blog caliente.

25.8.05

Mises, boys bands e fucsias

Há dias, mais afortunados (ou menos, de acordo com a perspectiva), em que o mundo se nos mostra colorido, abundante de bizarrias impossiveis de não ser notadas. Os dias em que o mundo se parece com os reality shows na sua forma mais pura, como os daquele brasileiro infinitamente asqueroso (começando pela mise, mas sem esgotar o tema, que eu já volto a ele) que comenta as pseudo-traições de namorados(as) assanhados(as) por gigolos do bas-fond carioca (ou semelhante) pagos, presumo, a cinco euros à hora (ou fracção).

Aqui, em Trinidad e Tobago, paraíso que escolhi para a minha curta estadia de férias, também há shows inusitados. Num jantar calmo e indolente, consequência directa e necessária de um dia longo de calor, eles estavam ali, insinuando-se, interrompendo, à força, a minha paz preguiçosa. Rodeavam-me por todos os lados, menos por um - o que dava para o interior do restaurante.

Os da esquerda compunham um casalinho britânico. Ela, descaradamente plagiadora das spice girls, quer na roupa, quer na expressão pateta; ele, no melhor e mais puro género brit-pop, de cabelo cortado à toa, melenas puxadas para a testa e para as patilhas, de forma tão absolutamente humorística que, pensei eu, se deve rir de si próprio de cada vez que se olha ao espelho. Aposto que sonha ser o vocalista dos Gorillaz ou dos Coldplay e que ensaia em casa, cantando com a mesma voz pastosa os êxitos das bandas britânicas mais enjoativas de que há memória.

Em frente a mim, sentava-se um adolescente de nacionalidade indefinida. A camisa, longa, desapertada em cima e em baixo, de forma a mostrar o umbigo; as calças arrastando pelo chão, caídas até metade das ancas, fazendo sobressair a cuequinha azul turquesa; dependurada na calça fashion, uma mariconera estrategicamente posicionada. O petiz entrou no restaurante com pose rígida, longamente estudada: mãos nos bolsos e olhar de baixo para cima, à James Dean. Augurei-lhe um triste futuro, situado algures entre o estilo do Robbie Williams e o Kapinha. Mas, dada a tenra idade, ainda há esperança.

Na mesa situada imediatamente atrás da minha jantava uma família lisboeta, composta por mãe, filho, sobrinha e tia velhinha. A mãe, notoriamente fã da Lili Caneças, aperaltou-se toda para o jantar, vestindo-se de preto, fucsia, excesso de jóias e brilhos. Comandava a família como um brigadeiro, com passinhos pequenos e voz de comando, tratando o filho e a sobrinha por "você", como ouviu dizer que fazem as pessoas de bem e movimentando-se ao longo do buffet, gulosa, à cata dos melhores croquetes. Até que eu, saboreando o robalo quietinha e silenciosa, dei um pulo na cadeira quando a senhora se levantou e, colocada por cima de mim, decidiu que tinha ordens para dar ao empregado de mesa. Olhei-a supreendida, mas ela não se rendeu; depois desculpei-a, imaginando que, seguramente, ainda não tinha chegado ao capítulo sobre "não gritar por cima da mesa vizinha" do livro daquela senhora com a cabela cilíndrica que se chama Paula Bobone.

Não me entendam mal. Eu não tenho nada contra o mau gosto genuíno, de criação. Daqueles que vem com o chá. Os maus gostos que se ostentam, orgulhosos de si mesmos, inconscientes dos gritinhos de aflição dos bem educados. Também não tenho, aliás, nada contra o mau gosto fabricado. Mas esse, por isso mesmo, diverte-me.

Os D'ZRT passaram por aqui há uns dias atrás e eu quase tive de ir pedir-lhes um autógrafo. Quase.

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