blog caliente.

24.4.06

Quantas circulares há à volta de Lisboa?

As gentes do Norte têm a fama da boçalidade, do vernáculo hard-core, até do propalado ressabiamento face à capital. Mas têm, também, uma boa parte do proveito. No que me diz respeito, agrada-me muito viver numa cidade semi-provinciana, a estourar pelas costuras por não ter (felizmente) mais por onde crescer. De Lisboa, gosta-se com distanciamento, como sucede quando se conhece alguém a quem se encontra particulares virtudes mas que não atrai ao ponto de se desejar intimidades. É assim, com a capital. Habita-a quem nela nasceu, por acaso do destino, ou quem nela investiu para cumprir o sonho da escalada social ou do desafogo financeiro ao estabelecer-se com uma mercearia de bairro. Lisboa é uma cidade de exilados voluntários, que todos os dias, temerários, testam a falta de qualidade com que vivem ao passar duas horas pela manhã mais duas pelo crepúsculo na travessia da tenebrosa segunda circular e de outras monstruosidades rodoviária, mas que, ainda assim, insistem em não se mudar. Estamos mais perto de tudo. Tudo o quê, ao certo? Ninguém sabe. Alimenta-se esse assombramento com a macrocefalia. Sustentam-se as vantagens da capital num conceito viciado, e bajulador, do progresso. Não há, na verdade, qualquer vantagem em morar na capital e eu tenho-me esforçado por lembrar essa evidência a todos os lisboetas que conheço (adianto, aliás, que os mais honestos concordam comigo). Quem não sonha ser chefe de gabinete, manequim famoso, estrela da canção, pivot de telejornal, analista político, cronista social, crítico literário, jogador do Benfica ou coqueluche dos lobbies intelectuais vive infinitamente melhor no Porto. É este o meu bairrismo.

View blog authority