blog caliente.

2.4.06

Famous light words

Pode alguém que não nasceu bafejado pelo talento da criação artística criticá-la como se dela tivesse sido autor? Quem não sabe criar arte também vê, naturalmente, diminuída a sua capacidade de a conhecer no próprio acto de criação, de nela encontrar os motivos e o seu iter criativo. Ora, um crítico de arte é, neste contexto, uma fraude: apresenta-se como profundo "connaisseur" de um ofício que não sabe, afinal, exercer. Um crítico de arte não possui, na verdade, mais habilidade para criticar do que qualquer outro mortal para contemplar o produto, o que o reduz àquilo que ele, na verdade, não pode deixar de ser - um contemplador. Mas nunca um criador. Mas pode, claro, fazer de o Criador, autodivinizar-se pela expressão (livre, claro) da distrinça entre boa escrita e má escrita segundo o insondável, mas ao que parece infalível, critério de fabrico exclusivo, mas para uso universal.

Escapam-me as razões que motivaram o João Pedro George a dedicar-se, com fervor suficiente para encher de letras umas centenas de páginas, à demonstração pretensamente inilidível do auto-plágio perpretado pela Margarida Rebelo Pinto. Não se percebe: não veio, a bem dizer, revelar nada de asssombroso, nenhum escândalo, nenhum podre que nos matasse a ilusão quanto à MRP. Provado que está (graças ao João Pedro George) que ela se auto-plagia, as nossas vidas continuam exactamente iguais ao que eram antes da revelação. Quem não lia a MRP continuará sem a ler; quem a lia, está-se nas tintas para o auto-plágio, porque um leitor, como o leitor-tipo da MRP, só deixa de ler um qualquer autor se se desiludir com o que lê - não por aquilo que terceiros declaram sobre quaisquer vírgulas mal colocadas. O que nos leva, aliás, à outra prova de inutilidade da crítica de arte: achem bem ou achem mal, o certo é que há-de haver sempre quem ache o contrário. O consumidor de arte julga, as mais das vezes, pelo seu próprio senso, e só não é assim quem não sabe muito bem o que lê ou vê, ou sequer ao quem vem, caso em que se suporta em muleta alheia apenas para aparentar erudição.

Daí que pareça bem visto, o enfurecido (mas sibilino) desabafo da Margarida sobre o tal livrinho no prelo: alguém anda a querer ser famoso à custa da fama alheia. Este há-de ser, talvez, o caso mais bem sucedido de migração blogosférica, o que mais contrariará o mito da intransponibilidade da típica escrita de blogue, até porque um livrinho de escândalos, ainda que se trate de escandalozinhos, vende sempre uma boa porção de exemplares. Enfim, pelo menos para quem aprecia o género MRP e, agora, o género JPG. Ambos, também, very light, com a única - mas decisiva - diferença de que só a primeira o confessa - ou pelo menos não desmente.

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