Eleitorados (2)
Devo dizer que a lista de "eleitorados" que aqui escrevi foi feita de rajada (deu-me para aquilo naquele momento) e, não sendo eu sociólogo, psicólogo, político ou coisa do género, não tenho a pretensão de que a mesma seja mais do que o reflexo da minha visão "dos outros". Ou, como o besugo escreveu, os meus "outros" sou eu a olhar para eles.Dito isto, acho normal a tentação em que todos caímos de - olhando para uma qualquer enumeração de eleitores/tipo, mesmo que elaborada por quem não tem, manifestamente, qualificações para tanto - procurar-nos a nós próprios nessa enumeração. O besugo tentou encontrar-se e não conseguiu. A lolita - como é mulher, com tudo o que isso implica e que aqui me dispenso de referir - apenas disse que tentou procurar-ME. Eu próprio, como o besugo, li e reli o que tinha acabado de escrever, tentando encontrar-me naquelas classificações. Sem sucesso.
É que, ao elaborar aquela lista, não olhei nem para mim nem para o que de vós conheço. Estive mesmo a olhar para "outros".
De qualquer maneira, acho difícil que nenhum de nós três se reveja ao menos em aspectos parcelares de duas ou três categorias daqueles eleitores/tipo que inventei.
E assim, faço aqui um exercício de auto-classificação. Não tentarei fazê-lo quanto aos meus colegas de blogue. Mas a verdade é que nenhum de vós correponde - a meu ver - a nenhum dos eleitores/tipo que elenquei. O mais que posso dizer é que, de acordo com aquilo que de vós conheço - e a minha amizade por vós não é "intrometida", pelo que não vos conheço tanto como isso - o besugo andará algures entre o e) e o f), mais para o último que para o primeiro. A lolita, por seu lado, andará entre o c) e a identificada subespécie do d).
Dito isto, e voltando ao que me respeita, considero-me algures entre os eleitores/tipo a), b) e c). O discurso do Salazar em Guimarães, no início do que viria a ser o "Estado Novo" (o famoso discurso sobre, num tempo de dúvida e angústia, quais as certezas que ele considerava essenciais para que Portugal seguisse um caminho) é um discurso que aprecio. E, já o disse aqui, considero o Salazar o melhor estadista que Portugal teve no séc. XX. No entanto ... sou convictamente democrata, e acho que o Salazarismo feneceu por ser um regime sem democracia e, portanto, sem possibilidade de gerar em si mesmo a renovação necessária e de permitir a este País reprojectar regularmente o futuro. Na verdade, o futuro do "Estado Novo" nos anos 30 era o passado dos anos 60. Mas não era possível mudar de projecto. E por isso, um estadista que poderia ter passado para a história como um marco de sucesso na época em que era jovem e rompeu com o estado de desgraça crónica do País, será por ela julgado sobretudo à luz da quase imobilização do País na segunda metade do séc. XX (enfim, e para ser mais rigoroso, nos quase 30 anos que mediaram entre o fim da II Grande Guerra e a revolução de 1974). Mais por isso do que pela sua suposta característica "ditatorial". Na verdade, seja pela sua matriz católica, seja pela sua formação jurídica, o Salazar foi um fraco ditador, se é que ditador é nome que se lhe possa chamar.
Assim, na alínea a) não caibo. Não só não me arrependo de ter votado como convictamente defendo a democracia enquanto regime político. E, também, não vivo do passado ou da sua saudade (apesar de a lolita dizer que sim, de cada vez que o meu anti-comunismo primário assoma aos meus escritos). Estou assim mais próximo da alínea b), a do eleitorado "conservador", do que da a).
Ainda assim, também não me revejo inteiramente na descrição que eu próprio fiz do eleitor/tipo dessa categoria. Por uma razão, que a lolita sagazmente descortinou: sou incapaz de votar no PSD e, muito menos, no PS. Não é tanto por o PSD ser ou deixar de ser de esquerda. É que acho, e achei sempre, que o PSD não é ideologicamente nada. Ou por outra, é o "centro" em todo o seu esplendor. Tudo e o seu contrário, dependendo do líder e das circunstâncias. Um Partido com tal falta de raíz pode gerir - por exemplo com um Cavaco - com sucesso, se a conjuntura fôr de feição. Em tempos adversos, em que seja necessário fazer face a interesses instalados, ou destruir pela raíz causas do imobilismo do País e/ou da mediocridade geral da sociedade, é um partido incapaz. O poder político é um meio para chegar a um fim. Para o PSD - e também para o PS - o poder político é um fim em si mesmo. E acho que, assim, fica também explicado porque é que não me enquadro no eleitor/tipo da alínea c) Concordo que a generalidade dos políticos é incompetente, concordo que o motor da sociedade e da economia tem que ser a sociedade e detesto o Estado-paternalista que alguns conservadores apreciam, mas defender que o País poderia ser gerido por um conjunto de tecnocratas com sucesso no sector privado é tomar a nuvem por Juno e, mais uma vez, não ter ideias. E elas fazem falta. Fazem mais falta do que o pragmatismo e a defesa da pura "eficácia" que é apanágio desse tipo de eleitores.
Nota: Curiosamente, um destes que eu conheço - que diz ser de si próprio ser "de centro-direita" e que falou comigo ontem disse-me que ia votar pela primeira vez PS. Não porque seja socialista ou de esquerda. Mas porque quer que o Santana deixe de ser líder do PSD, para que o PSD possa fazer oposição eficaz e substituir rapidamente o PS, com outro líder. Votar CDS não considera, sequer como hipótese. O CDS nunca indicará o Primeiro Ministro, e o que interessa é quem vai ser Primeiro Ministro.
Nota2: A lolita diz que eu apresento o eleitorado de direita como mais pensador, crítico e esclarecido. E o de esquerda mais disciplinado e vulnerável à demagogia. Não é verdade e não sei onde foi buscar tal ideia. Quem eu acho que não pensa é o eleitorado centrista. É apenas verdade que este constitui a maioria do eleitorado.
Nota3: Eu acho que o eleitorado de esquerda pensa, mas pensa mal.
Nota4: Mas isso sou eu a vê-los, como diria o besugo.
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