Ceras abertas
Justino Santos, presidente dum país que não há, com o aparato inerente a qualquer presidência, haja-a ou não, chegou ao sítio, todo encerado de véspera. Que é quando se enceram as instituições, de véspera, na esperança de reduzir a instituição à cera, ao cheiro a lavado de fresco que a cera certa empresta ao bafio institucional.Justino Santos sabia (Justino Santos é marinheiro antigo, embora prefira velejar em doçuras mansas) da semelhança entre a sua missão ali e uma mão cheia de nada que tivesse vindo na sua vez. Mas, mesmo a inutilidade deve ser rodeada de pompa institucional, quando tudo se passa institucionalmente. Encera-se uma instituição e surge, imediatamente, um advérbio.
Justino Santos chegou tarde ao sítio, exibiu a simpatia descontraída de quem pode ser simpático e descontraído nos sítios todos, porque não tem de lá ficar: é uma brisa fugaz, nem sequer é um vendaval fugaz, ambos fugazes, brisa e vendaval, mas o vendaval mais marcante. Que pena...
Justino Santos fez de cicerone dum sítio que não conhecia. No fundo, tornou-se uma espécie de "guia improvisado do labirinto", como aquele do livro de J.K Jerome. Habituado a ser protagonista onde quer que esteja, foi ao sítio falar (em vez de ouvir), perguntar coisas cuja resposta estava contida na pergunta, generalizar-se na abrangência dos "conselhos aos alunos". As generalizações fáceis de qualquer Justino são equivalentes à pomposidade dum médico que, perante doente sofrido, lhe recomenda que deixe de fumar, que beba pouco, que caminhe: isso sabe ele. Sabemos todos.
Para isto não era precisa tanta cera apressada. Até porque, amanhã, tudo seguirá o seu rumo de empoeiramento progressivo, paulatino, até ao costumeiro bafio que se consegue tocar, em alguns dias: o bafio táctil das rectaguardas da realidade.
Justino Santos não terá de o cheirar tão cedo e deve estar a descansar numa beatitude mais profunda, ainda, que o seu discurso.
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