rossa
a comparar l'anello!
Sì, sì, ci voglio andare!
e se l'amassi indarno,
andrei sul Ponte Vecchio,
ma per buttarmi in Arno!
Mi struggo e mi tormento!
O Dio, vorrei morir!
Babbo, pietà, pietà!
Babbo, pietà, pietà!


Lamentavelmente, não sei pôr aqui som. Fica aqui, assim, a letra desta ária de Puccini que, hoje de manhã, no carro, na voz da Maria Callas, me despertou a alma.

28.10.03

Sobre nada

A ordem é incompatível com o prazer. É castradora, triste, morna. As emoções são puras antí­teses de emoções anteriores e nascem do caos da rejeição destas. De construção e desconstrução permanente. De sentidos contra e a favor. O único caminho para os momentos felizes é o do confronto, nunca o das águas suaves.

Os olhos nus da TVI

Mais uma brilhante reportagem da TVI, hoje, à hora do almoço. A pivot de serviço, aparentemente excitada, interrompeu uma reportagem sobre outra coisa qualquer e remeteu-nos, uma vez mais, para a porta do Tribunal da Boa-Hora. Aí, pudemos observar um jornalista de ar perspicaz, que nos apontou uma carrinha, antes de ser posto dali para fora pela polícia. Mas ele foi falando e presumindo que aquela carrinha iria servir, provavelmente, para transportar Carlos Silvino de regresso à cadeia. Foram entrando polícias no furgão. A câmara fez um “zoom” para o interior do veículo, e de Bibi, de facto, nada. A carrinha começou a fazer manobras e o jornalista, novamente focado, mostrava agora uma expressão de desencanto ofendido. Aventou a possibilidade de, afinal, aquilo não passar duma manobra de diversão para enganar os jornalistas, que talvez Bibi tivesse saído pela porta das traseiras. Percebeu-se que estava descontente com essa possibilidade, que se sentia traído. A reportagem ia passar, novamente, para a senhora do estúdio, quando o homem destacado para o exterior brada um “atenção!”, destinado a captar, novamente, a nossa interessada vigília. De facto, outra carrinha da mesma cor, mas sem janelas, saía do estabelecimento, seguindo a outra, pela rua fora. O jornalista de serviço, aparentemente vingado e reconfortado, lamentou não ter “olhos de raios X”, tal e qual, mas que lhe parecia, mesmo sem esse apetrecho fundamental, que Carlos Silvino devia ir ali dentro. Não o podendo garantir, obviamente, ressalvou, por ter ali, naquele momento, apenas os olhos normais. Os populares que por lá se encontravam, eventualmente munidos de olhos mais expeditos, assumiram mesmo a presença de Bibi naquela carrinha, porque desataram a vituperar o veículo. A reportagem voltou para o estúdio, podendo observar-se a expressão de inefável orgulho e excitação aparente da senhora que lá estava, que garantiu ao colega de serviço ao Tribunal que, embora não tivesse “olhos de raios X”, era jornalista e, por conseguinte, tinha cumprido nobremente a sua missão de dar informação de qualidade.

De facto. Nem a gente almoçava sossegado sem ter a noção (nada o garantiu, contudo...) de que o Bibi voltava para a cadeia num carro celular devidamente escoltado. Muitos de nós poderíamos supor que se deslocasse em carro próprio, talvez num Porsche ou num BMW cabriolé, sem escolta policial.
Informação de qualidade é isto. Mesmo sem “olhos de raios X”, brilhante peça!

27.10.03

Ao besugo

A linha editorial deste blogue não é compatível com copy/paste de outros textos. Faça o favor de não entender isto como uma atitude preconceituosa com a publicação em causa e queira abster-se de, futuramente, apropriar-se de escritos alheios para encher estas páginas. Use os neurónios com que veio ao mundo, mesmo que aquilo sobre que escreve seja profundamente censurável, como sejam, por exemplo, as dissertações sobre o seu ódio ao Mourinho.

O acto constante de pensar

É interessante. Quando sabemos a verdade antes dos outros a saberem pode ser perigoso. E se calha sabermos e os outros não virem a saber? Mesmo que seja por não quererem saber, mesmo que saibam? Devemos explicar-lhes tudo? Recortar a nossa figura contra um fundo contrastante?
A importância da primeira permissa, que é sempre subjectiva. E da segunda, talvez... Depois tudo se articula.
Isto é um mero exercício de sofrimento. Não liguem.

Caramba, lá ganhou o Porto, outra vez, pelos vistos.

Duda Guennes

Duda Guennes, n’A Bola

"Como reage o homem brasileiro, conforme a região.
O paulista: encontra a mulher com outro na cama e vai fazer terapia.
O carioca: encontra a mulher com outro na cama, junta-se a eles e diverte-se.
O mineiro: encontra a mulher com outro na cama, mata o homem e continua casado com a mulher, exactamente como manda a TFM (Tradicional Família Mineira).
O gaúcho: encontra a mulher com outro na cama e, ao contrário do mineiro, mata a mulher e fica com o marmanjo só para ele.
O paraibano: encontra a mulher com outro na cama e, sendo a peste que é, mata os dois e arruma outra no dia seguinte.
O goiano: encontra a mulher com outro na cama, entra em depressão, pega na viola e vai para a rua à procura de outro corno para montar mais uma dupla sertaneja.
O baiano: encontra a mulher com outro na cama, senta-se na sala até que os dois terminem o que estão fazendo para ele poder dormir um pouco.
O brasiliense: sempre que pega a mulher com outro na cama, de raiva vai para o Congresso e inventa mais um imposto.
O curitibano: quando pega a mulher com outro na cama, não faz nada, pois curitibano não fala com estranhos.
O cearense: quando pega a mulher com outro na cama, agradece a Deus, pois vê que não é só ele que pega mulher feia.
O pernambucano: mulher de pernambucano não vai para a cama com outro, porque está satisfeita com o marido que tem. É lógico!"

O Duda tem uma excelente coluna n'A Bola, há muitos anos. Pernambucano, o Duda, palpita-me...

26.10.03

Gostei...

...de ver o Pacheco Pereira a perder a frieza cerebral do costume, quando falou das praxes académicas. Visivelmente incomodado com a mediocridade das brincadeirinhas que os meninos universitários impõem aos caloiros, falou da menorização dos estudantes universitários e ilustrou a imbecilidade das praxes com fotografias, comentando-as com um cinismo arrepiante.

Intriga nacional

Intriga-me esta onda de acusações ao Ministério Público. O Souto de Moura está longe de estar à altura das funções, se se atentar na sua habilidade notória para errar a pontaria nas situações em que fala e devia estar calado e, mutatis mutandis, na situação inversa. Mas está, também, longe de ser o arquivador-geral da República que na década de noventa sossegou e acarinhou os poderosos influentes da economia e da polí­tica portuguesa. Poderá estar aqui, portanto, uma pista a seguir para esta frente inquisitória, generalista, histriónica, que pede a cabeça não só do PGR mas da procuradoria toda.

É grave que o bastonário Pires de Lima compare o MP à  PIDE ou à GESTAPO. À força da abundante e transversal polémica sobre a justiça, hoje presume-se que quem berra mais alto é quem tem razão , quando, pelo menos do meu ponto de vista, declarações com este teor mereceriam, de tão patéticas, a mais absoluta desconsideração. É exigível que um Bastonário de qualquer ordem mostre rigor, contenção e sensatez quando opina publicamente e que não se porte com a ligeireza que teria se estivesse numa tertúlia de amigos em que, entre Cohibas e aguardente velha, caricaturasse com cores fortes os podres das instituições.

É, igualmente, grave que o bastonário Júdice acenda o barril de pólvora ao sugerir publicamente a demissão do PGR e depois se recolha atrás de éticas bacocas sobre cartas entreabertas cuja existência ele próprio legitimou e que, ao que parece, não passaram de uma ratoeira em que o Souto de Moura, mais uma vez, caiu, errando de novo a pontaria.

Tudo isto parece-me estranho e intrigante. Independentemente das ambições pessoais, conhecidas ou insondáveis, de cada um destes bastonários, e que dou de barato que possam até ser legítimas. Espero é que tudo isto não tenha outros fins mais obscuros, como o de que voltemos à era do arquivo morto.

A barra, parte III

Hoje o mar está cintilante e brilha, espraiado e sereno, à luz do sol, fazendo uma coroa à volta do Cabedelo. A linha do horizonte separa com perfeita nitidez os dois azuis, do céu e do mar. Gaivotas. Nuvens brancas em cascata. A banda sonora deste filme é, hoje, a música que Tom Jobim dedicou a Ana, sua mulher. Enche-se o peito de ar e fecha-se os olhos, a guardar isto tudo cá dentro.

Pesar

Ao dar a volta pelos blogues percebi que há um amigo que está triste e decidiu contar-nos isso. Tem motivo forte para a tristeza.
Deixamos-lhe aqui um abraço e o desejo de que regresse, logo que queira, refeito da grande perda que teve.

Doutoria e Senhoria

Esta questão das formas de tratamento é interessante. Em Portugal dá-se doutoria a qualquer licenciado, é tradicional. E há, de facto, um certo culto do “canudo” anteposto ao nome, em forma de “dr.”. E alimentamos algumas vaidadezinhas dessa forma, admito. Sem custo.
Sendo médico, exerço a profissão que, tradicionalmente, mais se presta à doutoria. Muita gente, pelo menos para cá do Marão, afirma que “vai ao doutor” e logo se percebe que “vai ao médico”. O médico é, tradicionalmente, o doutor por excelência. E não está aqui em questão o mérito ou o demérito da doutoria, evidentemente. O médico é, apenas, um licenciado. Curiosamente, os médicos académicos, que fazem doutoramentos, passam a chamar-se professores. Para os distinguir, a eles que são, de facto, doutores, dos outros doutores que somos nós, os licenciados.
Dar doutoria ao médico é costume, também, pelo que sei, em outras paragens e culturas. É ancestral. Havia sempre um “Doc”, geralmente amargo e dado ao etanol, nos livros de “cow-boys” que me lembro de ter lido, ilustrando isto que acabei de dizer.

Isto para chegar onde? Exactamente: à importância que atribuímos, justa ou injustamente, aos títulos que nos dão. Pensando bem, uma das coisas que mais me irrita é aquele tom jovial e desrespeitoso com que alguns desenrascados, que me não conhecem de lado nenhum, me chamam “doutor”. “Ó doutor! As análises estão demoradas?”. Este vocativo é aberrante e tremendamente desrespeitoso. Dá vontade de escarafunchar a profissão do indivíduo e responder-lhe, ao calhas “Não, ó canalizador (trolha, juiz, jogador da bola, marchante, tenente-coronel, ao calhas), estão quase prontas!”.

A questão é mesmo essa. Abandonando os caminhos da tradição, prefiro que me dêem senhoria que doutoria. Se me derem as duas, entenderei isso como prova de respeito. Respeito por mim, se me dão senhoria, e pela tradição, que me empresta a doutoria.

Mas isto da "senhoria" também tem que se lhe diga. Nunca gostei, ensinado (mal, se calhar) por gente antiga, de dar senhoria seguida, unicamente, de nome próprio: senhor António, senhor Paulo, senhor Rui.... O nome próprio, e isto não tem nada a ver com a cultura anglo-saxónica, presumo, habituei-me a usá-lo com quem conheço bem, sem senhoria anteposta.
É por isso que, independentemente de quaisquer processos de intenção, me parece que o senhor Juiz Rui Teixeira errou (quanto mais não seja por falta de cortesia) ao tratar por “senhor Paulo” o senhor Paulo Pedroso. A senhoria completa tinha de lha dar, e essa inclui, sempre, um nome de família.
Por acaso também acho que lhe devia dar doutoria. Porquê? Pelo mesmo motivo que, se calhar, lha daria se Paulo Pedroso lhe fosse apresentado noutro lugar qualquer. Ou não daria? É que se daria, sou levado a crer que tentou achincalhar o arguido, despersonalizando-o, despindo-o de parte da sua identidade, apenas pela circunstância penalizante de o ter ali, “a perguntas”.

Só mais um episódio, que já me calo. Em tempos, numa unidade coronária de um hospital central, uma excelente unidade, diga-se, onde trabalhei 6 meses, estava mais ou menos estabelecido entre a equipa de enfermagem que todos os doentes internados teriam tratamento igual: senhor “qualquer coisa”. E esse “qualquer coisa” era o primeiro nome. Diziam as enfermeiras, julgo que com a melhor das intenções, que “não há cá doentes de primeira e de segunda!”. Não consegui explicar-lhes o motivo de não concordar nada com elas. Devo ter-me explicado mal, na altura. Espero ter sido mais claro hoje.

Isto vai longo e fastidioso. Espero, ao menos, que não pensem que pretendo ser discípulo da senhora Bobonne. Não é nada essa a minha ideia.

A traição do outono

Curto outono, este, que se intimida com elogios. Pressuroso, cedeu lugar ao inverno, demitindo-se de sossegar o verão para voltar à sua bisonha condição de o apagar, rapidamente, da nossa memória. Este outono resvalou, como os últimos outonos, para a traição.
Não, decididamente não gosto do frio. Nem das mudanças horárias, que me fazem anoitecer mais cedo, todos os dias.

"Must I justify this?"

Só soube agora, por mera casualidade, que a TVI transmitiu durante horas a fio a inauguração do novo estádio do Benfica. Só tenho pena de não ter visto o Durão Barroso a ser vaiado, possivelmente por ter dito hoje que a sua principal motivação para cumprir o Pacto de Estabilidade é a de tornar o paí­s credível. Não se riam, que ele disse isto com um ar sério e em inglês.

25.10.03

As evidências do Alonso

Este rapaz não é parvo de todo e costuma, ao contrário daquilo de que me acusa, usar os neurónios todos que tem, tal como o usam cerca de 70% dos portugueses. Está na média, portanto. Além de que, de indeciso passou agora a mostrar-se decididíssimo. Precipitado, é certo; mas assaz assertivo.

Ó Alonso, eu passei pelas tuas evidências e fiz-lhes referência. Não viste? É fácil imputar ao Rui Teixeira um putativo comportamento prepotente, propositadamente dirigido a "vincar o estatuto inferior daquele a quem se dirige", sobretudo quando uma entrevista trágico-comedida nos envolve emocionalmente nessa inegável tese da impiedosa urdidura. Visível, até, em pormenores como a forma de tratamento...

O que tu exigirias ao juiz em circunstâncias destas, Alonso, seria questão que só a ti e a ele diria respeito. Mas não viesses tu mais tarde dar uma entrevista cirurgicamente preparada para compor a maquilhagem, em que referisses, entre outros pormenores patéticos, que o juiz não te tratou por doutor Alonso, que isso não te ficava nada bem. Além de que só enganarias os tais 70% dos portugueses.

Bom fim de semana, doutor Alonso. A mim pode, se quiser, tratar-me por señora.

Senhores e Doutores

Lolita, como de costume, baralhaste tudo.

Uma coisa é discutir o costume português de usar dê - erres e outras coisas do género no trato com licenciados.

Outra coisa é verificar que, ao contrário desse costume (goste-se ou não, goze-se com ele ou não), um juiz trata um arguido de modo diferente.

Porque é que o faz? Será porque acha, como a Lolita, que é uma parolice portuguesa o uso do dê-erre?

Se fosse por isso, até podia estar bem.

Mas não é.

É para marcar, melhor, vincar, o estatuto inferior daquele a quem se dirige.

É disso que fala o Miguelito e, se puseres mais de metade do cérebro a funcionar por um dia, até tu entendes isto (hehe).

A meu ver, se a mim me fizessem isso, nas circunstâncias em causa, eu exigia uma de duas coisas:

a) trate-me por "senhor arguido", e eu trato-o por "senhor juiz"

b) trate-me por "senhor", mas receba de mim o mesmo tratamento.

A hipótese "a" é a formalmente mais correcta. A hipótese "b" era por admitir a hipótese de o juíz, na verdade, não gostar de chamar nem de ser chamado "doutor".

Talvez que a despreconceituosa Lolita, se fosse juiz, aceitasse de imediato qualquer destas hipóteses. Duvido que a generalidade dos juizes o fizesse.

Papillon

Hoje li o artigo do Miguelito, homem mais de emoções do que de razões (virtude que o coloca num distanciado terceiro lugar no ranking dos manipuladores de opinião do momento, muito atrás dos dois cerebrais mais poderosos deste país; além de que está de folga ao Domingo), que cultiva a postura de enfant terrible porque cedo percebeu que lhe vai bem, fazendo, aliás, pendant com um distanciamento intelectual vagamente internacional de quem nasceu na urbe mas a rejeita, em favor de uma atracção fatal pelo inexplorado e virgem mundo selvagem. O que lhe confere a rudeza emocionada da expressão, valorizada pela curvatura convexa dos lábios, como se, quando fala, o faça de uma forma perfeitamente fretada. As componentes bastantes para fazer dele um herói romântico, qual Indiana Jones, sendo que este era, pelo menos, mais espadaúdo. É que se os lábios são convexos, as costas começam-lhe a concavar-se.

Entre outras coisas, algumas certeiras (sobretudo naquilo que ele pensa sobre o Carrilho), o Miguel disse isto, no Público: "Acho preocupante, a ser verdade, aquilo que Paulo Pedroso contou ao PÚBLICO: que, durante todo o interrogatório perante o juiz, Rui Teixeira nunca o tratou por "senhor deputado", "senhor doutor", "senhor Paulo Pedroso" ou, ao menos, por "senhor Pedroso". Tratou-o sempre e só por "senhor Paulo". E Paulo Pedroso e o seu advogado ficaram-se."

E Paulo Pedroso e o seu advogado ficaram-se. Inacreditável. É evidente, porque o Miguel assim infere e eu acredito, que o Rui Teixeira (perdão, doutor Rui Teixeira) quis com esse tratamento descortês destratar o senhor doutor Paulo Pedroso (sim, assim mesmo, doutor por extenso), que ainda por cima é senhor deputado. E o senhor doutor Juiz Rui Teixeira apenas o tratou por... senhor. Vilipendiando-o na sua honra de forma grosseira e malvada, para que ele estivesse ciente da sua condição subalterna no teatro da justiça e que não esperasse muito dele, senhor doutor Rui Teixeira, porque no que dependesse deste ele iria parar com os ossos à cadeia.

Porque toda a gente sabe, como o Miguel sabe porque é um rapaz de boas famí­lias, que não se trata em Portugal um licenciado com um título inferior ao dê-érre que marca a diferença, que faz com que se seja mais bem tratado em qualquer lado a que se vá e que motiva nos titulares dos canudos o desejo de que os outros pronunciem o dê-érre de forma suficientemente sonora para que terceiros possam ouvir e lhe percebam o estatuto especial. E que é nos momentos de adversidade, como quando se está a ser interrogado por um juiz preconceituoso, que essa forma de tratamento se torna ainda mais premente. Não sendo respeitadas as elementares boas maneiras, então sempre se pode aproveitar para, numa entrevista futura, deixar cair que, até porque o juiz não o tratou por doutor, o processo só pode estar a ser manipulado.

Curioso, isto. Eu também li a entrevista do Paulo Pedroso (perdão, doutor Paulo Pedroso) na Pública da semana passada e imediatamente me lembrei do livro que o Vale e Azevedo escreveu na cadeia.

24.10.03

Ilações

Excelente e surpreendente besugada!

A conclusão que dela tiro é que a Universidade devia ser um sítio em que se estuda e se aprende qualquer coisa mais do que a resposta à pergunta "quantas cervejas aguentas até ficar bêbedo?"

Besugo, aposto que és daqueles que só não pode ser ministro da educação porque as medidas que gostarias de tomar (para além de te valerem toneladas de papel higiénico e de outros mimos aqui irrepetíveis), vão diametralmente contra a tua espinal medula feita de tolerância, compreensão, pavor/ódio no que respeita ao conceito de autoridade e outras coisas simpáticas e absolutamente inúteis que se te meteram na cabeça e que dela nunca sairão.

Aliás, até te entendo. A praxe cheira-te a tradição, até a Estado Novo, se calhar. Por isso não te custa vilipendiar a nossa gloriosa juventude e, quiçá, desejar que a mesma seja reprimida nestas tão elucidativas actividades.

Estás enganado. O Salazar até se benzia ("falso beato, esse sacana", dirás tu) se soubesse que estas coisas se passavam. Benzia-se ... e mandava prender estes jovens, que assim se alcandorariam a paladinos da liberdade de expressão e que então - só então - granjeariam a tua simpatia.

Desculpa lá, pá (sim, eu também digo "pá", como o António Costa), que até concordei contigo, mas hoje estou com os azeites.

Com amizade, e votos de um bom fim de semana,

Alonso

Outra vez a praxe

A grande saga académica continua! Os futuros dirigentes do país, quando não estão a entregar papel higiénico nas reitorias ou nos ministérios, ou a apanhar grandes nardas em cervejarias e assim, dedicam-se à praxe. A praxe é uma coisa sem a qual, verdadeiramente, não se consegue conceber uma academia. Pelo menos uma academia credível, em que os valores tradicionais (a buba, a capa, o efe-erre-à, a buba, a capa, não pagamos, a buba... que mais?) sejam conservados.
Parece que lhes tem dado, agora, aos puristas da “praxis”, para observar os genitais dos caloiros. Das caloiras não sei, talvez também seja uma ganda nóia a exposição púb(l)ica da vulva caloira. Mas não há relatos fidedignos. Pelo menos por enquanto.

Tudo se passou em Coimbra, como não podia deixar de ser, que é uma cidade com grande tradição universitária, até porque o próprio Alberto João lá se licenciou.
OK, isto é desonesto. É a brincar.
Agora o que parece ser sério e preocupante é constatar a ganância dos veteranos universitários de Coimbra, sobretudo os mais ligados às engenharias, por avaliar os genitais dos caloiros. E quando digo avaliar, não é só olhar! É pendurar-lhes coisas, metê-los na água, eu sei lá que mais! E onde mais!

Ora isto, ao contrário do que veiculam alguns sectores mais "bota-de-elástico" da nossa sociedade, é salutar. É pedagógico! É académico! É, até, profiláctico!

Senão, vejamos: o caloiro chega ali convencido que é gente. Vai ali armado em cão com pulgas. E o veterano, que tem experiência, que anda ali a marcar passo apenas porque a sociedade se encarrega de lhe provar que marcar passo é bom (quando não, corria-o dali, directamente, para o amanho da terra ou para a estiva), logo ali lhe ministra sua dose de pedagogia: tu julgas que és gente, mostra a pila! É lógico, rima com pedagógico, por isso é bem... até do ponto de vista sociológico! A propósito, pila rima com argila, e nas Caldas há faianças que, não sendo de argila, poderiam ser úteis na praxe. Fica o alerta ao Dux. A vaselina, é na farmácia...

E há lá coisa mais académica que obrigar o caloiro a baixar as calças e mostrar o vasilhame? Não há! O caloiro, em expondo a sua tímida gaitola, fica imediatamente penetrado da filosofia universitária vigente! É-lhe logo ali ensinado, em traços firmes, que mais vale mostrar os vigores aos colegas do que aos lentes! Aos lentes, as fraquezas! Vai daí, o caloiro imbui-se daquele espírito empreendedor que o transformará (honra inaudita) num veterano, em tempo competente. E já vai compondo a braguilha berrando não pagamos, muito catárctico.

Por outro lado, expor a genitália ao veteranato é profiláctico. É que não estão ali só veteranos. Também estão veteranas e caloiras. Que podem, desta forma, observar com atenção e algum detalhe o potencial vergueirense do recém-chegado. Evitam-se, assim, desilusões e más noitadas, porque deixa de fazer sentido que a Sónia Cristina saia com o Diogo Rafael, a ver o Matrix, ou outro filme desses, de culto académico, a menos que esteja ciente de que vale a pena comprar dois bilhetes de segundo balcão, fila de trás.

Só vantagens. FRA!

Lamaçal

Moita Flores quer processar Ferro Rodrigues. João Pedroso exige pedido de desculpas a Marcelo Rebelo de Sousa. José Miguel Júdice acusa Souto Moura de enviar cartas entreabertas. Manuel Maria Carrilho exige congresso do PS. O advogado do Bibi suspeita da isenção de Adelino Granja. Manuela Moura Guedes pega-se com Miguel Sousa Tavares. Ana Gomes vocifera para que se descubram os ministros de que fala o Le Point.

Montem uma piscina de lama, já.

22.10.03

Dark side of the moon

Há lados lunares e lados lunares...
Hoje o meu lado lunar é um brilho de lua cheia, de satisfação pelo dever cumprido, de alma cheia, igual áquelas luas das noites em que se vislumbra o homem carregando às costas o feixe de vides.
Outros lados lunares são mais sombrios, de finais de quarto minguante a antever a lua nova, esperançosa de um futuro mais brilhante. Aliás esses lados lunares costumam ter tons averdiscados...
E pronto, lembrei-me dos Pink Floyd a propósito disto.
Só para que vejam os estimados bloguistas as alegrias que um homem tem depois de cometer o sacrilégio de ir a Marselha cantar "A Portuguesa"...

Já agora, esclareçam-me uma dúvida.
Qual é o contexto de alguém que se está a cagar para o segredo de Justiça?
Será que se referia ao segredo de Justiça da Guiné-Equatorial? Ou do Burkina Faso?
Cagaria de alto? Ou bem rente ao penico?
Teria comido All-Bran?
E já que os juízes são uns merdas, será que estaria o senhor a cagar algum juíz?
Ou será o segredo de justiça alguma merda?
A lo mejor...

O que Jorge Sampaio poderia ter dito ontem aos portugueses

No meio de tanto marasmo, tanto entupimento, tanta falta de confiança e tanta apatia, há apesar disso neste país uma forte e positiva pedrada no charco que todos, independentemente das suas simpatias individuais, forçosamente devem reconhecer: o FCP, combativo, dinâmico, confiante, eficaz, coeso e exemplarmente orgulhoso. Vá lá, admitam esta evidência e capacitem-se de que ainda há esperança.

Lado lunar

Enquanto a Lolita e o Alonso se degladiam em diatribes inúteis (basta ler as minhas postas para se fazer luz em qualquer cabeça, mas eles adoram complicar...) eu venho aqui expor o meu lado lunar. Sim, eu, que sou o verdadeiro porta-estandarte da Justiça, a luminosidade calma deste blogue, possuo, também, um lado lunar.

Que me impele a dizer o seguinte:
1 - A liga portuguesa foi considerada como "equivalente", em termos qualitativos, à francesa, pela Federação Internacional de História e Estatística (IFFHS).
2 - O Marselha é o segundo classificado da liga francesa
3 - O Marítimo é o segundo classificado da liga portuguesa.
4 - Por conseguinte, a excelente vitória do FCP, hoje, em Marselha, tem um valor relativo equivalente ao que teria uma vitória do FCP no Funchal.

Ou seja, parabéns FCP, já percebemos que sois capazes de ir ganhar ao Marítimo.

O meu lado lunar considerará duma profunda desonestidade intelectual a introdução dos dados seguintes (que rotularei de apêndice 1 e apêndice 2) no meu inatacável silogismo.

apêndice 1 : contudo, o Marítimo ganhou ao Sporting no Funchal
apêndice 2: e o FCP bateu o Sporting nas Antas.

Estes apêndices são de extrema má fé, porque, como todos sabemos, isto é só futebol e é impossível extrair qualquer conclusão lógica dos mesmos apêndices. Recomendo, pois, apendicectomia. Dupla.

O meu lado lunar encerrou por hoje, dando lugar à mais radiosa das estultícias.

Eu disse que não voltava ao assunto

...mas o D'Artagnan voltou à carga. Ora vejamos:

Quanto ao Athos: inteiramente de acordo. É grave, gravíssimo.

Quanto ao Portus: que se saiba, a existência e a verificação da existência da prática de um comportamento ilícito, seja ele qual for, não depende da queixa do visado por esse comportamento. Queixe-se ou não se queixe o Procurador, a tentativa de pressão existe para além disso e independentemente disso. Não? E pode até ocorrer que o Procurador seja um homem piedoso e tenha, entretanto, perdoado o PS por esse mau passo...

Quanto ao Aramis: conjecturas, Alonso, meras conjecturas. Foi isso que eu tentei dizer. Entretanto, não penso que tudo isto desabone sobre ninguém em particular, mas sim sobre todos em geral. Pelo menos enquanto não se apurar de onde partiu a fuga de informação.

Por fim, uma palavra de apreço para o cardeal Richelieu, cuja odiosa ganância acabou, afinal, por precipitar uma confissão do Alonso: a sua incondicional fidelidade pela Rainha infiel. Como isto merece reflexão, agradeço e aceito a devolução do voto.

Os três mosqueteiros

também eram, afinal, quatro.

As minhas 3 notas:

1 - Athos - Se os desabafos são irrelevantes no contexto da investigação, não deviam dela constar. E o facto de constarem revela até que ponto essa investigação se deixa levar pelas susceptibilidades pessoais e de classe dos respectivos titulares. O que é grave. Aliás, é gravíssimo.

2 - Portos - Quem é que se queixou de ser pressionado no âmbito do processo? O Porcurador Geral queixou-se? Segundo creio, o Procurador Geral confirmou o que o António Costa disse/escreveu a esse propósito. E não sei de mais ninguém que se tenha queixado de tal coisa.

3 - Aramis - Que as escutas agora tornadas públicas eram já do conhecimento da defesa é algo que a dita defesa desmente. Aqui, ou acredito na defesa, ou acredito no MP. Prefiro não tomar posição, atenta a manifesta parcialidade de ambas as partes. O que não desabona da defesa, que é suposto ser parcial. Mas desabona seriamente do MP. Mas discutir isto é tentar tapar o sol com uma peneira. Não cabe na cabeça de ninguém que fosse a defesa a tornar públicos estes elementos. Muito menos os Profs. de Coimbra.

Finalmente, uma tirada à D'Artagnan: milady, os seus votos a meu respeito são-lhe integralmente devolvidos. Prefiro defender o Reino, mesmo sabendo que a Rainha não é fiel, do que colocar-me ao serviço de um cardeal que em vez de pensar no que é suposto, pensa que é Rei e age como tal.

Depois prometo que mudo de assunto.

Três notas:

1. É pacífico, exigí­vel e inquestionável que as conversas privadas se devem manter privadas. Ninguém devia saber, neste momento, que o Ferro Rodrigues, eventualmente num momento de torpor alucinado, tenha pronunciado ao telefone o verbo "cagar" numa frase em que pronunciou também a expressão "segredo de justiça" e o calão "merdas" na mesma frase em que falou em "juí­zes". Mas sabe-se. E se estes desabafos são irrelevantes no contexto da investigação, já não o são no contexto político.

2. Relevantes, no contexto da investigação, são os possíveis indí­cios que se retiram das escutas telefónicas - ainda assim, ilegitimamente divulgadas - quanto à tentativa de pressão dos intervenientes no processo, directamente ou por interpostas pessoas. E esses indí­cios, perdoem-me, parecem-me muito mais claros e preocupantes do que a dimensão escatológica da opinião do Ferro sobre o segredo de justiça, esta possivelmente passageira e sem outro significado além de um eventual suicídio polí­tico do lí­der do PS e dos seus acólitos.

3. As transcrições do teor das declarações que resultam das escutas telefónicas eram, desde Junho, do conhecimento da defesa do Paulo Pedroso. Que, aliás, as disponibilizou aos ilustres jurisconsultos que emitiram os pareceres que foram juntos ao processo. Já havia, então, muita gente fora do processo a conhecê-las para que se saiba agora quem as divulgou. Por isso o Júdice está tão apreensivo. Pudera, eu no lugar dele também estaria.

Só mais uma coisa: a opinião do Alonso é semelhante à dos "indecisos", no universo de inquiridos de uma sondagem. Para ele, o meus votos de rápidas e profícuas reflexões sobre o assunto, partindo do princí­pio de que a sua (do assunto) evolução não seja tão perturbadora como, para já, se adivinha.

Afinal eram quatro notas.

Vernaculidades escatológicas e escutas

Antes de mais, informo que não vou malhar no besugo. Ele discordou de mim quando eu escrevi que o PS se tinha amarrado ao processo da Casa Pia, e eu, discordei dele. Estamos esclarecidos, portanto.

Em todo o caso, devo dizer que esperava muita coisa (o que escrevi, basicamente), mas não esperava esta revelação das escutas (continuava optimista dentro do meu pessimismo).

Claro que nunca se saberá quem as "soprou" para a comunicação social. Os defensores da cabala política dirão que foi a maioria, ou esbirros a seu soldo. Por mim, acredito que não foi. E acredito que foi de dentro do poder judicial (muito poder e pouco judicial, na minha modesta opinião) que tal "sopro" veio.

Mas tudo isto são apenas conjecturas e, por isso, vou ao que interessa. O Ferro diz "merda" e usa o verbo "cagar" nas suas conversas telefónicas. Isto, quando não diz "gajos".

Eu quero dizer o seguinte: digo inúmeras vezes "merda" e "merdas", uso amiúde o verbo "cagar" e devem ser milhares as vezes que digo "gajos" por dia. Em conversas privadas, que no exercício profissional uso expressões diferentes: Substituo "merda", na frase "isto é uma merda" por "situação (ou objecto) inteiramente desadequada, ineficiente e injusta que deve ser reparada ou, se a reparação não fôr possível, revogada e substituída". Substituo "merdas", na frase ".... são uns merdas", por "incompetentes" ou outro epíteto do género. Substituo a expressão "estou-me a cagar" por "é para mim irrelevante". E substituo a palavra "gajos" por "indivíduos" ou "pessoas".

Assim, não vou atirar pedras ao Ferro pelas expressões que usou nas conversas particulares que teve (as que atiro têm que ver com a insensatez que lhe aponto nas declarações e atitudes públicas dele e do partido que chefia ... nas quais não foram usadas, que eu saiba, tais expressões).

Mais, desconfio bem que quem deu o teor das escutas à comunicação social deve dizer pior. No mínimo, quando tomou a decisão de fazer isto, deve ter dito aos seus correligionários, amigos, mulher (caso tenha) e afins "eu quero que o segredo de justiça se f***".

É claro que quem fez isto não foi escutado.

A propósito da prisão...

No post de baixo falei das penas de prisão. Só quero acrescentar que tenho sobre as penas de prisão e sobre a sua eficácia do ponto de vista da reintegração de deliquentes uma péssima impressão. A execução das penas, da forma como é praticada, ou melhor, da forma como a inércia a determina, é, hoje, obsoleta e sinistra. Um dia desses falo nisso.

Humildemente

Só um pequeno reparo, Lolita, que a um leigo tudo é permitido. Com toda a simplicidade, pode ser? Eu digo isto:

1 - As escutas telefónicas são um meio traiçoeiro e não leal de invadir a privacidade alheia. Posso ser escutado sem ser culpado de nada. Até mesmo sem ser arguido. Basta que me suspeitem ou que me queiram cuscar. E não me avisam antes.
2 - A liberdade é um direito fundamental da qual posso ser privado se infringir lei que o preveja. Eu sei a lei (ou é suposto que saiba) e sei ao que me sujeito. E é de crer, a menos que a justiça seja mesmo a "cagada" a que o outro senhor se referia, que só me será retirado esse direito fundamental se for culpado.

Desculpa lá, mas são abstracções um bocadinho diferentes.

Escutas justas

A justiça não passa de um princí­pio abstracto, uma mera aspiração, que se tenta, em cada decisão judicial, alcançar e que só encontra a sua verdadeira dimensão quando concretizada. Só tem, evidentemente, sentido falar em justiça quando aplicada uma dada disposição legal a uma situação concreta. Uma lei, por si só, não é justa ou injusta. Justa ou injusta será a sua imposição ou aplicação a um facto e as repercussões que provoca essa imposição ou aplicação na esfera jurí­dica de uma ou mais pessoas.

A possibilidade, legalmente prevista, num processo de natureza penal, do recurso às escutas telefónicas para o apuramento dos factos em investigação é uma mera abstracção. Uma mera previsão legal, potencialmente utilizável, dentro de determinados pressupostos, com vista à descoberta da verdade. Tudo abstracções, meros princípios. E a relatividade não se aplica a princí­pios, com bem nota o besugo.

Daí que proibir, indiscriminada e liminarmente, as escutas telefónicas - sabendo-se que a sua utilização pode ser justa e plenamente justificada na descoberta de indícios da prática de um crime - será tão absurdo como proibir, por exemplo, indiscriminada e liminarmente, as penas de prisão. Trata-se, em ambos os casos, de direitos fundamentais. Se o besugo se ressente com a abstracta violação da privacidade que representam as escutas telefónicas, não posso deixar de concluir que ele defende ainda mais efusivamente o abstracto direito à liberdade.

Uma carta à Lolita

Cara e querida Lolita:
Que recebas esta de saúde e que a bonomia te possua, sossegando por instantes a tua turbulenta índole.

Tu dizes que o PS não reconhece o desgaste, a incapacidade para manipular, desdobra-se em explicações, sublima contestações intestinas. Nem discuto. É discutível, mas leva lá a bicicleta. Por ser para ti, Lolita, uma bicicleta rosa, de senhora, para poderes andar de saia rodada.

Também afirmas que o PS teve azar, foi saloio e azelha, geriu mal o caso Pedroso. É a opinião que mais se ouve e lê, de facto. Mas eu sou teimoso. Uma opinião emitida por uma multidão (mesmo de gente bem vestida e cintilante) não me faz mais efeito nas meninges do que a mesma opinião sussurrada placidamente. Pode é enervar-me, assustar-me, fazer-me mal ao coração. "Caramba, tanta gente inteligente a dizer o mesmo, besugo!". Pois... mesmo assim. Mas podes levar, também, esta motocicleta, Lolita. É das de dar gás, podes conduzi-la em frente ao Molhe.

A seguir atiras este potente murro: "As escutas não podiam ter sido divulgadas, mas foram-no!" Ora bem, eu isto não discuto, até porque, como acabei de referir, não devia DE TODO haver escutas telefónicas. Fora esse princípio respeitado e nem sequer se colocaria o problema. Outra trotineta para ti, Lolita, daquelas da marina de Vilamoura. Não te distraias a olhar os iates.

Quanto ao restante da tua contundente prosa:
“...ninguém imagina um líder da oposição, com aspirações a formar futuramente governo e a chefiá-lo, num país europeu, democrático e ligeiramente desenvolvido (pelo menos de acordo com os critérios da UNESCO) que, um dia, chamou "merdas" aos juízes numa conversa privada que, sem que ele pudesse evitar, caiu nas bocas do povo que o elege(ria).”
Eu imagino. Não me parece que chamar merdas a um juiz, negligente ou imbecil a um médico, patife a um trolha, incompetente a um ministro, sevandija a um mancebo, pouco escrupuloso (ou mesmo tratante) a um jornalista, vigarista a um advogado, chusma de marrecos a um governo inteirinho, tudo isto EM PRIVADO, seja incompatível com altas funções de Estado. São desabafos. Que se ouvem todos os dias. Um presidente pode ser malcriado, basta ver o Alberto João. Se o problema dele fosse só a má-criação estava Portugal sossegado. Assim, só vendendo aquilo, como já sobejamente demonstrei ser vantajoso.
Tudo bem, mas tu vais mais longe! Tu afirmas que o principal problema nem é esse! É ter caído nas bocas do povo! Deixou de ser privado, logo existe! Ai, Lolita, Lolita. Tu nem te incomodas a discutir “como é que caiu nas bocas do povo”, fazes a apologia do “caiu, deixa cair...”. Olha, vai a Entre-os-Rios com esse discurso e logo vês.
Tu acabas de recriar um aforismo. Complexo. E divertido. “Quem cai nas bocas do povo nunca poderá chefiar governo de país europeu, democrático e ligeiramente desenvolvido... porque o país é isso mesmo: apenas ligeiramente desenvolvido, até porque acredita que quem cai nas bocas do povo nada vale.” Longo aforismo, menina azougada.
E aí pelo Uruguai? Manda notícias.

Esguichos de besugo (2)

Se eu mandasse:

1 – Proibia, imediatamente, qualquer escuta telefónica. Não havia. Pura e simplesmente. Sem excepções. As excepções são fontes de excepçõezinhas, que são o melhor caldo de cultura para uma sepsis fatal a qualquer princípio. Podia-se escutar atrás das portas, por exemplo, e espiolhar a vida dos outros de binóculos e assim, para sossegar espíritos mais dados à cusquice. Mas também se podia ir às ventas aos tarados, se fossem encontrados a cuscar. Punição aplicada pelo ofendido, preferencialmente à chapada. Mas também podia ser com um taco de baseball.
2 – Quem se atrevesse a utilizar o argumento “mas as escutas são muito importantes porque assim se apanham mais facilmente os criminosos, que são os agentes do mal sobre a Terra, emissários do demo e inimigos da paz e da harmonia...” seria deportado para outro país, à escolha, mas que fosse longe e que permitisse abundantes escutas ao deportado. Porque apanhar criminosos não deve ser fácil à custa da privacidade de ninguém. É um princípio absoluto. A relatividade não se aplica a princípios. Ou não deve.
3 – Se algum energúmeno se atravessasse a dizer que “dizes isso, besugo, mas se fosse para apanhar o teu criminoso, o que te fizesse mal, ou a um filho teu, tu mudavas esse discurso!” seria imediatamente empalado por ausência de senso comum. Evidentemente que eu tenho todo o direito, uma vez individualmente lesado, de ter um ataque de primarismo e desatar a exigir escutas, barafustar, querer rapidez, esquartejamentos e essas coisas, mas sobretudo escutas! Muitas escutas! Escutar Portugal inteiro!
Nessa altura, poderiam acenar-me com o texto acima e dizer-me: “besugo, não são permitidas, OK?”. É que eu sei muito bem o que estou a dizer. Um revoltado não se constitui excepção de nenhum princípio. Isso mesmo: ninguém disse que manter um princípio não pode ser revoltante, fazer sofrer as pessoas, angustiá-las. Pode, claro. Há, até, quem tenha morrido por princípios, segundo consta.

Pronto. Para já era isto.
A resposta à Lolita segue depois de me servir dum Cutty Sark.

X-files

Por que razão nunca se soube antes que o PR, por inerência das funções, tem o direito a aceder a informação "necessária e legítima"? O que é informação necessária e legítima? Com que fins ele acede a essa informação e quem estabelece o critério da informação necessária e legítima a que acede o PR? Se essa informação não é usada com "fins menos legítimos", então é usada para quê? Quantos PR até hoje acederam a informação "necessária e legítima", podendo eles, na posse da mesma, ter evitado que o processo da Casa Pia só agora esteja a ser investigado? The truth is out there.

21.10.03

Dignidade

Tudo isto é patético: que o PS não reconheça o desgaste que provocou a si próprio desde o início do caso Paulo Pedroso. Que não reconheça a sua incapacidade para manipular o que quer que seja, até, e sobretudo, a opinião pública. Que se desdobre em explicações bacocas e pretensamente dignas. Que sublime a contestação velada no seu seio, dos históricos ávidos de poder à espera do melhor momento para "salvar" o partido do esmagamento. Teve azar, desmérito, azelhice, saloice, seja o que for, a gerir toda a novela pedrosiana. E as escutas não podiam ser divulgadas, mas foram-no. Mas aceite o PS este facto incontestável e irreversível e extraia disso a única conclusão possível: ninguém imagina um líder da oposição, com aspirações a formar futuramente governo e a chefiá-lo, num país europeu, democrático e ligeiramente desenvolvido (pelo menos de acordo com os critérios da UNESCO) que, um dia, chamou "merdas" aos juí­zes numa conversa privada que, sem que ele pudesse evitar, caiu nas bocas do povo que o elege(ria).

20.10.03

Mancebos

Comemorações do Dia da Defesa Nacional antecipadas pela polémica.
Em todo o país, foram convocados três mil jovens para o Dia da Defesa Nacional que decorrerá em Lisboa e Lamego. Os jovens de 18 anos são na próxima segunda-feira obrigados a comparecer pela primeira vez às comemorações do dia, em que o Governo quer "divulgar o papel das Forças Armadas", a um ano do fim do Serviço Militar Obrigatório. Paulo Portas, criticado pela oposição, estará ausente do início das comemorações.”


Não me surpreende. Estou mesmo a vê-lo, naquele seu jeitinho sempre varonil e altaneiro, sob pelagem cada vez mais rala, a congeminar a ideia: “Vinde a mim, mancebos! Em boa ordem, filhos da Nação! E se não vierdes, coimo-vos!”.
Os primeiros cem mancebos lá foram, que não se imagina ninguém a desejar ser coimado pelo ministro da defesa...
Houve um jovem, contudo, que se derramou em louvaminhas à iniciativa. Pertencia, contudo, à juventude popular, o que empobrece a minha ideia inicial de poder tratar-se dum imbecil qualquer. Qualquer, já não é. De facto.
Cresce em mim, por outro lado, a impressão de o exultante jovem poder ser uma sevandija.
Engano-me, seguramente, era o que faltava.

Engano seu

Nunca fui ex-nada. Nem sou de disfarces adicionais ao meu. Mas não me fale em pão, que me lembro de paz (ó Barroso! Logo paz, hem, pequeno Blairzito!?), povo e liberdade (ó grande Tanas, estás aí?) e de um hino hipócrita que me cheira ao mofo da pequena História... Um hino dos pequenos medos dos grandes cobardes, em tom maior. Há-de ouvir-se sempre com agrado, é como aquelas canções de Natal que nos fazem esquecer o Pentecostes.

Pão e leite

Claro que tu não tens deficit, ó besugo. E mesmo que estivesses abaixo do limiar da pobreza e fosses beneficiário do programa de luta contra a fome do Lula, tu nunca o reconhecerias perante a Ferreira Leite. Até porque tens abundante pão em casa, como o têm todos os democratas ex-maoístas e todos os maoístas disfarçados de democratas. E pensa bem antes de responder, não vá eu pensar que te revês numa das duas alternativas...

Mortadela

Não há qualquer défice em Portugal. Eu, pelo menos, não tenho nenhum. Se a SA decidir que há um, que o controle. Ah! Vai ser à minha custa? Aceito. Mais, mereço!
Este exercício de controle do incontrolável há-de revelar-se fatídico para a SA. E a SA sabe, eu também. E tu, Lolita, também sabes que o problema de qualquer silogismo é a qualidade da primeira permissa. E quem a escolheu, à primeira permissa, foi o putedo. Franciscano, isto.
Aliás, se o Vinicius fosse vivo, faria ontem 90 anos. Não os fez apenas por esse pequeno pormenor que a morte introduz na vida das pessoas. Demitiu-se. O Vinicius não passa dum Martins da Cruz com motivos mais fortes? Tem paciência.

Aliás...

Explodo a rir sempre que imagino o Ferro Rodrigues a dizer ao telefone que çe eçtá cagando pó çeggedo de juçtissa.

Sanduíche

Como calculas, não me preocupam os destinos da SA à direita. Mas a SA à direita, inoperante, amorfa e inconsequente (pese embora o ratinho frenético a tiracolo) só tem a ganhar em manter o bico calado. De um lado, o socialismo falido; do outro, a Nova Democracia, incólume de crimes pedófilos. A SA, parasitária, vai tornar a ganhar as eleições e o deficit há-de ser controlado.

E se isto fosse um fórum?

Vinha aí, de certeza, alguém dizer-me que "rato" se escreve com letra maiúscula. Ora eu não nasci para esse futuro, mais depressa me vendo a retalho. Coligações soa-me a putedo.

O teu erro

O PS não é uma empresa. A coligação do rato e do elefante (o PSD é o elefante, OK) é que parece. Não chega a ser uma AD, mas é uma SA. Somos Amigos. Acresce que, em certo sentido, isto é uma conversa entre assalariados. Não preferes falar do Douro, e da barra, e assim?

O futuro do PS

Se o PS fosse uma empresa, o Ministério Público já teria requerido a falência, o Ferro, o Costa e o Pedroso seriam responsabilizados por gestão danosa e o Paulo Portas seria o liquidatário judicial. Não haveria, contudo, bens na massa falida, mesmo que procurassem exaustivamente no fundo da gaveta.

Ligeira alteração

A Lolita pode, até, ter uma apoplexia por causa do que eu vou dizer. Mas hoje, de facto, não acrescento nada ao que ela já escreveu.
Enfim, talvez na última frase.
"... e que, se calhar, os reconstrói aos nossos olhos".



19.10.03

A outra face

"Aprendi imenso com o embaixador Jorge Ritto sobre arte e discuti muito com ele sobre literatura; falei muito com o Carlos Cruz sobre a sua história de vida na televisão e sobre os media; dava todos os dias a página de xadrez que sobrava de um jornal (que não o vosso) ao Hugo Marçal, que é um inveterado jogador, para ele estudar a partida durante a noite; o Ferreira Diniz transformou-se rapidamente numa espécie de médico informal de todo aquele pavilhão." Este é um excerto da entrevista de Paulo Pedroso à Pública de hoje. Não sinto simpatia nem antipatia por nenhum destes homens, incluindo pelo entrevistado. Nem é importante, para o caso, acreditar na inocência ou culpa de cada um deles. São só cinco homens a quem foi retirada a liberdade e a quem se descobrem sonhos e virtudes, tornados mais visíveis num ambiente que os constrange e que, se calhar, os reconstrói.

A barra, outra vez

Água cor de prata, como em Porto Covo. O mar, dominante. O céu, enorme. Desta vez, com os acordes de uma guitarra a entranharem-se no pensamento. Tudo tão perfeito e tão deliciosamente silencioso. Deixei-me ali, a aquecer ao sol e a sorrir sem me dar conta disso.

Sossegar o verão

Cheguei a casa há bocadito, cansado do corpo, mas de vistas lavadas. Nas encostas, os calços começam a derramar-se de vermelhos, amarelos e ocres, por cima do verde que ainda respira. O Douro e o céu, cinzentos enevoados, são linda moldura. A pintura não entristece, acalma os sentidos. Chove fino, devagar, certinho. E não está frio. Bonito outono, que tornou a cumprir-se na antiga missão de sossegar o verão.

Ainda o Eurico, mais a Judite

Não o presbítero do grandioso Alexandre, mas o desembargador que hoje foi entrevistado pela Judite. A de Sousa. Reparei num pormenor curioso da entrevista que demonstra claramente como um entrevistado algo insensato (ou não, caso os recados sejam intencionais) pode ser encurralado por um entrevistador atento. Sucede que o entrevistado era algo insensato, mas a entrevistadora não estava atenta. É que a dada altura, o Eurico disse, embora subliminar e sibilinamente, estranhar que, a julgar pela Catalina Pestana, haja testemunhas com vontade de desistir de depor devido às recentes decisões judiciais de libertação de alguns arguidos. Falou da sua experiência como juiz em processos de natureza penal, referindo que as vítimas de crimes violentos nos processos em que participou mostravam sempre vontade de se confrontar com os agressores. O que ele queria dar a entender com isto era muito mais, julgo eu, do que aquilo que foi a deixa seguinte da Judite, que se limitou a perguntar-lhe uma coisa semelhante a isto: "defende então que as testemunhas devem ser ouvidas presencialmente perante os arguidos?"

Ou estava distraída ou lhe calaram a voz, como o pinto do Sérgio.

Contentinhos

... devem andar o Pimenta Machado, a Fátima Felgueiras, o Vale e Azevedo, o Isaltino de Morais e mesmo o grupinho da Moderna. Jornalisticamente falando, deixaram de existir. Tudo graças ao malfadado (sic, juiz desembargador Eurico Reis, por duas vezes, hoje, na RTP1) processo da Casa Pia.

Barbaridade

A escolha do Filme Falado, do Manoel de Oliveira, para a candidatura portuguesa ao óscar do melhor filme estrangeiro deve-se, entre outras personalidades, à Bárbara Guimarães, essa prestigiada referência da cultura nacional, com vasta e marcante obra produzida e incontestável opinion leader da crítica literária, cinematográfica e artística. Pois foi, ela fez parte do júri. Temos garantias do seu notório bom gosto, a julgar pelas gravatas do Carrilho quando aparece à terça-feira no noticiário da SIC. Se eu fosse o Manoel, fazia como o Saramago e ia morar para a Ilha de Wight.

Como?

Escritor inspirado, homem esclarecido, blogueiro torrencial. Que pena que me dá, por isso, aperceber-me de que ele tem como certa a ideia da sectarização da inteligência. Fico a aguardar, com muita curiosidade, que ele fale um dia desses da inteligência dos homens e do que é que ele acha que ela merece.

17.10.03

Bem, bem...

Este senhor de barbas provocadoras (não, não é o que está na Turquia) veio para aí propalar que perguntar a uma dinamarquesa se quer comer um besugo é impróprio.
Colocou-se em perigosa encruzilhada, o temerário.
Dependendo da dinamarquesa, das duas uma: ou vai ter problemas comigo, ou lhe agradecerei, reconhecidamente, o zelo. Que Deus o proteja e alumie nesta hora difícil...

O exame de acesso à especialidade

Lembrei-me do meu, ao ler isto aqui, por interposta pessoa.
Decorreu na sala dos 70 metros, na Faculdade de Economia do Porto. Na véspera tinha estado de urgência, no São João, até à meia-noite. Na pequena-cirurgia, o que significava coser couros cabeludos até vomitar no porta-agulhas.
Excelente internato geral. A arte do desenrascanço, do raciocínio e da atitude sob pressão aprendem-se aí, que o diga a Margarida, é questão de lhe perguntar. Quantas vezes não foi, já, abandonada "às feras"? Não se queixe, não lhe fez senão bem, verá...
Hoje em dia é, talvez, um pouco diferente. Julgo que os internos gerais nem receitas podem passar. É um atestado de menoridade. O exemplo dos colegas espanhóis que para cá vêm medicar, logo após o curso, é o complemento ilustrativo do paradoxo que aponto e condeno. Alguns nunca "viram um doente"!

Os dois anos de internato geral eram (e espero que ainda sejam) a iniciação esforçada dos que queriam mudar o mundo. Onde se tarimbavam os olhos, as mãos, os sentidos.

A alusão ao Harrison (um tratado de Medicina Interna, como o Cecil ou o Stein) faz sempre recuar no tempo qualquer médico que se reconheça nas origens.
Eu espero que a Margarida, em momento de inspiração, escolha Medicina Interna. São 5 anos de esforço que lhe vão abrir o mundo... e fazer doer o corpo todo. E pode sempre jogar no totoloto para tentar enriquecer enquanto se gasta.

16.10.03

O meu amigo e o Papa

O Alonso trouxe aqui a questão da velhice. Eu acho que o percebi, porque o Alonso trouxe-nos aqui, no fundo: se vivermos o suficiente, envelheceremos o suficiente para sermos absoluta e categoricamente velhos.
Aquilo dos enterros é verdade. É normal assobiar para o lado durante a morte dos outros porque, enquanto a morte vai e vem, folgam as vidas. Mas é adiar a consciência do inevitável. A morte é uma coisa séria, definitiva. Salvo melhor opinião. E o avançar da idade aproxima-nos dela. Eu sei que isto é banal, “para que falas besugo?”. Mas não devia ser.
Irreversivelmente próximos da morte estão o Papa e o velho amigo de que vos falei ali abaixo. Entre outras diferenças, o meu velho amigo não atingiu o nirvana de estar a morrer proporcionando debates como o que Judite de Sousa, personificando nas madeixas pintadas e no gesto irreverente o desrespeito que a nossa relação com os velhos sempre acalenta (e, se bem li o Alonso, ele concorda comigo), estava a ter com o D. José Policarpo. Um debate elegante sobre as implicações da morte do Papa, que vai morrer mas ainda está vivo.
A morte do meu velho amigo eu não a debato. Muito menos com ele vivo. Choro-a, como me compete, antecipando-a e doendo-me. A dissecção duma vida como se já fosse póstuma, com trejeitos de inteligência mundana para horário nobre, é quase pornográfica.
É o que andam a fazer ao Papa. Se o meu velho amigo que está a morrer fosse importante, mediático e substituível, faziam-lhe o mesmo. Autopsiavam-no em vida, num écran qualquer.

Pó de estrelas

A ideia da mortalidade está intimamente ligada à ideia da mudança. O grau de intensidade com que se agarra a vida depende da maior ou menor consciência de que tudo é efémero, instantâneo. E também da consciência da finitude. Percebe-se a grandiosidade de tudo isto quando se sai da própria individualidade e se apreende a óbvia e bela constatação de que somos pequenas partes de um todo orgânico que, ao mesmo tempo que nos transcende, é a nossa própria essência. É uma espécie de colectivismo cósmico, reconfortante nos dias negros e perturbador nos momentos de excesso de auto-estima. No fundo, todos nascemos já nacionalizados pelo universo!

Eu costumo ser muito mais existencialista do que isto, mas todos temos momentos de descrença nas teorias individualistas da auto-determinação. Mas lá que o inferno são às vezes os outros, isso ninguém me tira. Os outros hão-de, naturalmente, achar o mesmo de mim...

O Velho

Pediu aos católicos de todo o mundo que rezem para que ele seja capaz de levar a sua missão até ao fim.

Ouvi isto depois de ler o blog do besugo, e tudo junto deu-me que pensar. Tantas e tão desencontradas coisas que não consigo escrever nada de coerente.

A velhice é algo que todos sabemos que há-de chegar, salvo se a nossa esperança é morrer depressa e sem achaques de espécie nenhuma.

A velhice, a decrepitude lenta e silenciosa do corpo, são o mais visível sinal da morte numa sociedade e numa cultura que postergam essa realidade para um armário (ou jazigo) que só se abre para meter mais um.

Mas que missão terá o velho Papa? Está gagá, concerteza! Que pode um velho fazer, para além de mostrar que é velho? Um velho é, por definição, um tipo que já não trabalha (porque é velho), que mesmo que trabalhasse trabalhava mal (porque é velho). Enfim, um empecilho, a quem se dirigem palavras caridosas (ai que bom que está, e tão lúcido. Parabéns, avô!) apenas para nos reconfortarmos a nós próprios.

E depois, quando vamos ao inevitável funeral (reencontramos sempre pessoas que não vemos há muito), o ritual é este:

1 - Ir ter com a viúva, os filhos e os mais próximos e manifestar pesar, com palavras de circunstância apropriadas.

2 - despachada a incumbência, recolhermo-nos uns instantes com ar compungido/contemplativo (mais tempo se formos próximos, breves segundos se nem por isso)

3 - Verificar rapidamente quem está, e anotar quem falta.

4 - Sair da igreja, sala mortuária, a pretexto de um cigarro, de um telefonema, ou porque alguém (caridosamente) faz sinal que quer falar connosco

5 - Passar o resto do tempo cá fora na conversa com amigos e conhecidos, mais ou menos formal consoante vai passando ou não algum dos muito próximos.

6 - De vez em quando soltar umas palavritas de circunstância reveladoras de que sabemos que alguém morreu ("A vida é assim". "Ninguém cá fica". "Ainda bem que não sofreu". "Deixa saudades", etc)

7 - Acompanhar o funeral (depende da proximidade com a família do/a falecido/a)

8 - Despachado/arquivado/arrumado o defunto, sacar a gravata preta e ir à vidinha que se faz tarde.


E não mais pensar no assunto. E continuar a encarar a velhice como alguma coisa de estranho, de desadequado e de incómodo com o qual não queremos viver. Sobretudo, não pensar na inevitabilidade da nossa velhice (salvo momentos depressivos em que também pensamos na juventude que se vai, devagarinho, desprendendo de nós).

Pois é. Que missão pode ter um velho? Chega a ser ridículo ouvi-lo dizer que a tem. Velho, e para mais chalado e presunçoso, pensaremos nós.

Talvez seja isto (mesmo que ele não o saiba o que, na minha superior condescendência de pessoa com menos de 70 anos admito com comiseração). Mostrar a velhice ao mundo. Para que o mundo a veja, a sinta, se incomode com ela, e ainda que o mundo diga mal dele e da Igreja dele por ter um velho como Papa.

Um lugar ao sol

São, ao que parece, unânimes as críticas ao Governo a propósito da decisão de eliminação da publicidade ao Euro 2004 na revista Time, numa atitude revanchista, no mínimo, primária. Eu também concordo; como é possível não concordar.

Se, contudo, se quiser ver as coisas por um prisma diferente, é um facto - inquietante - que são comportamentos semelhantes a este que sustentam outras democracias, como algumas, até, europeias, estas suaves e civilizadas, ou terceiro-mundistas, mais musculadas por força das circunstâncias. Atitudes que, ainda que prepotentes, possidónias ou gratuitas, são marcantes, carismáticas. Ou seja: de um ponto de vista estritamente politico-mediático, muito visíveis e polémicas. Vide o caso do Berlusconi. O Durão Barroso lá terá de se esforçar mais e de berrar mais alto, até porque não passa de um PM de periferia. Mas procuremos ver o lado positivo naquilo que Durão Barroso e o governo PSD tem de mau, à falta de algo de relevantemente bom. E que falem de nós, ainda que seja para dizer mal. Cimeira das Lages, (des)honras de ministros, contenção orçamental, desgoverno na saúde, educação sem rumo.... e, agora, a vingança, dirigida à Time. Para isso, conta, aliás, com o Paulo Portas mais os seus mancebos amestrados e mais quem este consiga amestrar pelo caminho, incluindo o próprio PM.

E assim se condenam inocentes

Caro homem-a-dias: nem sempre o que parece é. Leia com mais atenção. E bons cigarros, para si e para mim.

15.10.03

Decidir de nós

Já vai nos setenta, como o meu pai, e é meu amigo, pormenor importante que me dispensa de rigores científicos. E está a morrer. A diabetes, essa assassina lenta e silenciosa, proporcionou-lhe, agora, uma perna gangrenada. Já lhe vai no joelho, a morte, numa subida ritmada que os antibióticos não controlam.
O último ano, costuma ele dizer, não passou; passou-o ele. Quase cego, com dores dispersas, ameaçado de diálise. Impedido de todos os prazeres. A dieta, os remédios, a quase total dependência dos amigos para qualquer deslocação. A conversa no café transformada em ritual de trasladação, “quem me leva, quem me vai buscar?”. Cada vez mais amargo, mais sarcástico, mais achincalhado naquela impotência enrodilhada da doença que se entranha.

Agora a gangrena. Com ela, a paragem dos rins, o potássio a alarmar-nos a todos. A diabetes à solta, praga desvairada em campo de cultivo desleixado.
O internamento, o sofrimento e a fraqueza não lhe retiraram lucidez. Desde sempre agnóstico, órfão de republicanos convictos e perseguidos, comunista desde que se lembra ( e tramado por isso, em tempos antigos), enxotou o capelão mal o pressentiu. Mau sinal. E coitado do padre, tão triste.
Disseram-lhe o que havia a fazer: diálise (as sessões necessárias para lhe equilibrar o meio interno), seguida de amputação, o mais rapidamente possível. Que não, que não queria, que o deixassem em paz. A morte, encarada como o fim de tudo, impressiona mais quando o fim está mesmo ali, do que quando se discute, no café.

Quando lá cheguei estava a preparar-se para assinar o termo de recusa de qualquer tratamento, apelidando de “raça maldita” tudo o que mexia. Os meus colegas, desesperados, procuravam mostrar-lhe a morte inevitável, a breve prazo, numa tentativa vã de o dissuadir. Coitados de nós. Falhamos tanto, quando não conhecemos. Eles não o conheciam. Agitar-lhe o fantasma da morte era acenar-lhe com a paz.
Eu, que o conheço do tempo dos meus primeiros calções, percebi que o seu único receio era perder a autoridade que, enquanto lúcido, sabia que tinha sobre o seu destino. O medo de perder as rédeas, algures no percurso que lhe falta, caso a lucidez lhe escape. Falei com ele e ele comigo, porque somos amigos.

Fez hoje a diálise e tudo se prepara para a amputação. Prometi-lhe, apenas, e ficou lavrado em papel, uma coisa singela que o sossegou: não será submetido, em qualquer circunstância, a manobras de reanimação, nem às medidas invasivas que chamamos de “suporte avançado”. Não as quer.
Afinal era fácil. Queria decidir de si, enquanto podia. E nós estávamos a perceber tudo mal. Ele não quer morrer, pelo contrário. Mas, se tiver de ser, quer respeito. Há-de tê-lo.

Para já, está vivo e ficou a dormitar. Disseram-me que se cansou, na diálise, o que me fez sorrir. É que, engenhocas desde sempre, passou a sessão a perguntar às enfermeiras o funcionamento “daquela geringonça do inferno”.

14.10.03

Aprendamos!

Após um dia obstipante (na medida em que até o próprio encéfalo se sente entupido com algumas diatribes da nossa vida de relação) decidi purgar-me e contemplei, embevecido, pequena parte do noticiário da TVI. O discurso de Barroso, enjoativo como sempre, não me motivou a peristalse. Mas, logo a seguir...
Aprendi duas coisas, que não sabia e me serão úteis de futuro. Sejamos normativos, vai em forma de “1 e 2”.

1 – A Madeira, essa adorável pérola do Atlântico, esse jardim hilariante e dispendioso (por mim, podia vender-se, desde que a venda incluisse, obrigatoriamente, como contra-peso, o regedor), detém um serviço de protecção civil engenhoso e, como não podia deixar de ser, carregadinho de lógica empresarial. O chamado “serviço de protecção civil que cobra serviços, dependendo dos resultados”.

A coisa conta-se rapidamente. Dois montanhistas foram dar um giro, lá pelos montes. Contava-se que regressassem mais cedo, mas terão tido qualquer percalço que os reteve, tendo passado a noite fora. Lá naqueles montes, como noutros, não havia a chamada “rede”, que é uma malha fina e invisível que permite aos telemóveis funcionar a preceito. De modo que os ausentes não terão avisado ninguém e as famílias ficaram aflitas, apelando à protecção civil. A protecção civil, uma vez apelada, mobilizou meios e recursos e saiu à procura dos montanhistas. Que, entretanto, com a luz do dia, conseguiram regressar, sãos e salvos. “Que bom”, pensar-se-ia. “Olha, estão bem! Antes assim!”.
Nada disso. O madeirense de bigode que manda naquela parte do jardim que se chama “protecção civil –SA", numa lógica que há-de, certamente, ter adicional explicação iluminadora do breu intelectual que eu daqui vislumbro (“é estúpido, o gajo, venda-se também!”, confesso que foi o que pensei...), afirmou, pedagógico, perante as câmaras: “Não senhor, isto não é assim à balda! Vão pagar as “despeseinhas” porque foram mobilizados muitos meios para os salvar e eles estão vivos e, ainda por cima, bem! Ora “semeilhas”! Andamos a “brincuar”?”.

Ou seja, Protecção Civil do País inteiro, se me escutas, tu aprende! Tu estipula tarifas, regulamenta, olha a despesa! Olha o défice! Olha o exemplo que te vem de cima! Sim, que a Madeira é um jardim... suspenso (eu vendia-o, não sei se já vos disse... já disse, pois)!

Tu faz assim uma coisa deste género:
Artigo Primeiro e Único: Não sendo a protecção civil isenta de custos, que isto não é à borliú, determina-se o seguinte, que já amanhã vai para despacho: quem se atrever a não estar morto, mutilado, visivelmente escoriado, em choque emocional ou outra espécie de desgraceira, aquando de busca efectuada pela protecção civil, agravando ainda esta falta de respeito com a circunstância grave de, pelos seus próprios meios, regressar ao convívio dos seus, deverá pagar a totalidade das despesas tidas com a tentativa de resgate.”

E que o exemplo frutifique. Ou então venda-se aquilo, pelo amor de Deus, com “eles” lá dentro! Eu preferia...

2 – A questão das prostitutas e alternadeiras de Bragança, que teve honras de tratamento VIP na Time e nas nossas televisões, preocupou-me. Caramba, cheguei até a pensar numa concentração de meninas, ali em cima na raia! Uma espécie de concentração de motards (mas estes lavam-se menos, é inesquecível estar a uma distância de até dez metros dum motard, destes que se concentram, quando ele descalça as botas!), mas com o slogan “Bragança é que as tem, alternar é bem!”.
A TVI elucidou-me logo. Afinal, também há putas em Lisboa. E entrevistou duas. Brasileiras. Caramba! Excelente serviço.
Fiquei mais descansado.

A propósito do Pérez-Reverte...

... de que fala o Francisco, li há uns tempos El Capitán Alatriste, um romance escrito pelo Arturo e pela filha Carlota. Foi-me emprestado por um bom amigo galego na versão castelhana original, obrigando-me, no início, a uma leitura em sobre-esforço das aventuras e desventuras do Capitán em Madrid, no sec. XVII. É um livro viciante, muito agradável.

É isso!

Uma das razões que faz com que qualquer dos lí­deres partidários portugueses seja tão patético é a de que, por mais que se procure, seja no rosto, nos olhos ou na expressão, nenhum deles tem uma pontinha sequer de sensualidade. Bastaria um olhar inteligente, meu Deus. O que será deles?

Ala Arriba

Hoje estou deprimido, como já confessei. Mas gostei de ler o Peter Pan. "Casa Pia - a politização" e "Ana Gomes e os perguntadores".

De facto, não devia desiludir-me tanto com prestações que não encomendei nem recomendaria. Nem poderia, estou só aqui, voz pequenina. Mas não se pode ir assim desarmado a ambientes hostis, como Ana Gomes foi.
Deu-me a mão, sem saber que ma estava a dar, o Peter Pan.
Ainda não sei voar mas já tenho menos medo do Capitão Gancho.

13.10.03

Em cinco linhas não consigo. E é velha.

Pôncio Patacas (PP) queria namorar moça virtuosa. Testou várias candidatas, com questão crucial: "Como se chama isto que aqui tenho?". Todas diziam aleivosias, terminadas em "iça" (como na marinharia) ou "alho" (como na culinária). Todas PP rejeitou. Um dia, Sónia respondeu-lhe "pénis". PP levou-a ao altar num ápice. Reparem que ápice não é aleivosia. E tiveram noites de delíquio. À quinta noite, PP sentiu-se vagamente libertino e repetiu a pergunta fatídica. "Que tenho eu aqui?". Sónia repetiu-se, virtuosa e científica. PP, que estava num estado de profunda inquietude e instalara a TV Cabo, insistiu com Sónia "que agora já podia dizer a palavra que, ele bem sabia, lhe apetecia. E que só por ser virtuosa evitava". "Mas que palavra?", intrigou-se Sónia.

Aqui faço uma pausa, para decidir que vou utilizar a palavra pacheco. É um apelido, fica sempre bem, um apelido para designar um falo. É melhor que zezinho, ora. E já Miguel Esteves Cardoso disse isto, um dia. Podia ser sousa, pronto, mas fica assim.

"Que palavra, Sónia? Pacheco! Isto é um pacheco!"
"Desculpa, isso é um pénis, pacheco possui o primo Miguel, que até tem veias no lombo!".



Eu, hoje, definitivamente, desgracei-me. E a culpa é da mulher! Tinha alguma coisa que lá ir? Tinha?

A sério

Besugo: conta a história do primo Miguel, sim? Cinco linhas, no máximo.

Profundo amuo

Eu hoje não comento absolutamente nada, seja lá o que for, que o Paco escreva. Estou deprimido.
Bolas para a mulher. Que enxurrada sem tino! Sim, vocês sabem do que eu estou a falar! Foi na TVI, pois foi.
Provocado, tendo a falar do Sporting, aviso já.

Lolita, eu explico-te, sim?

Claro que não é a sério, Lolita. Lá terei eu de te explicar tudo, como de costume. Abre lá o blogue e vai lendo. Assim ao calhas.

1 – Perdoar pela salvação: um texto que faz o elogio do Abrupto, obviamente necessitado de mais esta palmadinha nas costas, a ver se alguém lê o degraçado. É a brincar, Lolita, acredita!
2 – Que grande desilusão: aqui a autora parece insinuar que a bomba inteligente tem responsabilidades na edição do livro do pipi, e que isso a entristece. Depreendo que não gosta do pipi, pronto. E que gostava, até aqui, da bomba inteligente. E que agora já não, ou gosta menos. Também depreendo que a autora acha os marretas uns palermas e a rata maluka uma ordinária, o que é, para ela, uma desgraça. É a brincar, então! Não se vê?
3 – Esclarecimento: nesta pequena posta, a autora demarca-se totalmente de qualquer laço familiar com a rata maluka, o que é surpreendente, uma vez que a considera uma desgraça. Outra reinação, Lolita, como vês. Toda a gente sabe que uma desgraça nunca vem só.
4 – A ovelha negra: num crescendo interessante (até porque esta posta é anterior, no tempo, às outras) a autora desanca a rata maluka de badalhoca (por interposto(a) pipi) e declara preferir a palavra pénis a qualquer outra para designar o órgão sexual masculino.
Isto só a brincar! Eu no fim conto a do primo Miguel, queres?
5 – O primeiro post: aqui, a autora derrama-se em sugestões para mudar nomes de blogues que, manifestamente, a incomodam. Vou fazer ctrl-c / ctrl-v, agora:

“E deixo algumas ideias que podem seguir sem sequer me agradecerem:
O Meu Pipi – As minhas estórias
O mundo da Rata Maluka – O mundo de uma menina maluca
Trombadinhas – Palmadinhas
Blog da merda – Blog sem jeito
A cagada – A defecção
O degredo – O segredo”


Eu já nem falo na analogia das “estórias do pipi”, nem na possibilidade de uma rata não ser menina. Gostei foi de perceber que trombadinhas, afinal, não é o diminutivo do que eu pensava. E, finalmente, que uma cagada pode ter um vago ar de “cozedura”... defecção-cocção... Eu até vou passar a ir à sanita com mais respeito pelo “acto matinal após café”!
Como vês, Lolita, e eu tenho de te explicar sempre tudo, é a brincar. E brincar é salutar, caramba!

Queres agora que te relembre a do primo Miguel? A brincar, e tal...

Canta, Baía

O filho mais velho do Felipão é portista.

Chiu...!

OK, a pedido de várias famílias, não vou sequer comentar as declarações da Drª. Ana Gomes nos noticiários da noite.
E, por favor, não me chamem caridoso!

Dr. Jekyll e Mr. Hide

Qual deles teria escrito estas linhas?

“A Europa não tem capacidade de integrar imigrantes como o melting pot americano. A política e os media não têm capacidade de enunciação desta questão porque o discurso politicamente correcto faz com que falar deste problemas seja entendido como xenofobia.
Hoje, estes homens e estas mulheres, empurrados pela mesma miséria, chegam com a identidade de uma cultura contra a qual a Europa combateu quase 1400 anos, e vice-versa. Pensam que isso não é importante e que o bom-avontadismo multicultural chega? Não chega.
Agora estes árabes que não querem ser franceses, nem belgas, chegam a uma Europa que não tem uma forte mobilidade social como os EUA – efeitos perversos do “modelo social europeu” – e estão condenados a permanecer num limbo entre dois mundos. É uma receita para o desastre.” In "Público" 6/6/2002

Por acaso não foi o Paulo Portas. Mas podia ter sido. E não deixaria de ter a razão ao escrevê-lo.

Por acaso foi o José Pacheco Pereira e não tem menos razão por tê-lo escrito.

A forma e o conteúdo das opiniões dos dois senhores sobre o assunto poderão ser relevantes mas, no essencial, são de tal maneira coincidentes que nem sequer vou meter-me na guerra que os tem posto em campos tão opostos apesar da semelhança das ideias.

Ou como, a um ano e picos de distância e com um pouquinho de ódio pessoal e intransmissível (já pareço a TSF...), temos os dois PP's a formarem uma AD a respeito da imigração.

Será que o PP (Pacheco Pereira) ainda volta atrás em relação às listas conjuntas para as eleições europeias?

Só o tempo dirá...


Na Paz de Deus

Mas isto é a sério ou é só um sucedâneo do malogrado Director de Sistemas?

O detestável fundamentalista

Sou fumadora. Eu sei, eu própria tenho a sensação de que ultimamente só escrevo sobre as "luzes" que, nos últimos dias, tenho visto e que me fizeram pensar - pensar mesmo - sobre uma série de hábitos, rotinas e ví­cios. Neste momento, estou possuída da verdade irrefutável de que fumar faz mal. Fumar faz muito mal. Isto é óbvio, porém eu estou mais consciente disso agora do que dantes.

O passo seguinte das minhas reflexões levou-me a averiguar qual o meu comportamento moral sobre o acto de fumar. Como todos os fumadores viciados, odeio fundamentalismos anti-tabágicos. E esse ódio é feito, confessemos, da culpa de fumar-porque-faz-mal e da busca de um destinatário (o detestável fundamentalista) em quem depositemos a raiva que sentimos de nós próprios porque fumamos descontroladamente. E atinge-se essa paz de espírito que nos chega da percepção de que somos mais livres e auto-determinados do que o detestável fundamentalista que nos censura. Quando, na verdade, somos mais prisioneiros do que antes.

Voltemos ao comportamento moral dos fumadores. Neste momento, porque fumar - muito - fez-me mal e porque fumar faz, efectivamente, mal e porque fumar mata mesmo, bolas, estou também convencida de que é pelo menos tão detestável como o obcecado anti-tabagista a boçalidade ostensiva de quem fuma com o orgulho agressivo de mostrar aos bacocos do outro lado da barricada que se é descondicionadamente livre quando, na verdade, não se o é.

Por minha causa (repare-se, só por minha causa), estou fumar muito pouco. Sem guerras de alecrim e manjerona, como a do Homem que foi jantar no Sábado à noite com um fanático, à frente de quem fumou cinco cigarros. Sejamos elegantes e contidos, sobretudo a fumar.

No limite

Às vezes, as pessoas deixam-se morrer aos poucos, quase deliberadamente. Ou, pelo menos, plenamente conscientes de como podiam sobreviver, na posse das soluções da sua própria ressurreição, que põem de lado. E vagueiam no doce embalo do precipício, que sabem estar próximo. No arrepio sedutor da negação da existência. Morrer é, sempre, um alívio, uma solução. Como um eterno sono reparador. Deve ser a isso que chamam paraíso. Eu imagino-o assim.

12.10.03

Quelqu'un ma dit

O CD da Carla Bruni, sereno e muito positivo. Sobretudo as músicas Tout le Monde e Le Ciel dans une Chambre. Muito bonito. Recomendo a quem precise de reerguer-se seja do que for.

Esguichos de besugo (há disto?)

Já me maça esta história, dissecada como se a vida fosse um teatro anatómico, do aproveitamento (ainda por cima estúpido, “pensado com os pés”, excelente juizo de valor sobre cabeça alheia, senhor professor Marcelo!) que o PS quis ou quer fazer da libertação do Dr. Paulo Pedroso. E, tendo querido fazê-lo, como o fez tão mal. Que preocupação, Deus meu, que esforço dantesco se está a fazer para explicar isto a Portugal inteiro!

Do que ouvi hoje, apenas um dado me foi novo. Eu não sabia (a minha vida não é esta, pronto, e muitas vezes falo de ciência inexacta, mas também não tinha dito nada sobre o regresso do deputado às lides da deputação, por isso...) daquele “falsete” de o homem não querer assumir cargos partidários mas achar que pode assumir o seu lugar no Parlamento. De facto, aqui, caramba... andaram pés a chafurdar no encéfalo. Como, aliás, quando foi pedida a demissão do outro PP, o do PP, que eu já admiti que não acho ser flor que se cheire, mas a minha perspicácia emocional embate na lógica irredutível do professor Marcelo: “dois pesos, duas medidas, então e os princípios?”. Touché, eu não tinha pensado nisto assim. E sei muito bem que, ao escrever de esguicho, não tenho razão tantas vezes como queria.

No entanto, quanto à festa do reencontro, mantenho que os paralelismos entre a libertação (foi uma libertação, ele estava preso e deixou de estar, não foi?) do ainda arguido Paulo Pedroso e as libertações dos presos políticos em 1974 são um excesso de “moscas no formol” nos teatros anatómicos que vão sendo algumas cabeças pensantes de Portugal.
Quem fez a cobertura da libertação de Paulo Pedroso não foi o aparelho do PS. O aparelho levou-o à Assembleia, ele deixou-se (ou quis) ir, as televisões entenderam dar cobertura a um reencontro de amigos. E a emoção pode fazer ganhar eleições, meus amigos, tomem nota disto. Nem 10% dos portugueses votam por motivos racionais, é com os pés, mesmo. Bom, pelo menos outros 10%. Os restantes 80% que votam fazem-no de acordo com a digestão e com o estado do tempo. Aprendam. Não devia ser assim? Mas é. Cavaco ganhou-as assim, às eleições, Mário Soares também. Portas nunca as ganhará, que só emociona (além da família) aquele rapaz loiro e de olhos azuis nostálgicos por detrás das lunetas, Guedes. Parece-me, posso estar enganado.

Mas, voltando atrás, a analogia é triste. Algumas pessoas nem percebem a maneira grave como apoucam a memória da libertação dos presos de Caxias com analogias destas. Não foi Ferro Rodrigues quem fez este paralelismo. Nem foi ele que encomendou a cobertura mediática da romaria. Foram as televisões do regime. E os comentadores que as televisões contratam para, sentadinhos bem dentro (bem dentro, repito, aconchegadinhos), parecer que falam como se estivessem a fazê-lo de fora. Que não estão.
Ora eu estou. Estejam à vontade.

Termino esta coisa dizendo o seguinte: que o professor Marcelo está cada vez mais parecido com o Nigel Hawthorne (enfim, obviamente, antes de falecer, coitado, e longa vida ao professor, caramba!) embora com os trejeitos do Fernando Santos; e que Pacheco Pereira me fez mudar de canal; é que já cá tenho um buda e viro-o sempre para a parede, a ver se me dá sorte.

Livre, sem entender

"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo." Clarice Lispector

Justiça

Convém termos a exacta noção do que é a Justiça: um princípio, um bem supremo, intangível, abstracto e indeterminado. Que nem sempre se cumpre mas sempre se busca. Insusceptível de apropriação, variável no tempo e no espaço e numa data de outros aspectos, alguns inconfessáveis.

Isto a propósito do que dizem estes danados sobre a justiça pós-acordão-da-relação. O mundo já era por vezes justo antes dele e vai continuar a ser muitas vezes injusto depois.

Auto-retrato

O'Neill (Alexandre), moreno português,
cabelo asa de corvo; da angústia da cara,
nariguete que sobrepuja de través
a ferida desdenhosa e não cicatrizada.
Se a visagem de tal sujeito é o que vês
(omita-se o olho triste e a testa iluminada)
o retrato moral também tem os seus quês
(aqui, uma pequena frase censurada...)
No amor? No amor crê (ou não fosse ele O'Neill!)
e tem a veleidade de o saber fazer
(pois amor não há feito) das maneiras mil
que são a semovente estátua do prazer.
Mas sobre a ternura, bebe de mais e ri-se
do que neste soneto sobre si mesmo disse...

Alexandre O'Neill

Pérolas

São bonitas, não haverá muita gente que o desdiga. Contudo, mesmo correndo terrível risco de represálias por parte dum cruzado emotivo, caso venha a tropeçar neste calhau, devo dizer que não digeri satisfatoriamente o seguinte, que se pode ler, integralmente, aqui.

"(...)Se foi constituído arguido com fundamentação suficiente ou insuficiente, se é ou não vítima de um erro judiciário, tudo isso cabe à sua defesa discutir e provar mas não certamente na Assembleia da República. Recepções de desagravo como aquela que foi feita a Paulo Pedroso na Assembleia da República são actos próprios duma república das bananas e não dum país democrático.(...)"

É claro e cristalino que a defesa de Paulo Pedroso fará o seu papel, em Tribunal. Agora, por mim, os amigos dele podem fazer-lhe as recepções que entenderem, onde acharem conveniente. Quem não é amigo dele, ou nem sequer o conhece, que é o meu caso, deveria penetrar-se desta coisa singela, de vez absoluta: dissociar os amigos de Pedroso do partido a que pertencem. Isso, desculpe, a senhora não está a conseguir fazer. Provavelmente porque não quer, porque lhe é mais interessante insistir nessa verrina (a ver se a massifica, é uma táctica comum) de insinuar exactamente o contrário. Desculpe, mas há aí, na frase que lhe citei (e nem vale a pena dissecar os exemplos que acrescenta, à laia de ilustração, no resto da sua crónica) alguns sintomas de “desonestidade intelectual”.

Num leviano exercício de má fé (que não faremos!) quase poderíamos pensar que a senhora defende duas coisas, que eu não acredito que defenda: que receber um amigo com alegria e festa, digamos que “no seu local de trabalho”, após ausência que supomos injusta (quanto mais não seja por ser nosso amigo, que a amizade liberta as emoções do raciocínio que as margina; a si não?) é uma manifestação de “republicanismo bananal”. E, por inerência, que o seu ideal de país democrático será um deserto emocional balizado pela contenção e pela estratégia, em que um leve aceno de cabeça, seguido dum imperativo e demagógico “vamos ao trabalho”, se constituirão nos únicos festejos permitidos em altura de reencontro.


Ao calhas

Gostei deste blogue.

Adjectivos

Quando deixa de ser suave, o português torna-se manso, que é uma variante perigosíssima, intradiplomática, da sonsidão. Mal se descuida, o sonso torna-se insosso. Ora, quem não tem sal não cruza mares nem faz germinar a terra.

Quem conclui isto é a Inês Pedrosa, no Expresso de hoje. E eu acrescento as incomodativas tolerância e prudência (como denuncia o arrebatado besugo), adjectivos que vêm mantendo a nação numa doce letargia desde sempre. Até o Scolari já descobriu a suave vocação da selecção para não mostrar o que é, ou o que podia ser, mesmo errando.

11.10.03

The rain man

Depois da politização da justiça, a emocionalização da política. O João Pedroso (irmão do famoso Paulo) foi há pouco entrevistado no telejornal. Emotivo, desnorteado, atabalhoado nos pensamentos e pouco assertivo na expressão e, no entanto, absolutamente credível. Admirou-me ver um homem bem intencionado, sem uma ponta de auto-censura ou de contenção própria de quem está habituado a falar em público: falou a mais, falou a menos, deu recados ao irmão, que veio, afinal, defender. The absolute rain man. Indisfarçável, o desespero de um cidadão anónimo (que se esqueceu que é juiz ou para quem isso deixou de ser relevante) e que debita os seus desgostos para quem o quiser ouvir, contra-argumenta sobre factos e opina sobre instituições, incluindo aquela de que faz parte, para se defender a si próprio e aos seus. Ingenuamente convicto de que a sua palavra (de honra, pois) será suficiente para alcançar a redenção. Voluntarioso, no melhor sentido do termo. Disparatado (lembro-me de ele soletrar F-A-L-S-O) e dando o flanco suficiente para a própria descredibilização e, talvez, para o enterro político do irmão. Acossado entre duas teses contrapostas para as quais ele sabe que a verdade material deixou de ser relevante para se construir o destino do processo, que há-de ser o da facção mais poderosa. E inseguro, tanto que nem todo o voluntarismo do mundo o ajudaria a disfarçar a sua própria e emotiva fraqueza.

Zurzir o sábado

Costumo almoçar, ao sábado, com a RTP2. O debate é multipartidário e os parlamentares convocados têm, geralmente, interesse. Sobretudo para mim, que me movo em patamares menos ilustrados, estes momentos de “política para o povo” são estimulantes. À chacun son chapeau.
Hoje estavam lá quatro deputados. Um deles era o Jorge Lacão, que trucidou a concorrência. Mas hoje era fácil, do ponto de vista intelectual, destroçar as hostes da coligação governamental. O tema eram as demissões dos ministros Lynce e Cruz. Quem tem Vitorino (como o PS tem) para acenar, nem sequer tem cólicas com debates destes. E demolir o Barroso, esse planalto agreste, é empresa mais árdua que zurzir Durões.

Eu achei genuinamente piada ao moço do PP que lá estava. Sabem o Vítor Hugo, o actual seleccionador nacional de hóquei? Esse mesmo. Se não se desse o facto de o Vítor Hugo ter alma nos olhos (bem maiores e límpidos) e um bocadito mais de banha (mas é mais velho, também, caramba!) seriam semelhantes. O corte de cabelo é igual. Aliás, há outro rapaz do PP que também usa o mesmo corte que o de hoje, mas é mais temperado e reflexivo. Que o de hoje, um Mel(l)o, estava desaustinado.
O que queria o de hoje? Zaragata. Levou no “beto” lombo, à vista de quem quis. Talhados para levar no lombo, estes moçoilos gugu-dadá-repimpampum.

Eu resumo a história de hoje. E resumo, ao mesmo tempo, a história recente deste PP (que não a do CDS, obviamente, essa é mais suculenta e respeitável). A história do PP-CCPAD* (Coliguem-se Comigo Pelo Amor de Deus). Querem?
OK. Eu resumo. Vai em itálico, que é uma adaptação de fábula anedótica.

Um rato e um elefante caminham pela estrada de terra batida. O rato chama-se PP e o elefante atende por PSD (claro que há animais maiores e mais importantes que o elefante, lembrem-se do Leão! Ai é relativo? Tá bem então).
O rato disse, olhando para trás, esganiçando-se, periclitante, nos seus sapatinhos de salto alto: “Caramba, pá! A poeira que a gente levanta ao caminhar!”.


O aforismo é velho, mas o rapaz é novo. Tem a desculpa da mocidade. Os papás e os amigos devem achá-lo o máximo, até porque amua. O tipo do PSD, mais maduro e sabendo que, POLITICAMENTE, não se defende o indefensável, é que se demarcou do rapazinho. Na pinta. Mas isso eu não sei explicar, porque... como é que eu disse? Ah! Eu movo-me em patamares menos ilustrados.



* Nota importante: não confundir com CCPAD, Clube de Caça e Pesca do Alto Douro, que é uma agremiação respeitável e não é para aqui chamada.

Julgamentos morais

No Abrupto, lê-se isto:
"Uma das vitórias de influência de Paulo Portas, director do Independente, foi introduzir na análise política uma verdadeira obsessão com o julgamento moral"

Este parágrafo é retirado dum bom texto de Pacheco Pereira. Engraçado como se fala, assim, naturalmente, de Pacheco Pereira, na blogosfera. Eu não conheço o senhor, só o leio. Mas sei quem é. Ele, a mim, neribi, mais do que inevitavelmente. Mas é, também, inevitável irmos buscar ideias àquilo que lemos. E os blogues quase que nos "intimizam", é engraçado. Acresce que o Abrupto, como o Aviz, como muitos outros, são blogues que se lêem sempre. São referências. Não são guias, mas são luzes. Que a gente segue ou não.

Paulo Portas, na minha modesta e parcial opinião, nunca foi referência nem fez escola, a não ser para a meia-dúzia de fiéis que lhe bebiam (e bebem) a (im)postura. Foi-me, sempre, antipático, visto daqui. Não lhe aprecio o olhar, nem a postura. Nem a filosofia. Limitou-se a introduzir (ou a hipertrofiar?) na política aquilo que já tinha introduzido (ou desenvolvido?) nas lides jornalísticas: uma confrangedora falta de escrúpulo e de escrúpulos, uma apetência alarve e indisfarçável pela trama, tudo abrilhantado por massa cinzenta notória.
Pareceu sempre obcecado por julgamentos morais, admito. Mas a dimensão moral dos julgamentos que nos vai, sucessivamente, propondo é de calibre pequeno, mesmo medido pela escala das morais mais simples. Que também prefiro. Os aplausos de subserviência dos seus seguidores (e o seu grandioso umbigo) nunca lhe permitiram ter a noção de que andou sempre nu. Sempre propôs julgamentos alheios com facilidade, na leviana esperança de nunca participar em julgamento seu. Em que a sua nudez ficasse mais exposta.

Hoje é ele o alvo fácil? Não é o mais fácil, mesmo assim. Ginga, abana-se. Há-de negar, sempre, a sua condição de "flasher". Mas, enquanto alvo, safa-se pior do que como atirador de dardos. Nitidamente. Isso é normal, e é bem merecido.

Como nunca gostei dele (e tenho a vantagem de ele não poder dizer o mesmo de mim), solicito que este simples manifesto de antipatia natural, em que todos caímos vez por outra, mas nem sempre registamos, fique reduzido à sua dimensão: um simples desabafo.
Em jeito de desabafo final, sustento, sem qualquer prova, mas as impressões não carecem delas, que Portas nunca foi luz para ninguém.
Por mim, no que à lanterninha dele diz respeito, hei-de sempre preferir caminhar às escuras.

El corte inglés (atenção, post muito fútil)

Por mim, acho muito bem que fique em Gaia. Eu hei-de continuar a ir a Vigo às rebajas, comer pulpo a gallega e zamburiñas, olhar o mar en La Guardia e invejar a garra dos espanhóis, por contraste à nossa triste placidez. Por mim, ponham o El Corte Inglés nortenho em Vila Real de Santo António, que fica lá muito bem.

Mas como?

Disse o Durão Barroso que não aceita lições de seriedade de ninguém. O que me espanta foi que, logo a seguir, disse que também não procura dar lições de seriedade... a ninguém. Será dissociação de personalidade?

10.10.03

Não pode um homem distrair-se a tratar pneumonias...

... que dá logo nisto:

O Paco diz que "as minhas leviandades poderão ser públicas mas as minhas sopeiradas são para mim e para quem gosta de mim". Faz bem, mas eu não resisto a partilhar as minhas fraquezas todas com quem gosta de mim. Se bem que leviandades... nem tenho. No fundo, este rapaz não me perdoa os dotes vocais.

Já o Alonso se preocupa, entre outras coisas, com o seguinte:
"Imaginemos (com calafrios) que o Ferro e sus muchachos ganhavam as próximas eleições. Aposto que elas se realizarão antes de terminado o "processo Casa Pia". E como será que o Ferro vai reagir ao facto de o Pedroso se sentar no banco dos Réus? Também com cara de seminarista, porque passou a ser primeiro ministro? Julgará ele que as imagens de arquivo da festa de ontem não passarão abundantemente em todas as TVs?"

Eu até deixo passar essa dos calafrios sem propor umas hemoculturas ao amigo Alonso, que prevê ficar num estado séptico caso se verifique uma vitória eleitoral do Ferro e sus muchachos. Mas, francamente! Como vai reagir o Ferro? Eu espero que se comporte como qualquer pessoa que não faça da vida política um emaranhado de trejeitos e manerismos deslocados da vida real, como outros que conhecemos e, no fundo, detestamos (eu, pelo menos, não gosto de massa cinzenta desprovida daquele pequeno músculo chamado carácter). Que mantenha a amizade pelo Paulo Pedroso, se achar que deve mantê-la, que perante as "imagens de arquivo" as não negue, porque negar é de Judas, e que explique dessa forma ilustrada que as emoções não antagonizam a prestação capaz dum bom governante. Que é bem diferente de ser um bom político, casta que aprecio apenas na medida certa e na devida dimensão.

A prudência é uma excelente virtude. O limite da prudência, caro Alonso, tem outro nome. Inteligência? Para mim não é esse. O nome que lhe dou tem, para mim, conotação mais negativa. Um belo bocado de cobardia. Que levada aos píncaros da extrapolação pode fazer-nos, um dia, berrar pelo salva-vidas que não está ali perto em vez de saltarmos para a água a salvar um filho que se afoga. Não sabemos nadar? Paciência, que soubéssemos. Mas saltar saltamos. E tu até és dos que saltas, para que te pões com isso?

Bendito Nimed

Bom. No meio das conversas sopeirais do besugo e do paco e das divagações do alonso sobre os acasos de alguns passarocos - e que ele teima que são imaginários (agora extensíveis, as divagações alonsinas, aos políticos passarocos) - a mim só se me oferece dizer isto: estou muito melhor do que ontem, e ontem estava muito mal. O que não quer dizer que já esteja bem, mas eu lá chegarei.

Sopeiradas

Tal como o querido besugo, também tenho uma pontinha de mentalidade de sopeira apimentada por uma leviandade indisfarçável.
E, tal como o besugo, só atribuo à genética a culpa pela parte da mentalidade porque a leviandade, tal como dizia um outro ilustre amigo, é mesmo adquirida ao longo do tempo...
E, sabe Deus que não há combinação mais perigosa que a da sopeiral lágrima no canto do olho com a juvenil leviandade.
À conta desta combinação muita sopeira leviana viu a patroa recambiá-la para as berças por ter ido na conversa do patrão.
Assim a modos que uma telenovela mexicana com patrocínio da Kleenex.
Foi mais ou menos isto que me fez lembrar o espectáculo do Rato e da AR.
Um melodrama tipo "Titanic" ou "Frankie and Johnny" mas em que a parte leviana ultrapassava largamente a componente sopeiral.
Pergunta mais que justificada: " Se este gajo tem mentalidade de sopeira leviana porque o irritou tanto a xaropada?"
Resposta: Porque as minhas leviandades poderão ser públicas mas as minhas sopeiradas são para mim e para quem gosta de mim.

P.S. Também não gostei do ar compungido dessa sopeira leviana que é o Paulo Portas a rezar no funeral do Tenente-Coronel Maggiolo de Gouveia mas pelos vistos aí não fui o único.

P.P.S. Depois de fazer um update às minhas referências necrológicas mantenho que os discos do Aznavour continuam por inumar pelo que o retenho à face da Terra a desafinar comigo e com o Elvis Costello, continuando a recomendar fortemente a audição do "North".

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