Baixarias de besugo
A campanha de Mário Soares deve ser feita "à esquerda". Tomem nota, senhores do marketing socialista.O eleitorado do centro não existe. É um eleitorado não ideológico. Existe, mas não está ao centro de nada, vagueia, na maior parte do tempo, de forma obtusa. Não tem ideias, não tem inteligência, não tem motivação. Vota contra, apenas. Ou abstém-se, que é uma maneira amuada de mostrar demissão e aborrecimento.
Não é verdade que o eleitorado socialista não vote Soares. Vota, sim. Na primeira e na segunda volta. Mas são 35%, não são mais.
O eleitorado comunista de Jerónimo de Sousa pode dividir-se, na segunda volta, entre a abstenção, a ausência, o voto nulo, o voto em Soares (mais um sapo) e, cerca de 1% deles, no voto em Cavaco. São os punitivos - pessoas que gostam da autoridade como conceito e deus menor, e que são comunistas só por isso - e os tipos que não gostam de Soares, sendo capazes de dormir com mulher feia para não terem de se masturbar.
Metade do eleitorado do Bloco de Esquerda tem os mesmos tiques de metade do eleitorado do CDS-PP: é para onde lhes dá. E a gente sabe que começaram (quase todos) por ler e escrever no Independente, uns contra, outros a favor, fosse do que fosse. Tirando Louçã e mais meia dúzia (espero eu) são rebeldes sem outra causa que não seja o seu protagonismo. E, reconheço, punir Soares pode fornecer protagonismo. Lá em casa, ao jantar, sobretudo. E em alguns programas da SIC, radical ou não.
Posto isto, Cavaco não ganha estas eleições, de forma nenhuma. Sobretudo se Soares se apresentar, como lhe compete, com um discurso de esquerda. Se conseguir convencer o eleitorado disfuncional (os 20% que andam sempre ali à babugem da sua bipolaridade intelectual) de que caga neles, que votem onde quiserem que ele não se importa. O eleitorado flutuante inclui cerca de 75% dos cornos mansos do país, o tipo de indivíduos que, em não lhes ligando, tendem a escrever poemas e a protestar a sua dor em cartas (ou votos) de amor à mulher amada que, assim, tanto os desdenha.
Soares, em sendo esperto, terá de tentar fazer esquecer que sacaneou Alegre (nem que tenha de pedir a Alegre que esqueça mais esta sua travessura de soba) e substituir-se a ele no imaginário de quem acredita, ainda, em alguma coisa. Terá de o ter a seu lado, na campanha. Isto não apoucará Alegre, pelo contrário, será apenas mais um sapo que Alegre, homem vertical, engolirá pelos outros. Era nele que votaria, sem qualquer dúvida, mesmo sabendo que perderia, provavelmente. Alegre iria ter um destempero qualquer que lixaria tudo, como é comum nos homens de bem. Mas eu gosto dele, seria um bom presidente da república. Provavelmente seria um mau ministro das finanças, mas não é isso que está em causa.
Soares tem estas eleições ganhas, embora renhidamente ganhas, se fizer assim. Se resolver fazer-se ao eleitorado do centro (que não existe, como já expliquei) vai perder o eleitorado de esquerda. É esse que tem de conquistar. É esse eleitorado que, a menos que Judas (o dos trinta dinheiros) ande aí á solta, o fará ganhar. Ou perder. Cavaco, na primeira volta (em aparecendo) terá cerca de 40% dos votos. Soares deve dirigir a sua campanha no sentido de não o deixar passar dos 49%, na segunda volta. Terá de fazer como eu digo, sem sombra de dúvida. E andam aí a dizer que um presidente da república não tem de ser humanista, de ter um trajecto humanista, mesmo que se admita que o humanismo, por vezes, descambe em narcisismo. Esta é boa. Tem de ser o quê, então? Um tecnocrata ainda mais narcisista, com menos motivos para se olhar ao espelho, ainda por cima?
Que fique claro, contudo, que Soares é livre de não seguir os meus conselhos. A blogosfera representa cerca de 0,7% dos votos, provavelmente. Pouco me importa se os segue ou não, aos meus conselhos. Não vivo disto, sequer. Eu trabalho.
E não acredito, já agora, que se possa votar em Cavaco ou contra Cavaco. Ele não tem tomates para se candidatar, sequer (e se se candidatar, nesta altura, já se pode dizer que o faz por falta deles, vai dar no mesmo).
<< Home