Desculpa?
Não sei se te percebo bem, Alonso.Por um lado, parece-me que concordas que há limites para a relativização, até para vermos se a tolerância, um excelente valor "cá dentro", não se torna numa paneleirice pegada de gajos e gajas extremamente compreensivos com os que estão "lá fora", sem jeito nenhum.
Quero crer, também, que o nosso tecto mais alto e mais aconchegante é a dignidade humana, tal como a entendemos "cá dentro". Desde que verificamos - para que serve a razão? - que a dignidade humana, "lá fora", é tratada com as receitas antigas e sempre perpetuadas - por fé? por paixão? hum...duvido largamente- pelos transportadores da verdade debaixo do turbante, as mezinhas da lapidação, da praga rogada, da amputação (mesmo da consciência), carecem de sentido todas as comparações com o que se passa "cá dentro", porque o que se passa "lá fora" é uma ignomínia e uma ignomínia merece um fundo ponto final, não um "talvez" seguido de "reticências e vamos lá a ver".
Não aprecio, como sabes, muitas coisas que se passam "cá dentro". Da mesma forma que não possuo um aparelho de ar condicionado para quando está calor demais, "cá dentro", por causa do calor que está "lá fora".
A questão é mesmo essa: nem é preciso invocar o IP4 (estava péssimo, melhorou-se), não vale a pena falar de futebol (até porque o Porto empatou e a lolita deve estar dispéptica), nem de excessos de fé e de paixão, que tanto há "cá dentro" como "lá fora". É como o calor de verão: sente-se "cá dentro" mas sabe-se lindamente quando vem "de fora".
E olha que "lá fora" pode ser praticamente "cá dentro", como em Quebradas. Não sei quantos daqueles Quebradenses de que falei ontem têm ar condicionado no domicílio, quantos passam fome, quantos são benfiquistas, quantos foram lavar as mãos depois do serviço e quantos só acedem à legítima habitação por quelhos esconsos de terra batida. Mas sei isto: são criminosos.
Sei que, o que fizeram, não se faz. Sei que todos os dias se cometem crimes que não podemos calar, quando eles vêm à conversa, da mesma forma que sei que não podemos passar o nosso tempo a denunciá-los e a lutar contra eles, porque temos filhos para criar e porque já levamos todos, de Quaresma, a nossa penosa dose diária.
Sei, sei mesmo, que por nenhum motivo se podem apedrejar pessoas, nem ostentar violentamente estandartes de fé como se fossem baluartes de civilização, porque - como bem sabes - foi sob estandartes de fés (há fés estranhas, temos mesmo, de novo pujantes, os novos e os velhos crentes no deus-dinheiro, a vender bandeirinhas baratuchas, mão-de-obra de leste...) que se cometeram as maiores atrocidades, por todo o lado, contra as civilizações. A barbárie não é uma civillização: é outra coisa.
Creio, por fim, que caricaturar um Deus, mesmo um Deus Grandioso e Severo, não deve ser punido pelos homens. Ele saberá punir-nos, quando chegar o tempo, sem precisar da canzoada que late por ele, se Ele cuidar ser isso, esse supremo castigo, necessário e merecido. Que se condenem os homens pelos crimes dos homens, mesmo que cometidos em nome de Deus: isso poupar-Lhe-á trabalho.
P.S. - Creio, ainda, que saí dos limites do teu escrito. Acontece-me. Se te percebi mal, desculpa. Se te entendi bem, desanca-me.
Um abraço.
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