Arroz de lebre
Que pena eu tenho, que pena, de não podermos jogar a final de amanhã, contra a Itália e, amanhã sim, ganharmos ou perdermos aquilo a que fomos.Fomos gozados. A imprensa e a opinião pública, cada vez mais confundidas nos seus enredos de cortelho, são iguais em todos os lugares. Quem vive da opinião (pública ou impressa) nunca a dará: vendê-la-á sempre. Isto é uma verdade imensa. Disseram, de nós, que somos falsos, fingidos, palhaços, mortos de fome, desleais. Ver os ingleses e os franceses a chamarem desleal a alguém é como observar duas putas a benzerem-se na missa do galo depois de comerem Cristo.
E se fosse Manuel Alegre a estar, hoje, em Estugarda? Em lugar do rígido e desinteressante hiato que agora simboliza o nosso anedotário de cagões, esse homem pio que, quando pia, parece D. Duarte Pio, que quando se mexe, parece D. Duarte Pio, que quando lhe pedem que fale seja do que for (para que se perguntam coisas a um "Dai-li-dou-pio"?) acaba sempre por dizer que "o que é preciso é trabalhar!", como diria D. Duarte Pio, à falta de melhor sentença pia.
Não foi capaz de dizer mais nada. Disse o que andou sempre a dizer, a vida toda, desde que comprou o Citroen-dele da nossa desventura-nossa. A guinchar o que já sabemos. O que irrita mais é que o guincha, sempre, como se instruísse o povo, como se estivesse a fazer doutrina de chavões.
Não gosto dele. Se perdermos hoje há-de ser por culpa dele. Há-de estar a ajeitar a peúga CD, enquanto babuja merdas, cheio de saliva na boca bisonha, para a chanceler alemã, se ela lá for, com aquele ar de tontinha - que não é, que não é -, no seu inglês de escolinha, em lugar de estar ali atento, vigilante, português e sem vergonha, de cachecol.
Manuel Alegre escreveu outra crónica.
O Luís Aguiar-Conraria manda-me os textos, mas não os publica ele. É um chato de merda. Às tantas, quer mesmo que seja eu a publicá-los, raio do ilhéu. E eu, que sou teimoso como uma mula mas muito rápido a sair da confusão, já de repente, faço-lhe a vontade. Andamos assim, pronto. Andamos neste andar.
Um dia destes almoçamos.
Que se almoça? Arroz de lebre. E um tinto velho de Macedo de Cavaleiros com cinco minutos de frigorífico, que isto tudo passar-se-á, como se passa sempre tudo, na Primavera ou no Verão.
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