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10.11.05

Coisas que não querem dizer pescoço

Não me faz efeito nenhum saber que, numa sondagem qualquer, os médicos são os profissionais mais elogiados. Não se comparam certas coisas, não se comparam profissões assim, à balda, por um lado. Digo mais: não se compara nada assim. E é uma estupidez, por outro.

Aqui há uns tempos, numa sondagem semelhante, andávamos pelo meio da tabela. Pelos vistos. Nada mudou, de relevo, que possa conferir outro significado a esta sondagem, mais recente, que não seja o habitualíssimo "para onde me dá" de quem responde a este tipo de inquéritos. Que é que mudou? Nada. Não tem havido é conflitualidade, só isso.
Era o que Pedro Nunes, bastonário da Ordem, deveria ter respondido. E, já agora, no caso das "deontologias da indústria", deveria ter vindo dizer, já, que quanto aos brindes, os enfiem nas suas partes anatómicas correspondentes ao sítio onde o velho forçado Papillon (lembrei-me agora do Charrière, que querem?) introduzia o "governo". Aliás, eu espero dos farmacêuticos a mesma indignação que me atormenta, a este respeito.

Eu sinto-me tão respeitável hoje como há cinco anos. Sinto-me hoje, como há cinco anos me sentia, aquilo que sou: um profissional diferenciado dum Serviço que foi criado para servir mas não é constituído por servos. Como nenhum Serviço é. Servir não é ser servo, é dar uma finalidade digna à existência. Não é a única forma digna de estar na vida, mas é uma delas.

Marimbo-me para o significado desta sondagem. Não me acrescenta nada. Dou-lhe o mesmo valor que darei à proxima, em que surgiremos, os médicos, eventualmente, em décimo segundo lugar, atrás das cerzideiras e dos picheleiros. Basta esperar pela próxima gripe, pelo próximo amontoar de macas pelos hospitais, que voltaremos ao meio da tabela, se não for mais abaixo. Nada disto é substantivo. É uma brincadeira de quem não tem mais que fazer. Pode-se brincar, mas não se pode levar isto a sério.

As sondagens, os inquéritos, são perversos. Sobretudo em política, que é onde quero chegar. Como são levadas a sério por quem lhes responde, as sondagens acabam por criar uma espécie de enfeudamento à opinião veiculada. Um tipo responde àquilo mais ou menos à toa e, depois, dificilmente muda, enquista ali. Vincula-se ao que disse e encara a reflexão (e, sobretudo, a mudança de opinião, às vezes a primeira formulação de uma...) como se fosse uma traição. Não importa que tenha respondido anonimamente e ao calhas: respondeu, ele sabe o que respondeu, e não quer passar o resto dos seus dias a pensar que se traiu. As sondagens, mais do que inquirir, do que sondar, tendem a formatar a opinião. São perversas, são, um bocado.

Reparei que faltavam as putas, no inquérito. Se é por falta de regulamentação da profissão, regulamentem-na, que eu quero ver em que lugar ficam elas no próximo "corte longitudinal da tecitura profissional portuguesa, by marktest ou by outra inutilidade pública qualquer"que se fizer.

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