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21.1.06

O retrato de um artista enquanto Homem de direita

Mal tu sabes, Alonso. Mal tu sabes que aquela "posta colectiva" era, também*, um teste, em que tu, meu caro, te espalhaste ao comprido. Num padrão de “normalidade”, a masculinidade não se põe em causa através da contemplação estética e só um vago (ou algo acima disso) marialvismo a associaria a uma suposta dimensão erótica da observação. Marialvismo esse que, em geral, é homofóbico. Homofobia que, por sua vez, é típica da atitude conformista perante o mundo. Conformismo esse que, conforme é empiricamente constatável, é, politicamente, um fenómeno de direita. Et voilá.

Bom. Não seria preciso mais para situar o Alonso na sua área ideológica, mas tudo isto que ele disse merece contraditório.

Eu percebo, Alonso, que a tua decisão de votar em Manuel Alegre tenha de se escudar em valores bem demarcados (e contrastantes) dos valores de esquerda. Para um homem visceralmente de direita, votar num homem de esquerda há-de ser, no mínimo, penoso e desconfortável.
E pressente-se que, nos últimos tempos, te tens sentido meio orfão, meio desiludido com os rumos dos teus pares ideológicos. Tomemos isto como um pressuposto (confirmável ou infirmável; tu, Alonso, o dirás).

O voto do Alonso em Manuel Alegre decorre, sobretudo, de um factor decisivo que tem agradado a uma parte significativa do eleitorado de direita, crítica e pensante, que não se revê em Cavaco Silva (mas, também, quem é que pode rever-se, credo). É que o discurso de Alegre está recheado de exortações neo-nacionalistas e patrióticas, algo líricas, enfim, mas caras e preciosas a alguém que, como o Alonso, anseia pelo regresso da nação aos valores do patriotismo proteccionista. E o Alonso não me parece ser um abstencionista em coisa nenhuma. Ponderados os pressupostos, as vantagens e os riscos, é fácil perceber que o Alonso, homem de direita que não gosta de Cavaco, renega Soares e literalmente ignora as candidaturas de esquerda, digamos, extremista, optaria, como diz ter optado, por votar em Manuel Alegre.

Dizia eu que o Alonso quis, aqui, demarcar-se da esquerda, imputando-lhe, com censura, o discurso da negação que, de resto, conforme adianta, só favorece Cavaco Silva. Por outras palavras, o Alonso quis dizer que vota em Manuel Alegre mas não faz parte da pandilha de esquerda que o apoia, e que faz campanha de negação, através da crítica à pessoa de Cavaco Silva. Eu acho tudo isto muito bem, excepto na parte em que ele me inclui nessa pandilha de esquerda, por causa do meu desvario dos nãos (obrigada, Evaristo, eu nem os tinha contado! Se eu pudesse imaginar que aquilo ia ser publicado aqui, tinha escrito uns quinhentos e cinquenta, a ver se preenchia uma página do DN…).

Nada disso, Alonso. Eu não sou activista política nem faço campanha a favor ou contra. Confio, porque assim o desejo, que o candidato que em decidi votar forçará uma segunda volta, mas não transformo isso num desígnio próprio e muito menos numa batalha minha. Limito-me a ver, a ler e a observar e é, para mim, muito difícil de entender como é que um candidato a presidente da República que, segundo as sondagens de ontem, pode ser eleito à primeira volta é tão evidentemente despreparado, hesitante, pusilânime, dissimulado. Não retiro, sequer, um daqueles nãos; a alguns observei-os, a outros adivinho. Aquele discurso é de negação, sim; mas não é meu. É o de Cavaco Silva, sem tirar nem pôr.

Devo dizer, para finalizar, que me parece que a direita (e tu também, Alonso) terá de reformular este discurso, já gasto, sobre essa suposta superioridade moral da esquerda que, como estratégia de vitimização da direita, já serviu alguns propósitos, em diversas vezes com apreciável sucesso. Parece-me, porém, que os tempos são outros. No caso português, é fácil constatar que bastante mais notório do que isso é que a esquerda fala (demais) e a direita cala (há tempo demais; sabes aqueles silêncios incómodos?). Se a esquerda está pulverizada e enfraquecida pelo advento da esquerda radical (atraente para alguns, mas seguramente objecto de curiosidade para todos, pelo "colorido estardalhaço") a direita portuguesa está pior; desestruturada, decomposta, quase moribunda, só sairá desta travessia do deserto quando deixar de se sentir orfã. No meio deste marasmo político, Cavaco Silva é só a ponta do iceberg.

E isso custa-te, Alonso. Pois custa. Admite.

E pronto. Ainda não é desta vez que és expulso, mas apenas por falta de enquadramento jurídico. E tu nem sequer tentes expulsar-me a mim, que eu conto aqui tudo sobre o teu passado anti-fascista, particularmente sobre aquele dia em que, nos idos de 1975, tu assaltaste o prédio da baixa pombalina onde ainda hoje manténs o escritório a meias com o Garcia Pereira (embora não se falem).

*Vês, besugo? Sai assim, sem querer. Que má vontade a tua, pá...

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