Ao Médico Explica...
O senhor parece não ter gostado do que eu escrevi aqui. Vejamos se eu me consigo explicar.Não faça extrapolações. A mim não me passou pela cabeça transformar nada em coisa nenhuma. O que me chocou, com franqueza, foi a aparente ligeireza com que afirmou, referindo-se aos IPOs, que “enquanto "perdem tempo com a paliação" podem atrasar-se diagnósticos dos quais podem resultar remissões completas com terapêutica atempada”. Admito, talvez, que o transformei numa espécie de paradigma da crueza com que a gestão hospitalar “vanguardista” trata os cuidados de saúde, de que o senhor sozinho, evidentemente, não tem culpa nenhuma. Todos temos.
Para mim, não existe qualquer dúvida sobre a equivalente importância dos cuidados paliativos face ao tratamento específico da doença. Nunca se “perde tempo” com cuidados paliativos, por muito elevados e importantes que sejam outros interesses a prosseguir.
Como lhe digo, não pretendi transformar nada disto em “programa” ou "anti-programa" do seu blogue. Eu nem sequer o conheço; só conheço o que escreve, além da sua confessada e, aliás, louvável vontade de esclarecer os leigos das questões éticas da sua profissão. Limitei-me a interpretar e opinar publicamente sobre uma opinião sua - também publicamente divulgada. Pela mesma razão, não aceito que afirme que quebrei uma insólita ética blogosférica que me impede de fazer citações sobre aquilo que publicamente escreve, quando, de resto, tive o cuidado de fazer o link para o seu post. Só seria, hipoteticamente, censurável o que eu fiz – destacar um parágrafo conclusivo escrito por si - se o que o senhor escreveu não fosse público e se os seus leitores não pudessem ler o seu texto integral. Peço-lhe: defenda as suas opiniões, mas não se vitimize à minha custa.
No primeiro parágrafo do meu post não me referia a si. Referia-me, pelo contrário, a uma visão primária do conhecimento de cada um em relação a si próprio. Tal como Sócrates – o clássico, não o “feroz” - leu no Oráculo de Delfos: conhece-te a ti mesmo. O que o fez passar a ter imensas dúvidas. Isto faz bem e é bom, ter dúvidas.
Também não pretendi deturpar o seu raciocínio, apenas interpretei aquilo que publicamente escreveu. Com link, repito, para o seu post. Da mesma forma, note que não tenho de omitir ou deixar de omitir as suas conclusões: o meu comentário só respeitava àquela sua frase, nele citada - está longe de ser um tratado sobre aquilo que o senhor escreve.
Falta-me a experiência como prestadora de cuidados de saúde, o que me parece natural; não me falta, contudo, a experiência como utente. Não queira retirar-me legitimidade para participar nesta discussão através da pseudo-pedagogia corrente de quem conhece a saúde por dentro melhor do que quem está cá fora. Tudo isso é muito respeitável, tal como são, para mim, importantes as minhas reflexões sobre o assunto e, ainda, como as suas também o são. Ninguém escreve sobre o mundo. Escreve-se, isso sim, sobre uma dada visão do mundo. O que faz com que, humildemente, cada um de nós – eu e você – reconheçamos que nenhum tem a razão toda.
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