blog caliente.

1.9.03

Dispneia. Olha, não digas.

Ando com falta de ar. Ou melhor, o ar não me falta, acontece é que o ar que tenho não me chega, parece que não me dá aquela saciedade plena de quando respirava melhor.
Deve, talvez, ser do fumo dos cigarros. Mas pode ser, também, por andar a respirar duma forma mais consciente, menos leviana. Sim, que eu respirava levianamente, como toda a gente que respira desde cedo. Quando se respira levianamente, não monitorizamos os nossos movimentos respiratórios, inalamos e exalamos com a mesma profundidade inconsciente e redentora: o ar lá vai, lá cumpre silenciosa e eficazmente, quase anonimamente, o seu papel purificador. A não ser em momentos de esforço, mas mesmo nessas alturas, a verdade é que temos, geralmente, mais (e, se calhar, melhor) em que pensar. A coisa agrava-se é quando começamos a vigiar-nos de tão perto que nos abafamos.
Isto não se resolve com máscaras de oxigénio a 24 ou a 28 por cento, nem com nebulizadores plenos de salbutamol. Também não se resolve com ansiolíticos, nem antidepressivos. Um abraço dos filhos ajuda... mas eles, depois, vão outra vez brincar e a gente fica na mesma agonia mansa, estuporosa, bovina, dispneica.

Do que eu preciso mesmo é dum dia cinzento na montanha, daqueles dias em que a gente fica só, enevoadamente, com os nossos pensamentos, a ouvir músicas que nos fazem deslizar pelos entrefolhos da gelatina encefálica melhores lembranças, mais belos projectos, menos amargura e algum restinho de beleza... Mesmo que os projectos se revelem engenharias impossíveis para tão pouca gelatina, e que a beleza esteja sempre lá e a gente fique triste por não poder metê-la toda dentro do peito, há-de ficar sempre uma certa doçura. Quanto mais não seja por termos ficado ali um bocadito esquecidos de nós enquanto nos apalpamos por dentro, esquecidos de respirar, mas respirando mesmo assim. Leviana e satisfatoriamente. Descer a encosta é que é pior.

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