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7.4.05

Açores

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A avenida de Ponta Delgada não é a avenida "E". Essa é interior, perpendicular à lonjura, e, se bem me lembro, nem se chama assim. A avenida de Ponta Delgada é a outra, esta, a que fica em frente ao mar.
É um ladrilhado preto e branco, do comprimento do mar e da espessura do céu. Um céu quase sempre cinzento, com alguns espaços azuis e amarelos, que aquecem a pintura. A avenida levava-nos, em deixando-nos ir, quase, da Calheta ao Hospital. Que era verde claro, antigo e encerado. À noite, sim, a avenida era assim, quase violeta. Uma magia tensa, de tons amarelos e alaranjados coados pelo breu enevoado. A escuridão brilhante do "capacete"...

Guardei uma Grande Reportagem, cuido que de há 3 anos, uma do tempo em que lá mandava o Francisco, em que se falava dos Açores como uma espécie de país que nunca existiu. Guardei-a porque é muito boa e porque me recorda, sempre que a releio, ciscos de "pedra-pomes" de mim.

Fala-se lá de Estrela Rego, que era o director do Hospital. De Sousa Pedro, que dirigia o serviço onde dei os primeiros passos na especialidade, pela mão de Armando Anahory e (amigo pouco mais velho) António Goulart: um faialense erecto, filho do velho "Dr. Sebastião", que nunca vi, com costela picarota. E irmão doutro Goulart, um "cetáceo" que desafiou João Bosco nas eleições regionais de 1989, perdendo bem, renhida e civilizadamente. Os antigos independentistas eram, já, no meu tempo, decalques dum sonho. Enganador, mas um sonho, pareceu-me.

Recordo-me de José de Almeida, o "antigo grande agitador", que morava nas Capelas, nas águas agitadas do norte da ilha, entre os Mosteiros e a Ribeira Grande, ampla distância. Mas que tratei, durante uns dias, duma coisa simples, que ele não se lembra, nem eu me lembrava. Mas que relembro, agora, porque recomecei a ouvir as músicas malucas do Tordo, no seu tempo de Açores, que foi (quase) o meu tempo. E porque os Açores são, para mim, uma mistura de cinzento, azul, verde, música bonita, bruma e ideias claras sobre a variabilidade quase diária das coisas.

Quando lá estive, já não se lançavam carros de comunas para a doca. E pescava-se lá bem. Na doca. Sedimentos nunca são inúteis, podem ser adubo de mais férteis mares. E de terras maiores, prolongadas na lonjura.

Os Açores, ainda hoje, me humedecem a secura. Em certas noites que se alongam.

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