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18.7.07

Revoluções

O Jorge Peliteiro lança-me um desafio que mais ninguém se atreveria a lançar-me: quer que eu diga as minhas cinco últimas leituras.

Malfeitor!

Eu leio poucos livros novos, muito poucos. Não tenho tempo, não tenho gosto. Leio até meio, às vezes nem tanto, algumas coisas: depois do meio parece-me sempre que já li.

Não consumo literatura, agora. Sobretudo o que escrevem os meus contemporâneos. Pecado meu? Certamente, sim, uma burrice grande. Mas, geralmente, chateiam-me muito.

Mas releio muito, nesta fase da minha vida.

E, portanto, posso falar, sem mentir, das minhas "releituras". São muitas, mas como me pedem só cinco - e presumo que se está aqui a falar de livros -, proponho cinco escritos de Eça.

Ficam aqui, como penhor de amizade a dois poveiros acidentais.

1 - A Capital: a história dum Artur Corvelo, ex-académica e ainda mais efeminada criatura, que quer ser autor admirado em Lisboa pelos seus versinhos e dramaturgias líricas. Ajudante de farmácia em Oliveira, sobrinho de tias religiosas, recebe herança de padrinho e emigra para a Capital que é, no seu entender, um Mundo! Encontra a classe jornalística, personificada por Melchior - o lambe-cus infame -, é escorraçado pela sociedade caduca do jet-set oitocentista (oitocentista, sim), mete-se com espanholas, putas e pseudo-aristocratas falidos, poetas sebosos e republicanos catacúmbicos. Fracassa, é humilhado, enxovalhado, perde o guito, e regressa a Oliveira: depenado e com histórias chulas de fadistas e nobrezas moles para contar no bilhar da vila. Ao Rabecaz.

2 - Alves e Companhia: um Alves de princípios rígidos, careca e comerciante próspero, descobre Ludovina, sua mulher e manteúda legal, nos braços de Machado, o seu sócio e protegido. E logo no aniversário do casamento de ambos, que é no que dá regressar a casa mais cedo, de surpresa, sem bater com os pés. Alves expulsa Ludovina, devolvendo-a à casa paterna, e quer que Machado aceite um suicídio sorteado, "quem perder mata-se".

Tudo isto acaba por evoluir para um jogo de cedências, em que Alves não se bate, Alves mantém mesada gorda para Ludovina e família paterna irem a banhos para Vieira de Leiria, até à cedência final: Alves pede a Ludovina para voltar a casa, meses depois. E ela volta. Volta-se sempre, eu sei.

3 - O Conde de Abranhos: um tonto, a julgar pela pena narradora de Zagalo, acaba por se manter dentro da pele do "ser ministeriável" até - pelo menos - 2007 (ou 2017, depende de quando se relê). A diferença entre um tonto destes e um filho da puta é mínima. Sim, os tontos são, geralmente, filhos da puta que se babam para fora.

4 - Textos do Distrito de Évora: eis aqui um conjunto de artigos publicados num jornal em que só havia um jornalista, que - por acaso - era Eça de Queiroz.
Eça humilhou bastantes vezes a "Folha do Sul", sobretudo esta, e "O Bejense". Isto entre outras folhas situacionistas e beatas que havia, no imenso Alentejo que é Portugal.
A discussão sobre a origem, finalidade e propriedade dos cemitérios é extraordinária de simples. Penso que esta foi com "O Bem Público". Cito esta porque pode fazer-se o mesmo exercício de demolição, hoje e depois de amanhã, com a maior parte dos artigos empolados que saem em jornais, ou emergem em blogues. Desde que seja Eça a fazê-lo, pode fazer-se bem isto. Talvez por isso se não faça mais.

5 - Os Maias: a história de João da Ega e de Afonso da Maia, contada como se o facto de Carlos da Maia e Maria Eduarda serem irmãos e andarem a papar-se de forma elegante fosse relevante, ainda por cima enquadrada por criaturas marcantes como Alencar (o que Bulhão Pato cuidou ser caricatura sua), Cohen e Gouvarinho (os enfeitados), e os "inhos", Damasozinho-flor e Eusebiozinho-mole.

Eram só cinco, mas espreitem ainda os Contos, as Cartas, A Ilustre Casa de Ramires, o resto inteiro.
Excepto A Cidade e as Serras: este é muito lido mas não vale nada, estava talvez bêbado.

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