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5.5.04

Cartolinhas pequenas

Está a decorrer, por todo o universitário país, mais uma queima das fitas.
A queima das fitas é uma cerimónia multifacetada, já se sabe. Mas, para que os nossos leitores mais rupestres entendam, sejamos pedagógicos: a queima das fitas, ó rústicos, é um ritual imprescindível a qualquer paisagem urbana, em que os jovens universitários decidem empiteirar-se em conjunto e zanzar pelas ruas de cartola na cabeça e bengala colorida nas mãos (preferencialmente, pelo menos até certa altura da noite). O que enfeita muito qualquer paisagem, mesmo que não seja urbana.

O estudante universitário padrão, nesta altura da época, já está cansado. Já estudou muita cerveja, já frequentou muita biblio-tasca da moda, já está bués de para-psicopatado com o stress. E pensa assim: "Bora lá pá rua com a malta, buber até cair e dizer coisas inteligentes às massas!".

E lá vão eles.

As massas, por estranho que pareça aos estudantes universitários portugueses "padrão", chateiam-se cada vez mais com estas manifestações culturais. As massas dizem: "caramba, que cambada de inúteis!" (não dizem nada, dizem assim "filhos da puta, ide pra casa estudar em vez de entupirdes o trânsito!", mas isto não se pode dizer porque pode haver estudantes universitários a ler e ex-estudantes universitários, daqueles dados à praxis, a convulsivar).

Mas é muito bonito. Sobretudo hoje em dia, em que se vê uma profusão de cartolas de cores perfeitamente "kitsch", que devem corresponder a cursos mineralogicamente divertidos, a julgar pela expressão basáltica das cabeças subjacentes.

Uma coisa não se deve fazer: é filmá-los. Os universitários portugueses em acção de queima são autênticos emplastros. Circulam pela frente das câmaras, um olho na TV e um ouvido no telemóvel, à espera da entrevista de rua. Um circo colorido, como os circos a sério, só que neste circo os palhaços fazem rir sem querer.

No dia em que Portugal ultrapassar os 11,7% de sucesso escolar secundário, nem quero pensar na garraiada que vai ser; se se aproximar dos 86,4% da República Checa, então, será o caos: uma Pamplona em San Fermín! Como lidar com tanta cabeça "emborrachada" debaixo da cartolinha, hem? Mísseis? Paulada? "Ide estudar"? "Ide trabalhar para as obras"? "Seus checos fatelas, seus letões, tendes tudo menos... enfim!"?

Caramba: travem-nos, arranjem-lhes emprego na Nokia, na Vodafone, no "nacional cançonetismo", no marquetingue, ou então em "castings" perpétuos para novelas e reality-shows! Mandem-nos para o Iraque ou para Cuba, para casa dos primos da Bélgica ou dos tios de Londres, mas tirem-nos da universidade! Ou, pelo menos, da queima! A sério!

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