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25.1.04

Ainda mais soltas

Há questões que são colocadas duma forma tão certeira que, quem as ouve ou lê, mais não devia fazer que não fosse prostrar-se às subentendidas respostas que as próprias perguntas encerram.
Se o não faço (prostrar-me rendido) é por revoltante e confrangedora incapacidade, que deve reportar aos meus tempos de mórula indiferenciada em ventre acolhedor. Não fora isso eu ficava caladinho, como é bom de ver.

O acutilante L.R. perguntou, dali de cima, isto:

"Greves
Algumas questões inocentes:

- Porque será que os sindicatos, sistemática e oportunisticamente, marcam as greves para a 6ª feira?

- Porque será que as greves ocorrem geralmente no sector público, por sinal onde os empregos são mais seguros?

- Se não estão satisfeitos com a política salarial, porque não se mudam?

Não há empregos? Criem-nos! Passem de assalariados a patrões! Invistam! Arrisquem! Inovem! Garanto que ficaríamos todos um bocadinho mais ricos."


Caramba. Três perguntas duras como punhos e um desabafo em forma de conselho exortativo! É obra.

Primeira questão:
Há várias hipóteses. Há aquelas que estão subentendidas nos advérbios da pergunta e as outras. Por exemplo: porque sexta-feira é um dia da semana de trabalho como os outros quatro. Eu sei que esta resposta é fraquinha mas, ao menos, não usei advérbios.
Segunda questão:
A resposta a esta pergunta é ainda mais difícil porque não se está a ver, de facto, por que raio não há mais trabalhadores do sector privado a fazer greves que não seja pela excelência do sector privado “himself”! Evidentemente que a ausência de greves no cheiroso e limpo sector privado não tem nada a ver com a obscura perspectiva do “olho da rua”, que é o olho mais cego do mundo. Mas é mais cego visto de lá, daqui nem sempre se consegue ver bem a cegueira que aquilo é.
Terceira questão e desabafo em forma de conselho exortativo:
A esta pergunta anda o governo a tentar responder e não consegue. Mas eu já comecei a tratar de reverter a situação. Convoquei uma assembleia de funcionários da administração pública daqueles que ganham à volta de 1000 euros por mês. E disse-lhes: “que quereis vós, ignóbeis parasitas, que auferis esses larguíssimos vencimentos e, ainda assim, estais descontentes? Por que não fazeis, em vez de greve, uma aplicação das vossas invejáveis poupanças num projecto desafiador e de alta pujança inovadora, que vos pode fazer, num ápice, passar de assalariados a patrões, com o benefício óbvio de todos? Cambada de súcios, que ninguém vos entende!”
Acabada a reunião fugi para aqui, sossegadinho. Mas acho que eles ainda estão lá fora a chamar-me, com bidões de gasolina, tochas e cordas grossas. Devem querer festejar, os imbecis. Esta turba é duma menoridade intelectual que chega a assustar. E que muito nos envergonha perante os nossos parceiros europeus como, por exemplo, os Estados Unidos da América.

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