Miscelânea (holandesas, ditadores, SNS, reformas, discussões conjugais e ... portagens)
1 - As holandesas lá foram embora, prometendo chatear o Zé Barroso sempre que puderem, e o Portas sempre que conseguirem. Boa sorte. Eles merecem ser chateados. Não por isso, mas por outras coisas.2 - Aqui, a conversa ficou circular. Não nos conseguimos entender, mas também conseguimos não nos desentender, o que já não é mau de todo, quando a matéria em discussão é esta.
3 - Uma nota apenas, que já não é propriamente sobre o aborto, mas sobre a alusão que o Sagan faz ao Hitler e ao Stalin no artigo que o besugo aqui referiu e que eu fui ler. Não acho a alusão inocente (nem o é a citação do Lutero, mas como o texto se dirigia a protestantes - nessa parte - estou-me nas tintas).
4 - E como não gosto, nem quero, que subconscientemente se assimilem as leis nazis ou comunistas sobre o aborto às ideias dos que pensam como eu penso, gostava de deixar esclarecido o seguinte: esses genocidas não regularam o aborto por serem contra ou a favor da proibição de se tirar a vida ao feto, ou em atenção a direitos da mulher sobre o mesmo. Esses gajos regularam-no por referência a supostos interesses colectivos que, para eles, se sobrepunham a qualquer espécie de direitos individuais.
5 - É por isso que é errado trazer esses sacanas (a minha linguagem vai piorando) para este debate ou usá-los para o que quer que seja.
6 - Curiosamente, o Hitler (sobretudo esse) costuma ser (mal) trazido a este debate pelos "anti-abortistas" (os "pró vida", os "proibicionistas", ponham-lhes o rótulo que quiserem). E, ao contrário do Sagan, por causa do fomento do aborto.
7 - Confusos? Não vale a pena. É aliás muito simples: sendo verdade que o Hitler proibiu o aborto às arianas, não o é menos que liberalizou a sua prática - sem quaisquer restrições de motivo ou fase da gravidez - às mulheres das restantes "raças" que iam ficando sob a alçada do Reich (judias, eslavas, ciganas e não arianas em geral). Sendo de qualquer modo sub-humanas, para que é que haviam de trazer a este mundo, ainda por cima no "espaço vital" que os arianos queriam ocupar, os seus - aliás geneticamente inferiores - rebentos? Que abortassem à vontado, portanto.
9 - Já o Stalin deu-se conta (depois de o Lenin - esse democrata - ter liberalizado o aborto) de que podia faltar "carne para canhão" na USSR (e/ou mão de obra nos "Sovkhozes"). Vai daí, e porque o superior interesse colectivo da pátria dos trabalhadores o exigia, toca de proibir as mulheres de interromperem a necessária "produção de filhos". Era uma questão de cumprimento dos planos quinquenais, que diabo.
10 - Enfim, quer num caso, quer no outro, nada há que se relacione com o que aqui se discutiu. E por isso, melhor teria feito o Sagan em não avocar a este debate tais alimárias.
Mudando de assunto ...
11 - Grassou ontem em minha casa (leia-se: entre mim e a minha mulher) acesa (mas civilizada, descansem os leitores) discussão sobre o projectado "pagamento escalonado das despesas de saúde nas unidades públicas consoante os rendimentos declarados pelos utentes".
12 - A questão não é tanto a da praticabilidade desse sistema ou da falibilidade das declarações de IRS. Sendo essa uma questão real, suponho que não altera as premissas de princípio. Mais que não fosse, haveria (mais um) bom motivo para se melhorar o regime fiscal e mais um incentivo para o Estado combater a evasão e a fraude fiscais com eficácia.
13 - A questão é esta: eu acho - sempre achei - que o papel assistencialista do Estado é isso mesmo. Assistencialista. E por isso, entendo que os serviços públicos, sempre que possível, devem fazer "discriminação positiva" a favor daqueles que não podem (por falta de meios) recorrer ao mesmo tipo de serviços que a iniciativa privada lhes proporciona.
14 - Aliás eu, que há uns anos acompanhava de perto a evolução dos números da segurança social (agora menos) não tenho quaisquer dúvidas de que, salvo improvável milagre, um dia as reformas acabam. E que, como não podem acabar para todos, devem acabar para aqueles que delas não precisarem.
15 - E que, até lá, convinha começar a meter na cabeça das pessoas que não podem existir "boas" reformas. E que, se o dinheiro escassear nos cofres do Estado, é para os que na verdade precisam que ele deve ser dirigido.
16 - Antes de divagar mais, e voltando ao serviço público de saúde ... a minha mulher não pensa como eu. Ela diz que a distinção que o Estado deve fazer é na colecta - quem ganha mais paga mais, quem ganha menos paga menos - e que é a esse nível que o esforço de solidariedade a que todos somos obrigados deve ser feito. E que, em consequência, não deve fazer depois uma nova diferenciação, quando as pessoas se dirigem aos serviços do Estado, desde logo, aos seus hospitais. E que - até - se as pessoas perceberem que têm (mais) um bom motivo para fugir ao fisco, mais fugirão ou tentarão fazê-lo.
17 - Assim, a questão é esta: o reequilibrio social que o Estado deve prosseguir deve ser centrado na sua política de receita (política fiscal) ou também na de despesa (seja na saúde, na educação ou em qualquer outra área em que o Estado presta serviços aos seus cidadãos)?
18 - Divagação final: de repente lembrei-me que a minha Espace - só por ser mais alta - paga o dobro da portagem que paga o Ferrari de uma pessoa que eu conheço ... acho que vou perguntar à minha mulher se acha isto justo, sem lhe dizer que estou ainda a pensar na conversa de ontem ...
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