O nó
O aperto começou-me no meio do peito e estranhei, que antes estava bem.Desapertei a gravata e fui abrir a janela, notando que suava. "É do calor", pensei, embora Novembro seja o tempo dos primeiros frios.
Estava enjoado e, se não me contivesse, vomitava. "Que é que eu tenho?", que me aperta o peito como se fosse uma prensa, lembrei-me da prensa das uvas que o meu avô tinha lá em casa, no armazém, e pensei que estava nela, ele a apertar cada vez mais , para sair o sumo, e eu cada vez mais enjoado, o cheiro do "mascoto" a nausear-me o raciocínio.
"Aperta cada vez mais, eu vou morrer, tu queres ver que vou morrer?!", e de quê, que é esta merda, eu estava tão bem, dei um beijo aos filhos de manhã, como de costume, e agora estou assim, não quero aqui ninguém, eu estou bem, estou bem, não, não quero nada, quero que me digam o que tenho, quero que me digam que estou bem, mas não estou, aperta-me já no queixo, agora, "Aperta-me no queixo!", merda, "ó Luciana! venha cá!", ela veio "que tem, senhor doutor?", "não tenho nada, a verdade é que não tenho nada se você, que é a única pessoa que está aqui, me safar disto, ajude-me, Luciana!", e ela, competente, sabedora das regras que impõem a família como valor absoluto do absolutamente correcto, lá foi, ligeira, saindo dali, devagarinho e ligeira, naquela rapidez lerda e costumeira da circunstância, deixando-me o sossego suado, cada vez mais suado e frio, de que "vou ligar à sua esposa, senhor doutor", e eu a pensar, já de certeza feita, "estou fodido, que o aperto é uma merda qualquer do coração e demora muito a marcar as teclas todas do meu 112 privativo, que nunca há-de chegar".
Não sei se morri ou não, eu sei lá se faço parte dos que, em se antecipando, têm a sorte inteira e calma dos que se antecipam bem, ainda a tempo de quase tudo?
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