Aplausos em Algés, estaladas na Portela
No meu post inaugural de 2006 não vou falar de política, nem de fado, mas vou falar de (blearrgh ...) futebol. Um pouco.Tendo eu pelo futebol profissional e pelos seus intervenientes mais visíveis (dirigentes, jogadores, árbitros, jornalistas, agentes, treinadores e claques) um baixíssimo conceito, muito próximo de os considerar uma espécie de escória humana que finge estar ligada a um desporto ... que de desporto já não tem nada, sou regularmente confrontado com o facto de ter adeptos dessa coisa na família. Uns do Benfica, outros do Sporting, outros do Porto e até alguns do Vitória de Guimarães.
No que me respeita, nenhum deles tenta, sequer, interessar-me nos jogos que se vão realizando. Mas tentam-no no que respeita ao meu filho. Tenho, nessa matéria, procurado evitar fundamentalismos (até lhe dei um jogo de futebol para a PS2) e tenho, sobretudo, aproveitado o facto de ele ter preferências clubísticas diferentes na família para lhe ir deixando a entender - perante cada assédio que lhe fazem - que, na verdade, todos os clubes são iguais e nenhum merece mais consideração que outro (ainda não lhe digo que não merecem nenhuma consideração, isso espero que ele mais tarde acabe por perceber). Se ele gostar de ver jogar bom futebol, pois que veja, mas com o mesmo desprendimento com que qualquer adepto fanático de um clube nacional vê um jogo entre o Manchester United e o Aston Villa: só para ver jogar bem.
Em todo o caso, vou procurando que o rapaz se interesse pelo que me interessa, ou seja, pelos desportos motorizados. Tenho vários jogos deste género para a mesma PS2, que ele aliás joga conduzindo já muito bem, tenho uma razoável pista de carrinhos montada no quarto dele, para o qual escapulimos os dois quando possível e, no que respeita a transmissões televisivas, já vai sendo espectador atento e interessado das provas de F1 e motas, ou de reportagens sobre rallyes. E, saindo de casa, já foi comigo algumas vezes ao autódromo do Estoril e mesmo já andou por caminhos enlameados para assistir a uma classificativa de um rally. Finalmente, já guiou karts, que isto de só ver também chateia.
Mas não há dúvida que a patente diferença entre a "malta" do automobilismo e a "malta" do futebol dá uma preciosa ajuda a estes meus esforços. Estes últimos dias o meu filho teve ocasião de testemunhar isso mesmo, como agora brevemente conto.
Sábado,dia 31, fui com ele e com a minha filha mais velha ver a saída do Lisboa-Dakar. Estávamos às 8 da manhã na rotunda de Algés (já não vimos as motas, que saíam a partir de umas inconcebíveis 6h30), e começámos a ver passar, às vezes sozinhos, às vezes em grupos, aquela colecção de chanfrados. Primeiro os profissionais da coisa, depois a interminável corte de amadores e finalmente os carolas que pegam num jipe e tentam chegar com ele a Dakar, por poucas que sejam as hipóteses de o conseguirem.
Ali estivémos, junto a um semáforo que fez parar a maior parte deles mesmo ao pé de nós e da impressionante moldura humana que ali se juntou, até cerca do meio dia, quando passou, no grupo dos últimos camiões, a Elisabete Jacinto. E devo dizer que foi uma experiência refrescante. Não só o ambiente era de festa, com uma calorosa despedida (e "boa sorte", que era o que mais se ouvia) a todos e cada um dos concorrentes, como estes corresponderam inteiramente, acenando, buzinando, agradecendo, fazendo umas graças ... enfim. Não houve vaias, ninguém insultou ninguém, e até - como é costume acontecer nestas coisas - ocorreram momentos hilariantes, como por exemplo o fortíssimo aplauso, acompanhado de intensas buzinadelas, concedido a um camião do lixo que, por qualquer acaso, ia no trânsito e foi rodeado dos impressionantes camiões de prova e de assistência. E até aquele funcionário camarário, provavelmente no fim de uma jornada nocturna de desagradável trabalho, se agarrou à buzina e agradeceu efusivamente os votos de "boa sorte, até Dakar!" que lhe foram dispensados. Há-de contar o que lhe aconteceu a amigos e família durante algum tempo.
Os meus filhos ficaram extasiados com tudo aquilo, fartaram-se de gritar palavras de apoio aos concorrentes e ali estiveram 4 horas sem um queixume nem um momento de aborrecimento.
Curioso é que o meu filho me perguntou, pouco depois de chegarmos e quando estavam ainda a passar as equipas oficiais, por qual é que eu estava. Ao que respondi: "Como todos os que aqui estão, estou por todos. Mas quando passarem os portugueses temos que fazer mais barulho ainda!".
E assim foi.
Quanto às cenas de estalada nos aeroportos e às declarações dos gangsters que mandam nos clubes de futebol e/ou que à volta deles gravitam, ele que veja, como julgo que terá visto. Eu nem procuro comentar. Acho demasiado evidente.
<< Home