Ao leitor atento: um desabafo de uma blogger oprimida.
É sempre isto. A lolita é autoritária, a lolita manda, a lolita explora, a lolita isto e aquilo... olha que caraças!Está mais do que na hora de repor a verdade dos factos. A verdade é que eu, neste blogue, sou a única que trabalho. Ele é os links, o template, os contactos com a imprensa, o catering, o Círculo de Leitores, tudo eu, tudo eu! Enquanto isso, o besugo passeia-se em diletâncias, debitando as suas verdades (ele é um confesso admirador da Simone) e vociferando sempre que alguém se atreve a discutir temas que são tabu no universo besugal, de que são exemplos as "regalias vs falta de produtividade dos funcionários públicos", "o corporativismo e a medicina", "frangos de Ricardo" e, last but not the least, "Leonor Beleza: uma perspectiva lírica, através da obra de Cesário Verde".
Um dos mais recentes esguichos de besugo (onde ele, de resto, aflorou o tema Leonor & Cesário) contém uma verdadeira pérola que não há-de ter escapado ao leitor atento. E reza assim:
"Mas custa-me mais saber de crianças sem família, tendo conhecimento de casais (homem-mulher) que, não podendo ter filhos, querendo tê-los, gastando-se inutilmente (há casos desses, infelizmente para eles e para todos nós) em tentativas infrutíferas de fertilizações "alternativas", não se dispõem a adoptar por motivos egoístas, que contrariam a própria essência da sua vontade de ser pais."
O negrito é da minha responsabilidade. Isto, conforme sabe o leitor atento, foi escrito como contributo para a discussão sobre a adopção por casais homossexuais. Não vale, sequer, a pena discutir a vaga homofobia (mas, ainda assim, homofobia) do besugo, confessada aliás à cautela, como que libertadora para a bomba que a seguir largou. O pensamento besugal preconiza, com efeito, que os casais heterossexuais e inférteis serão egoístas se não adoptarem. Que se lixe o direito a escolher e a planear a família, a autodeterminação dos indíviduos, de que decorre a dos casais, a das nações, a de toda a espécie! Será egoísta quem, achando-se biologicamente impedido de procriar, não adopte. E pronto. Palavra de besugo!
Não sei se sabem, mas este axioma pertence a um sistema epistemológico mais vasto, de inspiração colectivista, através do qual o besugo ordena a realidade. Conjugando o sonho colectivista com o autoritarismo marxista que sempre o apaixonou, faltava só a pitada do juízo moral. Eizia.
Por via interpretativa - e o besugo, honesto homem de bem que é e se preza ser, não me desmentirá - extrai-se, ainda, uma outra lei fundamental da sociopatologia (que há-de ser a ciência que estuda os comportamentos desviantes em comparação com os comportamentos normais - portanto a ciência que estuda, também, o fenómeno da homofobia): a de que o egoísmo dos casais infertéis é a pecha que impede ainda a erradicação, para todo o sempre, dessa ideia peregrina da adopção pelos sociopatas homossexuais. Ou seja: se todos fizessem o seu dever. E mainada!
Outras questões se levantariam, outras reflexões seriam possíveis. Cada posta de besugo é um imenso manjar, acolitada de batatinhas e molho abundante. Tu desculpa, besugo, mas sabes que a minha profunda consciência humanista me impede de calar a voz perante o autoritarismo e a intolerância. E sabes que só não aceitei ser Alta Comissária para as Minorias Étnicas porque pagavam mal. Mas eu calo-me, pronto. Vou, entretanto, ler um pouco sobre sociopatologia para me inteirar dessa matéria que adivinho apaixonante e já volto.
(besugo: tu não mintas, olha-me bem nos olhos e não mintas: não era isto?)
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