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18.12.04

O Binário de Schindler

Penso que o que mais os impressionou foi verem a crueza da morte sem efeitos especiais. E que se pode morrer de forma simples.
Quando Amon, o Bom, matou pelas costas (e à distância) o rapaz que lhe tinha maltratado a sela do cavalo, depois de ter tentado perdoá-lo, como lhe tinha ensinado Schindler, os meus filhos abanaram.
Tinham acreditado que é a mesma coisa "ser filho da puta mas gostar de coisas bonitas" e "gostar de coisas bonitas mas ser filho da puta". Perceberam a conversa de Schindler com Stern, lembram-se?

Depois, aprenderam que pode não haver regras de conduta que nos salvem do mal: Helen, a bela judia que foi escolhida pelo tarado e cirrótico Amon para o servir, disse-o. "Sei que vou morrer, porque ele mata sem critério". Isto é um intróito para o resto da questão, porque um dia os meus filhos hão-de perguntar-se: "Calma aí, qual é a diferença entre matar sem critério e matar com critério, a não ser permitir nortear o caminho triste de quem corre risco acrescido de ser morto, com ou sem critério, por quem dita as regras?".

Faz-lhes bem. O bem é uma coisa altamente variável, sobretudo para os filhos da puta que vivem baseados na cómoda e inteligente relatividade, mas eu quero que os meus filhos esqueçam a relatividade quando se trata de valores absolutos. É o caso do direito à vida de quem não quer morrer, um sistema binário, no limite: sim ou não.
Uma questão de livre arbítrio que, desculpem, não se aplica a questões fetais. Não me deturpem. Não tem, sequer, comparação. Trata-se aqui do direito à vida de quem não quer morrer, trata-se aqui de martírios. O verdadeiro martírio é o sofrimento da inteligência, da identidade. E isto precisa de ser dito, que é para acabar de vez com mariquices e não misturarmos questões; quando não, qualquer conversa fica uma açorda de sotainas.

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