Zelar
O avião seguiu para São Nicolau como se fosse uma camioneta de carreira vocacionada para apeadeiros. Depois, lá aterrou em S. Vicente.Com tudo isto, o Sporting acabou por sofrer um golo cedo, por azar. Por sofrer uma expulsão, por sofrer outra, porque foi assim que as coisas se passaram. Se eu fosse holandês de Roterdão, talvez não se tivessem passado assim, as coisas. Teria uma visão diferente das coisas, às tantas por ter as ventas carregadas de "hash" legal. Isto se fosse mais novo, que aos 44 anos a única droga que nos não envergonha é o pensamento. Pensamento rima com excremento, mas depende sempre de quem cheira.
Ganhámos 2-1 aos holandeses. O avião poisou bem. E ainda bem. E, no entanto, continuam as macas no meu hospital, admito agora que sem culpas de ninguém. Somos muitos, somos fracos, temos dores e febres urgentes todos os dias.
Ele, o meu amigo, foi comigo à urgência, esteve lá comigo. Sábado, de madrugada. Viu e percebeu, na sua visão crítica de tudo o que vê, que não exagero quando falo em untos que se acumulam nas macas que escasseiam.
Estou a falar, aqui, de um amigo de visão longa sobre as coisas, mesmo as que vê de fora. Um jurista (vade retro!) que seduziu, pela sua tolerância neutra de quem "está ali, apenas, por solidariedade", os que estão ali porque têm de estar. Os médicos, os enfermeiros. Os doentes não sei se seduziu, excepto um, que levámos lá de carro, com dores, para regressarmos com ele já fino, a falar de filmes, sempre no banco de trás.
O avião pousou, o blogame mucho está calmo, mas o blogame mucho é muito maior do que quem nele escreve. É uma espécie de Entroncamento sem magalas. Sem alferes milicianos. Com mais verde, mais azul, menos tristeza. Mais quente, sem ser mais seco, com menos fenómenos.
Viva o Sporting. E que os homens e as mulheres se temperem no sal de coisas mais importantes que decretos e regulamentos. O fortuito, o acidental, têm, por vezes, força de lição. E há abraços que se dão de longe. Incidentalmente.
O Peseiro foi mal expulso pelo austríaco poliglota. Detesto austríacos modernos: vivem à sombra do talento antigo e musical de antigos austríacos, alemães, húngaros e checos. São muito parolos, os austríacos. São brancos demais e, isto não é desprezível, mais teutónicos que os próprios alemães. Os alemães, ao menos, ainda hoje se penitenciam por causa dum austríaco. Os austríacos não se arrependem de alemão nenhum, excepto de Wagner, porque preferem o José Figueiras a "merdas chatas". Eu prefiro Brahms, que era alemão, como Wagner. Mas eu sou simples. Os austríacos são o contraponto "odeleriú" do fado. São execráveis aproveitadores do talento alheio, excepto Lauda, alguns outros automobilistas e Mendell. Mas este era padre e lidava com ervilhas.
Vamos passar a eliminatória, nós, o Sporting. Se Deus ajudar, na sua misericórdia eterna, o nosso talento, o nosso merecimento e a nossa crença. Vamos sim. E vamos ser mais felizes do que somos agora. Uns dias mais, outros menos, mas sempre mais que menos. E nunca seremos vogais de ninguém. Seremos sempre ... consoante.
E as macas vão deixar de ser precisas porque Deus vai ajudar-me. E a quem precisa delas, das macas e da ajuda de Deus. E o avião vai poisar de regresso, sereno, na única cidade de Portugal (ao menos, das que têm mais de 500.000 habitantes) em que não há mais paneleiros do que mar. Que é o Porto.
Esta prosa solta leva rumo. Tem destinatários. Tem o endereço de quem está lá longe, na cafraria dos aeroportos feitos apeadeiros. Tem o de quem está mais perto e foi solidário comigo, com o meu irmão, em noite de precisão. As rimas podem ser preciosidades. A gratidão e a precisão são rima fácil. Mas genuína, na sua singeleza fácil e imediata.
É um texto fraco, solto, este. Se é. Dos piores que aí há. Mas o Sporting lá ganhou. Isto desculpa quase tudo, justifica muita coisa. Até este texto.
Texto... isto? Parvo besugo, que confundes um texto com um pretexto para escreveres o que te sai.
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