do fundo do self
Fico irritado quando as pessoas reagem às coisas de maneira que me parece despropositada. Exagerada.
O exagero é, entre gente decente, a negação da decência. Não porque seja proibido exagerar, toda a gente exagera vez por outra, sem deixar de ser decente, seja quando for. Mas a decência, o conceito, a própria decência, não se compadece com exageros; e o exagero da decência, porque é disso que se fala, é indecente.
Pedro Henriques, o árbitro do recente Benfica - Sporting, não merece o que alguns sportinguistas têm dito dele.
Quando se está perante pessoas como Pedro Henriques, é preciso respeito.
Eu gostava que este árbitro apitasse todos os jogos do Sporting. É um tipo de que gosto, não quero saber de detalhes pequeninos, parece-me um tipo honesto e que não está sempre ali a apitar "prrrrrriiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiips". Apita pouco, até.
Num jogo em que nem o Sporting nem o Benfica jogaram de maneira a que qualquer um pudesse vir dizer, no fim, que "ah! eu joguei buédabem, pah!", e eu digo isto assim
que é para a juventude que calhar encalhar ao calhas neste calhau perceber - ao menos - uma frase deste texto, dizia eu, num jogo destes, com um árbitro destes, ficava bem ao Sporting (e ao Benfica, que até ficou) ficar caladinho (tantos "ficares", olha, vai assim) e ir mas é depressinha jogar bem à bola, de maneira a ganhar o próximo jogo. Seja onde for.
E eu repito: tenho pena é de não ter sempre árbitros como Pedro Henriques a apitar os jogos do Sporting.
Gosto deste árbitro. Emprestava-lhe o carro. A carrinha, que eu agora tenho uma carrinha.
A infelicidade
A infelicidade é como se fosse uma vaca, mas a infelicidade não tem pele para fazer mantas ou casacos, nem cascos e cornos para confeccionar botões, nem tem sequer carne para se comer, grelhada, frita; nem sequer dá leite.
A infelicidade é, portanto, como se fosse uma vaca desprovida dos atributos da vaca.
"A infelicidade não é, portanto, como se fosse uma vaca", dirão as senhoras e os senhores mais dados ao pragmatismo do design "pininfarina" da fraseologia.
É, sim. É mais, até, do que se fosse uma vaca.
É a própria vaca.
Tanto que avacalha.
A infelicidade é um tempo muito feito de currais.
do lameiro
Que é que aquele pastor do Paulo Bento andou a apascentar durante a primeira parte?
Que é que aquele pastor zanaga quis fazer? A sério, que raio de invenções faz ele, sempre que pode, na minha ausência?
Quer jogar em 4-4-2, sem extremos? (que não os tem), quer o losango de 4 no meio campo?, ai quer?, pois então joga com o Veloso no vértice de trás, com o Izmailov e o Moutinho nos vétices laterais, com o Romagnoli ou com o Vukcevic no vértice da frente.
Quer Purovic? Está bem. Também eu quero. Conforme queria o Pinilla, ou outro qualquer que tivesse mais de um metro e oitenta, quero este. Não há Derlei, não há Djalós.
O Purovic marca um golo em cada sete cruzamentos bem feitos. É sabido que qualquer Purovic, depois de marcar um golo em cada sete cruzamentos, e isto durante cinco ou seis jogos (é preciso é fazê-los bem feitos, aos cruzamentos), começa a acertar na baliza de quatro em quatro cruzamentos. E há-de haver jogos em que acerta na baliza três cruzamentos em três, e isso pode ser contra o Benfica, ou contra o Porto. Ou contra a Naval. Ou contra os gajos de Guimarães, que são os gajos mais parolos que eu conheço, a seguir aos do eixo Paredes-Penafiel-Santa Maria da Feira-Sacavém-Vilamoura. O eixo Guimarães-Trofa é, mesmo, execrável.
O que não se pode é inventar um combustível sem se ter o comburente. Ou o inverso. Quer jogar assim, joga. Mas então, se quer, joga mesmo. Dispenso-vos das considerações que podia aqui fazer sobre a questao energética.
Ó Bento, joga assim, boi! Vende o Djaló ao Lokeren! Logo que possas.
O pastor Bento não tem culpa das ovelhas e das cabras que apascenta, mas eu também não tenho culpa de haver um pastor assim. Nem as ovelhas, nem as cabras. Nem ninguém de as haver assim, também.
Que redil palonço.
Que pastor burro.
Mas eu gosto dele, do pastor, ele não sai. Atenção. Ele lê-me e atina. Não sai.
Sombras conhecidas de besugo
Aqui é que não o quero
Vamos lá ver. O Lampard e o Terry são jogadores bons, normais mas bons, mas com temperamentos medianos. Eu não me explico bem muitas vezes: são passivos - são bons, mas são passivos, andam sempre de olhos baixos -, dependem muito, para estarem bem, dos reforços positivos que lhes chegam de quem os comanda (ou da sorte). Isso é notório, basta comparar o seu rendimento no Chelsea de Mourinho e na selecção inglesa. Embora na selecção inglesa o caso seja mais grave, o selecccionador é quase sempre uma anedota, parece que os escolhem de entre "os gajos que mais me fazem sono". Contudo, houvesse bom senso na Federação Inglesa, que não há, não me admiraria que Mourinho fosse convidado para seleccionador inglês: parece-me capaz disso, também, desde que os ingleses quisessem mesmo ganhar uma merda qualquer.
Cá é que não, foda-se.
Mas o Lampard e o Terry, voltando atrás: vão andar ali órfãos de mãe, foda-se. De pai já andam órfãos, desde que falaram com o Gerrard que os três sabem disto, desta orfandade. Orfandade remediável por adopção. Na selecção inglesa, ao menos, é.
Esguichos de besugo
O futuro de José Mourinho não depende de mim. Nenhum futuro depende de mim, praticamente.
Mas, se dependesse de mim o futuro de Mourinho, ele ficaria em Inglaterra, treinaria o Liverpool. O Rafa Benitez sabe o suficiente para pôr o Liverpool a suar para não perder com o Porto e para empatar, transpirando, com o Portsmouth (a vitória na Champions contra o Milan foi o Kop que a conseguiu, o hino dos crentes, não foi o Rafa), mas não saberia nunca pôr o Porto a
quase ganhar ao Liverpool, nem a ganhar a taça UEFA, nem a Champions. Independentemente dos jogadores que cada equipa tivesse, sabe-se que Mourinho é melhor que Rafa.
O Rafa não serve para ganhar pelo Porto, quanto mais pelo Liverpool. O Liverpool, se quisesse e pudesse, precisava era de Mourinho. É o clube certo para Mourinho.
Eu, se fosse a ele, para Itália não iria. Para Espanha, terra de chicaneiros e de moscas, também não. Para a Alemanha, sim. Também podia ser. Mas menos, que aquilo na Alemanha é complicado: até lá têm o Berden Merden e tudo. Para Portugal não. Portugal, não. Ño Sporting, não o quero. No Porto e no Benfica também não. Motivos contraditórios. Na selecção, muito menos. Quero lá Scolari, não quero mais ninguém (embora Scolari devesse ter acertado melhor no sérvio, porque a teoria do
bate e foge, propalada por aí, é ridícula: um homem com mais de sessenta anos atira um pêro aos queixos dum sérvio de menos de trinta, acerta-lhe mal, nunca perde o ar de desafio "que foi, que foi, hem, pá, caralho?", e é bate e foge?, isto é má fé, mas vem de quem condena a violência inteira, e condenar a violência inteira é legitimá-la toda, mas eu nem explico isto que não vale a pena, toda a gente entende.
Eu não gosto do Mourinho, e era aqui que eu queria chegar. Percebam isto duma vez por todas. Ele é bom e competente, mas eu não gosto dele. E nem é apesar disso, nem independentemente disso: não gosto, pronto.
É a vida
Enganei-me. Não só não ganhámos ao Manchester com uma clareza surpreendente, como acabámos por perder.
Eu engano-me muito, enquanto posso.
Com que então alheira, hem?
Depois de
MP me chamar alheira sinto-me em estado de charcutaria.
Tenho atenuantes: eu já tinha lido algures isso da cadeia dos livros e não reparei que MP tinha invertido a questão.
Para me sentir, de facto, reconciliado com
MP, com o mundo inteiro, e para poder - enfim - regressar ao estado piscícola que mais me convém, preciso de fazer uma coisa. Vou fazê-la. Vou fazer aqui uma mistura de grelos, que é verdura que tanto vai bem com alheira como com besugo.
Parágrafo único - Os livros e autores que mais me marcaram, seja lá pelo que for, ao calhas, com breve explicação do facto, e só durante meia hora que não tenho mais tempo e seja o que Deus quiser.a) Lobo Antunes, António: marcou-me pela cisma que tem com Benfica e aquela zona que ele acha bucólica, a estrada de Benfica, o Benfica propriamente dito e, ainda, pelas referências repetitivas à guerra de África - é suposto, em cada repetição, ficarmos admirados por ele ter detestado aquela merda, até porque é sabido que noventa por cento dos gajos que lá estiveram adoraram aquilo -, pelo facto (explicado sessenta e seis vezes) de se sentir mal em hospitais (ao ponto de não trabalhar, que se saiba, há imenso tempo, num, embora o internamento possa ser uma alternativa ) - e, ainda, ao facto de já ter sido loiro e de lho terem dito várias gajas que, supostamente, comeu, em vários livros, ou que, se não comeu, queriam que ele as comesse.
b) - Ham (autor do tratado "Ham´s Histology"): Este cabrão consumiu-me tardes e noites de marranço sobre merdas que, aos dezanove anos, mais dado a ver se comia tantas gajas a sério como o Lobo Antunes sugere que papou em livros, quase me fizeram enveredar por outro curso qualquer. É ele o responsável por, ainda hoje, detestar microscópios. Se bem que me seja afirmado - desde 1980 - que a culpa de confundir uma célula de Leydig com um dendrito é toda minha, porque é como não distinguir um bocado de encéfalo dum colhão, ainda hoje culpo Ham pelo que me sucedeu, que foi ter de repetir a porcaria da disciplina. Ham marcou-me, mas se eu pudesse e fosse seu contemporâneo, quem o marcaria era eu, na cornadura.
c) Torga, Miguel. O doutor Adolfo. Eu aqui nem explico.
d) de Queiroz, Eça, esse fazedor de cócegas, esse génio da brincadeira das letras e das ideias feita com as ideias e com as letras, por mais tontas que parecessem ambas, esse poveiro de Tormes que só se espalhou ao comprido - o animal - na Cidade e as Serras: porque lhe deu para fazer, nesse livro seboso, de Verne, Jules.
e) - Hugo, Victor. Eu este, ultimamente, já nem leio. Oiço-o. A lolita sabe do que falo.
f) - Maugham, Sommerset. "Of human bondage". Quem não leu, vai a tempo. Quem leu e não gostou, que se meta menos nas pastilhas.
g) - Mann, Thomas. A minha montanha não é tão mágica como a dele, mas eu também sou suspeito, isto porque via quase todos os episódios de "Uma casa na padaria", embora me cheguem relatos - certamente torpes - de que o falecido Michael Landon habitava uma pradaria, e não um estabelecimento de confecção e venda de produtos panificados.
h) - Orwell, George. Pelo "Triunfo dos porcos", que sempre me pareceu conter mais do que o porco nazi Orwell lá quis meter. Pareceu-me sempre que os porcos comunas que ele ali pintou, os porcos de comité, iriam - noutro livrinho - ser comidos pelos porcos capitalistas e neoliberais que os destituiriam, e que, depois o ciclo se repetiria. E tenho razão, que eu sei: o "Triunfo dos Porcos" é uma versão unidimensional e unilateral do "História Interminável", porque foi escrita por um visionário que via só dum olho, ou parecia, mas marcou-me porque o li quando também só pensava com o que tinha dentro das bolsas escrotais, e nem um olho era.
i) - Sepúlveda, Luís. Basta ter explicado a diferença entre
cripsis e
aposematosis a uma besta como eu para uma besta como eu se sentir marcada por Sepúlveda, Luís.
j) - Camões, Luís. Marca-me muito o facto de ter ficado ciente, desde cedo, que nunca iria ler aquilo tudo dos Lusíadas. E ainda hoje me penetra a ideia de que aquilo, musicado pelo José Cid... Enfim, cala-te boca. É mais ou menos o tipo de marcação que sinto perante a obra de Graça Moura, Vasco, mas com uma nuance: deste, nunca lerei merda nenhuma.
l) (ou k, freguês) - Pessoa, Fernando. Sinto-me profundamente sulcado no meu envergonhado lombo por ter de admitir, aqui, que este frágil e grácil e divergentíssimo ser humano, já falecido e poeta lambidíssimo nas suas quatro anilhas, só me não entedia em meia dúzia de textos. Marca-me, isto, tenho cicatrizes em mais de quatro por cento da minha superfície corporal (ou seja, ainda bem que não é nos genitais, quando não lá estariam desfeados mais de trinta por cento da minha virilidade).
Não há provas científicas
Concordo,
MP. Os livros que "não mudaram a minha vida" não interessam para nada. São os que comecei a ler e pus de parte, por tédio ou por desinteresse. É verdade também que, dos que li, há uma significativa maioria de livros lidos que não me ensinaram a arte de viver ou sequer me mudaram alguma coisa (pelo menos que eu desse conta) que, pelo seu curso natural, não tivesse forçosamente de mudar (aí incluído tudo aquilo que eu quis que mudasse). Há, depois, um bem mais pequeno grupo de livros que me ficaram na memória, mesmo se lidos há décadas atrás - e mesmo estes não sei ao certo se, quando e como me mudaram a existência. Escolho, assim, uma interpretação restritiva da expressão "livros que mudaram a minha vida" e, por isso, a seguir enumero apenas alguns dos livros que li que gostei de ler. E que gosto de reler, de tempos a tempos.
Namely:
D. Quixote de La Mancha, Cervantes;
Memórias de Adriano, Marguerite Yourcenar;
De Profundis, Valsa Lenta, José Cardoso Pires;
A
Ilíada e a
Odisseia, Homero;
Amor de Perdição, Camilo;
Party, Agustina Bessa Luis;
Rio Triste, Fernando Namora;
Mrs Dalloway, Virginia Woolf;
The Great Gatsby, F. Scott Fitzgerald.
Passo esta saudável reflexão ao
Miguel, ao
João G e ao
Altino. Divirtam-se.
Palha, isso não é nome ribatejano? Não? Então desculpem
Não há nenhum problema na noite do Porto, assim como não há nenhum problema na noite de Lisboa, nem na noite de Vila Real, nem na noite de Viseu, nem mesmo na noite de Alcácer do Sal.
Não há nenhum problema, em sítio nenhum, que dependa da posição estratégica do astro-rei nesse lugar. Nem sequer da lua, quanto mais do astro-rei. Há é problemas. Envolvem Palhas? Envolvem, sim. Dia, noite, lusco-fusco, há isso. Há isso e Palhas. E Madureiras.
O astro-rei é o sol, isto para quem o que eu disse ali atrás lhe pareça vago.
E a lua é aquilo redondo e cinza-amarelado que aparece à noite, nas noites todas, se não houver nuvens em tapume horizontal, é irem agora à janela - que está luar - e vêem-na, à lua. Inocente de quase tudo menos de certos e determinados luares.
Como é que o Sporting vai ganhar ao Manchester, ó besugo?
Com uma clareza surpreendente.
Três mundos
Dez livros que não mudaram a minha vida?Tenho muita pena. Não sei dizer.
Eu nem dez livros li durante a minha vida inteira. Acho que li só uns sete. Nove, no máximo. Vá, li uns trezentos e sete. Deve ter sido, fora as sebentas e os tratados.
Mesmo desses trezentos e sete, vamos a ver isto com olhos de ver: acho que nem eu mudei a vida deles, quanto mais eles a minha.
Posso dizer uma coisa?
Muito bem, digo:
Jorge Amado, Luís Sepúlveda, Cáceres Monteiro.
O mundo como foi e é, o mundo como é e foi, o mundo como permanece.
Os pastores da noite, uma história suja, tudo como se se passasse no hotel babilónia.
Passo este pequeno inquérito sobre "os dez livros que não marcaram a minha vida" ao Jorge Peliteiro, ao Luís Tito e ao CMC, que ficou de serviço ao Sócrates no Tugir.
Sem links, isto pára já aqui. Ou talvez não, logo se vê.
Pára, certamente.
Ao intervalo
Isto que aqui está é uma alheira. Não parece? Mas é. É uma alheira.
Entrar, fazer o serviço, vir embora. Mais nada.
Ora bem, vamos lá tentar fazer isto na Cova da Moura.
Pois. Com o Pipi Romanhol não dá, que a malta ria-se. OK.
Palpita-me que esta merda, hoje, pode correr mal.
Ó Paulo Bento: manda os gajos correrem e darem pau a eito e chutarem na bola com força. É jogo para ganhar de qualquer maneira, se vamos para lá de "veludine" voltamos cobertos de "betadine". Pau a eito, comer os gajos, vomitá-los a seguir.
Mando-te os reforços da foto. Equipa-os a preceito e põe-nos a jogar. Faz o que te digo, ranhoso. Faz o que te digo.
Episódios não são epidemias, descansem
O primeiro episódio não tem graça nenhuma. E é aquele que eu acho que já contei uma vez. O segundo também não tem, mas acho que nunca contei.
Eu, uma vez, era o defesa direito da equipa do segundo ano de Medicina. E jogava-se importante jogo para o campeonato dos mal-aventurados, no campo do CDUP, que era relvado porque chovia muito e a erva ali medrava: mais ou menos como sucede hoje, mais de vinte anos depois.
Era o segundo ano contra o quarto, no quarto ano até jogava o Zé Leal, central do Paços de Ferreira (ou do Paços de Brandão?, do São Pedro da Cova?, do Candal?). Bom, respeito, era um central de nome, segunda divisão. Ou terceira, eventualmente. Não importa.
Eu era do segundo ano.
O ponta esquerda dos tipos do quarto ano, que agora é anestesista algures na Guiné, era o Veríssimo. Tinha uma habilidade fantástica e, nessa tarde, nos primeiros trinta e cinco minutos, só lhe faltou dar-me a bola para as patas apenas pelo prazer mórbido de ma tirar outra vez delas.
A dada altura pensei: "Vou passar a tarde a ver o número 11 nas costas deste filho da puta e isto não pode ser, foda-se o caralho do preto! Aquela colega bonita, que parece a Miriam Lambert, aquela do
Dancin’ Days, ou do
Astro, não me lembro - era um tempo de novelas brasileiras mágicas, das primeiras que se viram , ainda nem havia televisão a cores, só em 82 é que houve, é preciso saber isto - está a rir-se de mim a bandeiras despregadas, na bancada! Ai deste-me outro nó cego, ó preto do caralho? Perfeitamente. Agora levas uma pandeirada que até chias”.
E levou.
E tive, ainda, de lhe dar mais uma ou duas marretadas, até o árbitro (complacente quintanista, não me lembro do nome dele, tenho pena, ele também deve lamentar não se lembrar de mim) me mostrar o amarelo, com um aviso de
“então, pá!, andamos aqui para esta merda?, vê lá isso…”.
Nessa altura, eu já tinha referido ao Veríssimo que me parecia não estar ele ciente dos riscos que corria, e que - provavelmente - ia forçar-me a fracturar-lhe uma das gâmbias, e que mais lhe valia, em sendo assim, mais lhe valia a ele, ficar sossegadito... ou mesmo passar para a ponta direita, onde, afortunadamente, eu não estava. Nem estaria.
Ele só se ria, com aqueles dentes brancos que apenas os pretos têm, e com aquele jeito de
"faço de ti o que quero, ó besuguito da bosta", que era a verdade, as verdades doem mas não deixam de o ser. O Veríssimo marcou dois golos e, se dependesse apenas do baile que me deu, podia ter marcado o triplo deles.
Eu, por acaso e muito afinco, aí pelo meio da primeira parte, atinei com a finta dele, e até consegui marcar o 3-2 com que ganhámos o jogo, perto do fim, até porque não fumava muito na altura, e o Veríssimo deu o estoiro monumental dos fumadores compulsivos, já na altura era isso, fumador compulsivo de dentes muito brancos, calhares de fumos. E não passou por mim uma única vez, no segundo tempo. Mais do que isso, deixou-me aquele campo aberto à minha falta de talento, disfarçada pela ausência do talento dele, de tal maneira que luzi um pouco, o suficiente para receber aplausos de bancada.
Moral da história? Sei lá, apeteceu-me contar isto, não ando aqui para fazer moral. Não ando aqui para fazer coisa nenhuma, aliás. Isto foi assim e assim contei.
O segundo episódio também não tem grande graça. Até não tem nenhuma, mesmo. Mas passa-se no CDUP, como o primeiro. E sempre no segundo ano, valha a verdade.
Para nos emprestarem chuteiras, no CDUP, que ainda não as havia prateadas, nem douradas, nem doutras cores, eram todas pretas e engraxadas, tínhamos que apresentar o cartão de estudante. Ora eu, naquele dia, não o tinha. E jogar de sapatilhas, na relva, equivalia a passar mais tempo deitado no chão do que na pugna.
Impõe-se aqui um interlúdio. Um entremez. Gosto muito da palavra pugna, lida por castelhanos, sobretudo aplicada a questões envolvendo o segundo ano de medicina.
Ora bem, impunha-se que alguém me emprestasse o cartão de estudante. Alguém que o tivesse. Era premente, derivado às chuteiras. E um dos colegas que tinha cartão de estudante disponível até ostentava cabeleira igual à minha, naquela altura (era o tempo em que Mario Kempes brilhava na selecção argentina!), na vida e no cartão.
Com o cartão dele, lá pude jogar de chuteiras emprestadas e engraxadas.
Penso que não tive qualquer influência no resultado desse jogo, até nem me lembro bem dele.
Lembro-me é do colega em questão, ficámos mais ou menos amigos, nessa altura, uma simpatia de ocasião que depois sofreu do míldio do costume, não calhou evoluir e perdurar, já não sei dele há muito tempo. Chama-se Carlos Morgado, foi médico da UNITA, em Angola, esteve muito tempo preso e doente, há uns quinze anos, com grave infecção no corpo, por causa duns tiros que lhe deram. Mas agora cuido que está bem. Escrevi postais ao MPLA e tudo, a pedir por ele.
Fui sempre de pedir. Peço sempre mal, peço como sei, mas ele estará bem, se Deus quiser.
Lembrei-me agora disto porquê? Não sei, também.
Prometo não contar mais coisas destas. A não ser que me apeteça.
Estou confiante (I'm confident)
Estou convencida de que uma boa parte da capacidade persuasiva de José Sócrates como
líder das massas reside naquela maneira característica como brande as mãozinhas para a frente e para trás, a compasso, enquanto perora sobre as suas ideias para um futuro risonho dos portugueses. Como ontem se percebeu, também resulta na Ucrânia e - tarefa bem mais complicada - sobre o futuro dos europeus, que são muitos mais (sem esquecermos que discursou - e portanto gesticulou - em inglês).
Sistemas de cristalização
Ontem, no fim do jogo, o cigano estava na berra. Era com ele que o servo-sevilhano estava a espingardar, quando tudo começou. Depois, quando aquilo se generalizou, quando Scolari atirou aquele sopapo em câmara lenta ao servo-sevilhano, depois de ter levado uma palmada na mão, parecia cinema, o cigano fez o que costuma fazer, ficou com cara de cu a olhar, a fazer de conta que nem tinha sido nada com ele. Feitios de quem esconde o burro e a carroça.
Continuo a dizer o que disse sempre: Quaresma só joga no Porto, e isto se o deixarem. Simão só joga no Benfica, e já não joga lá. Cristiano não está a jogar em lado nenhum, agora, mas vai voltar a jogar. Contra o Sporting não, até o fodo. Deco parece um buda e, ontem, parecia mesmo o Carlos Martins, mas em menos veloz e em menos estúpido, mas vai voltar a ser o Deco lúcido do costume (ao contrário do Carlos Martins, que não passará de Carlos Martins até terminar a sua carreira, no Olivais e Moscavide). Ricardo Carvalho vai voltar. Caneira vai
deslesionar-se. Jorge Andrade vai, talvez, conseguir tornar a correr sem ser a dez à hora. Pepe vai mesmo jogar, um dia destes.
Para marcar golos? Quem há?
Olhem, Liedson, ou Postiga. Ou um Gomes inspirado. Quem há mais? Não há mais, sem ser o Tomás, mas esse não conta, é microcéfalo.
O Hugo Almeida é só um calhau com olhos, coisa impressionante da mineralogia.
Sobre a selecção e o caralho. E Navarone.
Penso várias coisas. Não espero a concordância de ninguém, sobretudo porque sobre a bola e o caralho - e sobre vários outros assuntos que eu cá sei - não careço disso.
Vai ao calhas, como de costume.
1 - A Sérvia tem uma boa equipa, bastante razoável. Tal como a Polónia. Ambas podem vir cá empatar. Em qualificações, porque lá no sítio do Europeu é mais discutível, aí perdem connosco como ginjas. Toda a gente sabe isto.
2 - O Deco não jogou um prepúcio desbastado. Parece sempre que dormiu pouco de véspera por ter ido aparar o lápis. O Tiago anda igual. Anda a ler Peter, o Tiago; e a penetrar-se dele.
3 - O golo da Sérvia foi fora de jogo. Foi o dentista, outra vez, o ranhoso que não viu o óbvio. O Merck. É preciso dizer isto. É dentista, o Merck. Se fosse oftalmologista merecia lapidação e murros nos olhos. Assim, sendo um gajo dos dentes, nem por isso.
4 - O Sporting vai ganhar ao Manchester, se depender do que jogou hoje o Cristiano: nada, não anda a jogar nada, jogou como jogaria a Merche Romero: aos saltinhos tontos.
5 - O Quaresma devia ter entrado para o lugar do Deco e o Simão fazia de Deco, se eu fosse o Scolari. E bastava. Mas eu não sou o Scolari. E o Quaresma é aquela merda de estar para onde está virado, eu não o quero no Sporting nem dado. Um triveleiro é um alternativo, uma alternadeira.
6 - Se eu fosse o Scolari tinha acertado na substituição do Deco. Mas também tinha acertado a sério no sérvio do Sevilha, tinha-lhe acertado mesmo a sério, um murro nas ventas, mesmo dois, e tinha-lhe fodido aquela mandíbula toda, estaria agora o sérvio sevilhano na Cirurgia Maxilo-Facial dum dos Civis de Lisboa, a abrir ficha. Castigo da UEFA? Que se foda a UEFA.
7 - Se eu fosse o Scolari ficava cá - a menos que me despedissem, porque há sempre essa possibilidade, a de o despedirem, caramba, se ele se for embora vêm-se logo dezoito gajos e meio e mais o Figo!, vêm-se os Albertos Ildefonsos, os Pereiras, alguns Dons Duartes, os Figos, os Vasconcelos, inúmeros carecas, Nunas e Unas e quejandas, os Aguiares, parte dos Catarros, certos Moreiras, um Seara e, já agora, sem sequer saber se o alarve viu sequer o jogo, ejaculam quase todos os Serrões, que é como se chamam os serranos
féxen - porque a única maneira de estarmos na vida que não mete muito nojo é mostrar às putas quem são os canhões. E para isso fica-se, para mostrar isso. A menos que nos mandem embora, caso em que "puta que vos pariu, adeus".
Parte do povo já pede Mourinho. Parte do povo é parva e leviana. Uma parte consideravelmente grande. Mourinho devia ser preservado disto. Por quê? Porque nem ele quer nem eu. Fazer o quê? Leirias, agora, outra vez?
Já Eça reparava que, em Portugal, se faziam bem camas. Não se fazendo bem, cá, quase mais nada.
Scolari tem a cama bem feita, andam a fazer-lha há anos. Mas eu sugiro a Scolari que durma, temporariamente, no sofá, se for preciso. Dorme-se lá bem. E a Madaíl, além da desistência definitiva do restaurador Olex, sugiro-lhe que se cale e espere.
Bom. Por agora basta.
Termino dizendo, mais uma vez, que gosto muitíssimo mais do Sporting do que da selecção de Portugal e que quero que se lixe quem achar isto um mau texto e esta última afirmação um sinal de má figadeira. Gosto de quem gosto, não gosto de quem não gosto. E detesto ratazanas. Figo e Rui Costa, hoje, foram ratazanas. Mais o Figo, é certo, é mais dele esta coisa de ratejar, mas ambos foram
norvegicus. Foram povo. Foram meninada de "nim".
Para isto, para esta produção ideológica, nunca mais lhes perguntem nada sem ser em eleições. E eu, mesmo aí , não lhes perguntava um corno.
Era tal e qual como ao povo, regra geral.
Já passa?
Isto deve acontecer com a maior parte das pessoas, mas, quando acontece connosco assume a relevância pueril dessa mesma particularidade: é connosco.
Lembrarem-se de nós para uma coisa qualquer que não seja darem-nos pontapés na cabeça, estando nós sossegados no nosso canto (tentando que não nos fodam a região cefálica mais do que sabemos suportar), é lisonjeiro. É agradável. Mesmo que a lembrança de nós não resulte em nada - nem sequer para nós - sem ser o próprio registo da lembrança (e das particulares razões dela, que são importantes e, nem sempre nos engrandecendo, tão pouco nos apoucam), é agradável.
Quando se lembram de nós tarde demais, porque nos parece tarde demais a nós, porque parece tarde demais a toda a gente, muito provavelmente porque é mesmo tarde demais, cismamos sempre que nos elevaram ao reles e podengo estatuto de refugo. Parece, não parece?
Mas quantas vezes, no refugo, se encontra posta satisfatória? Até para besugo, esse refugo feito às postas de mim.
De ser lerdo
Sou dado a estar atento. Nas consultas, noto sempre as cotoveladas e as palavras em surdina que os casais trocam enquanto rabisco no diário, ou enquanto lhes passo uma receita, umas análises, uma coisa qualquer que me faça baixar os olhos. É quando não os olho que se mostram mais e que melhor os vejo, agora.
Aprendi cedo que as pessoas todas, as que me buscam, têm "um fito". Um alvo. Um pino. Uma vontade.
Mas, primeiro, ainda pensava que me procuravam porque pretendiam doutrinar-se de mim. Não é nada disso. Querem, muitas vezes, quase as vezes todas, de mim, apenas isto: que lhes faça a vontade.
Uma vontade é respeitável e com os anos aprendi esta simplicidade. Ainda demorou, mas agora sei.
É no que dá não ter optado pela via profissionalizante
Há uns logos, ali mais abaixo à direita, que ligam a uns dados
sites deveras úteis para se obter estatísticas fiáveis sobre audiências e, mais importante, para se poder preparar convenientemente o plano editorial estratégico do ano seguinte. Portanto, inúteis há tanto tempo que já me esqueci para que raio servem.
Entretanto, o assalto do
Mercado Livre (o dos
celularis por centicatorzi reais) persiste, embora discreto, no cantinho superior direito.
A prova de que se cometem crimes em nome da liberdade
Perguntou-me qual dos Ninjas eu escolhia para lutar. Respondi-lhe que preferiria ser o Splinter, a ratazana de esgoto, mestre de
Tae Kwon Do e de auto-domínio, enfim, se tirarmos o facto de se tratar do mais repelente roedor que se conhece, ser-se um Splinter é um anseio razoável e compreensível. Mas não podia ser. O Splinter luta sozinho, nunca em parceria, do tipo Marlboro Man. Escolhi o Leonardo, o mais velho, mais ponderado e mais valente dos quatro, apostando assim em antagonismos do tipo "how do you feel in someone else's skin". Ele escolheu o Donatello, que é o mais histriónico e prolixo. Mas valentes são todos (sei disto, fui ver o filme). Vamos a isto. O primeiro nível passa-se no esgoto nova-iorquino, que é preciso atravessar sem deixar que uns cães de lata nos mordam. Fácil. No segundo, estávamos numa rua que podia ser no Bronx, atacados por mafiosos carecas e profusamente tatuados, e mais cães de lata, para enfeitar (morrem depressa, os danados). Os mafiosos demoram mais a morrer, sobretudo quando se conhece mal as teclas; "cruz" é para bater, "bola" é para saltar, mas desafortunadamente invertia-lhes a ordem, o que me valeu vários socos aplicados nos maxilares. O que vale é que de vez em quando há uns caixotes (bem mais pacíficos), que se abrem à porrada, cheios de pizzas para ganhar tempo de vida, quando a carcaça já fraqueja. São como que bálsamos curativos de medicinas alternativas. Parei quando já me doíam as falanges, não sem antes ter arrumado com, pelo menos, uns quinze mafiosos do Bronx. Senti-me, sim, um soldado da paz. Está bom de ver, pois, porque é que estas coisas viciam putos de qualquer idade.
A caminho do quinto
Muito (demasiado) tempo depois, mas julgo que ainda em tempo: obrigada à
Carla, à
Isabel, ao
Eclético e ao
Corta-fitas por se terem lembrado do nosso quarto aniversário blogosférico. E, em particular (e
não desfazendo) ao grandioso
Dragão que, para além de tudo, ainda descreveu com lucidez certeira um raro fenómeno: o de um hooligan raça pura que se diz adepto de um "
clubeco de tias e queques". Falo, claro, do nosso talibã.
Obrigada a todos.
Compasso binário, clave de sol
Em Setembro as coisas deviam escorrer por nós com a doçura dourada dum bálsamo morno. Uma doçura que nos sossegasse de Julhos e Agostos fogosos e que nos amaciasse de futuros Outubros e Novembros mais frios, de despedida.
A mim não me estão as coisas a correr assim, na pele toda, de maneira que isto não é Setembro.
E como não dei fé, este ano, nem de Julhos nem de Agostos, ponho-me a cismar que talvez Deus me poupe, este ano ainda, por ser justo e eu preferir, a Outubros e Novembros.
É que nunca fui bom a despedir-me. Nem ao ir-me embora nem quando se vão de mim.
da propriedade
A minha Mãe, que é professora primária (agora está reformada, mas era daquelas que ensinavam mesmo a ler, a escrever e a contar), nunca leu nada escrito por mim desde o tempo das redacções. No entanto, sábia criatura, deu-me um prontuário ortográfico da Porto Editora como prenda de aniversário. Fiquei-lhe logo grato.
Sim, eu digo prenda em lugar de dizer presente. Aliás, um presente, aqui no Douro mais alto, é uma bosta que se deixa num sítio qualquer:
"Olha, Saraiva Pinto de Sousa, o teu cão andou ali aos bordos na minha horta e, mafarrico do animal, deixou lá o presente!".
"Ai deixou? Então limpa-o, que a horta é tua!"
Nunca se limpa o presente decentemente.
Saraiva Pinto de Sousa, se me escutas, vai antes ler e não penses mais nisso.