Outra receita
O Chefe Silva telefonou-me choroso: "Ó besugo, você quer atirar-me para o desemprego?". Pobre homem. A minha resposta foi, como sempre, pedagógica: "Silva, você habitue-se de vez absoluta! Você sabe que este mundo é, cada vez mais, uma selva competitiva! Não, Silva, não tem nada a ver com o Ferreira de Castro! Lesse você mais vezes o seu
Pantagruel em vez de deambular pelos clássicos e escusava de estar aqui com choradeiras! Limite-se a aprender. O génio não se chora, canta-se!"
Não tenciono ferir o Chefe Silva, que prezo. E não cantou, o invejoso. Mas aqui vos mostro mais uma delícia. Não me babem o "template", coños! Usem-na, apenas, em ocasiões especiais. À baba, evidentemente.
Receita número dois:
Você quer fazer frango na púcara. Foi ao supermercado e comprou um frango de médio tamanho. Comece por desarrolhar uma excelente garrafa de vinho tinto. Depois, concentre-se. À falta de púcara, meta o frango numa caçarola. A ser a mesma da receita número um, assegure-se de que alguém já a lavou bem.
Se sim, meta lá o frango, algum azeite (meio frasco, em média), um alho inteiro, quatro cebolas e meia dúzia de batatas com casca, das novas. Despeje em cima meio pacote de leite Agros, achocolatado. Agarre em algum sal e meta lá também.
Por esta altura, o aspecto de conjunto deve ser algo desolador, por isso adicione o conteúdo duma embalagem inteira de
ketchup. Mexa bem. Na dúvida, use a varinha mágica. Há sempre algo de magia em cada besugal receita.
Quando tudo estiver bem misturado, ligue o fogão e deixe ferver em lume brando. Polvilhe com canela e acrescente o resto do vinho tinto que, entretanto, foi beberricando largueiro.
O prato fica pronto após 45 minutos de fervura.
Sirva em pratos ladeiros a toda a família e saia de casa rapidamente.
(In "Les grands secrets de la petite cuisine de besugo")
Sim, tenho outras, evidentemente. Mas a minha ânsia de partilha atenuou-se.
Cenas da vida conjugal (II)
Ela: Já foste ver o que se passa com a lâmpada do quarto dos miúdos?
Ele: Vou já.
Ela: Vai agora, porra! Quero ir arrumar os atoalhados no armário e sem luz ainda malho da escada abaixo.
Ele: ...
Ela: Caraças de gajo! É por essas e outras que estás gordo como um touro.
Ele: Ficas sabendo que a Gina acha que eu ainda sou um homem jeitoso.
Ela: Quem é a Gina?...
Ele: É uma nova escriturária lá do escritório. Toda laroca, a moça...
Ela: Ah sim? Laroca como?
Ele: É assim toda vistosa. Usa botas brilhantes, daquelas que vão até às coxas...
Ela: Bom. Vou ver se o Santana Lopes já está a falar na televisão.
Ele: Começas, é?
Ela: Não comeces tu com as tuas Ginas das coxas longas, ora! Tu podes e eu não?
Ele: Mas eu sou homem!
Receitas de besugo
A verdade é que, até conseguirmos atingir uma excelente beleza final no olhar, a vida nos reserva agruras e é preciso levá-la com aquele "fair-play" com que aturamos, diariamente, a expressão de intestino contentamento de Paulo Portas, Durão Barroso e, mesmo, Marques Mendes. António José Seguro? Ok, também. E aquele rapazinho do PP que parece o Vítor Hugo, também, bem alembrado. Sem esquecer as derrotas do Sporting, que nos esgotam totalmente, não é só o "fair-play"...
Bom. Assim sendo, não querendo este besugo que vos falte nada, lede estas receitas de petiscos que vos mostro. Com elas aprendereis, como outros aprenderam, que a minha vida não é esta mas, se fosse, seria fecunda.
Receita número um:
Ponha uma caçarola em cima do balcão da cozinha. Meta lá dentro cebola e alho picados. Ponha ao lume. Quando verificar que está tudo colado ao fundo da caçarola e o pivete é significativo, apague o lume e meta a caçarola na pia. Encha-a de água e pop limão. Deixe ficar a amolecer, que depois alguém há-de lavar aquilo. Pragueje veementemente mas aprenda: na próxima vez ponha óleo ou azeite na caçarola.
(In "Les grands secrets de la petite cuisine de besugo")
Prometo voltar ao tema. Todo o meu ser me impele à partilha do conhecimento.
A beleza no olhar do fim
Eu sei que o défice é mais importante e que é gratuito usar os olhos dos outros para ficar triste.
Cenas da vida conjugal (I)
Ela: Gosto muito de ver o Santana Lopes a falar na televisão. Ainda por cima ele é tão charmoso...
Ele: Heim?
Ela: Sim, o Santana Lopes. Tem uma voz super envolvente...
Ele: Quê??
Ela: Que foi?...
Ele: Ai o caraças...
Ela: Agora também não se pode falar do Santana Lopes? Porra lá para o mau feitio!
Ele: Estás com vontade de fazer elogios, é? Olha, elogia o Cardeal Patriarca!
Ela: OK, pronto! Desampara-me mas é a cozinha e vai ver se já começou a bola, porra!
A prova final da existência do Bem
O Bem é, naturalmente, um conceito subjectivo, mas há coisas menos subjectivas do que outras. Ora vejam:
Nota: impõe-se esclarecer que o senhor da foto não é, como muitos terão pensado, o Richard Gere. Chama-se Declan Mulqueen e é um activo membro do IRA.
Para tudo há uma razão
Ah! Hoje a liberdade pairou neste blogue! E a liberdade tem razões simples que se expressam em imagens singelas. Como esta.
Palpita-me, porém, que a liberdade é sempre sol de pouca dura.
Monólogos fictícios directamente da prateleira
"Sim, fui eu que comecei a congeminar este belo projecto de modernização da saúde e da linguagem, tudo ao mesmo tempo! Que informada eu era, que brilhante ainda sou! Que belo sistema idealizei e contabilizei, entre pesadelos! Sim, que eu sou como o besugo, também sonho encharcadita...
E, para que se saiba, tonitruo ainda isto:
Sim, amigos e admiradores eternos, embora não sendo do PCP, fui eu a primeira a institucionalizar a palavra
utentes! Alguém diga isto ao Pacheco Pereira, esse doente! Fui eu, Zé! Cala-te, homem!"
Diálogos impossíveis
Ele, terno:
"Estou à espera..."
O outro, céptico, de caneta:
"Em público, e logo nas finas beiças?"
Ela, pragmática:
"Não o beijes, caramba! Não aqui!"
Diálogos possíveis
O senhor da esquerda:
"Achas que se nota muito que me controlas?"
O senhor da direita:
"Claro, mas eu sou assim pequenino e divertido, ninguém acredita nisso a sério... e continua a sorrir, pelo amor de Deus, sim?"
Partilhas
O Natal é tempo de partilhas. É, mais ou menos, como quando nos morre algum familiar chegado que deixa algo de seu: logo corremos, após a choradeira inicial, a partilhar entre nós o "algo de seu", que se nos afigura, fortemente, "algo de nosso".
O imbecil do Bruce deixou isto ao Deus-Dará. Como se fosse "maninho" e não tivesse direito a herdeiro universal. Partilho convosco a injustiça de não ter sido, pelo menos, chamado a... exactamente, a partilhas. E logo neste caso, em que há um excelente "Bem" a dirimir. Tenciono processar alguém, evidentemente. Entretanto, eis "o Bem".
Sonhos de besugo
Eu tive um sonho. Aliás, eu tenho este sonho muitas vezes. É mais um pesadelo que um sonho, ainda por cima estou de fato e a fumar. Acordo sempre com dores no corpo todo e encharcado em suores frios. Fiz uma radiografia do tórax que me assegurou não padecer de tuberculose. Propuseram-me um EEG e uma TC cerebral, que estou a ponderar fazer. Enquanto pondero, querem que vos conte o meu sonho recorrente?
Então vejam. É isto:
Não, o facto de os senhores me jurarem que têm pesadelos parecidos, não me consola. Um pesadelo é exactamente o tipo de sonho com que cada um de nós tem de lidar sozinho, por muito comum que seja.
Colaboradores
No Hospital SA em que trabalho passei a ser conhecido como "colaborador". Eu e os outros. Do porteiro para diante, ou para trás, tanto importa, "é tudo colaboradores". Colaboradores de quê? De quem? Evidentemente:
da mola fulcral deste ambicioso e "gestionário" (fusão de gestor com torcionário? eu alembrei-me...) projecto! E qual é essa mola? A SA, "elle même"! Tudo colaboradores da SA! Da Santíssima Administração, exactamente. Sem a qual (eu agora estou humilde, de olhos em alvo e fingindo conveniente frouxidão testicular) "nada disto seria possível"!
"Isto o quê?". Isso é uma pergunta? Quereis brincar, agora?
Olha que bem pensado.
Esclarecimento
Quanto ao besugo: é tudo mentira. As expressões censuradas que ele me atribui aí em baixo não foram proferidas por mim, mas pela sua própria consciência. Sim, o besugo tem uma guelra falante.
Utentismo
O JPP afirma odiar a palavra "utentes", ao mesmo tempo que aproveita para lhe atribuir uma conotação esquerdista que por acaso não lembra ao diabo. Enfim, caíram-lhe mal as filhozes. Mas eu acompanho-o, apesar disso, porque odeio sentir a opressiva etiqueta de "utente" que me é atribuída assim que entro num hospital ou, pior ainda, numa repartição de finanças. Reduzido a utente, o utente tem de tornar a provar ao mundo que é um pouco mais do que isso. Que não é um mero receptor de um papel com um carimbo. Por isso reclama, resmunga, exige, para se sentir matéria orgânica de novo. Para se sentir vivo. Paradoxalmente, o utentismo estimula, por isso, o número de reclamações nos livros amarelos da Administração Pública. E integra-se, de resto, num plano mais vasto e mais ambicioso de erradicar dos serviços públicos todas as expressões que, ainda que subliminarmente, contenham simbolismos discriminatórios ou menos respeitosos. Hoje, no mundo civilizado pós-cavaquista, dever-nos-emos referir às vigilantes das escolas como "auxiliares de acção educativa". Às ajudantes, nos hospitais, como "auxiliares de acção médica". Havemos, dentro de algum tempo, por via de um ministro ainda mais reformista (que eu imagino laranja), de nos sentir obrigados a tratar os professores por "especialistas de acção educativa" e os médicos por "especialistas de acção médica". E quem se esquecer disso será um miserável possidónio. É o progresso!
Hoje nada me sai bem
A lolita voltou a entrar em contacto comigo e disse-me, aparentemente um bocadito fora de si,
"ao menos põe o ....... do link!". Como nas reticências duma destemperada pode caber um mundo inteiro, eu ponho. Aqui e lá em baixo.
http://www.carlinstuff.com/GEORGE%20BUSH.jpg
A minha existência é dedicada ao espírito de serviço. Como muito bem devem estar a pensar. Valha-me Deus.
Peço imensa desculpa
Eu sei que a lolita proibiu (veladamente) o copy-paste. Eu sei que devemos ser originais. Ser originais consiste, fundamentalmente, em ler os artigos do JMF, do EPC e do PP (esse guru), do MST (não confundir com os opiáceos) , da HM e do PQP (sim, o antigo corredor de automóveis), entre outros e, depois, com verrina diletante e certeira, dissecá-los, aplaudi-los, vituperá-los. Acrescentá-los daquilo que lhes falta. Fundamentalmente todos percebemos que o que lhes falta é termos sido nós a escrever aquelas coisas, porque se exprimem bem e são, nesse particular, invejáveis. Ou seja, eu sei que ser original é andar a reboque, à babugem, tipo "tu escreves e eu casco-te... ou lambo-te o excelso cuzinho". Claro, com pose, não é assim agachaditos, é com certa altivez.
Eu decidi atraiçoar este ideal de acutilância e originalidade, mais uma vez. Vou aqui botar uma "estampa" que copiei dum sítio qualquer. Refiro que isto não é uma cópia gratuita, apesar de ser conhecida de toda a gente. Paguei 9 euros por ela. Não se trata aqui de achincalhar símios. Não me venham depois com merdas dessas.
Ah! E não me parece que desejar "Bom Ano" mude as ventas ao tipo. E também não aumentará a distância "gibraltariana" que lhe medeia os olhitos, aqueles olhitos "originalmente" acutilantes.
Mas não custa tentar. Bom Ano!
Nota: tive de editar isto porque a lolita me mandou um raspanete. A bem dizer, mandou-me uma frase com 3 palavras. A primeira era um verbo, na segunda pessoa do singular, pretérito perfeito, que não reproduzo. As outras duas eram "...o template!"
Por isso, retirei o que tinha cá posto e substituo por um URL, ou lá o que é. Pronto.
Era isto.
Espreitadelas de besugo
Confesso que o Natal me faz sentir cada vez pior. Mas isso é outra conversa. E eu sei, aliás, a razão. É porque os meus Pais estão a ficar velhotes, é porque os meus miúdos já vestem o "M" nas camisolas e nos blusões, é porque não são só os meus Pais que estão a ficar velhotes... e tudo isto gira à volta do "M" das camisolas dos putos, qualquer dia entram no XL, como o pai deles, deixa de haver Pais e, no fundo, raios partam as camisolas. Eu, aqui, culpo as camisolas, como é bom de entender.
Não falo dos sem-abrigo, nem do aumento dos trinta cêntimos, nem do discurso pastoso e enjoativo (é o que eu acho, desculpem) do Dr. Durão Barroso a vislumbrar "piquenas recuperaçõezinhas..." de cagão, nem de mais nada. A bem dizer, tenciono deixar o tema do Natal pelo problema das camisolas. E asseguro-vos que já entendi, há muito tempo, que a vida é todos os dias e até um dia.
"Pronto. Então que quer este?".
Nada. Estive a espreitar um bocadinho do "A vida é bela", que parei de ver porque me incomoda de tão lindo e triste. E, como sei que me incomoda, saltei para a "2", onde passava uma reportagem sobre as Coreias. E percebi que na do Sul é Natal e na do Norte é uma triste Páscoa, mas ambas têm um excelente e grave problema de camisolas que lhes não servem.
É um caraças. Parece que o patrão da Hyundai está a ficar velho e vai morrer. E detestei o penteado do senhor que manda na Coreia do Norte, que também há-de morrer. Depois lembrei-me que aos do Norte lá ganhámos, em 1966, aos do Sul é que não, em 2002. E havemos todos de morrer, às tantas, em tempo competente. Ficou-me uma azia descomunal, baralhei tudo e encontrei um denominador comum para este fogaréu intrínseco:
Eu ando outra vez com falta de mimo.
E vou voltar ao filme, evidentemente. É muito bonito.
Ay Carmela!
El Ejército de Ebro
rumba la rumba, la rumba la
una noche el rio paso
Ay, Carmela, Ay, Carmela.
Pero nada pueden bombas
rumba la rumba la rumba la
donde sobra corazon,
Ay, Carmela, Ay, Carmela.
Contra ataques muy rabiosos
rumba la rumba la rumba la
deberemos resistir
Ay, Carmela, ay, Carmela
Pero igual que combatimos,
rumba la rumba, la
prometemos resistir.
Ay, Carmela, Ay, Carmela.
I'm dreaming of a white Christmas
A Noite de Natal é sempre inevitavelmente serena. Feita de silêncios de tréguas, de carinhos por olhares, de sorrisos cúmplices. Como se nela se cumprisse, anualmente, o balanço de todos os afectos. Como se fosse um suspiro de alívio ao chegar de um sprint desgastante, mas vitorioso. E eu, que com isto tudo me sinto transbordante de serenidade, faço daqui um
cheers! com o meu inseparável
martini bianco e desejo a todos um Feliz Natal.
Postal de Natal
O amável - porém reaccionário -
CêémeCê deu-me uma prenda! Fui ver e verifiquei tratar-se de um puzzle, que descobri, a tempo, ser extremamente complexo e viciante. O que ele pretende, Tia Lólita, é manter-nos entretidas com uma actividade alienante para que ele possa, sem oposição incisiva - como é nosso timbre - prosseguir a sua actividade subversiva junto dos mais incautos e dos menos atentos. Em todo caso, esta Lolyta agradece e formula sinceros votos de Feliz Natal ao CêémeCê e à Tia Lólita. E também ao
CMC, embora este, insidiosamente, me tenha eliminado um "l". Mas eu já começo a habituar-me à
grafofobia dos Cêémescês...
Ainda os "bonecos"
É que não se consegue parar de rir, a finura humorista destes brincalhões entranha-se e, como somos todos uma espécie de "amaricanos", ficamos aqui sentados a rir, a rir. Nem a Maria Vieira em dia de especial inspiração nos faria rir mais,
god damned!
Vem isto a propósito doutra pérola publicada pelos
mesmos amigos, que se conta rapidamente. O ditador da Líbia terá experimentado inusitada hipertrofia cerebral por indução de americana ensinadela. Uma espécie de
"tungas, pega lá, ó líbio, a ver se cresces!". Isto dito por anglo-saxónicos marca muito, porque são expoentes civilizacionais, tanto é que, se quiserem, compram todo o planalto de Gizé! Que não é na Líbia, eu sei. Mas compram na mesma.
Bom. Isto é giro, demonstra poderio, sobretudo insinua pujança intelectual. O problema é que o senhor Bush, confrontado com o dito "cartoon", se penetrou de inveja soez. Quer, agora, que o ameacem, também. Quer sentir aquele medo catárctico que lhe fará triplicar a massa encefálica. E quer ao fim da força, um querer feito de patadas no soalho e berros lancinantes! E não adianta explicar-lhe a elementar regra da matemática que demonstra, sobejamente, qual o produto de qualquer multiplicação ... se um dos factores é nulo.
Se eu soubesse desenhar não seria Picasso. Seria Lavoisier. Esta é profunda, raios. Desculpem: "God damned!".
Abres tu ou abro eu?
Há quem tenha fino gosto. E há os outros, aqueles que humildemente se regalam com a luminosidade dos eleitos. Eu sou um destes últimos exemplares, cada um é para o que nasce. E vá lá que não sou ceguinho, quando não nem via a luz, em toda a sua harmonia! Sim, eu venho apenas tecer os merecidos encómios ao excelente gosto, à fina ironia, à suprema subtileza do "cartoon" publicado por estes
pragmáticos amigos. O "boneco" não é deles, mas é como se fosse. Nota-se ali ternurice de progenitura, eu já vi disto em muitos casais felizes.
Excelente, na sua arquitectura imponente, o senhor Bush. Ali bem desenhado, dominador, a fazer orais (exames, claro!) aos maus. Que estão tementes, como convém perante divindades. Preocupa-me, contudo, a observação do senhor da esquerda, o de olhitos em bico. Não sei se o senhor Bush terá "oralidade" para tanto. Eu sei o que corre aí acerca dos chineses e derivados, também gosto de anedotas, mas o senhor Bush não me parece com cavidade oral suficientemente profunda para exame tão... delicado.
A vingança dos justos
O senhor Bush, que fala fazendo "boquinhas" e tem os olhos mais baços que eu já vi (sim, mesmo mais que um cordeiro defunto) expressou a sua douta opinião: "Eu acho que ele devia ser morto". Eu não sei colocar aqui sons, quando não afinfava-lhe um "ilustrativo zurrar texano, com sotaque".
O
justo "linkado" ali abaixo pela lolita hiperbolizou o outro justo, o dos olhitos baços. Provavelmente enquanto lhe lavavam o carro (
sobretudo o interior, please): "Que o homem sofra bastante, sim? E, entretanto, lave bem os estofos, que maçada!"
Se o cosmos fosse justo, que não é, desceria uma grande e calejada mão dos céus, empunhando um bruto martelão, maior que aqueles do São João do Porto (e feito de betão armado) de cada vez que alguém emitisse ideias provindas do folhoso, augurando sofrimentos "bastantes" a outrem, por exemplo. Mesmo que fosse a alguém que fez sofrer, evidentemente, que isto não é a cafraria! Ouvir-se-ia, então, um vozeirão tremendo: "Cala-te, titi contentezinho do popó... e, já agora, manda polir os guarda-lamas!". E tudo cessaria com um ruído chôcho de martelada excessiva em pasta de papel estilhaçado... e acabamentos de solarina.
Já passou. E, em termos de abóbada celeste, a voz deste justo há-de chegar onde chegou a voz do outro. Por aqui, enfim, lá se vão fazendo ler (graças a Deus ainda não podem obrigar-nos a ouvi-los cantar).
Em estreia neste blog, Nina Simone
My baby just cares for me. Embora seja só um bocadinho, como terão oportunidade de verificar se carregarem no
play.
Esteja à vontade!
A
sua preocupação pelo destino do Saddam é, seguramente, bastante maior do que a que ele tem por si. Aposto que não lhe mandou um cartão de boas festas...
Caro Manolo
Desculpa dar-te trato castelhano, mas isto vai aqui um frio cieiro digno de Queimadela, que é uma Castela enfiada no berço da portugalidade.
Então tu és assim? Mal penetras vais perorando contra os referendos? Estás aqui estás de candeias às avessas com a lolita que, se pudesse, referendava até o simples acto de privatizar empresas de construção civil!
Bom, prudência no falar. Andam por aí dois juristas e um arruaceiro armado em poeta do Douro. Não te arrisques a desnecessária entaladela...
Por mim, já sabes: estás à vontade. Tu sabes que eu defendo, desde tenra idade, esta
máxima minimalista: mais de setenta por cento dos portugueses não deviam, sequer, poder votar, quanto mais ser questionados em referendo. Não é por não responderem (que também não respondem, realmente), é por nem sequer entenderem a pergunta!
Aproveito para te informar, que eu sei que nem dormias sem saber disto, que o Porto ganhou em Alverca e, mais uma vez, com a ajuda do árbitro e dos deuses menores do futebol.
Aceita uma palmada forte nesses ossos e entrega os meus cumprimentos aos teus sogros. Manda os chouriços que prometeste e que Santa Irenéia te não avinagre os fígados.
Ora então com licença faz favor.
Antes do resto, queria dar o meu muito obrigado por terem permitido que eu penetre, quer dizer, que eu entre, neste vosso espaço de escreveres e de leres.
É sempre bom uma pessoa poder deitar cá para fora o que lhe vai no entendimento, e até quem sabe, mesmo o que lhe vai na alma, mesmo que a dita, como diz minha santa sogra, está mais negra que breu, que no falar dela é o mesmo que dizer mais escura que noite de Inverno.
Logo a mim, que sou tão bom rapaz e tão bom genro, ela diz isto, com ar sorrateiro, a modos de uma pessoa não saber se é a fingir ou é a sério, que o diabo da mulher tem artes de pantomina.
Pois fiquem vossemecês a saber, que eu não sou lá assim muito de alinhar nisto ou naquilo só porque todos alinham, e nem sou uma
Maria vai com as outras. Gosto de pensar, e de atinar conclusões a que chego, sozinho, ou com a ajuda de outros, principalmente do meu sogro, esse santo homem, uma seda, só vos digo.
Olhem, ainda agora, com essa coisa lá do Iraque, e da descoberta da toca do Saddam com ele lá dentro que nem rato, ficamos contentes que o homem não é flor que se cheire ou se dê a cheirar ao pior inimigo.
Até bebemos um copo do novo que furamos no S. Martinho.
Agora só lhes digo, que só ficamos a ver se ao outro que parece um roberto, que era um boneco que havia nas feiras no tempo da minha meninice, ao tal Bush ou lá como é também, também o levam preso. Sim, que para mim, quem invade um país atrás das riquezas, só merece degredo.
É como se para ir aos salpicões em azeite que a minha sogra tem na adega, eu arranjasse meio de o meu sogro lhe dar porrada ao ponto de a por no hospital para ficar com o caminho livre. Resolvia o problema, mas que não era bonito, lá isso não era.
Outra questão que temos debatido, eu e o meu sogro, é aquela dos políticos do contra andam a discutir, e que tem a ver com os desmanchos, ou abortos, como os finos dizem. Não digo que não seja importante a coisa, mas por certo haverá outras bem mais, em que gastem as forças para denegrir os do governo.
E depois, mais a mais, houve o referendo ao povo aí há uns cinco anos, que deu no que deu. Então para que é que andam agora com isso outra vez?
Se não têm imaginação para descobrir que fazer, que vão pentear macacos que é para o que servem todos.
Olhem, e agora desculpem, que isto já vai longo, e eu tenho de ir resolver uma necessidade que me está dar com muita urgência. Passem bem, e façam o favor de andar nos eixos.
Para memória futura
Reconheço o pragmatismo, o primarismo, o pauperismo do que vou dizer a seguir. Mas isto é só um recado para o Eng. Fernando Santos, que sei ser frequentador assíduo deste blogue. Párem de ler, fáxavore, que agora é só com ele.
"Caro Fernando:
Conforme pediste, aqui te deixo a constituição da equipa leonina para o jogo com os lampiões, em Janeiro. Não me pediste, mas eu sugiro-te, também, a "atitude global" a adoptar. Queres? OK, queiras ou não, aqui vai. Começo por ela.
1 - Atitude global a adoptar: o Sporting tem de ir à Luz jogar como se não fosse um derby. Evitar a emoção do "jogo especial". Há que explicar aos jogadores que vai ser um jogo para "partir", de muita raça e muito esforço, em que o objectivo é ganhar. Mas evitar todo e qualquer folclore. Porquê? Porque os lampiões estão a jogar muito mais que nós e se lá vamos de peito feito, armados em "lá vamos nós ao derby", levamos um pinhão que até vai tilintar na outra margem. Evita dizer isto aos jogadores, que anda por lá muito cagão medroso que a gente não há meio de despachar (o Beto, etc...), mas vai ser um jogo para tentar empatar, se tivermos força e sorte. Tomaste nota?
2 - Olha, então, a equipa:
Ricardo.
Garcia, Quiroga, Beto, Polga e Paíto.
Paulo Bento, Custódio, Rui Jorge, Barbosa
Silva
Registaste? OK, vai lá doutra maneira e vais ver como elas mordem.
Na segunda parte, se estiver zero-zero e os lampiões se enervarem, tiras o Silva e o Barbosa e metes o Lourenço e o Liedson.
Deixa estar o João Pinto sossegado até ver. Se, por um bambúrrio, estivermos a ganhar ao intervalo, eu dou-te a táctica para a segunda parte, nessa altura. Se os lampiões estiverem muito nervosos metes mesmo o João. Eu depois logo analiso e mando-te por e-mail o que hás-de fazer. Vê se atinas.
Diz mesmo aos tipos que aquilo não é um derby. Este ano não é. É para "comer" a relva mesmo. Mas com calma, uma relva comida com calminha. Ruminada.
Um abraço."
A ver se resulta e arranjo um contrato. Pois, que isto anda mau, agora com as SA...
O corporativismo
Parece mesmo a dança das cadeiras. Primeiro o
Bastonário Júdice, sacudindo a água do capote e apontando o dedo às magistraturas. Veio então o
Senhor Conselheiro defender-se, lembrando o alargamento dos prazos para a prática de actos processuais pelas partes. Portanto, apontando o dedo aos advogados. Agora o dedo enristado dos advogados há-de voltar-se para os funcionários judiciais, como
sugere o CL dos
Mata Mouros. E os funcionários judiciais hão-de ripostar e apontar a mira, talvez, aos advogados. A morosidade da justiça causa um enorme desconforto a todos e faz, por isso, transparecer todos os vícios corporativistas. Como bem (ou mal?) disse o Júdice, sacudindo a água do capote. Tudo isto é muito divertido, sobretudo por ser mera e inconclusiva retórica.
Lagoa do fogo
O mar açoriano de que fala o besugo é tão completo que esconde até pequenos mares, de puros azuis e águas misteriosas. Como este, que conheci há uns anos atrás, iluminado por uns parcos instantes de sol de Inverno. E eu retive, desde então, a imagem desta lagoa perdida e silenciosa. Valiosa, como tudo o que se entranha na mente; e bela, digo eu, mesmo quando chove.
Mar completo
O mar de São Miguel é um mar completo. É um mar cinzento em caixilho verde nos dias de bruma, é um mar azul que se ilumina no negrume do fraguedo, se calha estar sol.
O mar de São Miguel é São Miguel vista de longe. Não há um mar mais completo, nem em teores salinos nem em profundezas, que outros mares que aí há. Mas é um mar que nos fica sempre à volta... e de permeio. Parece um mar mais completo visto da lonjura. É isso.
"E, da minha janela micaelense, tanto se via só um mar cinzento como, em dias límpidos, lá na fundura do horizonte, se adivinhava o vulto esbatido de Santa Maria..."
Calmas de lolita
A lolita nem é de se gabar. Mas não tem culpa de, não sendo isenta de severa autocrítica, saber definir-se com pinceladas suaves e belas.
Há quem só vomite quando agoniado. Há quem se defina no próprio vómito. A lolita não. A lolita é livre de escrever coisas bonitas baseadas em coisas feias, que da fealdade se faz o belo, felizmente. Tantas vezes.
Fechemos a Caixa de Pandora.
Gosto de pessoas com vidas cheias, fartas de afecto e de trocas, de gestos de ternura e de pequenas e frequentes felicidades, feitas de olhar e de ter vontade de olhar os outros, para além do próprio e redutor egocentrismo. Gosto de pessoas que perceberam que o seu próprio brilho se alimenta da consciência de que a sua paz depende da serenidade com que sentem empatia pela dor e pelo sofrimento alheio, desconsiderando, ao limiar zero, a maldade – por essência, medíocre - de terceiros. Gosto de pessoas que aprenderam a usar a sua razão com o máximo proveito, transformando-a em pura, fresca e reconfortante emotividade e descobrindo, a cada dia, novos e estimulantes pretextos para definir espaços invioláveis de felicidade.
Alcançado esse doce bem-estar, descobre-se que o mal é apenas o caminho perdido de outros. Percebe-se, então, que a verdadeira dor de si próprio só existe e se torna justificável porque antes se percebeu a dor alheia. E o mal, esse, vai-se para sempre.
E tudo isto sabe muito bem.
A amargura
É uma dor ferrada nas ilhargas que não nos dá sossego. Aprendi isto há bocadinho, ao ler uma coisa. E percebi que não sou amargo, que eu sossego sempre.
Já agora...
Por motivos variados, alunos com altas classificações no ensino secundário não conseguem entrar nos cursos que desejam seguir. Medicina, por exemplo. Lá vão eles, até Salamanca, como nos mostrou a TVI (isto não é de hoje, é de
anteontem, atenção!). Num País com falta (assumida) de médicos chega a ser ridículo que se discuta a capacidade formativa das nossas Universidades, como já uma vez expliquei, separando claramente as águas da
clínica e da
investigação.
O que me parece engraçado é ouvir estudantes do segundo ano de Medicina compararem (atribuindo nota! influências do professor que parece cada vez mais o Nigel Hawthorne?) dois sistemas de saúde que não conhecem, baseando-se na injustiça de que se sentem vítimas para atribuir um "4" ao sistema português (que é o 12º melhor do MUNDO, segundo a OMS! Nós estamos entre os 12 primeiros em quê mais? Blogs? Empáfia?) e um "9" ao espanhol ("que se lixe, estamos cá, leva 9 em 10!").
E, sobretudo, constatar que a elevada classificação académica de que os nossos estudantes de Medicina em Salamanca se ufanam os não liberta dum lirismo pueril ... é ternurento. Quem os ouvir pode pensar que Castilla, Galicia & Leon apenas exportam os seus médicos para melhor poderem albergar os brilhantes craniozinhos dos nossos desterrados. Logo que se formem, que ainda nem isso fizeram. É que alguns deles pensam castigar Portugal ficando lá, entre castelhanos! Mas esta gente pensa? Ou só tira boas notas no secundário para poder assinar com
"dr" atrás os disparates que vier a dizer?
Isto é redutor. Eu sei. Se há falta de médicos em Portugal, Portugal que os forme, que lhes abra as portas da sua (nossa, de Portugal) necessidade. Mas não deixa de ser verdade.
Obrigado, paco!
Graças aos teus ensinamentos o meu texto não saiu. Brilhante paco!
A fonte
A TVI interrogou-se, hoje, sobre um intrincado problema. Equacionou-o assim, mais ou menos:
"Há falta de médicos em Portugal. Tanto assim é que se contratam cada vez mais clínicos espanhóis. Mesmo assim, estudantes portugueses (com altas médias no ensino secundário) que querem licenciar-se em Medicina, não entram en Universidades portuguesas! E alguns vão licenciar-se em Espanha!".
Seria útil a TVI convidar a senhora doutora Leonor Beleza (esta à cabeça, a intolerante "menina bimbas" do primeiro cavaquistão) e todos os ministros da Saúde que lhe sucederam, para debater isto. Mais do que ouvir os estudantes desterrados, que são uma outra vertente do problema, importante, mas diversa.
Eu, à Dra. Leonor Beleza, até devia perdoar tudo. Ela foi a responsável, em 1988, pela minha ida para os Açores, para aí iniciar a minha especialização. E eu vivi muito bem nos Açores, durante um ano. Muito bem mesmo.
Só que, nesse ano, para um contingente de médicos concorrentes que rondava os 3.000 (os que fizeram exame de acesso à especialidade), a senhora doutora disponibilizou 500 vagas, sendo cerca de 300 destinadas à carreira de Clínica Geral. Sobejavam cerca de duzentas para as especialidades hospitalares. Por isso me insularizei, com gosto.
A senhora doutora, surdinha a qualquer conselho que lhe surgisse de fora do cavaquistão, achava que havia médicos a mais. E que estes quinhentos "privilegiados" seriam os últimos a ter lugar no Sistema Nacional de Saúde, quase que por especial favor. Assim se fez, só que ela enganou-se. Fez mal as contas. Não contou bem. Foi mil vezes pior que Guterres no dia em que se enganou nas contas do PIB, em directo.
Nenhum dos 2500 médicos que ficaram de fora deixou de entrar, mais cedo ou mais tarde. E a senhora doutora contribuiu, largamente, para a adulteração do tal Sistema que parecia defender, tornando-o ainda mais promíscuo. Isto para não falar do que fez aos médicos em geral, descredibilizando-os injusta e aleivosamente, antes de ser encostada na prateleira dourada do PSD por indecente e má figura. Ainda hoje assoma, de vez em quando, esganiçadita, dos fundos do tempo. Mas a praga que lhe roguei tem sido mais forte. E Deus queira que assim continue, a bem da Nação.
Bom, a TVI deveria promover este debate. Em vez de perguntar a estudantes portugueses de Medicina em Salamanca o que pensam de dois sistemas de saúde que não conhecem (o português e o espanhol), tentando analisar "cernes de questões" através de olhos inexperientes (e injustiçados, obviamente, mas sobretudo desconhecedores do que ultrapassa a realidade académica!), a TVI podia ir beber à fonte.
E foi ali que tudo começou. Na fonte. Na mulher Leonor que se cuidava olímpica nos mínimos que não possuia. Eu digo isto com desassombro mas com muita calma, sosseguem. E o problema da formação em Portugal e em Espanha é outra conversa, embora muito paralela. Fica para outra altura.
Desiludido
É como fica um besugo quando lê e vê, no
Mata-Mouros, coisas que se intitulam "Like a rat" e "President Bush sends his regards".
Nem é por ser no Mata-Mouros. É por estar escrito e parecer que foi a sério.
Eu, da Vodafone do paco nem falo. O paco adere a todas as campanhas promocionais do Zé Lamego, do Tó Barcelos e do Quim Pousada de Saramagos. Que nem sei quem são. Mas, desde que vibre (e que se veja ali esforço de guerra), telefonem-lhe. Ao paco.
Direito de resposta
Ao Jiminy Cricket, ao faxista do CêÉmeCê, ao LT, à camarada Tia Lólita e a todos os demais colaboradores do
Ter Voz, em meu nome pessoal e dos restantes peixes desta tasca (os quais, mais uma vez, não consultei), vão os votos de um excelente e
rosa Natal. E queria dar-lhes uma excelente notícia: vocês também são do Norte, carago! Pelo menos do ponto de vista de um marroquino. Feliz Natal!
Ó besugo...
...desculpa lá.
A Vodafone já chegou ao Iraque? Afinal valeu a pena Portugal participar no esforço de guerra.
Já temos uma empresa portuguesa a sacar alguma coisa do espólio do Saddam.
Ah ganda Zé Lamego.
Só é pena não se ter passado no Estádio Azul...
Acabo de ler o Gasel, médico benfiquista, a descrever uma alucinante viagem ao futebol acompanhado do Gasel junior. Logo hoje, que estou com uma vertiginosa tendência para me enternecer com estas coisas. Lindo! Só por isso, prometo que não falo em negligência médica até ao ano que vem. Palavra de jurista. E de portista, claro. Entretanto, o
blogue em causa já passou para a lista à esquerda, mesmo sem as consultas prévias da administração.
Esguichos de besugo (IV)
O alonso merece resposta mais adequada do que a que eu hoje lhe vou dar, neste estado miserável em que me encontro. Sim, por uma questão meramente solidária, não faço a barba desde ontem e despenteei-me vigorosamente.
O Alonso detestou, como eu, a morte sumária do Ceausescu e da mulher. Abominou os pontapés que levou aquela senhora romena bem vestida, dados por uns mineiros quaisquer, logo a seguir, em Bucareste. Vomitou com a morte macabra do tipo da Libéria, há uns anos. E com a do aviador israelita que se ejectou, há mais de 15 anos, sobre o Líbano (e foi morto com requintes próprios de canzoada, e passeado nas ruas poeirentas e na televisão do mundo para os filhos, em casa, poderem ver). O alonso lembra-se do linchamento dos dois polícias ingleses, na Irlanda do Norte, em 1988, apanhados que foram a observar as exéquias dum católico do IRA, morto previamente pelos polícias ingleses. E lembra-se de ver imagens horrendas de Mussolini, entre outros, pendurados pelos pés, já mortos mas "ali", a serem escarrados pela populaça.
Os outros mortos, as vítimas inocentes dos
humilhados finais, remetem-me para um bonito filme: "A vida é bela". A morte dos justos, dos impotentes, é muito importante, muito chocante, muito revoltante. Choramos juntos, alonso, a vileza dos vilões e a tristeza dos pobres, seja em Cuba, na Alemanha, no Iraque, na Argentina ou no Chile. Eu sou homem para chorar onde tu quiseres!
Mas a imagem dum homem humilhado não devia vender-se, quanto mais mostrar-se gratuitamente. Se um dia os americanos de juízo decidirem que Bush é um assassino imbecil e decidirem aplicar-lhe sevícias públicas e televisivas, eu juro-te pela saúde dos meus filhos que te repito isto sem retirar uma vírgula.
Eu espero que o Fidel, que é o velho e despótico líder dum país pobre, não seja apanhado com vida por americano nenhum, por cubano nenhum, por homem nenhum. A menos que me prometam que a populaça inteira se vai transformar, definitivamente, em povo. E até te digo mais: que me assegurem que os iraquianos colaboracionistas vão ser desmascarados pelos iraquianos genuinamente descontentes (ah! Pétain! vives ainda, cão francês! residente, agora, no Iraque!). E que ao Fidel, a ser apanhado em vida, não lhe desfarão a barba, não lhe darão banho - não tem ar de precisar, até o Saddam tem um ar limpo, embora desleixado, quanto mais o Fidel! - nem o cercearão da liberdade de continuar a fumar charutos "hechos en Cuba", e não "made in Bushy and bloody Blairie homeland!". Prendam-no, julguem-no, mas não o exibam derrotado. Sobretudo não divulguem imagens de matarruanos do Massachusets mascando insolentes chicletes a grunhir "Eu disse-lhe (ao caralho do iraquiano da merda!) que lhe apresentava os cumprimentos de G.W. Bush!". Os cumprimentos dum lorpa? Apresentados por um alarve de capacete? A um homem acossado? Baril, bués, fixe. Viva a vodafone! Duh!
O problema não é meu. É de quem pretende encontrar alguma pedagogia neste "cinema" degradante, baratucho, de pacotilha. Isto é apenas triste.
Eu e o alonso estamos de acordo. Mas ele nunca o admitirá, até porque não tem televisão em casa.
Ponto de Ordem
Este recanto de prosas e lamentos está a ganhar laivos de ditadura do proletariado em que se decide por voto de braço no ar a admissão de novos membros ou quaisquer outras decisões de relevo para o quotidiano do blog.
Então, para que servem as reuniões do Conselho de Administração?
Basta um qualquer iluminado, entre duas goladas de conhaque, lembrar-se de propor uma qualquer mudança nas regras da cubata e
…”cá vai alho”, estica-se o bracito à moda das UCP’s alentejanas e está tomada a decisão.
A ser assim, o Sr. Dr. Vaz Guedes ainda agora estava a percorrer as obras que a SOMAGUE tem por esse país fora, perguntando aos seus funcionários se devia ou não
internacionalizar a empresa que é como quem diz, vendê-la aos espanhóis.
Os mais desatentos poderão pensar que isto é culpa do conhaque mas não, é apenas mais um tique da coloração rosada, ou até mais para o avermelhado das guelras de um certo besugo.
E a Lolita, na sua boa-fé, deixa-se levar na onda, ela que até está habituada a ver as ondas no Molhe e já devia conhecer de ginjeira as ondas besugais.
Portanto, e para terminar, para a próxima é favor marcar com a devida antecedência a competente reunião do CA em que serão debatidos os assuntos constantes da respectiva Ordem de Trabalhos, sendo os intervalos aproveitados para mais umas goladas no conhaque ou outras libações apropriadas.
P.S. Com tudo isto, não ponho em causa o elevado calibre estético da escrita do novel bloguista, mais a mais, tendo sido relembrada a sua admissão por este que vos escreve.
Deixo desde já um desafio quanto ao nome que irá o dito adoptar mas, em se tratando de espécime oriundo das serranias do Douro Sul, em que correm regatos cristalinos onde nadam peixanitos ariscos, proporia chamar-lhe
el rabeco.
Imagens que ficam
O Saddam na versão "velhinho desamparado, miserável e sem abrigo" (não obstante ter abrigo e 750.000 dele consigo) lembrou-me as imagens finais do Ceausescu e da mulher. Um casal de velhos, à mercê dos algozes impiedosos que sumariamente os fuzilaram.
Suponho que o mesmo acontecerá ao Fidel, se vier a ser derrubado e apanhado em vida (como espero). A alternativa a estas imagens é a do funeral majestático, da mumificação e do mausoléu próprios de quem se julgou dono e senhor absoluto de vidas e pessoas que sob o seu jugo viveram e sofreram, ou morreram.
São, de todo o modo, imagens fortes. Por momentos, olhamos para elas e temos pena. Estranha pena que sentimos aqui, quando a não sentimos perante as imagens das caveiras e ossadas das suas vítimas. Suponho que faltam olhos às cavidades orbitais, barbas aos maxilares e que, assim, não sentimos o incómodo de ver do lado de lá um ser humano, que pode devolver-nos o olhar.
O que nos faria perder a pena perante a imagem de ditadores apanhados? O ar marcial dos nazis que foram apanhados a tempo do julgamento de Nuremberga? O cabelo branco impecavelmente penteado do Pinochet? A verborreia e a postura desafiante do presidente da Sérvia? O simples facto de estes nunca terem sido filmados na situação, ou com a aparência, de velhos desamparados?
É tudo uma questão de imagem? Talvez. Talvez sejamos assim, vivendo na nossa cabeça o que os nossos olhos comem. E talvez, então, fosse melhor que os EUA tivessem tido cuidados cosméticos, e não publicassem aquelas imagens do Saddam. Primeiro proporcionavam-lhe um banho, davam-lhe uma das fardas dele, cortavam-lhe a barba e o cabelo (e penteavam-no) e "last but not least", davam-lhe um charuto retemperador. E só depois o filmavam, na pose orgulhosa e marcial que menos nos impressionasse.
Mas, por outro lado, a verdade é que aquelas imagens eram mais urgentes para outro público que não o ocidental, tão cheio de complexos de culpa "civilizacional". Eram urgentes para os ex-súbditos de Saddam, para os seus ex e actuais seguidores, e para os que, nada tendo que ver com ele, são inimigos de quem o prendeu. E, para esses, o ar "clochard" do Saddam não causa pena (causará quanto muito desprezo) nem muito menos faz dele "mártir da causa".
A verdade é que são estas as imagens que ficarão para a posteridade, como ficaram as do casal Ceausescu, como ficaram as de Nuremberga, de Pinochet e de muitos outros.
Para finalizar: nem cá venho mortificado, nem cá venho de quinze em quinze dias, nem cá venho em cumprimento de promissórias. Venho quando me apetece (e apetece muitas vezes) e escrevo quando tenho alguma coisa para escrever (e tenho menos vezes). E se me chateiam muito vou à Régua e ao Porto partir-vos os bibelots.
Para finalizar2: Vem aí peixe fresco. Se preza a amizade, a mais importante das qualidades que são apresentadas como seu cartão de visita, uma recomendação apenas: Não seja lírico como o besugo, não interprete a excessiva e enlevada contemplação de um molhe (local em que o mar bate e baterá até ao fim dos tempos) como algo de necessariamente saudável e ... seja bem vindo. Faço votos por que tenha inúmeros complexos de esquerda, para que a minha escassa vontade de escrever se agigante e eu deixe de ler "remoques" à minha mortificada intervenção neste blog.
Parcialidades
Sempre gostei de pessoas, ao contrário doutras gentes que se renegam na interposta negação de si.
Dei um passeio e li
isto. Chama-se "Apanhado". Gostei. Manifesta respeito, aquele respeito indispensável e benigno, que deve ser sagrado. E mantido, até por quem não tenha feito grande coisa por merecê-lo.
Besugo
Claro que tens o meu voto. O do Paco podia ser impugnado, vistos os conhaques, e o do Alonso deve ter sido falsificado (como terá eventualmente acontecido no teu iconizado kremlin), dado que o homem anda sempre fugido... Mas deixemos assim, que é por uma boa causa. Diz ao novo inquilino que terá um período experimental inversamente proporcional às linhas que escrever e que lhe garantimos liberdade de expressão, excepto se disser mal do Porto. Falo da cidade, bolas! E que, se conseguir ser citado pelo MRS no telejornal, terá direito a lugar na administração. No restante, ele que entre sem cerimónia e que esteja à vontade. Nesta tasca, contrariamente à outra de que falas, toda a gente fala que se desunha e ninguém tem razão (ou cada um tem uma parte dela); mas acreditamos na lealdade e prezamos, incondicionalmente, os amigos. E um amigo teu só pode ser um excelente peixe. Quando souber de que espécie se trata, dar-lhe-ei as boas vindas.
Lolita
Se estiveres de acordo, que tu é que mandas aqui na cubata, teremos em breve um novo colaborador. O Paco, entre conhaques, babujou que sim. O Alonso aplaude a mãos ambas (assim pode vir aqui só de mês a mês, em vez de ter aquela obrigação quinzenal que muito o mortifica).
Que dizes?
O homem é de estilete afiado e não é de se render sem luta... ao contrário de outros que todos nós conhecemos doutros sítios, ainda hoje vimos isso numa tasca mal frequentada, reparaste?
E é duma candura encantadora, acredita em coisas cretinas e antigas como a lealdade e o ser-se amigo. No fundo, aquilo que acaba por unir quatro tarados e um simples besugo...em qualquer mar de jeito.
Repito: que dizes?
Porque hoje é domingo
Fui ver os meus filhos a jogar andebol. São muito bons, dois pivots de relevo nos infantis e nos iniciados duma das equipas cá do burgo. Nenhum deles é o "craque" das respectivas equipas, mas ambos são excelentes companheiros e, muitas vezes, decisivos. Ambos virtuais vencedores do torneio de abertura do distrito de Vila Real. Encantadora criançada. Lá vão todos, com os pais de arrasto, dirimir as pequenas-grandes forças que têm, uns contra os outros, uns com os outros. Têm piada. Aceitam a pedagogia dos árbitros federados, os conselhos dos treinadores. E gostam de ter 100 pessoas a vê-los fazer força das fraquezas. Bom início de dia. Até o sol saiu, fugaz, do nevoeiro.
Depois soube de fonte histérica que prenderam o Saddam, um vilão. E o meu dia estragou-se um pouco. Não pela prisão dum vilão, mas pela alegria alarve dos vilões que o prenderam. Pior do que um vilão é um alarve contentinho. Eu acho. Encontro potencial vileza em qualquer alarve sorridente de si. E sustento que um vilão potencial, envergonhado, é pior que um vilão assumido.
No fim do último jogo de andebol o Zé Pedro, que é o meu mais velho, perguntou-me: "É verdade que prenderam o Saddam? O Manel Pedro estava ali a dizer que sim.... ". Eu disse-lhe que sim, que o tinham apanhado. E o Zé Pedro, iniciado de andebol e da vida, disse-me assim: "Oxalá não o matem, que não o tratem mal, coitado...".
Compôs-me o dia. Nunca fui de fazer hinos de júbilo nas barbas maltratadas de nenhum homem derrotado. E revi-me no meu filho como nunca. Coitado dele.
São feitios.
História de encantar
Esta manhã, ouvi na TSF um americano a declarar, triunfante,
"we got him!" com aquele típico sotaque anasalado dos
boys from america. Soube, então, que a sua audiência, presumivelmente cheia de defensores da democracia e dos direitos fundamentais dos iraquianos, gritou histericamente de alegria pela boa nova. Que bom. Logo agora, durante a quadra natalícia, temos a exultante notícia de que o eixo do mal está mais fraco. O Natal dos democratas solidários de todo o mundo há-de ser, este ano, mais feliz porque Saddam, que nas fotos aparece agora com aspecto de
homeless ou, para quem quiser fazer dele um herói da resistência, com pinta de guerrilheiro sul americano, foi finalmente capturado. E os ditadores, como ele, têm sempre o tratamento que fizeram por merecer. Já se fala de pena de morte. Todos os maus, como acontecia nos filmes de cow-boys, hão-ser,
sooner or later, apanhados e castigados. O bem triunfará, mas só para quem estiver do lado do bem. Ou do lado do Bush, por outras palavras. Nunca o mundo esteve tão próximo de se tornar um lindo conto de fadas.
Quem peixe procura...
Ó besugo! Há uma
abrótea na blogosfera!
Curiosidades
Li há pouco uma frase qualquer sobre a rusticidade e o empirismo de que serei carente. Estes mimos, seguidos de um "bem hajam", lembraram-me uma cena desta semana, que me alembrou do rústico e empírico peixe que habita este blog. Bem haja.
Por razões absolutamente desinteressantes para a comunidade bloguística, fui forçado a estar com uma pessoa que mal conhecia cerca de meia hora, enquanto ambos esperávamos outrem. Nessas circunstâncias, a urbanidade, sobretudo a dos rústicos, obriga-nos a encetar o que vulgarmente se chama de "conversa de crcunstância".
As mais das vezes, começa-se pelo tempo, por comentários ao local físico em que nos encontramos, e de seguida tudo depende: pode ser um martírio, mas também pode ser um prazer.
Neste caso, foi verdadeiramente um prazer. O meu interlocutor era um homem de avançada idade, e essa idade conferia-lhe o "à vontade" que só têm pessoas de idade que vivem aparentemente contentes com o seu presente e com o seu passado, sem qualquer espécie de acabrunhamento "de velhotes". Um homem bem disposto, com um modo de falar franco e muito vivo, e com muito que contar de uma vida recheada de muito mais do que aquilo que eu ali fiquei a saber. Viveu, casou, teve filhos e trabalhou em Angola desde muito jovem, terra a que continuava evidentemente ligado - e para onde alguns dos filhos voltaram entretanto - fugiu, depois da independência ("fiquei até poder, acredite ... mas já não podia mais!") por caminhos inenarráveis para a África do Sul, onde não ficou muito tempo ("aquilo não tinha que ver comigo ...") e depois foi para Espanha, País da mulher e que é também o seu por adopção. Voltou no entanto a Portugal ("... tinha cá as filhas ...") e vive hoje entre Lisboa e Madrid, pelo que percebi sem grande "parança".
De Portugal diz apenas que é a sua origem, a terra dos seus Pais e Avós - e portanto sua. Di-lo com um tom indefinível, que não me permitiu perceber se ele admirava Portugal, se realmente gostava do País de nascença, ou se o aceitava como aceitava ser carne da carne e sangue do sangue dos seus Pais e Avós. Como uma inevitabilidade.
Enfim, estou para aqui a discorrer e afastei-me do que me levou a intervir. É que, a certa altura, o Homem - que é arquitecto - começou a discorrer sobre a Arquitectura que se vai impondo pela cidade e sobre o papel (ou falta dele) da Câmara de Lisboa no assunto. Daí passou para o que considerava ser um escândalo: A contratação do arquitecto americano Frank Gehry pelo Santana Lopes. E ... entre outros mimos ... disse isto: "Aquele Santana é um verdadeiro .....
... besugo!"
Soltou-me uma gargalhada, o raio do homem. Bem haja!
Bom fim de semana.
El toro
Espanha tem coisas que não me agradam. Poucas, mas tem. Os
desayunos, por exemplo: não há hostal, parador ou hotel onde a manteiga seja manteiga e não margarina. E há os
platos combinados, que sabem sempre ao mesmo. As
patatas, que, quando fritas, são das congeladas. Os
postres compõem-se quase sempre de
leche frita e de
sortido de helados. E o abominável café, que nos enche de carência cafeínica quanto maior for a estadia (ainda que se tenha o cuidado de encomendar um café
solo), mas que, no entanto, nos permite, a nós portugueses, afirmar gloriosamente, na nossa subjectiva e pequena vaidade, que pelo menos(!) o nosso café é melhor do que o dos espanhóis. E depois há as odiosas estâncias de férias da costa mediterrânica, que quase sempre tomam designações toponímicas
tropicalientes, portanto pirosas, do tipo "aguadulce" ou "isla bonita", aquelas estâncias que nos panfletos turísticos são propostas como "beautiful spots" plenos daquele ambiente pimba que ficou famoso com o "The Love Boat", essa inesquecível série de televisão em que as mulheres se riam muito e vestiam roupas de lantejoulas, os homens tinham grandes patilhas e usavam smokings espalhafatosos com camisas de rendinhas e tudo soava vagamente imbecil, embora doce. É nesses paraísos turísticos, tão procurados por portugueses pouco cautelosos e pouco exigentes, que os hotéis promovem festas nocturnas onde a animação é assegurada por manhosos conjuntos musicais cujo vocalista imita a voz do Tom Jones ou do Frank Sinatra com aquele inconfundível e saboroso
british accent que só os espanhóis conseguem dar à língua inglesa. Experimentem pôr um espanhol a pronunciar a palavra
spice, por exemplo.
Mas eu gosto de pensar que essa profunda inabilidade dos espanhóis para as línguas estrangeiras é um mero corolário do orgulho - exacerbado, enfim - na sua pátria. Eles, os espanhóis, amam genuina e irracionalmente a sua Espanha. Veneram e acarinham o rei e todo o infantado, os seus ícones agregadores da nação, semana a semana refrescando essa idolatria na salerosa
Hola!, que vende e promove uma Espanha sentimental, febril de emoções primárias feitas de devoção pelas Rocios, Carmens e Lolas famosas e belas, todas berrantemente vestidas e maquilhadas, desabafando as suas vidas difíceis em que o amor apaixonado por um qualquer
torero dá lugar, quando acaba, a um profundo desgosto que mostram, sem qualquer pudor (ou, talvez, pensando bem, com sentido de estado) em fotografias
close-up que enchem os corações das espanholas comuns e anónimas de solidária dor. Espanha tem muita cor. Tem as cores das telas de Picasso, o vermelho dos filmes do Almodovar, que tão habilmente satiriza todo esse
kitch espanhol ao mesmo tempo que o depura e o torna admirável e sedutor, o amarelo quente da vasta e rude
Extremadura onde D. Quijote cavalgava o seu rocinante. E tem a poética e histórica Andaluzia dos vizires muçulmanos, do quase mítico Allambra e dos grandiosos Alcazares. E do sevilhano flamenco, chorando de raiva, nunca de baça e conformista tristeza. Espanha, ao mesmo tempo una e antagónica, tem românticos independentistas bascos, cidades desenhadas com humor e génio gaudiano,
plazas mayores, tapas, movida, noites longas, história, carisma, pensamento, sentimento. Eu vejo-a assim, quente e colorida, forte e imponente como
el toro que, desde criança, me habituei a procurar sempre que percorro uma qualquer
autopista. Há poucos anos, comprei finalmente um pequeno mas fiel simulacro do verdadeiro, que coloquei junto ao pexixé, como na música do Rui Veloso. Um
recuerdo de Espanha, pois.
Douro I
Quem, por estas alturas, percorrer os caminhos do Douro arrisca-se a dar de caras com algumas das mais poderosas imagens que esta terra tem para oferecer.
Hoje, que tive de ir até Vila Nova de Fozcôa, uma vez mais realizei que hoje o Douro só de homens é fraco, tal a pujança da paisagem, a riqueza das cores, o vergar a que a Natureza se obrigou para dar corpo aquela a que Torga chamou a mais séria realidade de Portugal.
Dos mortórios de Gouvinhas e do Ferrão, às vinhas tiradas a régua e esquadro da Quinta do Seixo, aos geios espaçosos da vizinha Quinta da Corte, subindo o rio Torto até aos altos fraguedos da Pesqueira, terras do Marquês de Soveral e do Senhor Salvador do Mundo de onde se avista a Valeira, aos amendoais de Vilarouco e por fim às terras de vinho e de azeite do Douro Superior.
Dizia o fadista que
Tudo isto existe, Tudo isto é triste, Tudo isto é fado.
Por mim, apenas digo que tudo isto é Douro.
E mais triste que o Douro de hoje, só a triste e fraca figura de alguns cavaleiros que, podendo, não querem varrer de vez a tristeza que perspassa por todo este pedaço de mundo e que só não impressiona quem nunca a sentiu de perto.
E, apesar de tudo isto, quando regressei, tinha em mim uma sensação de esperança (que, pela côr, cheguei a atribuir à besugal convivência...) mas que percebi surgir apenas da certeza de que o Douro, rio e região, é torto como um arroxo e há-de, no momento certo, zurzir sem dó os lombos daqueles que o tentam levar ao degredo.
Almanaque do besugo (I)
Decidi encetar, hoje, uma espécie de almanaque. Acordei razoavelmente bem disposto, como de costume, e logo se me afigurou necessária esta contribuição educativa. Pensei: “ó besugo, tu podias partilhar tanta coisa com a blogosfera!”. “Pois podia, pois podia!”.
Brotou-me logo a ideia para o meu primeiro ensinamento. Espero que vos seja proveitoso, sobretudo à lolita, ao paco, ao alonso e ao kaneko: são pessoas de grande e fervilhante actividade cerebral mas sentem dificuldades manifestas quando chamados a intervir em situações pouco diferenciadas, em que é necessária uma certa rusticidade e um empirismo que só a vida campestre ensina. Bem hajam.
A pesca do sargo:
1 – A geografia do sargo
Para pescar um sargo é necessário colocarmo-nos em locais onde eles, os sargos, existam de facto. Tentar fazê-lo em outras geografias pode ser compensador, do ponto de vista “fui aos sargos mas não deu...”, mas dificilmente se conseguirá comer um deles sem passar pela peixaria.
O sargo é peixe de mar e há, de facto, muito mar para pescar sargos. Contudo, eles pescam-se bem nos Açores, porque se concentram ali, junto à doca de Ponta Delgada, apenas pelo convívio saudável que mantêm com as anchovas e pelo prazer que qualquer sargo sente na sonoridade do sotaque micaelense.
2 – Preparação psicológica para o sargo
Bastam quinze minutos de concentração. O sargo não é muito elaborado e alguns minutos de perplexidade contemplativa são suficientes para o pescador se penetrar do perfil psicológico necessário à sua (do sargo) captura. Para vos dar um exemplo, qualquer equipa mediana da segunda divisão B precisa de metade do tempo para entranhar em si a convicção de que pode ir ganhar ao estádio da Luz.
3 – O material para pescar sargos
Na questão do material é preciso contar com um amigo (ou amiga) que já tenha, de facto, pescado sargos. Ajuda bastante. Esse amigo (ou amiga) encarregar-se-á de tratar das canas, do pão de mistura e do lombo de porco (para o sargo), dos transportes, do farnel (para os pescadores) e dos agasalhos. E não deverá esquecer-se dos anzóis, que, pelo menos no caso da pesca do sargo, são curvos e têm uma espécie de pequena farpa na ponta. Não é preciso chumbo, por isso abstenham-se de armas de pressão de ar. E há quem se muna de camaroeiro (que é uma espécie de cesto de basquetebol tapado no fundo) para a extracção do sargo do seu habitat. O sargo esperneia muito em contacto com a atmosfera.
4 – A atitude do pescador perante o sargo
Deve manter-se uma postura desdenhosa perante qualquer ciclóstomo. O sargo não é um ciclóstomo, é um peixe médio com escamas, mas merece atitude semelhante, evidentemente. Quando não, em se lhe dando confiança, em se lhe mostrando ansiedade, o sargo assume toda uma plêiade de comportamentos zombeteiros, hesitando na investida. Um sargo é um touro aquático. Marinho. Contudo, não é azul.
5 – A atitude do sargo perante o pescador
O sargo tenta ignorar o pescador mas não consegue. O sargo é uma espécie piscícola exibicionista e disfarça mal essa tendência para o vistaço. Não dá saltos aparatosos como a carpa, mas aflora a superfície em trejeitos de artista de variedades. O sargo é uma espécie de Santana Lopes com guelras e ainda menos cabelo.
6 – Nota final
É sempre bom contribuir para o conhecimento. Sinto-me bastante feliz e calmo, ao contrário dos sargos. Pressinto nesta minha profícua “explicação do sargo” consequências devastadoras na fauna sargueira. E o sargo é um espécime dotado de alto sentido premonitório.
Também sei de culinária e voltarei ao almanaque. Não escrevam muitas cartas, que a minha vida não é esta.
Entretanto, fiquem-se com esta interessante ilustração em que se pode ver um sargo segurando dois besugos. Sim, a luta é, por vezes, desigual...
Serenidades
A lolita aconselhou serenidade aos médicos, sugerindo que não a percam quando um jurista lhes fala de negligência. E explicou porquê. E bem, acho eu.
Só que o
Colega colocou a questão noutra vertente, lolita. Ele, como eu, está habituado a formidáveis títulos e mesquinhas entrelinhas sobre "mais um caso de negligência médica", em tudo o que é jornal, rádio ou televisão. A autos-de-fé escandalosamente públicos e impúdicos.
Desde os idos de Leonor Beleza (que, aliás, foi uma das pioneiras artífices da política restritiva à formação de novos clínicos e uma das responsáveis por variadíssimas agressões a médicos no seu local de trabalho, com o seu discurso populista e redutor) que a classe médica se vem habituando a esta ligeireza no (des)trato. Em que não se faz o mínimo esforço para entender (e explicar) a diferença entre o erro e a balda. Parece sempre balda, quando não é. E isso é cansativo e assustador. O que legitima atitudes defensivas.
Eu não defendo aqui (nem o colega defendeu) impunidades. Mas expresso, claramente, que se instalou um espírito de "quase inevitabilidade de culpa" na sociedade portuguesa, que não se esgota, sequer, no erro médico. Estende-se a tudo! E alguma comunicação social, que mais do que dar a notícia pretende, numa lógica interna de lucro, vendê-la, fomenta este estado de coisas.
Os portugueses tendem, nos últimos tempos, para uma espécie de fanatismo de que "a culpa não morrerá, nunca mais, solteira". Parecendo obcecados por um novo dogma:
se algo correr mal, se der para o torto, alguém tem de ter A culpa! E esta predisposição "culpadora" não augura nada de bom, se se mantiver assim, fundamentalista. Porque culpar assim, desta forma inevitável, parece ter algo de "raivoso" e a raiva deve ser passageira para poder ser saudável. Encarada como transitório contraponto aos "brandos e permissivos costumes" de muitos e bolorentos anos, entende-se. E pode ser redentora, progressista, útil. Prolongada no tempo, hiperbolizada, como parece interessar a alguns, num país com cultura de "humildadezinhas" mas sem educação e sem tradição de tolerância, pode ser perigosa. E pouco inteligente.
Erro e negligência
Ó
Sôtor: eu sei (porque o leio) que gosta de defender causas justas e que não gosta de ler dislates, mesmo inconscientes. Sei também que é um facto que os jornalistas, por vezes (muitas vezes), vendem mais do que o que compram. E sei, finalmente, que a tolerância social ao erro, no que respeita à sua profissão, é consideravelmente baixa. Mas essa discussão, no congresso de que fala, há-de ser conduzida por especialistas do Direito e da Medicina e basear-se-á no debate da negligência no contexto da culpa, ambas no sentido técnico-jurídico do termo, sendo certo que a negligência consiste no grau
mais baixo da culpa, nesse mesmo sentido. Repare: quando um jurista fala em negligência não está a chamar relapso a ninguém, muito menos num sentido moral; pode até estar, de facto, a desagravar substancialmente o grau de culpa de um dado comportamento. E se há casos de erro médico que configuram negligência, outros existirão em que nem sequer existe culpa e, consequentemente, responsabilidade. Isto tudo para lhe dizer o seguinte: o Público
não errou ao falar de negligência, porque na generalidade dos casos só existirá responsabilidade civil ou criminal do médico se se demonstrar ter existido uma conduta negligente da sua parte. Ou, por outras palavras: os casos de negligência esgotam
quase todos os casos de responsabilidade dos médicos (naturalmente, no exercício da profissão).
Dito isto, faço votos que o Sôtor passe a encarar a expressão
negligência médica com mais serenidade.
Template
A lolita esteve aí abaixo a dizer que gosta de cinzentos. Foi o que ela disse, pois foi, que eu fui ver. Antes da goma arábica, falando do Aviz.
Eu admito que não sou de ter inveja assim às pontinhas, como ela. Sou invejoso duma forma quase intestina. Eu estou a escrever isto às patadas no chão!
E que raio é template? Parece o imperativo dum verbo castelhano...
Goma arábica
Com uma pontinha de inveja, devo dizer...
... que o
Aviz passou a ter o mais bonito template de toda a blogosfera. Um caso exemplar de harmonia da forma com o conteúdo. Parabéns ao
Adzivo.
Aos que pedalam demais
O besugo insistiu para que eu lesse atentamente o link que está no post das lembranças. E valeu a pena. Descobri, entre outras coisas, que o Joaquim Agostinho nunca teria sido o que foi se outros não se ressentissem do seu talento. E não, como se convence o besugo, porque se iniciou no Sporting.
Liquidação total
Isto de a gente se meter com besugos, ou outros peixes, dá sempre no mesmo.
Escorregadios que são, acabam a escapar-se-nos por entre os dedos.
E este particular espécime é especialmente deslizante e sinuoso.
E, como o besugo muito bem não quis entender, a única coisa que eu não chamei a alguém foi tumor.
Acho apenas que a certas pessoas se deve dar o devido desconto.
Umas vezes menor, outras vezes maior. A roçar a liquidação total.
Lembranças de besugo (III)
O cromo do meio, provavelmente o que mais fortemente ficou colado à caderneta, com a cola do tempo, foi este:
Na minha memória ficou um homem rústico, "rijo duma cana", que caía e se levantava. Mesmo no dia em que morreu se levantou.
E o resto da história dele está
aqui, por exemplo.
Reli o Paco
E não é que, indubitavelmente, é que não há mesmo volta a dar-lhe (a menos que edite, o sacana do Paco!), chamou tumor ao ministro da defesa!?
Tumores
Se o Mário Soares é um placebo, não é um tumor. Disseste tu, muito bem.
Estás a chamar tumor ao ministro da defesa, Paco?
Viste a luz?
De que cor é?
Independentemente do que tu digas, Paco, digo-te eu: se é tumor não sei, mas é maligno. E furta-cores.
Conversas privadas
Diz o povo com a sabedoria que se lhe costuma atribuir que "entre marido e mulher não metas a colher".
E, digo, eu, que em conversas entre pai e filho, não se deve meter o bedelho.
Mas o besugo não me vai levar a mal que eu meta aqui o meu bedelho, apenas para dizer que se tivesse sido comigo o Mário Soares tinha ficado sem resposta.
Apenas porque os tumores, e disso sabe o besugo, respondem à radioterapia e à quimioterapia, e o Mário Soares quando muito será um placebo (assim tipo Sargenor), apenas com uma
corleonesca arrogância que lhe dá o pretenso direito de desfiar barbaridades a seu bel -prazer.
E a idade (ou a falta dela) não é desculpa.
Olha, Pai
O ministro da defesa, aquele senhor que tu também não gostas, veio dizer que tu és um homem do passado. Eu sei que tu não és o Mário Soares, nem a Mãe se chama Maria. E sei que o ministro da defesa nem sequer te conhece. Mas quando se responde "sobre" alguém como o ministro da defesa respondeu hoje "sobre Mário Soares", quando se justifica e desculpa (ironizando) o que quer que seja com "o passado", com "a velhice"... esmifra-se o passado até ao esqueleto e achincalham-se velhices, acabamentos, finais de vida.
Olha, Pai, nem ligues. O ministro da defesa não deve ter nada de jeito no armário da memória.
Ele renegou o Pai dele, no fim de contas. O próprio Pai, que o Mário Soares nem é para aqui chamado. Pensa bem.
Amor e Sexo
Amor é um livro - Sexo é esporte
Sexo é escolha - Amor é sorte
Amor é pensamento, teorema
Amor é novela - Sexo é cinema
Sexo é imaginação, fantasia
Amor é prosa - Sexo é poesia
O amor nos torna patéticos
Sexo é uma selva de epiléticos
Amor é cristão - Sexo é pagão
Amor é latifúndio - Sexo é invasão
Amor é divino - Sexo é animal
Amor é bossa nova - Sexo é carnaval
Amor é para sempre - Sexo também
Sexo é do bom - Amor é do bem
Amor sem sexo é amizade
Sexo sem amor é vontade
Amor é um - Sexo é dois
Sexo antes - Amor depois
Sexo vem dos outros e vai embora
Amor vem de nós e demora
Rita Lee / Roberto de Carvalho / Arnaldo Jabor
Parece-me mal
O Paco defende com pundonor que o ministro Arnaut poderia ser o
quinto Beatle. Eu não digo que não, mas acrescento que a ministra Ferreira Leite, se tivesse melhor cabeleireiro, se fumasse e se tivesse talento musical, não seria muito mais feia que o Keith Richards.
Se eu encontrasse um ministro que me lembrasse, vagamente que fosse, o Elvis Costello... estavas tu bem tramado, ó Paco!
Eu bem lhes digo...
Com a devida vénia ao
Médico, mais uma vez dou largas ao meu fundamentalismo empedernido e continuo a dizer: "Não vou ver ninguém ao IPO".
E pronto!
Lembranças de besugo (II)
O meu Pai faz hoje 71 anos. Foi passar dois dias à Póvoa mas há-de chegar ao fim da tarde, a tempo do abraço. Pode ser que me traga um bocadinho de mar e de nortada, que o ar, aqui, vai de cieiro seco.
Há muitos anos atrás levou-me a ver o Sporting, que jogava em Guimarães. Eu nunca tinha visto nenhum jogo do Sporting, só aqueles resumos televisivos a preto e branco, sem repetições em câmara lenta.
Nesse dia vi a cores e o jogo inteiro.
O Sporting ganhou. Jogava o Damas e este senhor argentino que o meu Pai me disse que "era o melhor de todos a seguir ao Damas". Chamava-se Yazalde, o "Chirola"; e morreu novo.
O meu Pai é o primeiro cromo da caderneta
"porque raio sou eu assim e logo sportinguista", que sempre guardarei com zelo e há-de ficar para os meus filhos. O Yazalde foi o terceiro. Falta um no meio, mas eu logo conto.
Parabéns, Pai.
Só fala de orelhas...
Segundo o
Público, Washington partilha as dúvidas da
OSCE sobre as eleições na Rússia.
É preciso ter lata, depois da palhaçada das eleições na Florida, vir atirar pedras aos telhados que nem dos vizinhos são.
Ministério pop
Este Governo tem sido uma fonte de surpresas, não tanto pelas suas acções governativas mas por se ter tornado um caso sério de composição idiossincrática. Senão vejamos:
Temos um PM que poeticamente empeixou e se transferiu da lota de Sesimbra para o Palácio de S. Bento. O Homem Invisível está à frente do Ministério da Cultura, a Catherine Deneuve a fazer de Ministro de Estado e da Defesa, um ex-boxeur seguidor do DeNiro de "Raging Bull" na Presidência e o Nosferatu nas Finanças.
Para o elenco ficar completo só faltava mesmo um personagem de que há décadas se falava em segredo mas cuja existência nunca foi provada. O 5º Beatle.
O ministro Arnaut é sem dúvida o elemento que faltou aos
Fab Four para levarem a uma histeria ainda mais completa as
teenagers incoscientes deste mundo.
O homem tem todas as qualidades que fazem dele um ídolo das multidões, um corte de cabelo a cobrir a orelhita, o narizito adunco a la Ringo, um ar vagamente distante de quem sabe que é bom, enfim um Beatle perfeito. E, mais a mais, as cachopas caem que nem tordos quando ele passa.
Ainda vamos vê-lo, em alguma inauguração por esse País, com uma peça de
lingerie atirada por alguma moçoila mais entusiasmada.
Com estes predicados e a dar a música que o ministro dá aos portugueses isto só pode estar bem encaminhado. que o digam os trabalhadores da Docapesca e os lavradores do Douro.
Contra o mau feitio
Sobre rodas
Duas mulheres, uma aparentando longa idade, outra menos; talvez sessenta e alguns. Esta última, forte e corpulenta, como as poveiras. E um homem, já bastante idoso, talvez marido da primeira, transportado em cadeira de rodas pela corpulenta e, talvez, poveira segunda mulher. Já os tinha visto, aos três, ao longe, enquanto esperava, resignada e de cabeça encostada ao vidro, numa enorme fila de carros, naquelas ocasiões em que, por pura indolência, se fixa o olhar em qualquer coisa que mexa e que nos estimule o miolo no seu limiar mínimo. A TSF vomitava histericamente o relato do Sporting – Estrela da Amadora, de forma que assisti, em directo, a dois golos do Sporting. E então vi-os fazer menção de atravessar a rua entupida de trânsito. Sem problemas, atravessaram metade. No meio, havia um passeio separador das duas vias que compunham a rua. E foi a mim, que estava na segunda via, que coube parar, como me impõe o Código da Estrada (embora de forma redundante), junto à passadeira. Sucede, porém, que alguma construtora inimputável se esqueceu de fazer, no dito passeio separador central, a indispensável rampa destinada a estas situações. A segunda mulher, a corpulenta (que, por essa altura, eu já tinha decidido ser poveira), bem se esforçou por levantar a cadeira de rodas: mas esta, por efeito do peso do corpo transportado, manteve-se irredutível. Isto passou-se em muito mais do que uma dezena de segundos, mais tempo, portanto, do que seria expectável para a travessia e, portanto, do que seria normal para a paciência de todos os envolvidos. A dada altura, o idoso senhor, agastado e com expressão de suprema irritação, levantou-se de um salto da cadeira e calcorreou vigorosa e rapidamente a passadeira de peões, em muito menos segundos do que os que consumiram a tentativa falhada de o transportar
on wheels.
Esclarecida a aparente inexistência de incapacidade física, fiquei eu a pensar que mesmo os mais afortunados têm os seus dias menos bons. E, se calhar, a esposa era afinal a corpulenta.
N'O Independente
Caro Gabriel: hoje cheguei tarde ao Café Moreira (que, estranhamente, ainda não tem site na Internet!) e, como é costume, pedi que me emprestassem o Público, que já estava esgotado. Sugeriram-me “O Independente”. OK, seja. Também era isso ou “A Bola”… Enfim. Em todo o caso, tentei passar à frente os artigos mais suspeitos e encontrei um que me permitiu saber pormenores do verniz que estalou em Guimarães. A ser verdade, duvido que isto se passe até na Colômbia! O Vitória de Guimarães é proprietário (e possuidor) do estádio desde 1990, sem que tenha, até hoje, registado a aquisição. E a edilidade vimaranense, em 2002, apresentou-se como proprietária do estádio quando solicitou financiamento para as obras, juntando ao processo certidão de registo predial. Doze anos depois de o ter vendido, por escritura pública, ao clube. Está tudo
aqui.
O belo e a monstra
Como sempre faço aos Sábados, procurei no
Público a crónica semanal do meu
ódio de estimação, que hoje fala no
barnabé a propósito da polémica sobre a Odete Santos mais as suas incursões no teatro de revista.
Parece tão claro. Enquanto uns, do lado oposto da barricada, perfidamente o acusam de misogenia, egocentrismo, passadismo bacoco (disto acuso eu, confesso, e nem me barriquei), rentabilizando o mais que podem os proveitos de um seu "mau passo",
Daniel, o postador, esbraceja, chafurdando em águas que ele sabe serem movediças, justificações densas e já longínquas da singela fotografia da Odete Santos que inicialmente originou a porrada virtual e, agora, real. Até o Anjo Azul e a Marlene ele foi buscar. Ó Daniel, você admita lá de uma vez que deu um fatal tiro no pé quando postou aquela fotografia e trate de usar os seus abundantes neurónios (que os tem) e o seu verbo torrencial (que costumo ler) para outros temas. Tudo se esquece, mas você tem de ajudar. Senão, digo eu: oitenta anos para isto?
Contas e tenções de besugo (I)
Tenciono assistir ao Barcelona - Real Madrid, esta noite.
Amanhã, às seis da tarde, o Sporting vai jogar na Amadora. Conto, também, assistir a este desafio. Que o Sporting vai vencer, segura e duvidosamente.
Conto (e tenciono) mais coisas "para a minha vida". Mas aos desafios que referi posso assistir sozinho. À minha vida é que não quero limitar-me a assistir. Muito menos só.
Eu não quero ser como um filme fraco do falecido João César Monteiro. Não quero coleccionar pintelhos, nem telas escuras. Eu quero muita luz, muito calor.
Lembranças de besugo (I)
Quando Sá Carneiro morreu, de "morte trágica e acompanhada", eu
besugava pelo Porto em ânsias de ser médico e de ser gente. A morte é sempre trágica, nem sempre se morre acompanhado e quanto ao resto, onde
besugava eu, é irrelevante para o mundo inteiro. E ainda hoje continuo a tentar ser médico e a perseguir ser gente. Donde se deduz, com trasmontana simplicidade, que o único facto relevante deste intróito é a morte do
pequeno advogado narigudo e acutilante do Porto.
Mas para mim não basta. Sem nunca ter sentido fascínio especial pela personalidade política de Sá Carneiro, afigurava-se-me "romanesca" a sua passagem contestatária pela Assembleia Nacional, a sua faceta emocional de homem mundano (no melhor sentido, amorável mas nunca imoral) e lutador. E vilipendiado, que acredito que o foi.
Para além disto, vinham-me lufadas de "Sá-Carneirismo" da casa paterna, onde, ainda hoje, o tema
"Sá Carneiro - a vida e a morte" não é pacífico, fazendo-me nutrir pelo pequeno-grande estadista genuína simpatia.
Acresce, senhores, que eu vivia no Porto. Ainda hoje é a minha cidade do coração, habituado que fui, desde pequeno, a "ir até ao Porto fazer compras aos Marques Soares", que era onde se abasteciam de roupas e pequenos folguedos os funcionários públicos e seus filhos. E aquela atmosfera cinzenta de invernia, aquela calidez de quem se importa, "aquela altivez de milhafre ferido na asa", senti-as sempre como minhas. Mesmo sabendo que me eram emprestadas.
Quando Sá Carneiro morreu eu senti a tristeza da cidade quase inteira e "reequacionei" o homem. Dou-lhe letra pequena, ao homem, que é a que me dou, a mim. E eu não posso dar-lhe mais do que o que tenho. Mas cresceu-me, na "reequação", outra pessoa maior. Percebi que se podia, sem hipotecar honestidades, sofrer pela morte de alguém que nos não pertencesse por laços de sangue ou, sequer, ocasional conhecimento. Entendi a noção de
símbolo quando o meu Pai me disse aquilo que o Mata-mouros admitiu ter desabafado, logo que soube da triste notícia. "Mataram-no!".
Eu continuo a "querer crer" que não o mataram, porque me é mais fácil acreditar num acidente. Os acidentes choram-se, lamentam-se, a gente sofre, mas não "se sofre". A gente não "se sofre" tanto. Sangramos mais quando pressentimos, na morte, orquestração.
O meu Pai adoptaria o discurso saudoso, calmamente revoltado, de quem ainda hoje "sente falta", do
CAA. E eu comovo-me com cada vez mais facilidade, que os quarenta anos são a última barreira da comoção. E cada vez mais pressinto, nos outros, a grandeza que não tenho. Que me impele a persistir na tentativa de ser gente. Ser médico é mais fácil. E já não vivo no Porto, tristemente.
Não há mentiras pequenas
Um senhor farmacêutico, amigo do
Vilacondense, chamou-me
parolo e
nabo. Afirmou que existe uma organizacão de âmbito corporativo na blogosfera formada pelos
médicos blogueiros (citou outros), que logo terão cerrado fileiras e refilado contra uma coisa fantástica que ele, boticário, escrevera e que, pelos vistos, considera inatacável e digna do maior
respeitinho. A extraordinária criatura insinua, ainda, que eu não receito genéricos. Mais grave do que isto, o estimável senhor estabelece mais um postulado brilhante: eu sou um potencial e execrável vendido à indústria farmacêutica e, em vez de vos contar que 15 anos de prática clínica me ensinaram que
Lasix é bom e os outros nem tanto, deveria era fazer um ensaio clínico que o provasse. Insinuando, mais uma vez, que teria excelente patrocínio duma multinacional que ele refere, que me pagaria não sei que benesses por eu ser assim franzino da dignidade. Esquecendo-se que, enquanto eu e os meus colegas pudermos prescrever
Lasix sem que nos alterem a prescrição nas boticas (mesmo nas hospitalares), estamos descansados; e que, depois, veremos. Deitando às urtigas que o óbvio exemplo do
Lasix era, apenas, uma
boutade. Que só ganhava pertinência na tendência generalizadora (e não genérica) do postulado do interposto farmacêutico, que, já agora, vos mostro:
Não há que ter medo Sr. Ministro!
É fácil, eu explico:
O Infarmed garante a qualidade de todos os medicamentos,
O Médico prescreve o princípio activo,
O Farmacêutico disponibiliza as várias opções,
O Doente escolhe.
O vilacondense, ao menos, só me chamou gágá e receitou-me um placebo para me tratar. Já lhe ofereci uma bicicleta, um tandem (e não duas, ó gulosos, assim
mãos largas convosco são os
Mata-mouros, é logo aos pares!). E ficámos cada um na sua razão, julgo eu. Cuido que cada um crendo na boa fé (e na ironia) do outro e na bondade dos argumentos de cada um. Eu não tenho é culpa que o vilacondense se arvore em vitorioso juiz das discussões em que entra. Isso é lá com ele, tem este feitio folgazão e uma auto-estima que não cabe no Estádio dos Arcos, que eu aceito e não me ofende.
"Nabo, parolo, corporativo e corrupto" é mais forte. Nabo e parolo, é como o outro. Eu até já citei o Eça e admiti que posso ser visto como
"pilriteiro que só dá pilritos". Mesmo que isto seja visto lá do fundo de qualquer botica, admito que seja notório.
Agora corporativo e corrupto,
senhor farmacêutico? Não sou, não senhor. Eu fui ler o seu blogue e, lá porque o senhor confessa que se empiteira às vezes, com os amigos, não tirei daí nenhuma conclusão geral, definitiva e pesporrenta, sobre a sua lucidez habitual. E é por lhe atribuir clarividência e responsabilidade nas suas afirmações que lhe repito: não sou corrupto nem "corporativista". E concluo, baseado nisto, que o senhor é, pelo menos às vezes, mentiroso.
E, retomando Eça, a menos que se desdiga, considere-se portador de virtuais bengaladas nesse boticário lombo.
Os Miseráveis de Maio.
Vou mudar-lhes os nomes, mas nem seria preciso. Ninguém os reconheceria pelo que vou contar.
O Martinho tinha 42 anos e era um antigo polícia. Compulsivamente reformado, depois de lhe ter sido apurada culpa na morte de outro homem, anos atrás. Ainda alegou legítima defesa, o assaltante que tentava dominar ameaçara-o. Mas a Justiça decidiu que dois tiros fatais, desfechados por Martinho na cabeça do outro, mais pareciam ataque deliberado. O falecido apontara-lhe arma branca ... e a dois passos...
Martinho, aliás, já perto do fim, acabou por me contar tudo. Quando as nossas conversas eram mais frequentes, prolongadas e íntimas. Por causa do seu sofrimento e do meu. Maior o dele, porque estava a morrer, lentamente, o mais leve e lentamente que eu podia, dum cancro no estômago. E eu, mero comparsa, não estava. Contou-me que matara o outro porque tivera medo. E concordava que medo nenhum desculpa a morte de ninguém. E vivia com aquela culpa, havia anos, secando-se por dentro.
Quando soube da doença que tinha, dos tratamentos desgastantes (para mim esperançosos) que iria suportar, julgo que se apercebeu da sua condição de homem a prazo. Somos todos homens e mulheres a prazo, mas ele entendeu, fino Martinho, que o seu era curto. E pareceu-me encarar, desde cedo, a proximidade da morte como um acto de justiça, a punição que lhe faltava para acabar com a culpa e sossegar.
A história do Martinho é mais longa, muito mais bonita do que isto. Mas não cabe aqui, sossega na minha memória, na dos amigos dele, na da família. Enquanto pudermos lembrá-la sossegadamente, como eu faço hoje.
Na madrugada em que o Martinho morreu eu estava de serviço. Coincidência de sofrimentos, o dele infinitamente maior...
É aqui que se impõe falar do Gaspar.
Uma morte angustiada é uma morte angustiante. Impõe perfusões de morfina, que são o bálsamo para ambas as dores, da alma e do corpo, legítimo lenitivo para quem não pode mais. Doses correctas, que esta história é triste mas nunca perdeu beleza!
O Gaspar, meu colega, apercebeu-se do meu drama logo que entendeu o do Martinho. Ficou comigo, ajudou-me na colocação do catéter e na regulação da bomba perfusora e, depois, sossegou-me a vigília. Vigília abençoada: como se uma calma doirada viesse da noite cálida de Maio, ninguém mais precisou da Medicina Interna naquela madrugada. Ficámos ali, falando de tudo e de nada, entre os silêncios. O Martinho dormia, respirando placidamente. Calmando-nos os músculos tensos e doridos. A conversa deslizou para coisas bonitas e o Gaspar, homem sensível, levantou-se, dizendo “venho já”. Quando regressou, trazia-me um presente, com um bilhete que me arrependo de não ter guardado. Rasguei o embrulho, com calma. Era música. O duplo CD dos Miseráveis, que eu não tinha e que o Gaspar, sabendo que eu gostava, havia já muito tempo, comprara para me oferecer um dia. Um dia em que viesse a propósito.
Veio a propósito naquela madrugada, que se estendeu até hoje, atenuada mas sempre viva. Sobretudo quando avivada pela necessidade de a contar.
O Martinho morreu às cinco e meia daquele dia de Maio, tornando a noite mais leve e clara. Como se tivesse decidido antecipar a aurora, no seu clarão de morte.
Nunca mais pude escutar as belas canções do Gavroche, da Cosette, do Marius e do Valjean sem ressuscitar o Martinho, na sua (finalmente) calma despedida. E sem chorar calado. Suponho que se passa o mesmo com o Gaspar , mas nunca mais falámos disso. Como se ambos soubéssemos, em silêncio, que tem de ser assim.
A missa
Intriga-me uma certa moral sectária que se arroga no direito de decidir, através de critérios de miserabilismo e de exclusão social, a que mulheres devia ser legitimado o direito de praticar o aborto, como se fosse possível fixar uma linha de fronteira entre as mulheres que merecem a compreensão alheia por razões sociais e económicas relevantes (sendo certo que seria necessário definir, também, o que se entende por razões sociais e económicas
relevantes) e as mulheres que vivem desafogadamente e que estão, portanto, na posse de todos os recursos suficientes para impedir uma gravidez indesejada, sendo que apenas as primeiras estariam legitimadas a praticar o aborto. Como se a responsabilização do Estado relativamente aos comportamentos individuais dos cidadãos (e a culpa, na sua dimensão moral) fosse, ou
devesse ser (o que é ainda mais estranho), proporcional ao estatuto económico-social. Como se fosse possível distinguir os comportamentos penalmente censuráveis dos não censuráveis pelo grau de acesso aos recursos económicos ou, mais explicitamente, aos programas de planeamento familiar e aos anti-concepcionais. Afirmar que uma tia de Cascais ou uma adolescente violada têm, possivelmente, menos direito a praticar o aborto do que outras mulheres socialmente menos favorecidas não é mais do que defender o arbítrio moral, talvez despótico, que legitimaria o Estado a casuisticamente definir quem poderia praticar o aborto sem censura penal e quem não o poderia por não apresentar uma justificação menos fútil do que uma noite passada no
bas-fond da movida lisboeta. Não tenho simpatia especial por quem, em geral, actua com ligeireza e indiferença em relação às consequências que os próprios comportamentos causem a si ou a terceiros (mesmo embrionários). Mas intrigam-me as pseudo-doutrinas morais aplicadas à defesa da criminalização do aborto, como se se pudesse aprioristicamente definir estatutos morais ou sociais merecedores da solidariedade social e, em consequência, do sancionamento legal. Por mais que pense no assunto, não saio disto: a decisão sobre a prática de um aborto não pode ser participada. É sempre, ou devia ser, individual, porque a ela corresponde a um direito próprio, natural, precedente à lei ou aos costumes. Não é atribuído por decreto; já reprimido, pode ser.
Tudo isto porque estive a ler a
missa, que até me agradou. Em parte, está visto.
Generalizações
Desde as obras do Terreiro do Paço que ficámos definitivamente a saber que em Portugal as construtoras são irresponsáveis, anónimas, inimputáveis.
Clara Ferreira Alves
Eu até tinha esta senhora em boa conta - leio semanalmente a
Pluma Caprichosa - mas afinal também padece da psicose das generalizações. Fico à espera que ela generalize também sobre os clientes públicos das construtoras e os afirme inoperantes, maus pagadores, mal profissionalizados e, sobretudo, anónimos. E, portanto, impunes.
A chicla entranhada
Saí do carro e fechei-o. Com a chave do carro na mão e uma chicla de mentol na boca preparei-me mentalmente para a deitar - à chicla - no primeiro caixote do lixo que encontrasse. E ele ali estava, próximo. Sempre de chave na mão e chicla na boca, abeirei-me dele. É a chicla que devo deitar fora, pensava. Porém, assim que atingi a proximidade suficiente mantive a chicla na boca e deitei fora a chave. Raios. Mas há sempre uma primeira vez para tudo, enfim. Respirei fundo e enfiei o braço todo dentro do caixote. Escarafunchei-o, com a mão, usando o tacto (e involuntariamente o olfacto, já que a visão voluntariamente afastei, essa consegui) para descobrir a chave de entre outros inomináveis objectos. Os húmidos é que arrepiam, garanto; os secos até são suportáveis. Encontrei-a, à chave. Enquanto, há uma hora atrás, me purificava no duche, reflecti sobre este insólito evento e tirei duas conclusões: a primeira, a de que tenho de tratar de saber porque é que fui traída pelos meus próprios reflexos. A segunda, eventualmente consequência da primeira, é que não quero voltar a pensar em deitar fora uma chicla de mentol.
Enganas-te, lolita.
Lê esta receita. Facilmente perceberás que sou mais de matar a fome aos outros que de saciar a minha.
No hace falta ser de Lugo
para asar un buen besugo.
Con aceite, pan rallado
perejil y un buen tostado
satisfecho de la broma
quedará quien se lo coma.
En tres cortes por un lado
pon limón al asustado
y quítale las agallas
al iniciar la batalla
para que sienta la sal
y no te sepa fatal.
Extiéndele la papilla
desde el centro hasta la orilla
con la fórmula indicada
y la mesura adecuada
antes que cumpla condena
en el horno y no en la trena.
Con limón bien rociado
se pondrá todo dorado
si lo has asado con tino
y es besugo y no el vecino.
Agosto 2003©Fernando Luis Pérez Poza
Pontevedra. España.
Aos incautos, porém franzinos
Não se atemorizem. O besugo só fica assim quando está esfomeado.
Le bonheur
A felicidade dos outros gerará, se formos bons e puros, um bom pedaço da nossa própria felicidade.
Sem assunto
À superfície, transparecia um homem calmo, mais sisudo do que sorridente. Tinha modos suaves, gestos pausados. Ouvia mais do que falava. Como costuma, inevitavelmente, acontecer com os bons ouvintes, ninguém o ouvia a ele. Não que ele precisasse que o ouvissem, porém. Paciente até à exaustão, sempre disponível, sempre assegurando que a bonança viria, depois da tempestade. Fortemente presente, sobriamente marcante, indispensável a quem ele dedicasse a sua selectiva atenção.
Esse homem tinha um segredo. Uma dor. Um amor descoberto ao acaso, mas que o prendeu para sempre. Era mais amante do que amado, o que o prendia ainda mais. Consumava esse amor furtivamente, ao sabor das possibilidades. Mas amava, ainda assim, sem tréguas e de forma incondicional, mesmo sem receber (quase) nada em troca. E ninguém sabia quanto ele amava. Mas sabia, ele, que a sua vida havia de estar irremediavelmente presa àquele amor que o faria sofrer, só porque o fazia feliz. Porque
só amava. Raramente, só muito raramente, lhe transparecia na expressão o reverso triste desse amor, porque sabiamente escondia aquela
dor feliz que ninguém lhe amaciaria. Muitos anos passaram. E ele assim se manteve, só com a sua dor, com o seu amor impossível e anacrónico, no que restava da sua vida. Tornou-a suportável, rodeou-se de amigos, quase todos mais amados do que amantes. Muito poucos perceberam que ele tinha sido, em poucos momentos fugazes, infinitamente mais feliz do que eles.
Era só isto. Um post sobre um homem que sofre com grandiosidade.
Oferece-se bicicleta
Eu esforcei-me por reler tudo o que escrevi sobre propinas na Faculdade de Medicina. Sobre formação de médicos e investigadores. Sobre genéricos. Sobre farmacêuticos. E li o que escreveram Dupond et Dupont acerca de mim, do que eu penso, da minha falta de capacidade de resposta. Da minha dispepsia de sportinguista condenado ao sofrimento e à pirose. Da minha falta de estatura argumentativa.
Reli tudo.
Eu lamento muito, mas não tenho nada a acrescentar ao que já disse. Desculpem esta fraqueza (ou franqueza, se calhar a fraqueza e a franqueza andam de braço dado pela blogosfera), mas não sei juntar um hífen ao que já disse, porque disse, muito simplesmente, o que pensava. Sem querer mudar uma vírgula ao pensamento de ninguém, nem um acento circunflexo altero ao meu.
Podia vir aqui dizer que o
Sargenor é um singelo placebo, o fabuloso aspartato de arginina, e brincar mais um bocadinho com o Dupont. Podia, até, mostrar-me ofendido. Eu receitei-lhe
Xanax, que é um honesto, disseminado e socialmente aceite ansiolítico; e ele sugeriu-me um placebo para a bacoquice esclerosada que, de forma leviana, me pressente (foi Dupond que lho confidenciou, certamente).
"Ou um placebo ou um genérico", vejam vocês daí as mangas alternativas que este pano dava... mas que não dará.
Eu leio o
Aviz, que é o
blogue dum barbudo de Chaves (fez lá o Liceu, pelo menos, o Pité contou-me) e ele, sem o saber, é no que dá escutar as conversas dos outros, chamou-me à razão.
Adoce-se a blogosfera, até na discordância. Adoce-se a vida, sobretudo.
Mais um auto-golo? Pois que seja. Tenho baliza que sobeja para qualquer Beto.
(Como o Sporting ganhou, hoje não ponho links).
Conclusões
O Sporting ganhou, justamente, ao Braga. Houve ali esforço, luta, alguns pedaços de bom futebol. Provavelmente não chegará para superar o FCP mas, hoje, bastou-me.
Não retiro uma vírgula ao meu sportinguismo. Comoveu-me a morte de Jesus Correia (como comoveu toda a gente; que se a morte já não nos comove sujamos, definitivamente, a vida) e aquele minuto de silêncio no estádio do Benfica, por ser ali, tocou-me. E perdoei tudo, como amante que ainda ama, ao meu Sporting. E, até, ao Benfica...
Tratamos muito mal quem amamos, geralmente. Porque queremos ser amados incondicionalmente, egoístas que nós somos. Que nunca nos falhem! E, depois, facilmente perdoamos. Porque, no fundo, sabemos que ninguém está para nos amar acima da bitola do nosso mesquinho amor, todo feito de nós, todo baseado no amor que sentimos por nós. Um desamor pegado que não passa de mimalhice.
Se amamos fazemos estas tristes figuras. Pior que isso: publicamo-las. Mas o Sporting (também o Sporting) merece exposições públicas de patetices. Eu amanhã estou melhor.