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2.10.05

A ponte

Sentado no cadeirão, fez como sempre tinha feito: pegou num bloco de notas e fez a lista das compras. Fruta, vinho, iogurtes, pão, mais chocolates e rebuçados para dar aos miúdos, quando vão lá a casa. A caligrafia, igual à que sempre foi, certinha, carismática, cuidada, sem o menor sinal de tremor nem da mão nem do pensamento. E, ainda que seja trémulo o pensamento, sabe-se que se refugiou, sossegado, nas rotinas que cultivava com gosto, com que se rodeava de conforto escolhido à medida e com que rodeava os outros de ternuras. As mesmas rotinas com que ensinou os pequenos a ser netos e os mais maduros a ser filhos, que a vida correu-lhe muito mais como pai.

Mantém-se pai e avô, mas mudou o modo ao tempo presente, ao transformá-lo num presente aliviado no passado imperfeito ao qual, por direito, foi buscar todas as perfeições.

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