blog caliente.

10.6.04

Felizmente, acabou a campanha.

Lembro-me de, quando Sá Carneiro morreu, não se ouvir de nenhum dos seus adversários políticos qualquer manifestação de pesar. Lembro-me, também, de ter sabido que, aqui no Porto, multidões de populares feitos da mesma massa que os populares que hoje, na lota de Matosinhos, protagonizaram mais uma daquelas encenações terceiro-mundistas que exibem orgulhosamente ao resto do mundo, aqueles populares mais antigos, dizia eu, terem ido à Avenida dos Aliados festejar a morte de Sá Carneiro. E Soares Carneiro perdeu as presidenciais pouco tempo depois. Só passados muitos anos se começaram a ouvir vozes não filiadas ao PPD-PSD a ensaiar elogios e a apontar virtudes ao homem que "nunca chegou a ser".

Vista assim, à distância de mais de duas décadas, a democracia portuguesa ainda era jovem e, naturalmente, as clivagens ideológicas acentuadas. No entanto, tudo parecia estar no seu devido sítio. Os governos caíam porque havia oposições fortes e determinadas. Os populares manifestavam-se. As minorias não se coligavam. As eleições eram disputadas, o parlamento era frequentado por cabeças pensantes e de olhos postos em mudanças. Em suma: havia contraste. Hoje não.

À morte de Sousa Franco seguiu-se toda a espécie de manifestações públicas de condolências. De todos os quadrantes políticos surgiram os elogios quase beatos e comportados sobre a personalidade de um homem de bem que teve a má fortuna de se enfarinhar no seio de instituições e aparelhos partidários que, passadas duas décadas, apodreceram na democracia amadurecida. Hoje, cultiva-se a cidadania através da política arruaceira mascarada de boas maneiras e de comunicados politicamente correctos prontamente divulgados, quase em uníssono, por todo o espectro partidário.

E eu lembro-me com alguma frequência do admirável Francisco Sousa Tavares, o malcriado mais consistente e frontal que passou pela Assembleia da República. Que dizer daqueles dois fulaninhos da coligação - Ana Manso e o puto da Juventude Centrista -, só para dar os dois exemplos mais ostensivamente patéticos?

View blog authority