O estúpido ganhou
As eleições americanas lá decorreram, desta vez com um final clássico (choro de um lado, festa do outro) e sem as peripécias do anterior. O seu resultado (a vitória do Bush) dá uma liçãozinha de humildade democrática a todos - sobretudo na Europa - que o engolem com dificuldade.Na política interna não faço ideia, mas na política externa sou crítico da "administração Bush", e sempre achei o derrube do Saddam menos prioritário do que um investimento localizado e constante na recuperação do Afeganistão. Hoje ainda será mais claro que a invasão do Iraque foi, no plano estratégico e diplomático um erro - em linguagem vulgar, um salto maior do que a perna.
Em qualquer caso, o tipo de ataques que a "bem-pensante" sociedade europeia desencadeou contra o Bush errou manifestamente o alvo. Regra geral, está por estas bandas instalado o conceito de que o tipo é, basicamente, estúpido. E não deve haver esquerdófilo jovem de barbicha, ou velho com-saudades-do-tempo-em-que-era-associativo, que não sinta por ele algo próximo do desprezo.
As coisas, na verdade, não mudam muito. Tudo isto me lembra o que há vinte anos os jovens barbichas os velhos saudosos de então diziam do Reagan, cuja passagem pela história do Séc. XX ficou no entanto indelevelmente marcada (e mais não digo, senão a lolita acusa-me de viver no passado com o meu anti-comunismo serôdio).
O engraçado disto tudo é, no entanto, que quem pensa que o Bush é estúpido e o despreza não se dá conta da absoluta vacuidade dessa acusação. Ele não é - evidentemente - estúpido, mais que não seja porque se o fosse não chegava onde chegou (agora duas vezes).
E é por não se darem conta desta tão simples evidência que, perante as eleições de ontem, as reacções encontradas ou são de incredulidade ou de profunda confusão. Desta vez nem dá para discutir o sistema eleitoral americano, considerando que, apesar da magra vantagem do Bush no Colégio Eleitoral que designa o Presidente dos EUA (274 - 252) , a verdade é que ele teve mais três milhões e seiscentos mil votos que o Kerry.
Resta, é claro, desenvolver teorias da conspiração, culpar os judeus americanos, os cubanos de Miami, o Bin Laden e quejandos ... e chamar estúpidos aos americanos em geral (esta última hipótese é, em regra, o desporto favorito de quem perde eleições).
A meu ver, no entanto, devem encontrar as razões da sua derrota em figuras como o Michael Moore. Eu não sei quantos votos o seu filme-panfleto deu ao Kerry ou tirou ao Bush. Mas desconfio que são menos do que aqueles que deu ao Bush, admitindo mesmo que não tirou ao Kerry, mas à abstenção.
Não é por se chamar estúpido, primário ou coisa similar a um adversário que ele passa a sê-lo. E se, na verdade, o não for, quem assim o tratar subestima-o, fica em desvantagem no "combate" e ... provavelmente ... perde. Só ganhou ao estúpido numa coisa: em estupidez.
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