Era uma vez aqui dentro
De vez em quando gosto de ouvir a banda sonora do "Once upon a time in America". Esta tarde deu-me para escutá-la, de novo. Fui desencantar o CD, como seria de esperar, dentro duma caixa onde, para ser franco, devia estar um CD do Van Morrison, que hei-de procurar em devido tempo, quando me apetecer ouvi-lo. Isso não me preocupa, porque era o Ennio Morricone que queria ouvir hoje e amanhã é outro dia.Curiosamente, foi o Paco que me deu este CD, há alguns anos. Há cerca de 4 anos. Sei isso porque fiz dele uma espécie de "fundo musical" para a brilhante caminhada do Sporting no campeonato de 2000: chateava toda a gente pondo aquilo na maior altitude estereofónica (para se ouvir no quintal) antes dos jogos e, como pareceu dar resultado, transformei o Morricone numa espécie de ritual de antecipação de vitória... até ao jogo em que o Sabry me abalou a crença. Por uma semana.
O Paco (que acabo de responsabilizar, eventualmente, pelo título do Sporting em 2000...) escreveu, em minha opinião, a síntese perfeita das análises imperfeitas que todos fizemos, em registos diferentes, à morte do Fehér. O Paco sabe que o fatalismo existe, embora a gente o deteste e faça os possíveis por se esquecer dele. Mas o Paco revelou que tem sabedoria para o pressentir onde ele se mostra, para lhe notar a inevitável e marcante passagem por nós... e para se limitar a assinalá-lo da forma bonita que pudemos ler.
Eu tenho um irmão que é benfiquista doente. É o kaneko, só cá escreveu uma vez, é professor de educação física e tem um dos piores feitios que eu conheço, honra lhe seja. Ele disfarça o benfiquismo mas não consegue mais do que isso. Disfarça penosamente. Ultimamente esforça-se por parecer desinteressado das coisas da bola, embora quem o conheça de menino (desde os tempos infantis em que gravava, em cassettes BASF, as partes dos relatos de futebol em que se gritava "gooooooooolo do Benfica!" para ouvir depois, num ritual muito seu que me enternecia, se calhar por ser dez anos mais velho que ele...) lhe perceba a ansiedade de poder voltar a gritar uma alegria o mais depressa possível. E eu, que sou sportinguista, tão bem o entendo (mas ele não sabe)!
No domingo à noite, conhecendo bem o meu irmão caçula, telefonei-lhe. Não quis falar comigo, não queria falar com ninguém. Devia estar para ali a chorar aquela raiva surda que às vezes o morde. Sensível como poucas pessoas que conheço, o meu irmão sentiu, seguramente, que o Fehér lhe morreu. Já falámos, depois disso, que ele recompõe-se bem. Mas falámos, apenas, doutras coisas.
No entanto, porque ele merece, deixo-lhe aqui uma promessa. Atenção, miúdo, agora é contigo: eu não confundo as coisas e desejo fortemente que o Sporting volte a ser campeão, se possível já este ano. Mas ficas a saber que quando o Morriconne te fizer saltar os tímpanos, desta vez, também é por ti e lá pelo teu Benfica. Que mereces. E o teu Benfica também, raios vos partam que me fizeram comover.
Mandei uma faixa do Morricone à Lolita. O tema. E a Lolita, minha inimiga mais amiga da blogosfera e arredores, já percebeu que o Morricone, no sábado, quando atroar o Douro, muito mais do que antecipar a vitória que eu espero (e ela não, já se sabe que a Lolita NUNCA me subscreve...), significará o mais bonito e desinteressado hino do Benfica que alguém já escreveu. E ela, que é Mãe do mais parcial e conhecedor portista que eu conheço, saberá ensinar-lhe isso, no devido tempo.
Julgo que até o Alonso, que não liga às coisas da bola, entenderá isto. Entre duas conquistas do Rommell, do alto do seu panzer, lá vai estando connosco. Fugidio mas marcante.
Eu não gosto desta posta, não sei porquê.
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