Imagens que ficam
O Saddam na versão "velhinho desamparado, miserável e sem abrigo" (não obstante ter abrigo e 750.000 dele consigo) lembrou-me as imagens finais do Ceausescu e da mulher. Um casal de velhos, à mercê dos algozes impiedosos que sumariamente os fuzilaram.Suponho que o mesmo acontecerá ao Fidel, se vier a ser derrubado e apanhado em vida (como espero). A alternativa a estas imagens é a do funeral majestático, da mumificação e do mausoléu próprios de quem se julgou dono e senhor absoluto de vidas e pessoas que sob o seu jugo viveram e sofreram, ou morreram.
São, de todo o modo, imagens fortes. Por momentos, olhamos para elas e temos pena. Estranha pena que sentimos aqui, quando a não sentimos perante as imagens das caveiras e ossadas das suas vítimas. Suponho que faltam olhos às cavidades orbitais, barbas aos maxilares e que, assim, não sentimos o incómodo de ver do lado de lá um ser humano, que pode devolver-nos o olhar.
O que nos faria perder a pena perante a imagem de ditadores apanhados? O ar marcial dos nazis que foram apanhados a tempo do julgamento de Nuremberga? O cabelo branco impecavelmente penteado do Pinochet? A verborreia e a postura desafiante do presidente da Sérvia? O simples facto de estes nunca terem sido filmados na situação, ou com a aparência, de velhos desamparados?
É tudo uma questão de imagem? Talvez. Talvez sejamos assim, vivendo na nossa cabeça o que os nossos olhos comem. E talvez, então, fosse melhor que os EUA tivessem tido cuidados cosméticos, e não publicassem aquelas imagens do Saddam. Primeiro proporcionavam-lhe um banho, davam-lhe uma das fardas dele, cortavam-lhe a barba e o cabelo (e penteavam-no) e "last but not least", davam-lhe um charuto retemperador. E só depois o filmavam, na pose orgulhosa e marcial que menos nos impressionasse.
Mas, por outro lado, a verdade é que aquelas imagens eram mais urgentes para outro público que não o ocidental, tão cheio de complexos de culpa "civilizacional". Eram urgentes para os ex-súbditos de Saddam, para os seus ex e actuais seguidores, e para os que, nada tendo que ver com ele, são inimigos de quem o prendeu. E, para esses, o ar "clochard" do Saddam não causa pena (causará quanto muito desprezo) nem muito menos faz dele "mártir da causa".
A verdade é que são estas as imagens que ficarão para a posteridade, como ficaram as do casal Ceausescu, como ficaram as de Nuremberga, de Pinochet e de muitos outros.
Para finalizar: nem cá venho mortificado, nem cá venho de quinze em quinze dias, nem cá venho em cumprimento de promissórias. Venho quando me apetece (e apetece muitas vezes) e escrevo quando tenho alguma coisa para escrever (e tenho menos vezes). E se me chateiam muito vou à Régua e ao Porto partir-vos os bibelots.
Para finalizar2: Vem aí peixe fresco. Se preza a amizade, a mais importante das qualidades que são apresentadas como seu cartão de visita, uma recomendação apenas: Não seja lírico como o besugo, não interprete a excessiva e enlevada contemplação de um molhe (local em que o mar bate e baterá até ao fim dos tempos) como algo de necessariamente saudável e ... seja bem vindo. Faço votos por que tenha inúmeros complexos de esquerda, para que a minha escassa vontade de escrever se agigante e eu deixe de ler "remoques" à minha mortificada intervenção neste blog.
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