blog caliente.

22.11.04



Olhamos pela janela e o Alvão está sempre lá em cima. Mas não se vê, da janela, isto. Isto está torpemente escondido. Uma pessoa perde-se meia dúzia de vezes antes de lá chegar, dá sistematicamente a volta ao pé duma capela risonha ("outra vez?...") que, essa sim, a capela, encontra-se sempre com facilidade, os caminhos da fé são sempre menos escondidos que os da paz e da beleza. E metade das capelinhas riem-se sempre de nós, independentemente da maneira como lá se chega..
Enfim, lá se chega. Metade das vezes. Na outra metade anoitece antes de chegarmos. Outras conversas.

Mas isto não interessa nada.
"É como o resto que tu dizes, pá!", oiço eu.
Perfeito, gosto de coros a gozar-me. Consigo imaginar corais inteiros de Santanas a fazer os baixos, de Pedros Reis e Sócrates a fazer de conta que são tenores, famílias inteiras de Portas e de Congas (Cóias, Corjas?) a fazer os contraltos (há o Portas do BE que já não consegue fazer voz de capado, ou nunca conseguiu, Deo Gratias!) e a Cinha Jardim a reger aquilo tudo, com a batuta do "baixo mais à mão"... na mão, seringadora. O padre Borga saltitaria pesadamente na minha imaginação, ondulando as manápulas em obsoleto contratempo e, num altar elevadíssimo, Goucha e Moura Guedes fariam interessantes "um-dó-li-tás".

Mas não era nada disto.
Era isto:

- "Tou, sôtôr você?"
- " Sim, sou eu, quem fala?"
- " É a fulana, da administração! Tá bom?"
- "Eu estou, que foi?"
- " É que o senhor doutor (arquitecto, engenheiro, o caralho) fulano não vai poder recebê-lo, também, no dia 23...".
- "Está doente? Morreu? Vai-se embora?"
- "Não, credo! Sôtôr você, que mau humor! Está perfeitamente, graças a Deus!"
- "Folgo muito em saber, tenho por ele devoção canina... e então, desembuche lá a sua bosta de hoje, mulher."
- "É que a sua reunião "querapaceratreziquepassoupavintititrêspaçagorapavintinove". Pode ser?"
- "Então não pode? Hurra, hurra! Claro que pode! Agradeça muito ao senhor doutor (engenheiro, arquitecto, o caralho)".
- "Farei isso! Bem haja!".
- "Amo-a, sabe?"
- "Desculpe?"
- "Não peça desculpa, você não tem culpa de fazer entesoantes preliminares."

Também não era isto.
Não, isto é que dava um filme. É agora.

-"Estou? É da administração?"
- "Sim, fala a fulana! Quer ter a bondade..."
- "Bom, daqui é o besugo. Era para dizer ao senhor doutor (engenheiro, arquitecto, o caralho) que a reunião que ele ia ter comigo no dia "vintinove" fica sem efeito. Estou a desmarcá-la, porque eu não quero falar com ele e, mais que isso, a falar com ele, não garanto que lhe não fornecesse um murro potente na focinheira. Como calcula, isso prejudicaria, a acontecer, a minha esbelta imagem de manso e cordato cavalheiro, não faltando quem me associasse à "dirty figure" de Clint Eastwood na sua versão "fourty years old, yet", ou seja, antes do filme das pontes. Nem você quer isso, cara amiga, nem eu quero andar a chegar Betadine aos nós dos dedos...".
- "Quer adiar a reunião, é, sôtôr você?"
- "Eu não. Eu quero é que você seja imensamente feliz e que não pense muito; oiça e veja aqueles anúncios dos telemóveis, aqueles que apelam a que pense menos e fotografe mais; vai ver que entende tudo: um telemóvel é uma máquina fotográfica, uma máquina fotográfica é um chaveiro, um chaveiro é uma pipeta, uma pipeta você deve saber o que é, faça favor de usar a pipeta para o que ela serve: chupe".
- "Sempre a brincar, sôtôr você! Bem haja, então, contamos consigo no dia vinitinove, sim?"
- "Claro que sim, mamífera hemi-encefálica com sotaque de lísbia, claro que contais! Falo chinês, eu?"

Bolas, também não era isto. Não me sai nada, hoje.
"- Como de costume, sôtôr você, como de costume... hihihi... não desliguei, fiquei a ouvir... hihihi".

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