blog caliente.

23.11.06

Esguichos de besugo

O Aristides é benfiquista e já só pesa 38 quilos. Estimativas feitas em pé, a homem deitado. E está a morrer, duma maneira quase alheada da sua amargura notória, lentamente.
Veiga, para ele, é uma veiga doce que ele procurasse. Mais nada.
E a morte, nele, parece uma colina que se descesse bem: nunca se descem assim, certas colinas, mas eu não sei a dele e é ele quem a desce.

De maneira que ontem, antes de sair, fui-lhe dizer que cada golo do Benfica seria, para ambos - mais para ele, mas para mim também - uma patada na barriga do destino. Ele sorriu sumido.

Hoje, antes de me dizer que "não posso ver o seu Sporting, que não há Sport TV no hospital, mas veja lá se logo ganha", pediu-me que o virasse, para lhe aliviar a parte apoiada dos ossos. E sorriu malandro, enquanto eu o voltava no regaço do fim, acusando-me de dualidade de critérios. Tal e qual.
Eu percebi: nos meus olhos devia ler-se que, da mesma forma que gostei de lhe dar a vitória do Benfica - se fui eu que lha dei, que eu aprendi isso de dar, mas posso dar assim tanto? - também gostei muitíssimo do golo do Celtic, que a apoucou nos objectivos.

Amanhã, que vem já aí, espero que o Aristides ainda esteja capaz de me dizer uma palavra de consolo, "foi o destino que não quis mais patadas, ó besugo!", com aqueles olhos brilhantes de sacanita, lobo magro que me consome enquanto se consome na sua fome imperativa de desgarrrado da alcateia, consumições diferentes do que é para consumir em cada um de nós, cúmplices desiguais do mesmo crime de sabermos ambos quase tudo, fingindo que não.

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