Amanhã passa-me
Já aqui me enchi de dizer o mal que penso da TVI. Leia-se, por TVI, "sensacionalismo", que é rio que transborda o leito da TVI (há outras emissoras) e desagua nas nossas consciências, tantas vezes mar plácido de bovinas e cúmplices tranquilidades, desinteressadas e interesseiras. Acabei de inventar um passivo e baralhado (mas ávido) ruminante com guelras, evidentemente. Por mim chamava-lhe "povo português", mas a taxonomia já está toda inventada. Os senhores já sabem que me dá para aqui, às vezes, também me desculpam mais esta.Hoje, a TVI passou duas notícias que eu vi e gostei de ver. Para variar. Não que eu tenha ideia que as notícias devam ser feitas para eu gostar. Nada disso. Eu entendo, até, que as notícias não devem ser "feitas". Devem ser "dadas", que eu não gosto de ser manipulado fora de contextos estritamente necessários ou saborosos. Contudo, já que se insiste na apresentação da notícia "embrulhada" no papel que mais parece brilhar na altura, admito que prefiro este tipo de "embrulho", simples e bonito, sem purpurinas.
Pela positiva, sem grandes esgares nem grande empolgamento, a TVI veio dizer bem do Hospital de D. Estefânia, "A Estefânia". É um acto de justiça. Já muitas crianças lá morreram, já muitas crianças lá sobreviveram, mas a reportagem é ilustrativa da utilidade, da bondade, da indispensabilidade dum Sistema Nacional de Saúde que é considerado o 11º (acho eu) melhor do Mundo pela OMS. Eu não espero consensos, nem sequer discussão, que isto é indiscutível para mim. Já dei para o peditório, individual ou colectivo, do "a mim trataram-me mal, por isso merda", esse ferrete malévolo com que "os que se queixam sempre" contagiam quem tende a "emprenhar só pelos ouvidos", fechando o coração ao empenho dos outros. Como se cada nódoa obrigasse a deitar fora toalhas antigas, bonitas.
A TVI, numa bonita reportagem, mostrou "A Estefânia" que todos gostamos de saber que existe. Mostrou o que se passa (eu acredito nisto com o meu coração todo) em todos os Hospitais Públicos Portugueses... em muitas ocasiões. Muitas mesmo. Quase sempre. Corrigir este quase pode ser difícil, pode custar dinheiro, mas façam assim: não mo dêem a mim, juro que não o quero. Dêem-no, de boa fé, aos Hospitais Públicos. E, depois, pagando-me o mesmo, vigiem a maneira como eu o faço gastar, controlem o meu empenhamento, mas façam-no com a bonomia de quem confia em mim, porque é suposto eu saber o que faço. Se fizerem assim, eu sorrio-vos também, de alma aberta, por me deixarem viver a minha vida a tentar ser útil. A servir quem precisa de mim. A fazer que a minha vida tenha algum sentido, no fim de contas.
A outra notícia mostrou as vantagens do sistema de vídeo-conferência no colmatar de dificuldades das pessoas que têm... inferioridades. Num País em que a interioridade geográfica acarreta uma inferioridade de cidadania intolerável, sinto-me orgulhoso (o orgulho é um sentimento passageiro e simples, não é grande pecado, passa-me amanhã) por motivos muito meus, muito dos meus doentes. A minha vídeo-conferência semanal, muito dos tempos pré-SA (cuja saudade me vai matando aos poucos), lá vai sobrevivendo.
A TVI enerva-me muitas vezes. Hoje emocionou-me muito. Como já disse, infelizmente, amanhã passa-me.
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