A oportunidade para ter liberdade - ou a liberdade de ter oportunidade.
Não, Gabriel. Ter liberdade nada tem a ver com um aumento de preços sem outra justificação além da alavanca do aumento do IVA. O exercício da liberdade é - e isto é básico - muito mais auto-controle do que libertinagem. Quando se age em liberdade, cada atitude e cada comportamento se justifica, senão de uma forma puramente lógica, pelo menos de uma forma racional e humanista. Sendo assim, justificar-se um imprevisto aumento de preços com o argumento de que vivemos numa economia de mercado é um argumento semelhante ao que se usaria para recusar as penas de prisão porque se pode aplicar sempre a pena de morte. E sobretudo porque, ao usar-se desse alegado direito ao aumento dos preços (aparentemente, para os liberais, sem outra justificação do que o "já agora aproveito") se está, ao mesmo tempo, a reduzir a margem de liberdade de quem compra, atento o universo, teoriamente infinito, de comerciantes que se arrogariam de fazer uso desse direito (direito?). E não nos esqueçamos de que quem compra já suporta, irremediavelmente, o aumento da carga fiscal sem que ninguém se preocupasse em cuidar de saber se, com esse aumento, a sua liberdade de consumo seria reduzida. E não fica?Continuamos, portanto, a falar de utopias. Partindo, por isso, de uma perspectiva pragmática sobre a questão (colocada pelo Alonso e desenvolvida pelo besugo) da bondade vs maldade ontológica da espécie humana, melhor será que se introduzam medidas correctivas, do tipo caça-oportunistas, de que todos beneficiamos. Até, veja-se bem, os comerciantes. Esta é, suponho, uma daquelas coisas que deviam ser pacíficas e unânimes (como a de que Alberto João Jardim devia ser entregue ao Hezbollah como penhor da boa vontade do Ocidente para com a causa palestiniana), mesmo para um liberal. Mas, enfim, esta ideia - como combater o oportunismo, numa sociedade liberal? - é uma areia que entope até as engrenagens liberais moderadas, quanto mais as extremistas. Caro Gabriel: as práticas são bem mais indesmentíveis do que quaisquer teorias construídas como pirâmides de cartas de baralho, por mais que pareçam atraentes e, por isso, possíveis. A economia não comanda nem a vida nem a liberdade. Se quiseres, podes até dizer que a inversa é verdadeira.
Ao que parece, visto daí, eu é que proferi uma blasfémia...
<< Home