Desilusões
1. Fui educado a respeitar os mais velhos, a acreditar que todas as pessoas são boas até prova em contrário, a dar o benefício da dúvida aos nossos governantes. Assumir cargos de responsabilidade é, nos dias que correm, uma tarefa cada vez mais difícil, eventualmente cada vez menos atractiva ás pessoas competentes, rigorosas, sérias. Quanto maior for o nível "orbital" do cargo, maior deve ser a dificuldade em lidar com aparelhos partidários, com imbecilidades, lobis organizados, pagamento de facturas eleitorais, e outras anormalidades etc. Dirigir, governar, gerir a coisa pública deve ser uma tarefa, a ser levada a sério, tão estimulante como tenebrosa, e potencialmente aterogénica !2. O tipo de vida frenético que levo, faz-me recordar um colega, que dizia lamentar-se por o dia não ter 48 h, para poder fazer todas as tarefas de que necessitava. Mas existem momentos especiais em que (raramente) é possível descontrair, reflectir sobre as coisas importantes da vida, ou simplesmente não pensar em nada, nem que seja apenas para admirar a paisagem, ouvir a nossa estação de rádio favorita, as músicas escolhidas (CD, cassete) ou até respirar um pouco mais fundo e calmamente - Para mim conduzir o automóvel, em viagens longas, é um desses raros momentos de prazer, de liberdade. E aí vou eu, tipo cowboy do asfalto, a pensar na vida, a tomar decisões, a ouvir música, a fazer vocalizos ou a ouvir as últimas da rádio.
3. Como convergem os pontos 1 e 2 deste post, perguntam vocês ? Porque tenho tido a sorte de apanhar acontecimentos políticos de relevo, enquanto conduzo traquilamente o meu automóvel. O que lhe dá um sabor especial. E foi assim que este fim-de-semana pude acompanhar o último congresso do PSD. Que estranha sensação de déja-vu com aquele congresso do PS, presumo que já muito perto da derrota nas autárquicas, onde o nosso então PM Guterres saía "reforçado" numa quase unanimidade (excepto MMCarrilho) para enfrentar "os combates políticos do futuro de Portugal" - que estranhíssima linguagem compañeros, não é ? "partido unido" "fileiras cerradas" e coisas assim. Tive a sensação imediata de que aquela gente orbitava (hoje apetece-me aplicar termos espaciais, não sei porquê) num autismo incrível - como aliás se viu mais tarde. E eu fui um dos portugueses que tinha acreditado no Guterres - que tinha uma capacidade oratória / persuasiva impressionante. E, numa época de fim de ciclo cavaquista caracterizado por um discurso, por vezes arrogante, aquele homem era um bálsamo para os meus ouvidos. Por educação, acredito sempre no meu presidente, no meu PM, no meu director, no meu chefe etc, até prova em contrário como disse. O resto, foi história - o Guterres foi "reforçadíssimo" para a rua - voluntáriamente e á força - e em mim ficou a desilusão de um país novamente adiado - mesmo dentro de um contexto de pujança económica, tão propício a reformas, a mudanças. Quando penso nas paixões do Guterres: educação, saúde, blá, blá, blá...!!!
4. Mais uma vez, dei o benefício da dúvida a Durão. Ainda por cima com a solidariedade de um transmontano, que partilha mentalmente com ele a dificuldade de governar um país numa situação muito difícil. Ainda por cima um PM que se expõe dessa forma a governar, vendo as suas opções ministeriáveis a diminuirem rápidamente de qualidade - mais uma razão para eu, simples cidadão, assumir que estou aqui para o que der e vier! Dois anos depois, mais uma vez, num momento de reflexão - conduzir o automóvel pelo Alentejo profundo - ouço com atenção um Congresso de estranha unanimidade (duas vozes discordantes - da jota e de Bragança) com o nosso actual PM, também "reforçado", o partido "preparado-para-o-combate-político" com "fileiras cerradas", enfim a tal linguagem que soa a autismo por todos os lados. No fundo todos presumem, que estará algo de importante para acontecer ! Mas detesto unanimidades, deixem lá que hei-de fazer !
5. No fim do ciclo Guterres e deste meio ciclo Durão, como está o país ? Seguramente mais partidarizado. O resto deixo á vossa imaginação, á vossa opinião e experiência. Não estou nada optimista. Perdemos demasiadas oportunidades, para dar saltos qualitativos imprescindiveis no país, nos sectores fundamentais. Presumo que temos todos a noção de desperdício de energias, em matérias secundárias, e não no essencial da resolução dos problemas. E escuto, muito preocupado, um PM a fazer um discurso, a todos os títulos, inacreditável para um cidadão no exercício dessas funções:
- Não gosta da pequena política, do espírito mesquinho de certos portugueses - como se não fosse a educação da sua responsabilidade.
- Fala no papel das mulheres - rais parta os políticos que falam das mulheres como se fossem deficientes, anormalidades!
- Soube que o governo não controla as forças de segurança, é o PCP !
- Sendo Sousa Franco um homem com uma capacidade e rigor técnicos reconhecidos em todos os quadrantes políticos, cuja acção no 1º gov de guterres, terá sido essencial para adesão á moeda única europeia (corrijam-me pf se não for verdade), foi no mínimo deselegante a forma como o pm a ele se referiu - apontado como um dos responsáveis pelo descontrolo orçamental posterior. E Sousa Franco fora um dos políticos mais infuentes (?) do PSD !
- Parece que foi num governo PSD que aconteceu a adesão á CEE: eu não sabia !
- E outros momentos dum discurso, que me pareceu, no geral, muito pobre, muitas vezes demagógico, excessivo, até confuso e repetitivo. Tive pena !
6. Espero por dias melhores. Embora mais desiludido!
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