blog caliente.

30.1.08

Espero que não seja só simplex. Espero mesmo.

Não tenho muito tempo, nem jeiteira; nem grande vontade, que a minha vida não é esta. Amanhã é dia de índio.
Sei que as políticas são mais importantes do que os políticos que lhes emprestam a face, mas a substituição de Correia de Campos pode ser mais importante do que parece e, a mim, que não gosto dele - não aprecio aquele género de pessoa, pronto, peço desculpa pelo que isto possa ter de irracional - fez-me bem à alma. Tem olhinhos mas não tem olhos, não gosto.
Ana Jorge, a substituta, apoiou Manuel Alegre nas eleições presidenciais. Suponho que o terá apoiado, também (mas isso não sei), quando foi das eleições internas do PS, em que JS (Pinto de Sousa) concorria com Manuel Alegre, João Soares, etc., os que JS acabou por acotovelar.

Nessa altura, nessa esgrima interna, Alegre foi o único a defender o SNS. Puro e duro, como base de trabalho e não como um conjunto de cacos. Como faiança inteira. O único.
Espero vir a descobrir (farei pesquisa, lerei, relerei, verei o que vier a seguir) que Ana Jorge apoiou Manuel Alegre mesmo nessa altura "interna". E não apenas nas presidenciais. Digo isto agora porque foi agora que me lembrei disto. (*)

Registo aqui, contudo, para memória futura, que, ainda que Ana Jorge venha a revelar-se uma defensora pura e dura do SNS (e, já agora, ideia peregrina de besugo, as parcerias publico-privadas, que eu aqui não concedo um milímetro, são determinadas pelo interesse público e não pelo privado, mas isso é esta besta a falar), ainda assim, dizia eu, Maria de Belém seria sempre a minha preferida para a pasta. E para a função.
Eu ainda me lembro da lei dos CRI, que nunca foi aplicada. Mais: deve ter sido uma das únicas leis que foi quase secreta.
Eu hoje não tenho tempo.
(*) E lembrei-me mal; uma voz amiga ensinou-me hoje uma coisa que eu não sabia: a senhora nem sequer é militante do PS. Lá está, mesmo um tipo ponderado (leia-se "pesado") como eu tem momentos de precipitação. Alguns é mesmo no abismo.

27.1.08

verde e branca por um dia

O besugo tem razão. Eu quero que o Sporting ganhe ao Porto porque, embora seja portista e do Porto (o que é diferente mas, neste caso, vai dar no mesmo), não só quero como creio e me apetece.

lolita

Por que é que o Sporting vai ganhar ao Porto

1 - Porque sim.
2 - Porque, se não, o Benfica fica com quatro ou seis pontos de vantagem sobre nós e isso enerva-me.
3 -Porque nenhum portista quer isto que eu acabei de dizer, no ponto 2.
4 - Porque somos melhores que o Porto, jogador por jogador, equipa por equipa, tudo por tudo.
5 - Porque embora 4 seja mentira, valem 1, 2 e 3.
6 - Porque, se não, venho aqui dizer palavrões tipo cona da tia, mas piores.
7 - Porque eu quero.
8 - Porque sim.

26.1.08

É verdade que os argentinos dizem "arientina"?

Se eu soubesse pôr aqui música punha uma coisa antiga, o "Inside fireworks", por exemplo.
Resume muitas vidas e muito fogo fátuo. Mas não sei pôr.

Não andamos aqui para ter razão ou para deixar de a ter. Andamos aqui mas é em ânsias.

Para que conste, para que conste mesmo dentro do blogamemucho, calculo que não tenho razão em - para aí - 50% das vezes em que falo, ou em que debito letra escrita à pressa.
E mesmo sem ser à pressa, o que é mais raro, é 50% na mesma.

Na verdade, eu não sei como funciona o SNS galego. Sei o que me dizem, o que vou vendo à pressa, e o que vem na "bibliografia oficial", mas não sei se resulta bem, sequer.
Eu, que detesto prospectos e dados oficiais, usei-os. Sou um boi.

Eu nunca mais faço isto. Ainda por cima o Federer lerpou na Austrália. Eu nunca mais faço previsões, excepto daqui a bocado e amanhã e daqui por cinco anos, se cá andar ainda.

Mande-me foder. Eu não vou, que enquanto conseguir não me foder não me fodo, mas mande-me foder na mesma, se quiser, que eu mereço.

Você deve ser, ainda por cima, boa pessoa, embora insista em parecer que não é. Boa pessoa não será, está bem, mas má pessoa também não é, de certeza. E escreve muito bem, mesmo sem lhe pagarem para isso. Muito bem mesmo.
Como isto vale o que vale, repito-lhe a ideia base disto: vá-se foder também.

Segue prosa mais rija, logo que possa, que eu não tenho jeito para isto e já estou aos vómitos há dez minutos e só devo poder mais logo.

24.1.08

Isto começa mal...

22.1.08

Sobre "isto", mas citando "aquilo". Está bem.

Há mais de quinze dias escrevi aqui uma coisa que, resumida, dava mais ou menos nisto: pode haver coisas boas nos lugares e haver, na mesma, estradas que nos transportem entre lugares. Às "coisas boas dos lugares" chamei, entre outras coisas, "merdas", o que desde logo me denuncia a má-criação e alguma falta de vontade de fazer doutrina.

A coisa era sobre várias "coisas" mas era, sobretudo, sobre cuidados de saúde.
Eu peguei em algumas terras que me lembrei de Trás-os-Montes e Alto Douro, depois agarrei na Espanha inteira e, sem citar sequer um número, uma cifra, e apenas inspirado no facto de a Espanha ser já aqui ao lado (no meu caso, é "aqui arriba") e de ser constantemente apontada como exemplo para quase tudo pelo Programa Simplex (excepto no caso do tabaco, mas aí eu entendo, porque, de facto, só ontem é que me apercebi do fenótipo daquele senhor de risco ao meio e de barbas mal aparadas que manda nas proibições e se chama George e, a partir de ontem, não preciso que me forneçam o genótipo da criatura para entender a basezinha daquilo tudo), discorri. Fui por ali abaixo e disse, em muitas palavras, sem nenhuma intenção doutrinária, aquilo que agora, ali em cima, resumi: "pode haver coisas boas nos lugares e haver, na mesma, estradas que nos transportem entre lugares".
A mim ninguém me paga para escrever, quanto mais para escrever bem.

Veio aí o maradona (salve-rainha e "acto de constrição") e colou duas listas.

Na primeira lista diz a população do município (concello, povo) de Ourense. São 110.000 alminhas.
Na segunda, soma as populações do que lhe apeteceu somar, algumas cidades que eu disse ao calhas com alguns concelhos, e deu-lhe 155.000. Nessa segunda lista misturou a cidade de Bragança com o concelho de Bragança, porque o concelho tem cerca de 35.000 habitantes, a cidade é que tem 25.000, esqueceu-se de meter Vila Real (nem cidade nem concelho, a cidade tem 37.000 habitantes, o concelho tem 50.000) e enganou-se para ali noutras coisas, o que não teria importância nenhuma se ele não tivesse querido provar fosse o que fosse. Mas quis. Este tipo, que já não percebe nada de bola e que, como se isso não bastasse, ainda se arrepela todo porque está a ver que o Federer vai ganhar o Open da Austrália apesar dos agoiros todos que lhe lança, veio aí com números. Isso fode-me, e vou dizer aqui umas coisas sobre isso.

Vamos deixar a Espanha inteira e pegar na Galiza. Pegadinha a Trás-os Montes e ao Minho, não é?, pois é, mas deixemos o Minho e a Galiza litoral, a das imigrações, a Galiza mais desenvolvida e povoada. Vamos pegar assim, para ficar mais ou menos equilibrado: Trás-os-Montes e Alto Douro é uma província? É. Ourense é uma província? Pois é, também.

E vamos agora acelerar, que a minha vida não é esta e tenho de me levantar cedo. São precisos dados? Muito bem.

A Província de Trás-os-Montes e Alto Douro tem 2 distritos, Vila Real e Bragança. Trás-os-Montes e Alto Douro tem, portanto, cerca de 400.000 habitantes, mais ou menos. A Província de Ourense tem à volta de 345.000 habitantes. Pode comparar-se assim? Penso que assim se pode.

A província de Trás-os-Montes e Alto Douro tem uma área de 11.000 Km2, enquanto a de Ourense tem, por alto, 7.300 Km2. Pode comparar-se: as pobrezas comparam-se em todas as dimensões.

Em Trás-os-Montes e Alto Douro é como se sabe. Posso fazer um desenho um dia destes, mas por hoje passo. Vamos à Província de Ourense, à Galiza interior. Vamos?

Bom. A Província de Ourense tem 92 concelhos. Vão de Avion a A Peroxa, Monterrá a Maside, Verin a O Barco de Valdeoros, de Ourense a Castrelo de Miño. São 92 concelhos. O curioso é que tirando Ourense (110.000 habitantes), o resto são pequenos povos. Tirando Verín (13.500), Barco de Valdeorras (13.300), O Carballiño (12.800) e, vá lá, Xinzo de Limia (10.000), o resto tem entre 600 e 4000 almas viventes. A Teixeira tem, mesmo, só 569 pessoas, sendo de referir que os concelhos de O Bolo e de A Bola, juntos, perfazem 2900 seres humanos. É assim, não vale a pena inventar.

Ora bem. Então e nestes 92 concelhos quantos Centros de Saúde há? Há 110. Porquê? Porque sim. Porque há 14 concelhos que têm mais que um. Ourense tem 5. E Castrelo de Miño, por exemplo, tem 3. Palavra de honra: tem 3, e tem 2095 habitantes. Deve ser, talvez, terra de pouca gente e muito ancha, não?
Desses Centros de Saúde, 15 têm Serviços de Urgências permanentes. Falo de Ourense, de Verín, mas também de Viana de Bolo, Xinzo de Limia, O Carballiño, O Barco de Valdeorras, Bande, Ribadavia, são 15. Ribadavia tem 5500 habitantes, por exemplo.
Os Centros de Saúde que não têm urgência "drenam" (detesto esta palavra, mas, como disse, não me pagam para escrever - quanto mais para escrever bem), num critério que não é outro senão o da proximidade, para o Centro de Saúde - com urgência - mais próximo.
Os Centros de Saúde com Urgência permanente têm, em mais de 60% dos casos, além de clínicos gerais (habilitados a fazer suporte básico de vida, que é fundamental pelos motivos que se prendem com aquela parte de o coração bater e de a gente respirar), pediatras, e enfermeiras de Obstretrícia. Em 25% deles há dentistas - cá, nem nos hospitais. Há Fisioterapia, em cerca de 10% dos Centros.
Nesses 110 Centros de Saúde trabalham, ao todo, salvo óbitos recentes ou intervenções externas de Correia de Campos, 275 médicos generalistas, 45 pediatras, 15 dentistas, um porradão de enfermeiras e enfermeiros, variadíssimos técnicos, assistentes sociais. Muitos desses Centros têm possibilidade de fazer análises clínicas e radiografias.

Ora bom, encurtando distâncias que ainda tenho de ir mandar um e-mail ao Paulo Bento: além destes Centros de Saúde, a Província de Ourense tem que mais?
Bom.
Tem o Centro Hospitalar de Ourense, com tudo, mas tudo mesmo (mesmo as merdas que não há em Vila Real, sim, a Cirurgia Vascular, a Neurocirurgia, a Radioterapia, os Cuidados Intensivos Pediátricos, a Unidade de Transplantes, a Endocrinologia, a Reumatologia, a Geriatria, a Oncologia Médica e Cirúrgica, a Angiografia, a RMN, a TC helicoidal, o caralho. Tem mesmo tudo, galegos dum raio). E tem 505 médicos e 811 camas.
E que mais? Bom, há o Hospital Comarcal de Valdeorras, com Medicina Interna, Cirurgia, Nefrologia com hemodiálise, Fisioterapia, Anestesiologia e Reanimação - pudera, têm todos, eu sei - Unidade de Dor e a puta que os pariu; pois é. E são 100 camas de internamento, e são 52 médicos.

E agora uma pausa educativa. Escutei assim uma pergunta, há bocadinho: "isso de Verín, com 13.000 habitantes, é preciso ver até que ponto vai o quase...".
Vai até aqui: 80 camas, 42 médicos, Medicina Interna, Cirurgia, Anestesiologia, Reanimação, Dermatologia, Unidade de Dor, Fisioterapia, Otorrino, Oftalmologia, Urologia, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria, Psiquiatria... por aí fora. A Régua, a cidade, tem 11.000 habitantes. E não tem quase nada.

Os cuidados de saúde são como o resto. Devem relacionar-se entre si da mesma maneira que se relacionam as pessoas: ou há relações - e têm de ser próximas, daí a importância dos lugares, porque os lugares são as pessoas em espaços pequenos, médios, do tamanho que tiverem - ou não as há e, nesse caso, que se foda a Bwin Liga.
Se é assim na Galiza Pobre, pensem como será na Galiza Rica. Na Catalunha, na Comunitat Valenciana, no País Basco, na Andaluzia, no caralho!
Eu é que misturei tudo? Muito bem, então desmisturem, a ver o cheiro das tintas!

Repito: pode haver coisas boas nos lugares e haver, na mesma, estradas que nos transportem entre lugares.
Nota de rodapé: já agora, entre o Tronco (Chaves) e Vila Real, são 99 Km. Ou seja, 1h13m, segundo o Via Michelin. Mulheres que estais de "interessâncias", apertai bem a vulva no caminho.

20.1.08

Esguichos de besugo

Começou o campeonato da Europa de andebol e eu já sabia que isto ia acontecer: "ó pai, desculpa lá, mas quando está a dar futebol, ou outra coisa qualquer que está a dar em directo, por exemplo o telejornal, ou uma daquelas coisas que tu dizes que não se repetem, por exemplo aquele programa sobre a carreira do Maradona, e nós queremos ver filmes ou outra coisa qualquer, tu dizes sempre que tem de se ver o que tu queres porque está a ser agora e não se repete, por isso agora vê lá se não te contradizes, porque o que está a dar em directo - e não se repete - é o andebol, e é logo o França - Suécia!".
Tanto sabia, que já tinha pensado em aceder, dar-lhes razão, mas ficar de trombas durante o tempo que fosse preciso para eles repararem que eu estava de trombas. Repararam quando estava 6-1, ganhava a França. Mesmo assim tive de os ajudar a reparar, com um grunhido "está renhido, isto, que jogo interessante...".
Iam passar-me o comando da televisão para a mão, depois de me verem as trombas, mas não o quis. Por acaso até estava a gostar de ver o jogo e não me apetecia fazer outra coisa, mas também não lhes disse isso. Disse apenas que "não, tudo bem", que íamos ver o resto do jogo; e acabei por desmontar "as trombas", o que os sossegou. Pelo menos até eu dizer "mas eu estou pela França, rapaziada", e estava, ou passei a estar, eles detestam a França, eu estou quase sempre por aqueles por quem ninguém está, mesmo que sejam mais fortes, a sério, eu quando me disseram que o Mystic River era um bom filme e comecei a vê-lo pensei logo "vou foder a cabeça a esta gente toda, vou pôr cara de cu desde o início ao fim", e lembro-me de até ter afirmado que o Sean Penn tinha cara mas era de ter violado a filha antes de a matar, não sei, há coisas que nunca hei-de saber sobre mim, mas talvez quando eu morrer me deixem ser eu a fazer-me - como a palavra, aliás, assim de repente, parece indicar - a autópsia. Por quê? Porque acredito que se me deixarem ser eu a ver do que morri acabarei por entender certas e determinadas merdas, tipo "por que vivi", ou "por que caralho é que vivi assim", ou, ainda, "foda-se, às tantas já devia mas era ter morrido há muito tempo, olha aqui esta coronária esquerda toda entupida... e a cerebral média esquerda, pá, parece um arame gorduroso! Por isso é que eu já não dizia coisa com coisa mas achava que sim..."
Uma vez chamaram-me manipulador, mas eu acho que não sou. Gosto é que reparem quando estou de trombas, mesmo que depois achem que não tenho razão para estar de trombas, e me dêem algum mimo.
Eu depois faço o que quiserem.
Se sou um manipulador, então sou-o duma maneira estúpida: manipulo só até obrigar os outros a perceberem que já podem manipular-me outra vez, como de costume.
Com a minha autorização, sim, senão fico de trombas muito tempo.

8.1.08

Tiques. Quem viu, viu.

Naquela irritação peculiar dos pícnicos dados à pirose e ao meteorismo, Campos tinha acabado de escutar de "não me lembro agora quem, um dos que lhe fez o plano, um que era suposto para Campos estar ao lado dele e do seu lado" coisas mal combinadas, imprevistas, que lhe soaram - a Campos - a indicador apontado à sua escara mais à mão.
Acontece isto, ou pode acontecer, mesmo aos Campos, e - no caso - aconteceu-lhe mesmo, porque nem sempre se lhe senta cadeiras-meias um acólito como o da ARS de Faro, um daqueles que se prestam, na plateia, ao papel de "ó tu de Faro, sobre isto, para foderes aquele ali, fala agora tu".

Estava Campos nesta indigestão quando falou Osório. Seja Osório quem for, estava Osório assentado do outro lado, em banquinho igual ao de Campos, por detrás de mesinha igual à de Campos, e ao lado de Silva (que, aliás, já tinha usufruído, impassível, da sua dose da dispepsia de Campos, ficando na mesma calmo - ao contrário de Campos, cuja temperança e "boa esperança" são feitas de Adamastores amestrados e rubicundez tradutora).
Estava-se ali, portanto, numa nivelação de pêndulo - ou assim parecia.

Interrompido por Osório nesse seu estertor de balbucios indispostos, Campos abriu a "pochette" dos tiques. Eu nem sei o que lhe disse Osório, não se ouviu, mas sei que há "pochettes" que são caixas de Pandora cheias de tiques.
Campos disse, a Osório, assim: "O senhor reduza-se mas é à sua..." e interrompeu-se.
Mais vermelho ainda, já suado, Campos demorou quase dois segundos a completar a frase que lhe brotara da vesícula. E completou-a assim, num adoço de hermesetas chocarreiras, o tique chocho de arrogante deficitário em enzimas : "... à sua condição de participante num debate democrático".
E foram para intervalo, lá no "reality show", altura em que devem ter sido accionados os mecanismos de segurança tendentes a libertar Campos - e o sossego simplex da metodologia - da "malta de Anadia", que manifestava cada vez mais intensamente o seu desamor por Campos, de maneira pouco beijoqueira, talvez mesmo achando-o uma insignificância, em lugar de o cuidar "participante num debate democrático".
Mas eu disto sei pouco, de maneira que me calo por uns dias. Já nem vi a segunda parte.

6.1.08

La Strada (leia-se "la carretera")




Vamos lá, tem de ser.
A Régua tem, agora, névoa. De Novembro a Março acontece muito isto, esta opacidade gasosa aqui por cima. Subimos três quilómetros, para o lado de Vila Real ou para as bandas de Lamego, e já está sol. Ou pode ser que esteja. Mas aqui não. Aqui nunca está, aqui é quase sempre este reumatismo cinzento e húmido. Depois vem Março e, por aí afora. Em Agosto, abafa-se de azul e de amarelo.
A introdução está feita.

Temos agora aqui uma ambulância. Temos agora aqui, finalmente, a segurança motriz. A viaturização unitária da infelicidade múltipla: organizem-se.
Temos agora aqui, pequenininho, o sonho de Cavaco, executado pelo seu mais dilecto e filosofex discípulo; temos agora aqui, também, o sonho dum amigo meu que, embora sem carta de condução, sonhou um dia, para ele, um Portugal assim, ele sempre a fazer de co-piloto: Portugal seria - e é -, cada vez mais, uma longa estrada, cheia de viaturas para transportar os que não estão bem. Os que não estão bem pontualmente e os que não estão bem em lugar nenhum. Os que precisam de estrada. Para chegarem ou para irem indo. E vindo. Sempre em movimento. Sentados na estrada o movimento é quase uniformemente movimentado.

Temos agora aqui, portanto, para consumo diário, uma espécie tosca da Espanha. O que temos é, penosa e árida, para consumo diário, a Espanha das férias tristes e cheias de moscas, aquela Espanha que é uma estrada preta com terra amarela à volta, aquele ermo que é a Espanha das férias no sul das férias, aquele deserto amarelo e preto de secura e alcatrão que nos enoja os pontos cardeais todos, aquela Espanha falsa que cuidamos ser a Espanha "aqui ao lado", até chegarmos a um sítio qualquer espanhol em que paremos o tempo suficiente para conseguirmos perceber que há gente que lá vive, em Espanha e, mais do que isso, vive lá e, só por isso, a Espanha já não é bem "aqui ao lado". E que, vivendo lá, ainda assim se queixa. E bem: a queixa é o intestino do coração, fica no lobo frontal, à esquerda de quem entra.
Vive gente em Ourense. Ourense tem um Hospital com uma Unidade de Cuidados Intensivos e mais merdas.

Chaves não tem, Bragança e Mirandela não têm, Macedo de Cavaleiros e Moncorvo não têm, Régua e Lamego não possuem. Tem isso, apenas, essas merdas, Vila Real.

Não vive gente, nos outros sítios - sim, aqui na Régua também não, aqui também não vive nada nem ninguém -, que não queira, em Portugal, para Portugal, senão estrada. Havendo estrada, meu Deus, parece mesmo que há tudo.
Ourense tem quase tudo, a Corunha também tem; e têm quase tudo Vigo, Pontevedra, Lugo, Ferrol, Santiago. Cuido que mesmo A Guarda tem quase tudo. Verín, sim, também tem tudo, ou quase. E há Zamora, Salamanca, Burgos, Valladolid, Badajoz e Ayamonte. Santander, Gijón, Pamplona, Vitória e Alicante. Valência. Madrid. Bilbau e Barcelona. San Sebastian. Albacete. Múrcia, Málaga e Sevilha. Cáceres e Cordoba. Saragoça e Toledo. Tarragona, Tordesillas. O caralho.
Los pueblos, "os pobos", os sítios, os lugares, a gente dos lugares.

E têm, na mesma, estradas.

1.1.08

Epílogo da nicotina

Aos abençoados fumadores que nunca fumaram, aos ex-fumadores que puderam escolher deixar de fumar quando ainda ninguém os proibia, aos pregadores dos comportamentos saudáveis, aos indefectíveis do ambiente, aos ortodoxos das regras morais, aos prescrutadores de vícios alheios, aos que insistem em conduzir-nos ao bom caminho, aos delatores dos pecados e dos pecadilhos, aos perseguidores dos excluídos, aos bufos anónimos que já se adivinham, aos que pregam sobre os vícios da vida na selva sem nunca terem passado a Taprobana, aos intolerantes, aos que só não se qualificam como intolerantes porque condenam por pura habituação, aos viciados na inquirição das vidas alheias, aos que se gratificam pela criação de guettos morais, a todos eles e sem esquecer o director-geral da saúde, que fez penhor da nomeação para honrar a nobre missão de erradicar os nicotinómanos nem o José Sócrates, pela promoção (involuntária) desta amostra civilizada de política de assepsia social, a Todos, muito obrigada pelo fervor com que se empenharam a forçar-me a deixar de fumar. Ainda que os meus gestos de fumadora (cada vez mais clandestina) passem agora a ser vigiados pelo Estado que me protege de comportamentos auto-agressores, aposto que respirarei bastante melhor de hoje em diante.

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