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24.11.05

Presidenciais

Fazendo eu parte de um blog que deliberou dar oficialmente apoio ao Manuel Alegre, apoio esse que, por parte dos meus colegas é mais que oficial, pessoal e fervoroso, venho aqui também escrever sobre o assunto “presidenciais”. Em termos dificilmente publicáveis no blog da campanha do M. Alegre, mas ainda assim nos meus termos. E vou dizer o que acho de cada um dos candidatos, e do que têm feito.

a) Cavaco – Vai gerindo com, mais que parcimónia, prudência as suas intervenções. E é criticado por isso (neste blog é mais gozado, mas isso tem que ver com o carácter lúdico que é comum a todos os seus escritores).

No entanto, e pensando em termos estritamente políticos, faz bem.

Cavaco enfrenta um de dois cenários. Ou ganha na primeira volta ou tem que debater – a sério - na campanha da segunda volta. Para ele, não se põe sequer a questão de não passar à segunda volta.

Encarando o primeiro destes cenários, Cavaco é colocado ante uma campanha em que há vários outros candidatos. Sabe que todos dirão mal dele, mas sabe também que todos dirão mal uns dos outros, até porque, ou estão a marcar terreno na esquerda eleitoral (Jerónimo e Louçã), ou estão a disputar entre si a passagem à segunda volta (Alegre e Soares). Cavaco não só não tem qualquer necessidade de entrar “na guerra” como, pelo seu comedimento eleitoral, faz passar para o primeiro plano noticioso não o que dele os outros dizem, mas o que entre eles é dito. E ele lá vai cumprindo o seu calendário, numa campanha verdadeiramente à parte.

É certo que isso pode provocar o seu apagamento nesta campanha, mas é incerto que isso o prejudique. Pode na verdade impedi-lo de ganhar na primeira volta, mas que consequências teria para ele entrar a fundo em controvérsia com outros candidatos? Provavelmente, e porque não é fácil “disparar” contra quatro, com o mesmo impacto mediático, teria que “eleger” um adversário principal. O que este, obviamente, agradeceria. E o que daria a este inegável vantagem numa segunda volta.

Assim, acho que Cavaco não quer repetir o erro de Freitas em 1986. Que apostou tudo na primeira volta, chegando, “a bout de souffle” e sem mais nada para dar, à segunda que, inapelavelmente, perdeu.

E por isso, Cavaco só fará verdadeiramente campanha na segunda volta. Se precisar de a fazer. Contra um adversário que ele já sabe quem é. E com quem entrará, seguramente, em forte polémica.

b) Soares – É o mais “político” dos candidatos. No sentido de que é aquele que tem maior intuição sobre aquilo de que necessita para ganhar o seu primeiro grande objectivo: passar à segunda volta.

Para atingir esse objectivo, Soares tem necessidade de forçar a bipolarização da campanha. E foi por isso que se lançou em sucessivos e violentos ataques ao Cavaco. Não lhe correu, no entanto, bem. O Cavaco não só não contra-ataca como – e muito bem – salientou hoje o Manuel Alegre na entrevista publicada no Público – “nem sequer se defende”. Soares fica assim a falar sozinho, e começa, no que já parece manobra de recurso, a atacar o próprio Manuel Alegre (por via da, fisicamente, interessante Joana Amaral Dias). O que duvido que surta outro efeito se não o de reforçar a ideia de que o Manuel Alegre começa a deter vantagem à esquerda.

É prematuro vaticinar derrota ao Mário Soares, conhecida que é a sua capacidade política. Mas que a vida não lhe tem corrido bem é uma evidência.

c) Alegre – Passada uma fase de indefinição, quase apagamento do palco mediático, por força da primeira vaga de assalto que a este (ao palco) fez o Soares, começa a ressurgir. Tem um discurso bastante bem construído e, a meu ver, lançou no momento certo (no início do abrandamento da campanha do Soares) um “facto político” (que é, como se sabe, aquilo que aguça o lápis aos jornalistas) ao falar/recordar as peripécias do processo interno do PS que levou ao apoio oficial deste partido ao Soares.

Recuperado o palco, e com as sondagens sempre a favorecê-lo, opta por um discurso que é sereno, que não dá demasiada importância a nenhum dos outros candidatos (nem sequer ao Cavaco) e que, pela diferença, o faz marcar pontos face ao Soares. De tudo é bom exemplo a excelente entrevista hoje publicada no “Público”. Vale a pena lê-la.

É, para meu desgosto, um discurso fortemente marcado pelos temas caros à esquerda (defendendo, por exemplo, a solução legislativa do aborto), mas ainda assim demarca-se da histeria anti-cavaquista (ao dizer que a democracia não está em risco se ele for eleito, juntando no entanto que a sua natureza “crispada”, a par de uma hipotética tendência do mesmo para apoiar soluções ultra-liberais poderá vir a resultar, na actual conjuntura, no agravamento futuro de fracturas sociais).

Mas compreende-se que o seu discurso seja essencialmente virado para o eleitorado “de esquerda”. Afinal, Alegre não está ainda a fazer campanha para ganhar as eleições, mas apenas para forçar Cavaco a uma segunda volta contra ele. Aí sim, terá que recentrar o discurso. O que não significa retirar uma vírgula que seja ao que já disse e dirá até à primeira volta. Significa apenas que os “leit motivs” do seu discurso terão que ser dirigidos a todo o eleitorado, e não a metade dele.

O Cavaco que se cuide, se houver segunda volta e o Manuel Alegre fôr nela o seu adversário.

d) Jerónimo – Gozando do capital de simpatia que a recente campanha autárquica lhe granjeou e não temendo a comparação com Francisco Louçã, candidatou-se procurando, por um lado, não o desbaratar e, por outro, dar ao “seu” eleitorado um quadrado onde colocar a cruz. Faz a sua campanha, com os temas habituais num líder do PCP e com um objectivo não confesso. Ter mais votos que o Louçã. Acredito que terá, porque é menos afectado do que o seu adversário directo pela bipolarização à esquerda.

e) Louçã – Já me enganei muitas vezes ( deve ser por isso, entre outras coisas, que não aprecio particularmente o Cavaco), por isso posso estar mais uma vez enganado, mas acho que a vida não vai correr bem ao Louçã nestas eleições. O eleitorado BE é muito volátil e não se me afigura que o mesmo possa votar maciça e ordeiramente no candidato “oficial” que lhe foi indicado, mesmo sendo ele o inevitável Francisco Louçã. Por um lado, porque este heterogéneo eleitorado, essencialmente urbano, é composto por realidades tão diferentes como filhos-família “com vontade de ser diferentes” de votantes do PSD e do CDS e também soixante-huitards serôdios que se zangaram com o PS e/ou se desiludiram com o PC e se acham pós-modernos. E esta malta é bem capaz de votar no Cavaco, no Alegre ou no Soares, por razões que só eles sabem, do alto da sua suprema “coerência” de raciocínio, explicar.

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