Um trombo na corrente é uma jangada em que já não viaja ninguém
Deitado na maca, sei muito bem o quero dizer mas não me sai. Um tipo de bata pergunta-me como me chamo e eu sei muito bem que me chamo José Luís, mas balbucio, só, "pneu".O tipo de bata, que conseguiu olhar-me dentro dois segundos, depois olhou para fora, diz a uma tipa de pijama azul, loira e de olhos azuis como o pijama, que devo ter um enfarte do território da cerebral média esquerda, o que deve ser verdade: tentei esmurrá-lo com a mão direita, pontapeá-lo com o pé direito, e só senti a impotência e a vómica das vertigens. Nenhum dos membros se mexeu. A minha impotência funcional impediu-me um processo no cível, que eu sei muito bem que tenho uma puta duma trombose e que não há vara criminal para os deficitários do encéfalo.
Se conseguisse, dizia-lhe que a cerebral posterior deve estar lixada, também, porque sinto muitas tonturas. Mas não consigo. Só consigo dizer "pneu" e coisas assim, de borracha. Talvez seja um sinal para apagar a vida que tive e começar outra, mas vai ser difícil, não sou canhoto senão de pensamento. E foi desse lado que se me entupiram os vasos, devo estar prestes a cantar uma coisa qualquer da Madalena Iglésias, sei quem ele é, a irmã do Julio, não me liguem, devo estar a ficar pior, já nem o lobo límbico me salva de mim e do meu museu dos coxos, putas das artérias e da nau catrineta, eu era o segundo marinheiro, o que dava "a baínha do meu punhal".
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