blog caliente.

30.11.05

E.R.

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Não é interessante contar histórias que não importam a ninguém. Muito menos contar um pedaço de filme, um pequeno episódio duma série longa de comprida: quem viu, viu, quem não viu, não viu.
Ainda por cima, não sei contar histórias. Perco-me em detalhes, disperso-me e disperso. Já me disseram isto e é verdade. Para que conto esta? Sinceramente, para nada. Por que conto? Isso é diferente. Conto, porque vi. E porque é uma história simples. Eu, às outras, nem as entendo.

A sério, se tiverem tempo, continuem a ler. É um favor que me fazem.

Na semana passada, um miúdo maltratado pelo pai (fracturas várias, hematomas, essas coisas) foi colocado sob a custódia da assistência social. A assistência social é uma merda, já se sabe, mas tenta evitar mais fracturas. É uma questão a discutir, sobretudo pelos pobres do mundo. Se a querem.

O pai ficou aborrecido e, neste episódio, transformou-se num serial killer, por lhe terem tirado o miúdo dos amores e das práticas torcionárias (onde é que isto se mistura?). Matou várias pessoas, feriu gravemente outras. Criou, sem o saber, uma colecção de histórias que, excepto no final, o ultrapassaram largamente.

Disparou sobre um homem de cinquenta anos, talvez menos, com SIDA, que escolheu morrer do ferimento em lugar de se esvair, deslizante, na sua falta de CD4. Benton quis operá-lo, mesmo contra a sua vontade verbalmente expressa, mas isso é porque há Bentons que não concebem que ninguém lhes morra, mesmo quando lhes dizem que se estão a cagar para o "lhes", perfeitamente.

Tentou abater um miúdo, mas falhou. Ficou quase ileso, o petiz. Mas a radiografia que lhe fizeram levantou uma questão: terá um osteossarcoma? Tinha. Criou-se uma cumplicidade entre Carter e o miúdo, acabando ambos a perspectivar percentagens... 70% ou 30%, vida ou morte, nenhum deles sabia, nunca se sabe. E eu nunca saberei entender estas conversas entre pais e filhos, em que o pai (que era ali Carter?) não se limita a afagar o filho, tristemente.

Finalmente, foi ele próprio abatido, sumariamente, chegando em estado precário ao Hospital. Tinha-se discutido, na urgência, que tudo aquilo se devia à venda livre de armas nos EUA. Eis que quem o abate é um taxista puto, que também gosta de andar armado. Greene, que já foi agredido quase até morrer no sítio em que trabalha, sabe que está na lista do assassino, porque foi ele que desencadeou o processo que levou à separação dos dois entes fulcrais desta pequena história: o pai que maltrata mas ama e o filho que é maltratado mas também ama. E o taxista, sabedor do drama pelas notícias, quando um tipo com ar de louco lhe pede para o levar a uma morada qualquer, percebe que tem ali, à mão, o homicida. Dispara cinco tiros, prostra-o, mas não o mata. Fez isto com uma arma de venda livre, o que coloca dúvidas em mentes mais franzinas.

O homem chega vivo ao hospital, reconhece Greene (que, entretanto, estivera a tratar da assistente social, também ela vítima da sede de tiros e vingança do liberal mais liberal do filme, o pai que ama e que bate, que a vida é como é!) e ameaça-o, mesmo quase morto.

Greene trata-o, executa maquinalmente e de forma eficaz os gestos do costume, mesmo sabendo que a morada que o assassino ordenou ao taxista, na sua última viagem, era a sua, a do careca Dr. Greene, aquela morada onde estavam, "jiboiando", a mulher e o rebento.
Quando calha terem de subir para o Bloco, é Greene que vai com ele. O homem olha-o com ódio, como desde sempre. Subitamente, no monitor, lê-se "fibrilhação ventricular". Greene arma as pás, carrega a 360 W, lê o monitor, que se aproxima das nossas caras, lê os olhos do outro, que também sofrem de "zoom" e, determinadamente, dispara as pás no ar, sucessivamente, deixando-o morrer aos sarrabiscos.

Que se passou ali?
Quem viu que diga. Eu vi e sei que, se escrever sobre isto, demoro uma semana, quinze dias, a vida inteira. Sem me sair nada de jeito.

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