Esguichos de besugo triste
É lixado. Morre-se mesmo. Eu já vi morrer muita gente, mais gente do que a maior parte dos senhores algum dia verá. Isto não me faz banalizar a morte, antes me faz respeitá-la de forma suplementar, por a saber inevitável, globalizante, irreversível, uma espécie de ponto-final-parágrafo-e-não-se-muda-de-linha.Tenho escrito sobre isso, várias vezes, até porque eu próprio tenho medo de morrer. Aqui há uns anos não tinha, agora já tenho.
Estou a desviar-me do que me trouxe aqui. A morte de Sousa Franco. Bonito epitáfio lhe fez o Paco que, se eu fosse político, seria meu adversário. Como não sou, é apenas meu amigo, um grande, grande amigo. E um homem bom.
Morreu de isquemia aguda do miocárdio, Sousa Franco. Um enfarte extenso. O coração morreu, pronto. Tinha, segundo ouvi dizer (e era previsível) doença coronária. Talvez não soubesse. Há mal-estares que nos vão passando e que a gente interpreta como "flatos" que não são. Foi disso que morreu hoje, e disso morreria amanhã, após outra emoção qualquer. Não morreu doutra coisa.
Ninguém tem culpa. Não me lixem com isso da culpa imediata. Sousa Franco levou um tiro "de acaso", desfechado pelas suas próprias artérias coronárias. O "sniper" estava dentro dele.
Isto é uma coisa. E acaba aqui.
Outra coisa é esta, e eu estou à vontade para a dizer porque chamei nomes aos bois no tempo competente: escusava bem, Sousa Franco, de ter morrido depois de ter participado numa campanha em que várias alimárias mais ou menos mansas o tentaram apoucar nas suas imperfeições físicas; em que ministros ridículos e sem carácter o "periquitaram"; em que futuras gestoras de Fundações ("falsas virgens", culpadas do passado e do futuro), o culparam do presente; em que "fedúncias de aparelhozinho apendicular" lhe imputaram paternidades de défices e misérias (o tempo, o tempo o dirá, cambada de precipitados, consumidores alarves do fast-food da palavra! Saibam esperar, caralho, para depois não se arrependerem, perante a morte inevitável de ningúem, por terem andado a fingir pragmatismos bacocos!); em que guerrilheiros da "partidarite interna" lhe invadiram a decência na praça do peixe.
São duas coisas diferentes. Choro a primeira delas: a morte dum homem que não suspeitou, sequer, da minha existência, que tinha valor e era cabeça-de-lista dum projecto eleitoral que, como só não sabe quem não me lê (felizardos!), ia - e vai! - receber o meu voto, no dia 13. São coisas minhas. Sou parcial e hei-de ser sempre. Adeus, Sousa Franco, a gente lá vai ter. Foda-se!
A outra coisa, o "enxurro de cloaca" de que falava Tomás de Alencar (noutro contexto bem mais discutível), nem sequer a lamento. Gente que só respeita a trégua da morte não merece lamentos. Nem tréguas. Não gosto deles e ponto final. Não gosto.
Por enquanto, ainda consigo mudar de linha.
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