blog caliente.

26.3.05

En hora buena

Há bons blogues de médicos jovens, por aí. Bom, há por aí bons blogues, por que não de médicos? E sendo assim, por que não de médicos jovens?

Este é um deles.
Ao João, que se interroga sobre se será o "Harrison's" o tratado escolhido para o seu exame de acesso à especialidade, que questiona a bondade da liberalização da venda dos medicamentos isentos de prescrição médica e que, por exemplo, afina pelo diapasão (excelente!) dos cuidados paliativos, crendo-os como eficazes substitutos da chamada "morte assistida", eu digo o seguinte.

1 - O "Harrison's" é um excelente livro, João. Se souberes o teu "Harrison's", farás um excelente exame, mesmo que o livro adoptado venha a ser o "Stein", ou o "Cecil". Acredita. E, já que vais ler o "Harrison's" de fio a pavio, aproveita para pensar na possibilidade de vires a ser internista. Eu recomendo sempre isto, quanto mais não seja para me sentir cada vez mais acompanhado.

2 - Aqui há uns dias, a propósito da venda livre dos vários paracetamois, lembrei-me do aumento significativo de transplantes hepáticos ocorridos no Reino Unido desde que passaram a vender-se "panadóis" fora do sítio. Tu, agora, vieste com o exemplo da aspirina. Outro bom exemplo, como o são os ibuprofenos e, em geral, todos os AINEs.
Como não faz sentido, por um lado, ter um técnico em cada banca de venda livre e, por outro lado, grande parte dos portugueses são (somos, pronto) analfabetos funcionais (somos imprudentes, refiro-me a isto), dou-te razão.
De facto, o mais adequado (a ser sentida necessidade de massificar o acesso livre ao medicamento, o que é outra discussão) seria permitir o aumento do número de farmácias.
No entanto, fiz uma mini-sondagem a alguns amigos meus. E verifiquei o seguinte: disseram-me que, mesmo nas farmácias, quando se trata de adquirirem medicamentos de venda livre, quem está atrás do balcão (geralmente não é um farmacêutico) nada lhes costuma dizer, em regra, sobre a boa utilização do que lhes vende. Ora, assim, também não vamos lá. De acordo?

3 - Não contraponhas, como se se substituissem mutuamente, a implementação de uma eficaz "rede" nacional de cuidados paliativos - que não a há, eu sei, mas devia haver; e, se queres um exemplo, o Plano Oncológico Nacional 2000-2005 prevê a sua criação e desenvolvimento, com fanfarras de "objectivo primordial" - e a necessidade de discutir e legislar sobre "morte assistida".
É que, João, tu já decidiste o que preferes. Mas pode haver quem queira decidir diferentemente.
E deixa a questão dos custos de lado. Para já, não te preocupes. Ninguém vai conseguir ir por aí, despudoradamente, agitando facturas como se fossem argumentos, ainda durante muito tempo. Felizmente.

Nos Estados Unidos talvez sim, mas eles atingiram um nirvana muito especial, só acessível a quem não tem, de facto, nem extenso passado, nem grande vergonha nas entranhas (que é onde se passa, nas entranhas mais obscuras, a maior parte do "sonho americano").

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