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30.10.06

Re: as trevas

Alonso: defendes, portanto, que "o lado que faz mais "barulho" é o que tem mais convicção". Concordarás, no entanto, que esse "barulho cheio de convicção" de que falas é um dos instrumentos clássicos da propaganda política. É assim como quem diz "quem faz mais barulho tem mais convicção, logo tem mais razão", a ver quantas alminhas se deixam enebriar pela verve abundantemente convicta.

Concordo. Mas também concordarás que é difícil manter a capacidade de fazer barulho se não houver convicção. E quanto às alminhas enebriadas, presumo que te referes ao facto de que a mobilização traz, ela própria, mais mobilização. Vale para qualquer lado de qualquer contenda e, como verdade, concordarás que é "La Palissiana".

Também concordas que a direita, com o tempo, adoptou os tiques da esquerda tradicional. Está cada vez mais colectivista e cada vez mais se move de forma organizada e disciplinadora - o que é apenas um sintoma de que se sente a perder terreno. Mas não te desiludas, Alonso: isto são apenas conjunturas decorrentes da orfandade da direita portuguesa e da falta de rumo de quem ainda navega à vista. Um dia desses (ou um ano desses), há-de renascer (o que é bom).
Aqui não concordo com nada de nada. Aliás, parece-me que te contradizes com o que antes tinhas escrito. Mas é-me indiferente se na verdade te contradizes ou não. A verdade é que a direita não adoptou tiques nenhuns da esquerda tradicional, não é nem organizada nem é disciplinada, muito menos disciplinadora. E, volto a dizê-lo, por um lado é redutor discutir isto sob o prismna da direita e da esquerda; por outro lado, a verdade é que de modo nenhum me parece que os defensores do "Não" tenham perdido terreno. O que não significa que eu não ache, também, que o "Sim" vai ganhar. Mas isso é porque eu acho que a sociedade de hoje é maioritariamente hedonista e que o aborto é apenas mais um hedonismo. Como de aqui a uns anos há-de ser a eutanásia. Assim como hoje se diz "coitadas das crianças que vão nascer sem condições", enquanto se quer, na esmagadora maioria dos casos, safar as pitas que não tiveram coragem de exigir ao namoradinho que usasse preservativo, um dia destes começamos a ouvir a treta "dos velhotes que têm o direito a morrer com dignidade", para safar a boa vida dos respectivos filhos. De desresponsabilização em desresponsabilização havemos de lá chegar: a uma sociedade em que as pessoas são como ilhas. Sem atilhos, é verdade. Mas sozinhas.

Não preciso de te dizer, Alonso, que a tua convicção - respeitável - não é maior nem menor do que a dos que defendem a despenalização do aborto. Assim como não preciso de te lembrar que a propaganda mais "barulhenta" é usada, geralmente, por quem mais teme perder um sufrágio - o que não corresponde, necessariamente, a maior convicção.
A minha convicção é respeitável, a tua também. Basta que exista. Sobre isso de que quem faz mais barulho é quem mais teme perder, tenho dúvidas. Mas aceito que temo perder. O que não faz de mim um heroi trágico, nem sequer um heroi. Só é verdade que não perderei calado. E, no limite, porque falei e porque pode ter havido quem me ouviu, nem sequer perco, porque alguma coisa hei-de ter ganho.

O tema é muito forte e isto é importante? Inteiramente de acordo. Não explico porquê porque já expliquei isso aqui vezes sem conta. E acredito, no mínimo com a mesma convicção do que tu, que a lei actual permite que sucedam indignidades intoleráveis. E que deve, como vai, ser alterada - aqui tens a minha convicção.
Pois, eu acredito que a lei que se pretende venha a ser aprovada vai permitir que sucedam indignidades intoleráveis. Lá está. E acompanho a tua convicção, ela vai ser aprovada.

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