Cinema e futebol
Ter vontade não basta. Os dias têm corrido depressa demais, o que é, claramente, um bom sinal. Para além disso - hélas! - o besugo não larga o meu computador. Há uns minutos atrás, apanhei-o, distraído, a ver o Suécia - Holanda, esgueirei-me pelo corredor e consegui chegar aqui primeiro. Como é forte, tive de o fintar. Pois.Falar em fintas faz-me vir à memória várias coisas agradáveis. Algumas, muito mais do que agradáveis. Porque se impõe a qualquer blogger minimamente experiente que comente todos e quaisquer eventos de relevância nacional, não poderia eu, evidentemente, passar sem falar do jogo mais emocionante de que há memória. Aqui houve gente que, depois do golo do Ricardo, chorou da maneira mais bonita que existe para se usarem lágrimas. Nessa noite, abandonei todas os meus chips racionais e transformei-me numa espécie de macumbeira profundamente crente na existência do acaso que determina a sorte e o azar do nosso fatalista destino. Até previ, imagine-se, o golo do Rui Costa e só voltei à realidade quando o Postiga, com a inconsciência descontraída que só se encontra em quem, pela sua tenra idade, pode perder tudo sem perder quase nada, marcou o já famoso classy penalty.
Falava eu em fintas. Ver cinema é, quase sempre, uma actividade intelectualmente estimulante da flutuante inércia em que quase toda a gente mergulha a partir das duas da madrugada. É, porém, imprescindível que haja companhia: quer pela hora (para combater o sono), quer pela natureza da actividade. Apreciar arte só é um acto individual no primeiro momento da observação, obrigando, quase imediatamente após o tratamento emocional da informação, à partilha dos dados. Eram, por isso, cinco da madrugada quando aqui se discutiu, ontem à noite, o Mystic River, o Sean Penn (e a sua relação incestuosa (?!) com a filha), o Tim Robbins, o acaso, a fraqueza, a força, a tragédia clássica, a expiação da culpa. Acabamos a discutir a náusea. Não a de Sartre, mas outra igualmente respeitável. E eu adormeci, já o dia despontava, pensando que já devia ter visto o Mystic River há mais tempo.
Vou jantar. Antes, não deixo de dar as boas-vindas ao Stkaneko, o maninho convicto do besugo. Convictamente íntegro. A ele, o acaso atribuiu o milésimo post deste blogue o que, se se pensar no jogo da passada quinta-feira, há-de querer dizer alguma coisa.
<< Home