Afinal mudei de ideias.
As carreiras muito curtas dos jogadores profissionais de futebol criam a aparência de que um jogador em final de carreira está acabado. Quem viu, hoje de manhã, a conferência de imprensa dada pelos veteranos Figo e Fernando Couto há-de ter reparado na expressão insegura quase disfarçada atrás do ar altivo, do tipo, "estou farto de vos dar atenção", que intencionalmente adoptaram. Figo foi ostensivamente rude e Fernando Couto, embora mais macio, barricou-se atrás das suas glórias passadas. Ambos, porém, pareciam sobretudo assustados, como protagonistas de uma intriga que lhes escapa do controle e na qual eles, acossados, esperneiam, embora sem a habilidade retórica que poderíamos ver num qualquer aprendiz de demagogo da mesma idade. E ainda bem, porque quem lhes procura subliminares intenções ou instigações à revolta cedo desiste perante a desarmante simplicidade do discurso.O futebol resume-se, para mim, a uma enorme vontade de vitórias das equipas, as equipas que eu apoio e gosto pela razão mais banal que recorrentemente está na base dos clubismos, bairrismos, chauvinismos ou nacionalismos mais ou menos exacerbados. É por razões acrescidas àquelas pelas quais sou uma portista emotiva que desejo vivamente que a selecção portuguesa ganhe amanhã à espanhola, de preferência com um demolidor três a zero, embora um magro um a zero ou um dois a um me sirva na mesma. Mesmo que joguem mal, embora eu goste muito mais de os ver a jogar bem. Eu gostava que a política nacional - em relação à qual tenho vindo a descobrir em mim uma céptica a caminho do agnosticismo crónico - me suscitasse estas convicções fortes em que os jogos da selecção portuguesa me embalam. Raios, como eu gostava.
Eu não consigo imaginar como deve ser duro, para vinte e três rapazotes entre os dezoito e os trinta e poucos anos, aguentar a pressão permanente dos milhões de olhos ansiosos e desesperados, que depositam neles todas as esperanças de uma vitória com sabor de final que, de uma forma esotérica, afastará todos os males da nação e nos fará recuperar uma efémera e embriagada auto-estima colectiva. Não consigo imaginar, mas o facto de me ter capacitado dessa inimaginada angústia dos rapazes dá-me reforçadas razões para positivamente acreditar neles, em todos, sem excepção. Se perderem, hão-de perder dignamente, a lutar pela vitória. Isso tem de bastar. Por mim, como disse, desejo vivamente que ganhem e que a pseudo-imprensa busca-podres seja extinta por decreto governamental. Aquele em que, quando o Euro acabar (mas só quando o Euro acabar, note-se), há-de exonerar alguns ministros.
<< Home