blog caliente.

8.1.06

Gud mouning



Deve ser mesmo verdade que todo o planeta se deslumbra, voluntaria ou involuntariamente, com a diáspora anglo-saxónica. Nem que seja negando esse assombramento, através das manifestações pró-cubanas ou de renegação da hegemónica cultura americana - que atinge, com frequência, o paroxista anti-americanismo (que, a maior parte das vezes, não é primário; é sobretudo selectivo). Os britânicos, esses olhamos com um misto de desprezo pela soberba e admiração pela excelência. E, também, com alguma altivez pelas peles leitosas, baças, provavelmente a maior vantagem que nós, meridionais, temos sobre os britânicos, já que essa de sermos bem menos desafogados mas termos mais sol é tão bisonha como a dos fumadores que reclamam o direito a fumar porque pagam impostos (vide Rititi, irada por não poder fumar onde trabalha - o que eu até entendo, de um ponto de vista, agora sim, estritamente primário-reactivo).

Seja como for, a série de médias metragens de "Hercule Poirot" não seria tão saborosa se não fosse em língua inglesa, com tiques e com countryside, urbe ou ex-colónia britânicos. Se, por hipótese, Agatha Christie fosse alemã, ainda mantendo intacta a genialidade da escrita, do lento desvendar do mistério ao alcance das pistas do observador atento, teria sempre contra si a dureza rugosa da língua. E Poirot seria estranho, ao declarar "Guten Abend Fraulein, je suis enchanté!". As idiossincrasias de Hercule Poirot só se salientam no seio de britânicos; o refinado e subtil propósito é o de concorrerem Poirot, o francês (pardon, belge) meticuloso e obsessivo da ordem, com as bizarrias britânicas do five 0´clock tea with cucumber sandwiches, disputa em que é incontornavelmente difícil decidir quem é que satiriza quem. Tudo aquilo se saboreia devagar, segundo a segundo, sem perder uma frase, sequer, dos diálogos. Sobretudo sempre que Hercule Poirot pergunta. Ou, de resto, quando apenas observa.

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