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2.5.06

A carreira dos gagás

Quando se morre, termina-se a carreira contributiva.

É para o que se nasce: para se iniciar uma carreira dessas. E morre-se, fundamentalmente, para que ela termine. A vida é, agora, para quem não consegue atalhos à carreira (contas de restaurantes "em serviço", viaturas, cartões "piratas" para o benefício do vinho generoso, ser amigo dum tipo que faça lavagens de dinheiro ou que controle um off-shore, essas coisitas), repito, para quem não consegue atalhos à carreira, a vida é uma permanente e efémera contribuição.

Uma mãe esforça-se a expelir um feto, agora cheia de novas vontades (até por causa dos futuros e inteligentíssimos incentivos à natalidade), para quê?: para parir um carreirista.
A criança nasce, berra, alimenta-se à babugem do leitinho uns mesitos, surgem-lhe dentições... e depois? Depois, mais lhe vale começar, desde logo, a trabalhar. Logo, cedinho.

Se começar por ganhar uma bizarria escassa, tem de se preocupar com a média: corre sérios riscos, em sobrevivendo o tempo devido, de lhe fazerem as contas com os "tristes e verdes anos". Arrisca-se a bradar, no fim, daqui a uns oito lustros, que "eu ganhava, ontem aos 64 anos, 350 contos e, agora, aos 65 e mais um dia, vou passar a ter, por mês, cento e oitenta..."

Depois, espera-se que a carreira seja longa. Quanto mais longa for uma carreira contributiva, melhor. Isto pensa o "carreirista", claro. O "gestor de carreiras" não, pensa diferente.

Isto não é sempre assim, claro.

Excepto se se morre entretanto. Isto é lixado.

Amanhã vai a enterrar um que, à luz da lei, tinha uma carreira contributiva que lhe permitiria receber, talvez, ou outros por ele, "um tanto", na velhice.
Mas não chegou a velho. Terminou a sua carreira, o imbecil. Bem feita, que não cumpriu a "basezinha da nova lei destinada a poupar nos pobres em lugar de poupar nos ricos, que é para os ricos poderem ajudar os pobres dando-lhes empregos, excelentes empregos, em que os pobres poderão ter largas e longas e caducas carreiras contributivas, para que o ciclo seja frutuoso, e se não for assim, paciência, houve azar".
Não cumpriu, logo, duas coisas, o desgraçado: não terminou a sua carreira contributiva e, parvalhão, morreu cedo de mais. Azar o dele.

Faz as contas, carrasquito. E esfrega as mãozitas liberais.

Regra nova para os novos tempos, e é se querem: quanto mais se prolongar a carreira contributiva, mais tempo tem um homem de viver, o que torna a medida boa, excelentemente boa, por se constituir em mais um incentivo à sobrevivência.

Se um contribuinte falhar, ainda que seja no auge da sua carreira, poupa-se.

Reformas aos 80 anos parece-me um passo importante. Há que ser engenhoso e filho da puta, que até o povo gosta disso - em lhe correndo ao pelo.

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