blog caliente.

18.9.06

O "faux pas" do Papa (?)

Antes do post: Chego à conclusão que o nosso blogamemucho não é uma casa, é mais uma autocaravana. Mudámos de endereço, mas o blog é o mesmo.

O post propriamente dito:

Antes de mais, quem quiser ler o texto da comunicação do Papa - em inglês, que foi o que se arranjou - encontra-o aqui. Devo dizer que, embora seja nitidamente o texto, de natureza essencialmente filosófica, de um alemão, não é tão cerrado como a maior parte dos textos de outros filósofos alemães que tive o infortúnio de ter que ler, e a sorte de ser obrigado a entender, tudo isto no liceu.

http://news.bbc.co.uk/2/shared/bsp/hi/pdfs/15_09_06_pope.pdf

Não sei muito bem o que pensar disto.

Por um lado, o discurso em si é inócuo e o seu tema nem sequer é o Islão. Trata-se mais de saber se a vontade de Deus pode ser racionalizada pelo Homem, e outras questões profundas - de um ponto de vista filosófico e teológico - que daí derivam.

Por outro lado o Papa não é estúpido (acho que escrever isto não é blasfemar, mas se for, é mais um pecado a juntar ao rol) e vem daí a minha perplexidade.

Ou seja: sabendo nós, como sabemos, que os muçulmanos não toleram que se lhes diga nada de desprimoroso sobre a sua religião e o seu profeta - e o Papa sabe-o também - porque é que ele foi incluir no texto da sua prelecção aquela passagem de um documento com quase mil anos que, tirando os estudiosos, ninguém nunca tinha ouvido falar.

Mais, no contexto da prelecção, a citação em causa é perfeitamente dispensável.

Não me parece que o Papa não tivesse ponderado as implicações e consequências de ter escrito o que escreveu. E, por isso, a única conclusão lógica que me resta é a de que ele "quiz" que isto acontecesse.

E, então, resta a pergunta: "porquê?"

Há, pelo menos, duas razões possíveis: a) a política; b) a religiosa.

Porquê estas? Porque o Papa é simultaneamente uma figura religiosa e uma figura política. E nem ele, nem nós, nem ninguém pode destrinçar essa dupla qualidade. Se alguma coisa podemos é dizer ou pensar que ele usa a sua dimensão política como instrumento da sua dimensão religiosa. E, neste sentido, há uma dimensão subordinada e uma dimensão subordinante.

Portanto, se o Papa usa a política como instrumento - ao seu dispôr - da sua missão religiosa, será mais na "razão religiosa" que devemos procurar o motivo da inclusão daquela citação no seu texto.

A vontade de, neste mundo em que é tudo igual, tornar claro que o Cristianismo é superior ao Islamismo é uma hipótese. A vontade de estancar a sedução do islamismo nas sociedades cristãs ou "de fronteira" é outra.

Numa análise mais cínica e, portanto mais política, podemos sempre virar isto ao contrário e dizer que o motivo foi essencialmente político: demarcar a Santa Sé - tida como demasiado simpática para com os muçulmanos, segundo os seus críticos por causa de ser anti-semita - dessa sua imagem "pró-árabe", assim ganhando espaço de manobra que eventualmente lhe esteja a faltar nas chancelarias dos países ocidentais e, sobretudo, dos EUA.

Ou tudo ao mesmo tempo. Ou nada disto, porque na verdade eu estou simplesmente a especular.

View blog authority