Irreflexão interna
Nunca reflecti profundamente sobre muitas coisas. Não há tempo. Não há vontade. Não há necessidade. De muitas coisas. Não são sempre as mesmas coisas, obviamente. As coisas variam tanto!Vivo em função da minha precisão de manter inconsciência no respirar e consciência nas atitudes. Essas sim, podem custar-me caro. A consciência do respirar, se involuntária, é uma execrável dispneia. E, claro está, as atitudes podem, também, revelar-se gratificantes. A gratificação é, sempre, uma resposta. Pode vir de dentro, mas não deixa de o ser.
Nunca reflecti muito sobre esta coisa dos blogues. Nunca tinha pensado neles como sendo coisa tão importante, como conceito, como fenómeno. No entanto, tendo entrado neste blogue por benévolo arrasto, cedo percebi que precisava dele. Muito.
Gosto de escrever. Um pouco como um escritor a sério, gosto muito de escrever. No meu caso, seguramente, não viria mal ao mundo se me desse, ao invés, para estar calado. Com os dedos e com a cabeça. Mas façam o favor de me assumir como uma espécie de contraponto estéril dos escritores a sério, uma penitência que suportam, caso queiram, pela simples certeza da existência de mais e melhores talentos.
Por motivos que não vêm ao caso, deu-me, desde há umas (poucas) semanas, para pensar nesta insidiosa e penetrante coisa de escrever num blogue. Em vez de pensar no que escrevo, pensar por que escrevo. Em vez de "ir ao blogue", como por vezes dizemos no blogame mucho, "pensar o blogue".
Pensar o nosso blogue é pensar nos outros blogues. Eu gostava de ter o "design" do Adzivo, do barnabé (que nunca de nós teve ciência), do Aviz (que nos espreita às vezes), do Piscoiso. Mas isso é pura forma. E eu não desdenho a forma. A forma é importante. Mas acresce que muitos dos blogues que leio (e são muitos, bem mais do que aqueles que linkámos) são muito bons. A um escriba ocasional "por gosto" é permitida esta subjectividade. Muito bons. Alguns emocionam, outros perfuram-nos pela acutilância, outros são hilariantes. Uns aparecem-nos voltados para o umbigo, outros devolvem-se todos ao exterior. Outros misturam ambos os ingredientes, numa culinária também apetecível.
No que nunca tinha pensado era na coexistência hierarquizada de blogues que tratam temas sérios e blogues que não. Tendo sido re-situado pelas circunstâncias, tive, forçada e esforçadamente, de me repensar. Repensar-nos é pensar-nos de novo, filtrados pela novidade daquilo que pensamos pela primeira vez. Não há aqui qualquer contradição.
E concordo. Concordo mesmo. Sob um certo ponto de vista este blogue não se debruça sobre temas sérios. É um blogue que, como os outros, é um ponto de vista. Mais: é um cadinho de pontos de vista que tenta encontrar seriedades nos temas que aborda, sem os rotular, de forma dogmática, de sérios ou jocosos. Este blogue tenta rir-se mesmo quando está triste. É um blogue apalhaçado. Mas que tenta não ser chocarreiro, porque não é composto de "peixeiros de faina comprada", dados ao arrasto em mares de pescar à linha. É um blogue de gente séria, ao menos quando não se ri. De gente que tenta, quanto mais não seja, encontrar seriedades alternativas (mas, nem por isso - e, muito menos, apesar disso - menores) fora dos temas eterna e etereamente decorrentes do quotidiano económico-financeiro. Não se reduz, aqui, pelo menos por enquanto, a seriedade a uma carranca.
Nem sempre conseguimos? Provavelmente. Há dias. Mas, pela parte que me toca, prosseguirá neste caminho duvidoso, entre o que "sai bem" e o que "sai mal".
Gostamos que nos leiam, da mesma forma honesta e pueril com que lemos os outros. Mas não encontramos em nós menoridades que se achincalhem perante grandiloquências. Cada vez mais vamos sabendo o nosso lugar. Não no "technorati", que existe e nos acriança em infantis negações do óbvio. Mas na vida: ela prossegue, ela foge-nos, ela é o que vai restando de nós. Para quê deixarmos de ser nós (ou o que resta de nós) só porque gostamos de escrever... e que nos leiam?
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